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Problemas decorrente do envelhecimento conflito inter geracional

2.4 Teorias Éticas

2.4.2 Paradigmas éticos em torno do envelhecimento

2.4.2.4 Problemas decorrente do envelhecimento conflito inter geracional

Nunca tanta gente chegou à idade avançada como hoje, e este progressivo aumento de pessoas idosas, sobretudo das muito idosas, tem aumentado a probabilidade de ocorrência de situações de dependência física, psíquica e social. Esta tendencial perda da autonomia, torna-as dependentes do apoio de terceiros, despontando a necessidade de se criarem novas respostas por parte do Estado e da sociedade civil, gerando preocupações no que respeita à sobrecarga dos sistemas de Segurança Social, à precariedade das suas condições de vida, à exclusão social, ao isolamento e ao exercício dos direitos.

Numa sociedade multigeracional, a opção da delegação da responsabilidade do encargo social com a velhice ao Estado ou à Família e a crescente exposição ao risco entre a popu- lação mais idosa, constituem novos/velhos desafios para a reconfiguração do contrato social, baseado num equilíbrio sustentável entre as gerações.

Sustentam algumas vozes que os gastos com as gerações mais velhas são excessivos e superiores aos que são feitos com as gerações mais jovens, o que é suscetível de agravar situações de conflito entre gerações, e desarranjos na evolução dos sistemas de Segurança Social74. Segundo L. Roussel, (cit, por Pimentel, 2001), os idosos constituem um grupo

74 Como refere M. Rosa (1993) citada por (Pimentel, L. 2001), o sistema de segurança social ´´e financiado,

na base de uma “solidariedade geracional do tipo transversal”, assente na conversão automática das contri- buições dos indivíduos ativos em pensões, fazendo com que o mesmo tende a ser crescentemente gravoso para as gerações mais jovens, das quais provém o grosso das contribuições. “Este aumento das despesas sociais para financiar as pensões de velhice pode …. originar um mal-estar social e conduzir, inclusivamen- te, a um conflito entre gerações com consequências gravosas para a sociedade.”

com poder potencial, capaz de exercer forte pressão política e económica “La guerre entre les générations nàura peut - être pás lieu, mais les tensions paraissent s`aggraver”. Numa visão mais pes- simista, a preocupação estende-se ao “conservadorismo” e a falta de vitalidade e dinamis- mo que tal envelhecimento acarretará para as sociedades (Fernandes, 1997).

Segundo M. Rosa (cit. por Pimentel, 2001) não é correto pensar-se que o envelhecimento demográfico traz efeitos necessariamente perversos em termos sociais, no entanto, este chama a atenção para os efeitos nem sempre positivos decorrente do aumento do número de idosos, pessoas mais velhas e dependentes75, especialmente quando associado a um conjunto de outros factores, susceptíveis de gerar desequilíbrio de forças e de recursos.

O peso crescente dos idosos na economia, a atual contração do crescimento económico a nível nacional e mundial, as medidas, sem paralelo, de contenção orçamental contempla- das no Plano de Crescimento Económico, com acentuada redução das transferências do Orçamento do Estado para os setores da Saúde e da Segurança Social tem agudizado, de forma significativa, a vulnerabilidade dos idosos na nossa sociedade.

A problemática das relações entre e no interior das gerações conduzirá inevitavelmente, de acordo com as linhas de análise do Livro Branco da Segurança Social76, à emergência de políticas globais de idade, novas formas de solidariedade e de convivência entre idades, grupos de gerações e culturas, desvanecendo as fronteiras entre os grandes grupos de ida- de, para tornar possível a existência de um capital social mínimo nas diferentes socieda- des, sem o qual todos os outros tipos de capital correm o risco de perder o sentido.

Segundo (Cabrillo e Cachafeiro, 1992) a questão de fundo com o problema da velhice não está na distribuição das despesas públicas, mas na integração social da pessoa idosa. A pessoa idosa não é um ser inútil, nem as suas qualidades e efeitos têm de ser encobertos,

75 Fala-se hoje, do aparecimento do conceito de 4.º idade. Segundo o INE (1999) o crescimento dentro da

própria população idosa não é homogéneo (Pimentel, L. 2001)«O grupo dos 75 e mais anos cresceu segun- do taxas superiores às da população com 65 e mais anos nas décadas de setenta e oitenta, …. A partir de 1981 o ritmo de crescimento mais forte passou a pertencer à população com 85 e mais anos. Esta situação retrata o envelhecimento da própria população idosa». Graças à melhoria das condições de vida e ao avanço da medicina é hoje perfeitamente possível ser-se da “terceira idade” e ainda estar-se ativo física e mental- mente. Deste modo surgiu a necessidade de criar um novo termo para designar a pessoa já no limiar das suas capacidades, daí a emergência do termo “quarta idade” ou “grandes idosos”. Não existe contudo uma opi- nião uniforme, nem em relação aos termos a utilizar, nem em relação aos limites de idade que os caracteri- zam. Assim, "Quarta Idade", a partir dos 85 anos aproximadamente (Nogueira P., 1996), para outros autores, a expressão é utilizada para referenciar os maiores de 74 anos, existindo ainda outras opiniões.

pelo contrário, podem e devem ter uma função na vida social, sem que constituam uma carga para as gerações jovens.

A este propósito, cabe aqui referir a noção de ética de responsabilidade de Hans Jonas, que apela ao dever para com as gerações futuras. O dever do homem em “preservar a humani- dade de ameaças contra a humanidade”.

A ética da responsabilidade, que coloca o homem no centro de tudo o que acontece, como “tutor” de todas as formas de vida, o outro

“que pode ser um ser humano, ou um grupo social, um objecto, um património, a natureza, o outro que pode ser o nosso contemporâneo, mas que será cada vez mais um outro futuro cujas possibili- dades de existência temos que garantir no presente". (Santos, B, 2000).

O respeito pela vida que se pretende desenvolver na mais profunda dimensao temporal, coloca a questão da responsabilidade no cenário das reflexões hodiernas. Jacqueline Russ77 observou:

“Se o respeito à vida enquanto tal está presente na filosofia antiga da Índia e na tradição judaico- cristã, o respeito ao corpo vivido, à existência encarnada, ao organismo qualificado por sua perti- nência a um destino, se enraíza no cristianismo, mas também no pensamento moderno...”

Trata-se, agora, de empreender esforços que orientem e afirmem a conduta responsável de todos aqueles cujas ações possam interferir com o bem estar dos idosos. E tal exigência precisa considerar a dimensão temporal dessa responsabilidade, porque, envolve compro- metimento com o geracional, isto é, com as gerações atuais e também com as futuras, abrangendo estas últimas as mais longínquas que o pensamento, desde hoje, seja capaz de projetar.

O desafio à bioética torna-se emergente e crescente, na medida em que esta assume o compromisso de propor princípios e limites orientadores para o esperado comportamento responsável de todos aqueles que, de algum modo, são capazes dessa intervenção e modi- ficação nos mais amplos domínios da vida.

76 Livro Branco da Segurança Social, Comissão do Livro Branco da Segurança Social, Versão Final, (1998). 77 Professor universitário agregado, doutor em filosofia e ciências humanas.

Atualmente a bioética apresenta-se como procura de um comportamento responsável por parte daquelas pessoas que devem decidir tipos de tratamento, de pesquisa ou de outras formas de intervenção relativas à humanidade e ao próprio biossistema terrestre.

O reformulado princípio da responsabilidade, expresso no pensamento de Hans Jonas, vem agora posto como uma espécie de base sobre a qual se espera construir todo esse comprometimento de respeito temporal profundo para com a vida. Como observou Rami- ro Marques (Marques, R, 2001) , a virtude do respeito traz consigo o que ele chamou de “polaridade ativa” a qual está marcada pela inafastável exigência de preocupação com os outros.