O presente estudo engloba os três objetivos da neuropsicologia. Enquanto pesquisa, busca compreender o impacto do tumor e de seu respectivo tratamento sobre o funcionamento cognitivo das crianças acometidas. Para tanto, parte da aplicação de instrumentos e observações clínicas com objetivo diagnóstico, nos quais são consideradas quaisquer condições associadas a danos cerebrais que possam intervir sobre aspectos cognitivos e sócio-educacionais, tais como: natureza, extensão e localização da lesão; características físicas, de gênero e de idade do paciente; sua história psicossocial e; particularidades neuroanatômicas e fisiológicas. Embora o desenvolvimento de programas de reabilitação neuropsicológica não esteja previsto operacionalmente neste estudo, espera-se que os resultados por ele obtidos transformem-se em elementos determinantes para a proposição de intervenções que minimizem os impactos neuropsicológicos decorrentes do adoecimento e do tratamento dos tumores de SNC.
A avaliação neuropsicológica é o método utilizado para a realização do diagnóstico neuropsicológico, através da investigação do funcionamento cerebral com base em técnicas desenvolvidas pela Psicometria, Neuropsicologia e Neurologia Comportamental (Mäder, 2002). Os sujeitos participantes foram submetidos a protocolo de avaliação neuropsicológica constituído por provas quantitativas e qualitativas As avaliações foram realizadas na própria instituição, com tempo de aproximadamente três (3) sessões individuais, com duração aproximada de 50 minutos cada. Os instrumentos utilizados são apresentados na tabela 2:
DOMÍNIO COGNITIVO INSTRUMENTO26
NÍVEL INTELECTUAL 1. Escalas Wechsler de Inteligência para Crianças – WISC-III.
ATENÇÃO 1. Teste de Atenção por Cancelamento de Capovilla &
Montiel (2007).
FUNÇÕES PERCEPTO- GNÓSICAS
1. Protocolo CEHOPE-LAPEN de avaliação neuropsicológica qualitativa.
FUNÇÕES MOTORAS E PRÁXICAS
1. Bateria de Testes Neuropsicológicos – BTN; 2. Bateria Piaget-Head;
3. Protocolo CEHOPE-LAPEN de avaliação neuropsicológica qualitativa.
MEMÓRIA
1. Span de dígitos – WISC-III;
2. Teste de aprendizagem auditivo-verbal de Rey (RAVLT);
3. FAS – fluência verbal; 4. Figuras Complexas de Rey
5. Recordação de História (Teste de Memória Lógica); 6. Protocolo CEHOPE-LAPEN de avaliação
neuropsicológica qualitativa.
LINGUAGEM 1.2. FAS – fluência verbal; Protocolo CEHOPE-LAPEN de avaliação
neuropsicológica qualitativa.
FUNÇÕES EXECUTIVAS 1. Teste de Classificação de Cartas de Wisconsin –
WCST.
Tabela 2: instrumentos componentes do protocolo de avaliação neuropsicológica.
Embora para o estudo do impacto decorrente dos tumores de fossa posterior e de seu tratamento seja desejável a investigação detalhada dos substratos cognitivos básicos responsáveis pelo declínio intelectivo-acadêmico das crianças, no presente estudo serão utilizados exclusivamente os dados oriundos da avaliação da capacidade intelectiva através das Escalas Wechsler de Inteligência para Crianças – WISC-III - instrumento padronizado e normatizado para a realidade brasileira. Esta opção se justifica pela inserção em proposta de mestrado, cujo prazo de execução é de 24 meses.
A seguir será apresentada a WISC-III e seus escores derivados:
4.3.1. Escalas Wechsler de Inteligência para Crianças – WISC-III:
O WISC-III, editado em 1991 e padronizado para o Brasil em 2002, é a versão infantil das escalas Wechsler, que têm sido comumente utilizadas na avaliação do desempenho intelectual de crianças na faixa etária de seis anos a 16 anos e 11 meses. A escolha por esta escala é justificada pela concepção de inteligência proposta por David Wechsler, para quem a inteligência é mais um efeito do que uma causa, podendo ser descrita como um conjunto de componentes intelectivos e não-intelectivos que permitem ao sujeito agir intencionalmente, pensar e lidar com o seu ambiente (Nascimento & Figueiredo, 2002). A utilização deste instrumento no presente estudo não tem o objetivo único de encontrar escores de QI que justifiquem o rebaixamento intelectual global de crianças expostas ao tratamento do câncer infantil. O uso de tal ferramenta de avaliação foi pautado pela busca por uma maior e melhor compreensão acerca do funcionamento interdependente das funções psicológicas neste subgrupo específico de crianças. Muitos subtestes da WISC-III têm sido utilizados isoladamente na avaliação de funções cognitivas específicas, como é o caso do sub-teste Dígitos que comumente é utilizado na avaliação da memória imediata verbal (ordem direta) e flexibilidade cognitiva (ordem inversa).
A WISC-III é composta por 13 subtestes que, quando agrupados de modo específico, fornecem três escalas de QI: QI Total (QIT), QI Verbal (QIV) e QI de Execução (QIE) e quatro Índices Fatoriais: Compreensão Verbal (ICV), Organização Perceptual (IOP), Resistência à Distração (IRD) e Velocidade de Processamento (IVP).
De acordo com Figueiredo (2000), o QIT pode ser considerado a melhor medida da habilidade cognitiva fornecida pelo WISC-III, apresentando um coeficiente de fidedignidade de 0,96 e um erro padrão de medida (EPM) de 3,20. Entretanto, a autora destaca que discrepâncias significativas entre os escores do QIV e o QIE, flutuações dos índices fatoriais, dispersões entre o desempenho nos subtestes ou a presença de variáveis afetivas e/ou culturais podem comprometer a utilização do QIT como índice da capacidade geral de inteligência da criança.
A escala verbal, que apresenta um coeficiente de fidedignidade de 0,95 e um EPM de 3,53, avalia a compreensão verbal e fornece informações acerca do processamento da linguagem, raciocínio, atenção, aprendizagem verbal e memória. Por sua vez, a escala de execução, que apresenta um coeficiente de fidedignidade de 0,91 e um EPM de 4,54, permite a avaliação do processamento visual, da capacidade de planejamento, aprendizagem não-verbal e habilidade para a manipulação de estímulos visuais de forma rápida (Figueiredo, 2000).
Os quatro índices fatoriais refletem aspectos específicos do funcionamento cognitivo. Segundo Figueiredo (2000) os fatores de Compreensão Verbal e Organização Perceptual seriam dimensões mais puras dos domínios verbal e não-verbal respectivamente. Por sua vez, o índice Resistência à Distração, envolvido no domínio verbal, avalia concentração e memória imediata, tendo forte correlação com as
habilidades matemáticas. Por fim, o índice Velocidade de Processamento reflete a velocidade psicomotora e a velocidade mental (Figueiredo, 2000)27.