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1.1. Tumores de Fossa Posterior:

1.1.3. Tratamento dos tumores de Fossa Posterior:

O alto grau de sofisticação terapêutica tem elevado de forma significativa os índices de sobrevida de crianças acometidas por tumores de SNC. Os progressos obtidos nas técnicas neurocirúrgicas, na radioterapia e na quimioterapia tornaram os tumores de SNC potencialmente curáveis (Furrer & Suzuki, 2003).

O tipo de tratamento a ser adotado é determinado pela idade e pelas condições neurológicas do paciente, pela localização, natureza histológica e extensão do tumor (Ferrigno, 2003). Nas próximas seções, serão abordadas em maior detalhe as modalidades de tratamento acima referidas.

a) Cirurgia:

A cirurgia é a via de redução tumoral mais rápida e eficaz, sendo, portanto, a primeira intervenção terapêutica dos tumores de SNC. A ressecção cirúrgica tem como principais objetivos: 1) a redução do volume tumoral e da população de células neoplásicas; 2) a diminuição da pressão intracraniana; 3) a retirada de amostra de tecido tumoral para análise anatomopatológica; 4) o restabelecimento do trânsito de líquor em caso de obstrução por hidrocefalia (Sanematsu Jr. & Suzuki, 2003).

A ressecção pode ser realizada parcial ou completamente, em função da avaliação do grau de infiltração do tecido tumoral nas estruturas nervosas. Quando não há envolvimento de estruturas adjacentes, como pedúnculos cerebelares e tronco encefálico, busca-se a ressecção mais completa possível. O grau de ressecção do tumor é um fator de grande valor prognóstico, uma vez que a existência de lesões residuais determina a necessidade de intervenções terapêuticas posteriores. Após a cirurgia, é realizado o controle periódico por imagem (tomografia computadorizada, ressonância nuclear magnética etc.), visando o acompanhamento da evolução da lesão para, se necessário, ser traçado um planejamento terapêutico adicional (Furrer & Suzuki, 2003).

A neurocirurgia tem alcançado grandes progressos nas últimas décadas, dentre os quais se destacam as avançadas técnicas de imagem que, por permitirem uma visualização topográfica mais acurada das lesões, tornam possíveis ressecções mais precisas e menos traumáticas ao tecido cerebral saudável circundante. Assim, tumores que antes eram considerados inabordáveis cirurgicamente, como os de fossa posterior e

da região da pineal, são atualmente submetidos à cirurgia com bons resultados de sobrevida (Sanematsu Jr., 2003).

b) Quimioterapia:

A quimioterapia consiste no tratamento do câncer através da administração de substâncias capazes de impedir o processo de divisão celular e, consequentemente, interferir na proliferação das células tumorais. As principais vias de administração de agentes quimioterápicos são a endovenosa e a intratecal (administrada entre as meninges, via adotada em alguns casos de tumores de SNC) (Furrer, 2003).

O uso de quimioterapia para o tratamento de tumores de SNC foi ampliado significativamente nos últimos 10 anos. Em crianças com baixa idade ao diagnóstico, a quimioterapia é utilizado como forma exclusiva de tratamento, sendo administradas altas doses com vistas ao controle da doença sem o recurso à radioterapia, ou retardando o seu uso, quando este for imperativo (Furrer, 2003).

No entanto, ainda persistem dificuldades associadas ao uso da quimioterapia em tumores de SNC. A heterogeneidade celular presente nestes tumores, o surgimento de linhagens celulares resistentes, a existência de diferentes graus de malignidade em uma mesma neoplasia e a restrição de alguns agentes quimioterápicos em ultrapassar a barreira hemato-encefálica11 podem interferir na eficácia terapêutica de agentes

quimioterápicos. Novas estratégias de utilização do tratamento quimioterápico vêm sendo propostas, dentre as quais se destacam os protocolos combinados de drogas

11 A barreira hematoencefálica é uma espécie de “fronteira” composta por capilares sanguíneos, com o compartimento intersticial

do tecido nervoso, que dá acesso ao compartimento intracelular. Essa barreira é extremamente seletiva, e atua impedindo a passagem de substâncias que possam causar danos à função dos neurônios.

quimioterápicas que, através da administração de fármacos com ação em diferentes fases do ciclo celular, atingem diferentes populações celulares do tumor e reduzem o risco de resistência (Furrer, 2003).

c) Radioterapia:

A radioterapia consiste em tratamento local ou regional realizado através do uso de radiação. Estas substâncias são capazes de promover a ionização dos átomos, formando radicais livres que quebram a cadeia de DNA das células na presença de oxigênio. Assim, a ação dos radicais livres alteram a integridade reprodutiva das células, agindo diretamente sobre o DNA celular. O uso da radioterapia no tratamento de tumores de SNC tem como objetivos: 1) destruição das células neoplásicas; 2) diminuição das chances de recidiva local; 3) prevenção de recaída ao longo do neuro-eixo em alguns tumores; 4) tratamento exclusivo de tumores inabordáveis cirurgicamente e; 5) a melhora do controle local e da sobrevida de crianças com tumores residuais (Ferrigno, 2003). As radioterapias de neuro-eixo e no local primário do tumor têm sido incluídas nos protocolos devido ao alto potencial metastático de alguns tumores de fossa posterior, e a sua utilização bem-sucedida na prevenção da disseminação da neoplasia através das vias cefalo-raquidianas (Stargatt et. al., 2002).

Os protocolos terapêuticos mais recentes empregam estratégias designadas e estratificadas em função da gravidade de cada caso. Para a composição dos protocolos terapêuticos, fatores como a idade da criança, a natureza da lesão, sua localização, presença/ausência de metástase e o volume de tumor residual após a ressecção cirúrgica são determinantes. Também a técnica de administração a ser utilizada (variáveis em

termos de áreas a serem irradiadas, doses finais e frações a serem liberadas), como a radioterapia crânio-espinhal, de crânio total, focal, a braquiterapia e a radiocirurgia é determinada por cada situação específica (Ferrigno, 2003). Nos protocolos terapêuticos atuais para meduloblastomas, o tratamento padrão corresponde à dose de 36 Gy12 nas

vias crânio-espinhais, seguida de dose adicional de reforço em fossa posterior, resultando num total de aproximadamente 54 a 55,8 Gy13 (Gottardo & Gajjar, 2006).

O tratamento supracitado é bastante agressivo ao SNC em desenvolvimento. Embora tenha havido esforços contínuos com vistas à redução dos efeitos da radioterapia sobre o funcionamento cognitivo14, essa modalidade terapêutica tem

demonstrado impacto adverso sobre o processo de neurodesenvolvimento, sendo responsável por déficits neurocognitivos importantes, especialmente em crianças diagnosticadas precocemente (antes dos sete anos) (Palmer et. al., 2007; Mulhern et. al., 2005; Ris et. al., 2001).

Nesse contexto, faz-se necessário o diálogo entre a Neuropsicologia e a oncologia pediátrica, com foco especial na possibilidade de investigação, compreensão e minimização dos impactos decorrentes dos tumores de SNC e de seu tratamento. Esta aproximação pode fornecer importantes subsídios para a proposição de estratégias de reabilitação cognitiva para este subgrupo clínico, garantindo a essas crianças o desenvolvimento pleno do seu potencial de aprendizagem.

12 A radioterapia tem como unidade de medida o Gray (Gy). Esta unidade corresponde à dose de radiação absorvida, medida em Joules por Quilograma (J/Kg). Um Gy corresponde à absorção de um joule de radiação por quilograma de matéria.

13 . Alguns centros têm adotado protocolos terapêuticos compostos de doses reduzidas de radioterapia crânio-espinhal (23,4 Gy) (Gottardo & Gajjar, 2006)

14 Dentre os quais se destacam o uso da topografia tridimensional para a administração de radiação terapêutica, com vistas à atenuação dos efeitos adversos do tratamento radioterápico (Palmer et. al., 2007).

Nas seções seguintes, será realizado breve aporte teórico acerca dos fundamentos da Neuropsicologia. Em seguida, apresenta-se o curso de maturação e desenvolvimento ontogenético das estruturas cerebrais, funções e habilidades cognitivas, visando fornecer o substrato necessário à compreensão dos prejuízos cognitivos observados em quadros de lesão ou disfunção, como é frequentemente observado em crianças com neoplasias cerebrais.