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3 PERCURSOS METODOLÓGICOS

3.3 PROCEDIMENTOS DE PRODUÇÃO DE INFORMAÇÃO

Como procedimentos de produção de informações, foram utilizados uma entrevista semiestruturada e um questionário sociodemográfico. Ao falar sobre o seu trabalho a partir da utilização de entrevistas, Zago (2003) entende que os instrumentos de construção de informações só ganham sentido quando articulados à problemática da pesquisa. Sendo assim, objeto de estudo e método se constituem mutuamente e, portanto, a metodologia de pesquisa precisa ser pensada e adequada àquilo que se pretende estudar. Justifica-se este posicionamento ao se acreditar que o fenômeno a ser pesquisado precisa ser compreendido como algo em constante construção, que se faz historicamente e não está dado, o que singulariza cada pesquisa. Sobre as particularidades de cada pesquisa e a multiplicidade de fatores que podem influenciar sobre os resultados, Zago (2003) afirma:

Não é inoportuno lembrar que a construção de um trabalho de campo é sempre uma experiência singular e esta escapa frequentemente à racionalidade descrita nos manuais de metodologia. [...] Neste sentido, há uma relação dialética permanente entre a realidade social identificada no trabalho de campo e o referencial adotado para a interrogar. (ZAGO, 2003, p. 292). Para Zago (2003), a escolha pelo tipo de entrevista não é neutra, assim como a escolha de outros instrumentos de obtenção de informações

também não o é. Esta escolha se justifica pelas interrogações e preocupações que a problemática da pesquisa suscita, o que leva o pesquisador a buscar as estratégias apropriadas para respondê-las. Sendo assim, optou-se pela utilização de entrevistas semiestruturadas, instigadas a partir de eixos norteadores (Apêndice C), como proposta metodológica (FLICK, 2004; MINAYO, 2009), acrescidas de um questionário sociodemográfico.

Compreendendo o desenrolar da entrevista como um processo em construção que envolve entrevistador e entrevistado, apesar das questões pontuais e pré-definidas pelo roteiro norteador da entrevista, a postura escolhida pela pesquisadora foi pedir para que as famílias contassem sobre o processo de adoção, suas experiências familiares e as vivências da deficiência. Estas narrativas, por sua vez, eram complementadas e dialogadas com as questões interpostas pela pesquisadora, proporcionando espaço para que estas famílias contassem sobre a sua história e sobre a trajetória familiar.

Outra consideração que se procurou manter presente durante a realização de todo o processo de pesquisa, foi o entendimento explicitado por Martins (2009) de que, apesar de projeções empáticas permitirem compreender o eventual impacto de uma determinada lesão corporal, é necessário olhar para as histórias de cada pessoa e reconhecer os modos singulares pelos quais vivenciam a sua condição corporal. A partir deste entendimento, que não categoriza o sujeito a priori em uma identidade fixa ou em um modo restrito de vivenciar uma condição corporal, é possível compreender as especificidades e singularidades de cada experiência de deficiência e, para além desta, de cada história de vida.

As entrevistas tinham como principal objetivo a compreensão das interpretações dos participantes sobre suas experiências, ou seja, os sentidos que eles atribuem à vivência da adoção de crianças e jovens com deficiência. Entre as questões propostas no roteiro (Apêndice C), buscou- se conhecer os motivos que levaram as famílias pesquisadas a exercerem a parentalidade por meio da adoção; a descrição de como se deu o processo de adoção, incluindo aspectos pré e pós-adoção, como a participação em grupos de apoio à adoção; o atendimento psicológico ou jurídico; o estabelecimento de vínculo entre cuidadores ou cuidadoras e criança; possíveis barreiras sociais e atitudinais e possíveis preconceitos vivenciados pela adoção e/ou pela deficiência.

As entrevistas foram realizadas entre os meses de maio a setembro de 2014, na residência das famílias, ou então em seus locais de trabalho, conforme o que as famílias consideravam mais adequado. Sobre o local de realização das entrevistas, entende-se que este também influencia na

situação de pesquisa e caracteriza-se como condição importante para a produção dos dados, uma vez que os efeitos das entrevistas serão distintos, dependendo do local onde forem realizadas (MATA MACHADO, 2002; ZAGO, 2003). Zago (2003) defende que entrevista e observação são dois instrumentos inseparáveis e complementares. Sendo assim, a escolha metodológica em realizar as entrevistas na residência dos pesquisados, quando se trata de estudos com famílias, oferece um material de observação bastante rico. Como vantagens da realização da entrevista na moradia dos informantes, destaca-se também a possibilidade de obter dados sobre as condições sociais e econômicas das famílias, a redução de interferências exteriores e a facilidade de conversação (ZAGO, 2003).

Embora algumas entrevistas tenham sido realizadas nos locais de trabalho dos participantes da pesquisa foram providenciados por eles espaços com pouco ruído e poucas interferências externas. Costumeiramente, as entrevistas eram realizadas em salas de reuniões ou na própria sala do(a) participante da entrevista. Apesar de não permitir as observações descritas por Zago (2003), referentes às condições de moradia destas famílias, as entrevistas realizadas nos locais de trabalho também possibilitaram os demais preceitos referendados pela autora, como a facilidade de conversação e a redução de interferências externas. Além disso, em alguns casos, esta escolha de local favoreceu a organização familiar para participar da entrevista, enquanto seus filhos participavam de outras atividades. Também parece ter sido essa alternativa utilizada por algumas famílias como estratégia para preservar a identidade da criança.

Todas as entrevistas foram gravadas, mediante o consentimento dos participantes e transcritas na íntegra pela pesquisadora. As famílias participantes receberam uma cópia do termo de consentimento, com informações a respeito da pesquisa e com os contatos da pesquisadora. Uma cópia da transcrição das entrevistas foi enviada a cada família participante por e-mail, a fim de que pudessem realizar a leitura e fazer possíveis alterações, correções e/ou omissão de informações13.

Zago (2003) também descreve que a entrevista encontra-se apoiada em outros recursos que têm a pretensão de complementar as informações produzidas. Frente à escolha metodológica de utilização da entrevista

13 Entende-se que a transcrição das entrevistas realizada pela pesquisadora caracteriza-se como uma releitura do material gravado e não como uma conversão precisa, exata e literal do áudio para texto. Entretanto, a leitura deste material pelos participantes da pesquisa foi considerada importante para respeitar suas escolhas quanto à divulgação das informações prestadas.

como instrumento de pesquisa, adotou-se, como recurso complementar, um breve questionário sociodemográfico14, a fim de registrar informações

sobre as famílias entrevistadas. O questionário teve a pretensão de reunir informações sobre a idade dos cuidadores e cuidadoras participantes da pesquisa e dos(as) filhos(as), sejam eles biológicos ou adotivos, nível de escolaridade, situação conjugal e renda familiar. Este questionário estava incluso no roteiro de entrevista, constituindo etapa introdutória desta, exceto em algumas entrevistas que foram se desenrolando antes mesmo do preenchimento do questionário, de forma que isto foi feito ao final da entrevista. Foi realizada uma descrição dos resultados com o objetivo de sistematizar as informações sociodemográficas relatadas pelos participantes da pesquisa.

Buscou-se também delinear um comparativo entre as características sociodemográficas das famílias participantes e aquelas que caracterizam os pretendentes e crianças/adolescentes inscritos no Cadastro Nacional da Adoção (CNA). Para tanto, foi realizada consulta no dia 7 de janeiro de 2015 aos relatórios divulgados no site do CNA com relação aos dados estatísticos sobre pretendentes e dados estatísticos de crianças/adolescentes cadastrados15. Embora uma análise estatística mais

consistente e aprofundada a respeito dos dados divulgados pelo CNA demande a utilização de micro dados, aos quais não se teve acesso para a realização desta pesquisa, acredita-se que as informações consultadas permitem a explanação de alguns dados sociodemográficos e sua comparação com os resultados produzidos com os participantes da pesquisa. Uma vez que os pretendentes à adoção costumam preferir um perfil de criança, conforme discutido anteriormente, acredita-se que esta comparação entre os participantes da pesquisa e os pretendentes inscritos no Cadastro Nacional da Adoção pode oferecer subsídios para discutir e caracterizar a adoção de crianças e jovens com deficiência.

A pesquisadora também fez uso de um diário de campo com o objetivo de registrar informações complementares como impressões da pesquisadora e diálogos ou falas dos entrevistados, anteriores ou posteriores ao uso do gravador de voz. O diário de campo também foi

14O questionário proposto foi adaptado da pesquisa de doutorado em Psicologia

de Maria de Fatima Joaquim Minetto (2010), intitulada Práticas educativas parentais, crenças parentais, estresse parental e funcionamento familiar de pais de crianças com desenvolvimento típico e atípico.

15 Relatórios disponíveis em:

utilizado como estratégia de registro dos primeiros contatos e formas de acesso às famílias participantes da pesquisa.