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Capítulo 2 – O caminho do estudo histórico e social

2.2 As bases metodológicas

2.2.1 Procedimentos e fontes da pesquisa

Na escolha da metodologia e das técnicas a serem empregadas na pesquisa histórica, o principal a ser observado vem a ser o tema escolhido; pois as peculiaridades existem do ponto de vista técnico e metodológico como referem Cardoso e Perez Brignoli (1983). É necessário, para a escolha metodológica, a elaboração de hipóteses de trabalho levantadas e a consulta a documentações acessíveis, assim como a disponibilidade do pesquisador, ou de outras pessoas confiáveis. Os mesmos autores referem sobre a fase de coleta, devendo-se estar atento para os instrumentos necessários tais como listas bibliográficas, fichários de bibliotecas, arquivos, bibliografia de obras anteriores sobre assuntos ligados à pesquisa, catálogos de documentos elaborados por arquivista, entre outros procedimentos.

Para compreender o caminho da pesquisa necessário se faz destacar a importância das fontes42. Na pesquisa histórica, o diálogo das fontes com a teoria são fundamentais e vice-versa. A despeito disso, as investidas foram inicialmente para levantá-las e organizá-las. O desejo de contemplar o maior número de informações a respeito dos campos da saúde e educação, dos quais os campos cada vez mais circunscritos permitiam contemplar a construção das relações sociais em seu sentimento de pertença pelos valores compartilhados dos agentes, cujo ambiente institucional era o HC, foi fundamental para a análise.

Nesse sentido, pesquisa nos documentos encontrados sobre o HC, disponível no Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano (APEJE), nos documentos reservados do Departamento de Ordem Política Social (DOPS), mostrou disputa política e jurídica entre o Estado e a Santa Casa de Misericórdia do Recife, tendo como referência a Associação Mantenedora do HC, quando de

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Existem dois tipos de fontes que favorecem os dados necessários à pesquisa: a) fontes primárias, como os documentos manuscritos de arquivos; fontes impressas, as quais são escritas no próprio período pesquisado, sendo até publicados muito depois; b) fontes secundárias, tidas em documentação bibliográfica como livros, ou artigos sobre o tema em estudo ou sobre assuntos de alguma maneira que estejam relacionados a ele. Mas não há uma rigidez nessa classificação, às vezes o que deve ser uma fonte secundária passa a ser primária pela importância e raridade com que os dados são revelados. Ver Cardoso e Perez Brignoli (1983).

sua desapropriação. Da maneira como foi feita a Contra Minuta43, fica clara a tentativa de consolidar a disponibilidade de enfermarias para o ensino, junto à Faculdade de Medicina. Nesses documentos foi possível identificar atas, relatórios financeiros e também nomes de enfermeiras e irmãs superioras, censuradas na época do início do Estado Novo. O empenho do diretor Fernando Simões Barbosa, nessa disputa, também foi observado.

A identificação das fontes feita através de visitas a arquivos, bibliotecas, escolas, entre outros locais foi útil não só para que se percebesse a viabilidade do estudo, tendo sido essa a tarefa mais difícil, mas também para se fazer a listagem do que seria realmente pesquisado. A ordenação dos documentos, além de ser feita em arquivos digitalizados também foi organizada manualmente. As fontes utilizadas no estudo (ANEXO A) foram dispostas por instituições e contemplam os periódicos44 e documentações manuscritas45, consideradas assim como fontes primárias.

A digitalização das fontes foi realizada em boa parte do material coletado, devido à necessidade de se racionalizar o tempo, bem como evitar o manuseio que comprometesse os documentos no local pesquisado. A comprovação dos documentos foi assegurada mesmo com a digitalização, sendo os arquivos formados e armazenados no próprio computador, para análise. As fontes, para serem digitalizadas, foram separadas e analisadas previamente de maneira que se contemplassem informações sobre o objeto a ser estudado. As digitalizações foram autorizadas desde que fossem justificadas para fins de pesquisa.

Em alguns locais pesquisados não havia registros da relação dos documentos existentes, consumindo tempo considerável para identificá-los, como foi o caso da Secretaria de Saúde do

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Acervo da Biblioteca Pública de Pernambuco. Coleção Pernambuco. Localização: PE, F 344.9, L 732r “Requisição do Hospital do Centenário-Contra Minuta”. Autoria de Oswaldo C. Lima Procurador dos Feitos da Fazenda. Recife, Oficinas Gráficas da Imprensa Oficial, 1938. 15p.

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Jornais e Revistas.

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Estado de Pernambuco e Santa Casa de Misericórdia do Recife. O Arquivo da Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco encontrava-se em processo de reforma com uma empresa terceirizada, e essa disponibilizou seus funcionários para catalogar a relação de todos os documentos existentes.

As fontes a que se recorreu na realização deste estudo foram extraídas de documentos oficiais, jornais e revistas da época, selecionadas de acordo com a crítica interna e externa46, para atender os objetivos propostos, tendo em mente que o “real se coloca de forma fragmentada, seja pela seleção feita pelo próprio passado, seja pela subjetividade do pesquisador e de sua capacidade de apreensão”, como diz Sellaro (2000, p. 13).

A pesquisa documental teve início em instituições cujos acervos estavam catalogados como Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano (APEJE) e Biblioteca Nacional (BN)47. Na APEJE, coletou-se documentos referentes às Mensagens dos Governadores de 1922 a 1938. Nelas foram identificadas as mudanças ocorridas no Serviço de Saúde e Assistência, o interesse pela organização de um corpo de profissionais de saúde pública, não só de médicos como de enfermeiras visitadoras, despertando interesse na legislação de ensino. Foram levantados documentos como relatórios inerentes ao Serviço de Higiene e Saúde e ao Instituto de Assistência Hospitalar, na época de sua instalação em 1938, mostrando a intenção verdadeira na desapropriação do HC. Documentos como portarias mostram que os agentes Amaury de Medeiros e Adolpho Simões Barbosa tinham prestígio no governo. No caso do primeiro, era notório seu prestigio48 no governo de Sérgio Loreto, pois, além de ser um profissional

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A crítica interna e externa corresponde à veracidade do documento, à origem, a quem se destina, o que significa para o estudo.

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A inclusão dessa instituição aconteceu em face de estadas no Rio de Janeiro para realizar estudos na Escola de Enfermagem Ana Nery/UFRJ.

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Portaria n.42. Palácio do Governo. Recife, 31 de janeiro de 1923. O governo do Estado resolve nomear o Chefe da Comissão Federal Sanitária Amaury de Medeiros para exercer em comissão o cargo de Director Geral de Hygiene e Saúde Pública do Estado.

competente, reconhecido nacionalmente, era seu genro. Em relação ao segundo, o destaque ocorre no Governo de Lima Cavalcanti. Adolpho Simões Barbosa veio a ser Conselheiro desse Governo49, pela Portaria n. 3109, de 30 de novembro de 1931, do Interventor Carlos de Lima Cavalcanti.

Os documentos reservados pertencentes ao Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) estavam também arquivados na APEJE. Nesse particular, foram fundamentais os documentos identificados pertencentes ao Hospital do Centenário, à Cruz Vermelha Brasileira e à Pernambucana, bem como os documentos sobre o nazismo. Cartas, atas, relatórios, listas, mensagens e inquéritos, ou seja, uma rica documentação foi consultada, mostrando a posição dos governantes e dos que estavam em posição na época de censura, pelo regime de Estado Novo. Também foram pesquisados, entre outros, os periódicos raros como o jornal “Saúde e Assistência”, publicação do órgão do Departamento de Saúde e Assistência, quando Amaury de Medeiros era diretor e o Jornal dos Enfermeiros. Esse último, embora tenha sido encontrado exemplar referente a outubro e dezembro de 1936, traz a preocupação e a luta do sindicato dos enfermeiros, desde a sua criação em 1934, para que houvesse uma Escola Profissional de Enfermeiras. O reconhecimento em novembro de 1936, pelo Ministério de Trabalho representado pelo pernambucano Agamenon Magalhães, mostra o prestígio adquirido mesmo que incipiente desses enfermeiros na época.

Na Biblioteca Nacional foi também pesquisado, no setor de iconografia, o livro em brochura intitulado “Paz e Trabalho”50 da época do Governo de Sérgio Loreto. Esse livro foi doado pelo Ministério das Relações Exteriores à Biblioteca Nacional, uma obra rara, não

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Nomeado pelo Ministro da Justiça e Negócios Exteriores. Comunicado através do Doc. n. 1.663, 1a. Seção, Rio de Janeiro, 19 de novembro de 1931, assinado pelo Diretor da Secretaria da Justiça e Negócios Exteriores, Senhor Victor Nunes. APEJE, Fundo: Ministério da Justiça. Loc. MJ-18, Doc. 623.

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localizada até o momento nos arquivos do Estado de Pernambuco. O livro retrata a conjuntura do governo de Sérgio Loreto com os feitos de cada departamento, principalmente o de Saúde e Assistência. O registro da imprensa escrita foi importante para identificar pistas e até discursos dos agentes, e situar o contexto sociopolítico e econômico da época. Na seção de periódicos foi selecionada a Revista de Pernambuco, publicação que destacava as questões políticas da cidade. Era uma publicação voltada às questões sociais, políticas e econômicas. No entanto, era ligada ao governo de Sérgio Loreto. Em outros periódicos como o Jornal do Recife, Jornal Pequeno e o Jornal do Comércio do Recife, esse último um jornal de ampla divulgação no Estado de Pernambuco, foram identificadas informações sobre o HC.

Na Biblioteca Nacional (BN), os exemplares do Jornal do Comércio do Recife foram encontrados em regular estado de conservação, podendo ainda ser manuseados, note-se que, na APEJE, muitos exemplares hoje não estão mais disponíveis. Já os microfilmados estão disponíveis na Fundação Joaquim Nabuco (FUNDAJ). Na BN só há alguns exemplares, os demais já estão em processo de microfilmagem.

Em contraponto, essas duas instituições, a APEJE e a BN, possibilitaram levantar documentos, como Mensagens dos Governadores. Na APEJE foi possível levantar as Mensagens dos Governadores no período de 1922 a 1938, bem como livros como Almanak Laemmert, edição para 1929, e Almanak de Pernambuco. Já, na BN, além de possibilitar levantar também os periódicos, possibilitou visualizar as Mensagens dos Governadores de 1922 a 1930, essas já disponibilizadas na internet, através do Projeto Latino-Americano (LAMP), em parceria com a Universidade de Chicago.

Os dados extraídos das fontes foram coletados utilizando-se um Roteiro Matricial de Coleta elaborado para esse fim, destinado para Exame de Periódico (APÊNDICE A) e para

Exame de Documentação (APÊNDICE B). O Exame de Periódico consta de 6 itens51 onde se contemplou: 1) caracterização; 2) notícia/matéria; 3) conteúdo da matéria/notícia; 4) informações pertinentes às questões norteadoras/hipóteses da pesquisa; 5) aspectos relacionados a outros dados da pesquisa (campo), pontos a serem esclarecidos, significados ou sentido das palavras ou expressões, questões a esclarecer; e 6) coleta dos dados. O Exame de Documentação também consta de 6 itens52: 1) caracterização; 2) análise técnica; 3) análise de conteúdo (título do documento, assunto, objetivos do registro); 4) informações pertinentes às questões norteadoras/hipóteses da pesquisa; 5) aspectos relacionados a outros dados da pesquisa (campo), pontos a serem esclarecidos, significados ou sentido das palavras ou expressões, questões a esclarecer; e 6) coleta dos dados. Em ambos os Roteiros de Coleta, cada item contém subitens para facilitar o preenchimento das informações e posterior análise dos dados.

No primeiro momento deste estudo, foi utilizado um esquema tentativo53 para subsidiar a contextualização da temática, a problemática do objeto, sua análise e interpretação. Dele resultou a convergência de temas ligados, por exemplo, à enfermagem, políticas de saúde e educação, Hospital do Centenário e outras instituições, abrangendo um período que vai de 1918 a 1938, demarcando, conforme as instâncias estabelecidas para análise, obedecendo a um modo

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Nos itens são contemplados subitens: 1) caracterização: razão social; ano de fundação; proprietário; tipo de periódico; periodicidade; editor; conselho editorial 2) notícia/matéria: data de publicação; tipo de matéria; localização da matéria; autor da matéria 3) conteúdo da matéria/notícia (título assunto, objetivos do registro): ementa; palavras-chaves 4) informações pertinentes às questões norteadoras/hipóteses da pesquisa: resumo/transcrição; 5) aspectos relacionados a outros dados da pesquisa (campo), pontos a serem esclarecidos, significados ou sentido das palavras ou expressões, questões a esclarecer: observações; 6) coleta dos dados: local e data; assinatura.

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Os itens também têm subitens: 1) caracterização: arquivo; fundo; classificação/localização; 2) análise técnica: de; para; data e local; tipo de documento; especificação/tecnologia; outros; 3) análise de conteúdo (título do documento, assunto, objetivos do registro): ementa; palavras-chaves; 4) informações pertinentes às questões norteadoras/hipóteses da pesquisa: resumo/transcrição; 5) aspectos relacionados a outros dados da pesquisa (campo), pontos da serem esclarecidos, significados ou sentido das palavras ou expressões, questões a esclarecer; e 6) coleta dos dados: local e data; assinatura.

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Instrumento elaborado na disciplina “História de Enfermagem Brasileira”, cursada no segundo semestre de 2003, na Escola de Enfermagem Ana Nery/UFRJ.

sincrônico e diacrônico na sua apresentação. Vale lembrar que o modelo médico-sanitário foi um ponto fundamental como parte do contexto referencial para análise dos dados.