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SEÇÃO II: A UNIDOCÊNCIA NOS CAMINHOS DA INVESTIGAÇÃO

2.3 Procedimentos metodológicos para análise dos dados

Os dados construídos ao longo do trabalho de campo, resultados da observação participante, entrevistas e análise de documentos legais e oficiais, foram submetidos aos procedimentos da análise de conteúdo (BARDIN, 2011; FRANCO 2012; MINAYO, 2013).

Bardin (2011, p. 48), define o terreno, o funcionamento e o objetivo da análise de conteúdo como:

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) dessas mensagens.

Franco (2012) lembra que o/a pesquisador/a que pretenda se aproximar de um objeto de pesquisa, valendo-se de uma concepção de ciência e abordagem metodológica críticas que reconheçam o papel dos atores sociais, tem, na análise de conteúdo, um recurso possível e compatível com tal finalidade.

A autora reforça ainda que a análise de conteúdo tem como ponto de partida a mensagem, seja verbal, gestual, silenciosa, figurativa, documental ou diretamente provocada. E, considerando que esta mensagem está vinculada ao contexto de seus/as produtores/as, é relevante destacar que tal contexto envolve:

[...] a evolução histórica da humanidade; as situações econômicas e socioculturais nas quais os emissores estão inseridos, o acesso aos códigos linguísticos, o grau de competência para saber decodificá-los, o que resulta em expressões verbais (ou mensagens) carregadas de componentes cognitivos, subjetivos, afetivos, valorativos e historicamente mutáveis. (FRANCO, 2012, p. 13).

Dessa maneira, no processo de análise e interpretação do conteúdo, a contextualização ganha destaque, pois constitui uma das principais preocupações do/a pesquisador/a, a fim de garantir relevância aos sentidos atribuídos às mensagens.

Franco (2012) acentua que a análise de conteúdo, situada no bojo de uma concepção crítica e dinâmica da linguagem, atribui valor ao conteúdo manifesto (a fala tal como foi manifestada) e leva em conta, também, o conteúdo latente (o que está oculto na fala), a hermenêutica e a complexa diferença que se estabelece entre significado e sentido.

Considerando que toda mensagem expressa um sentido e um significado, torna-se procedente evidenciar o que a autora esclarece a respeito da diferença entre estes dois elementos:

O significado de um objeto pode ser absorvido, compreendido e generalizado a partir de suas características definidoras, e pelo seu corpus de significação. Já o sentido implica a atribuição de um significado pessoal e objetivado que se concretiza na prática social e que se manifesta a partir das Representações Sociais, cognitivas, subjetivas, valorativas e emocionais necessariamente contextualizadas. (FRANCO, 2012, p. 13, grifo da autora).

Portanto, compreendemos que o significado situa-se no plano do universal, genérico, enquanto que o sentido, de característica mais particular, depende essencialmente do contexto, das circunstâncias que, condicionadas por múltiplas determinações, estão em constante movimento.

A produção de inferências é uma finalidade da análise de conteúdo que confere relevância teórica ao procedimento. Para elucidar o procedimento da inferência tomamos a explicação de Franco (2012) que se baseou em analogias de Bardin (1977):

[...] O analista é como um arqueólogo. Trabalha com vestígios. Mas os vestígios são as manifestações de estados, de dados e de fenômenos. Há mais alguma coisa a descobrir por e graças a eles... [...] o analista tira partido do tratamento das mensagens que manipula, para inferir (de maneira lógica) conhecimentos que extrapolem o conteúdo manifesto nas mensagens e que podem estar associados a outros elementos (como o emissor, suas condições de produção, seu meio abrangente, etc.). (FRANCO, 2012, p. 31, grifos da autora).

Operacionalmente, a inferência é o procedimento intermediário que viabiliza a passagem da descrição (enumeração das características do texto) para a interpretação (significação concedida às características do texto). Implica a realização de comparações, estando essas, guiadas pela experiência e conhecimento do/a pesquisador/a sobre as diferentes abordagens teóricas. (FRANCO, 2012).

Tendo optado, então, pela técnica de análise de conteúdo, os procedimentos adotados para organização e tratamento do material empírico e documental seguiram as etapas sugeridas por Minayo (2013) que são a pré-análise, a exploração do material, o tratamento do resultado obtido e a interpretação.

Na pré-análise, considerando as normas de validade qualitativa19 de exaustividade,

representatividade, homogeneidade e pertinência (BARDIN, 2011; MINAYO, 2013), reunimos todos os textos produzidos a partir do registro da observação participante, transcrição das entrevistas e documentos oficiais. Realizamos a estratégia de leitura flutuante desses textos e, na constituição do corpus de análise mantivemos a totalidade dos textos. Justificamos a decisão de manter todos os textos, pois tanto as entrevistas quanto as observações e os documentos contemplavam por diferentes perspectivas, aspectos relacionados ao modo de planejar e realizar o trabalho pedagógico unidocente levantados no roteiro de investigação, contendo as características essenciais do grupo pesquisado que contribuiriam para responder qual compreensão de unidocência é expressa no seu fazer pedagógico.

Com o corpus de análise constituído, passamos à etapa de exploração do material. Sem perder de vista a questão-problema e os objetivos de nossa investigação, realizamos várias e atentas leituras do corpus delimitado, procedimento que possibilitou a identificação e definição das unidades de análise.

Dentre as possibilidades de registro de unidades de análise, optamos pela composição de unidades temáticas. De acordo com Franco (2012), em análise de conteúdo, o tema é a mais útil unidade de registro. Ele é “indispensável em estudos sobre propaganda, representações sociais, opiniões, expectativas, valores, conceitos, atitudes e crenças.” (FRANCO, 2012, p. 45). Tecnicamente, as unidades de registro temática são declarações sobre determinado assunto, que podem estar numa simples sentença contendo sujeito e

19Em relação às normas de validade qualitativa Minayo (2013, p. 316-317, grifos da autora) aponta: [...]

exaustividade: que o material contemple todos os aspectos levantados no roteiro; representatividade: que ele contenha as características essenciais do universo pretendido; homogeneidade: que obedeça a critérios precisos de escolha quanto aos temas tratados, às técnicas empregadas e aos atributos dos interlocutores; pertinência: que os documentos analisados sejam adequados para dar resposta aos objetivos do trabalho.

predicado, num conjunto delas ou num parágrafo. Com maior ou menor intensidade, o aspecto pessoal atribuído pelo respondente sobre o significado de uma palavra e/ou sobre as conotações atribuídas a um conceito é incorporado pela questão temática (FRANCO, 2012).

As unidades de análise temática reconhecidas e definidas foram destacadas nos textos com sublinhado de cores diferentes, a fim de facilitar sua posterior identificação. Em seguida, em um arquivo de texto à parte, realizamos um agrupamento dessas unidades de análise, por proximidade e conexão conceitual, tomando a relação entre unidocência e trabalho pedagógico, objeto de nosso estudo.

Para definição das categorias de análise, levamos em consideração o pressuposto de que em um estudo do tipo etnográfico, as categorias não podem ser impostas, mas construídas, num transitar constante do diálogo entre a teoria e os dados empíricos (ANDRÉ, 2012). Assim, as categorias de análise temática levantadas em nosso estudo foram: interdisciplinaridade, profissionalidade, planejamento de ensino e estrutura administrativa da escola.

Interdisciplinaridade e profissionalidade foram categorias teóricas relacionadas a unidocência e indicadas na revisão de literatura, etapa inicial de nossa investigação que, além de revelar a atualidade e a direção dos estudos sobre a unidocência, nos aproximou da realidade e do contexto onde o fenômeno ocorre.

Os dados construídos a partir dos registros feitos em decorrência do trabalho de campo, resultados da observação participante e das entrevistas intensivas, evidenciaram ainda o planejamento de ensino e a estrutura administrativa da escola como categorias empíricas, mediadoras para apreensão do modo como as professoras no contexto da unidocência planejam e realizam o trabalho pedagógico. Minayo (2013) explica que as categorias empíricas emanam da realidade e, sendo construídas a partir do conteúdo manifesto ou latente das falas, possibilitam desvendar compreensões específicas do grupo em questão. Ainda, de acordo com a autora:

Quando um pesquisador consegue apreender e compreender as categorias empíricas de classificação da realidade do grupo investigado, perceberá que elas são saturadas de sentido e chaves para compreensão teórica da realidade em sua especificidade histórica e em sua diferenciação interna. (MINAYO, 2013, p. 179).

O trabalho de interpretação dos dados foi realizado a partir da produção de inferências, correlacionando as informações obtidas nos textos das entrevistas e observações com o quadro teórico adotado.

Explicitados os fundamentos e procedimentos teórico-metodológicos, evidenciaremos na seção a seguir, conceitos teóricos que validaram o trabalho de análise em nossa investigação.

SEÇÃO III: CONCEITOS TEÓRICOS: elementos para análise do objeto de estudo.