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4. PERCURSO METODOLÓGICO

4.1 Procedimentos

A primeira etapa ocorreu no período de setembro de 2007 a março de 2008, quando foram entrevistados quinze médicos. A representatividade da amostra foi estabelecida pelo critério de saturação, conforme apresentado por Fontanella, Ricas e Turato (2008, p. 18), ou seja, quando os dados obtidos passam a apresentar, na avaliação do pesquisador, certa redundância ou repetição, considerando-se ainda os “limites empíricos dos dados, a integração de tais dados com a teoria e a sensibilidade teórica de quem analisa os dados”. A partir desse momento, apesar das eventuais imprecisões, não é considerado relevante persistir na coleta de dados.

Os critérios para a inclusão dos entrevistados foram definidos visando garantir que a amostra contemplasse tanto profissionais médicos atuantes em cada uma das cinco UBS’s, quanto as diferentes especialidades médicas oferecidas. Deveriam também refletir as dimensões do contexto de trabalho que se relacionavam com o objetivo geral do estudo. Dessa forma, foram observados os seguintes critérios: ser médico (a); ser do quadro efetivo e estável da Prefeitura Municipal de Jaguariúna; ter mais de um ano de atuação nesse emprego, garantindo conhecimento mínimo da operacionalização do sistema de saúde; estar no desempenho de atividades profissionais no período da coleta e aceitar que a entrevista fosse gravada e, posteriormente, transcrita na íntegra.

Foram entrevistados cinco (5) médicos e dez (10) médicas, num total de quinze (15) profissionais, sendo que oito (8) são clínicos gerais, três (3) ginecologistas, três (3) pediatras e um (1) geriatra. As entrevistas foram conduzidas com privacidade no local de trabalho e tiveram duração média de 40 min. Além desses profissionais, foram entrevistados dois gestores da Secretaria de Saúde, com o objetivo de caracterizar mais detalhadamente a organização dos serviços oferecidos pelas Unidades Básicas de Saúde, bem como a estrutura administrativa da Secretaria Municipal de Saúde.

As entrevistas foram guiadas por um roteiro que apresentava a seguinte questão inicial: “Fale-me sobre como percebe a profissão médica nos dias de hoje”? Foram incluídas ainda questões sobre os impactos do trabalho sobre a sua saúde física e mental; o médico enquanto trabalhador assalariado; relação do trabalhador com sua atividade no SUS de Jaguariúna, com os colegas de trabalho, com a hierarquia, com pacientes e com as entidades médicas; condições de trabalho e condições de vida e tempo livre; e as perspectivas futuras da profissão. Outros temas foram incluídos a partir da própria condução das entrevistas. As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas.

A segunda etapa ocorreu no período de agosto de 2009 a novembro do mesmo ano, quando foram realizadas as entrevistas, baseadas no método de Instrução ao Sósia, feitas com cinco (5) médicos, um (1) de cada Unidade Básica de Saúde de Jaguariúna e que participaram da primeira etapa.

A partir do material transcrito das entrevistas individuais abertas, analisado preliminarmente, foi possível aprofundar a compreensão de temas levantados na primeira etapa. Diferentemente da entrevista individual aberta, a entrevista baseada no método de instrução ao sósia, foi desenvolvida em mais de um encontro, que serão detalhados a seguir.

Inicialmente, estava prevista a formação de um grupo com os médicos que participaram da primeira etapa, quando seria usada a técnica de instrução ao sósia. No entanto, diante da dificuldade em encontrar horários para reunir os médicos fora do ambiente de trabalho e da ausência de apoio institucional, para realizar encontros durante a jornada de trabalho, optou-se pela realização das entrevistas apenas baseada nos princípios do método citado acima, com pelo menos um médico de cada UBS.

Dessa forma, as entrevistas, baseadas no método de instrução ao sósia, já adaptadas às objeções supracitadas, iniciaram-se com o pesquisador apresentando a transcrição do material coletado inicialmente com as entrevistas individuais, confirmando opiniões, esclarecendo dúvidas ou aprofundando determinado tema. Em seguida, foi apresentada uma pré-análise, ou seja, as interpretações iniciais feitas do material coletado foram expostas. Nesse momento, foi possível identificar um aspecto presente na situação de trabalho, comum a todos os entrevistados. Esse ponto em comum consiste nas dificuldades relacionadas à organização das consultas, mais

precisamente, a dificuldade em se adaptar à regra, elaborada pelos gestores, dos quinze (15) minutos para cada consulta.

Em seguida, fez-se então a cada médico individualmente, a pergunta regra da técnica do sósia: suponha que eu seja o seu sósia e que amanhã irei substituí-lo, quais seriam as instruções, relativas à consulta médica, que deveria seguir para que ninguém percebesse a substituição? Ao longo do relato, foram solicitados mais detalhes acerca dos quatro (4) elementos da experiência profissional, a saber, acerca da tarefa propriamente dita; das relações entre os pares; das relações hierárquicas e da organização formal e informal do ambiente de trabalho.

De acordo com Clot (2006), as perguntas do pesquisador devem incidir sobre o material e a respectiva análise proveniente dos dados coletados inicialmente sobre o trabalho em questão, no sentindo de aprofundar sua compreensão, esclarecer imprecisões, contradições, ausências, etc. e aproximar-se de como os trabalhadores vivem e tentam recriar sua situação de trabalho. Além disso, a experiência de autoconfrontação pode ser considerada como um meio de aprendizagem e transformação de situações de trabalho. De forma que, no segundo encontro individual, o material transcrito do primeiro encontro foi apresentado ao médico, que, individualmente, o comentou de forma oral. Em um desses encontros, foi possível contar com a presença voluntária de outro médico (a) da respectiva unidade.

Entende-se que a autoconfrontação é possível mesmo quando realizada sobre a transcrição de um depoimento, pois, de acordo com Lima (2001, p. 140), “trata-se de uma verbalização produzida pelo trabalhador quando se confronta com os dados coletados sobre seu comportamento e quando responde a perguntas que incidem diretamente sobre estes dados”.

Na apresentação dos dados, optou-se por se referir aos médicos entrevistados por letras do alfabeto, visando garantir o sigilo dos depoimentos. Como foram quinze profissionais, as letras vão de ‘A’ até ‘O’. Esse sigilo se deve ao fato de que Jaguariúna é uma cidade pequena e não há muitos médicos nas UBS’s. Sendo assim, a partir de qualquer dado sobre esses profissionais eles seriam facilmente identificados.

No que se refere à análise dos dados, entende-se que é um processo contínuo em busca da identificação de dimensões, categorias, tendências, padrões, relações, desvendando-lhes o

significado. É um processo complexo, não linear, que implica um trabalho de redução, organização e interpretações dos dados que acompanha todo o processo de investigação. Assim que os dados são coletados, identificam-se os temas, iniciam-se as interpretações, gerando novas questões ou aperfeiçoando as anteriores, o que, por sua vez, nos remete à busca por novos dados, complementares ou mais específicos, num processo de ajustes que vai até a análise final (ALVES-MAZZOTTI e GEWANDSZNNJDER, 1998).