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5. CONSTRUÇÃO E VALIDAÇÃO DA ESCALA SABERES

5.1. D ESENVOLVIMENTO DE ESCALAS DE MEDIDA

5.1.1. Procedimentos teóricos

Os procedimentos teóricos na construção e validação de uma escala de medida diz respeito às providências para mapeamento do construto estudado, identificação de suas dimensões (quando existem), composição dos itens que representam as variáveis manifestas e por fim, avaliação da validade teórica para itens propostos, representada pela validade de conteúdo e validade de face. O processo de desenvolvimento de uma escala de medida por parte do pesquisador pode tomar dois caminhos: o indutivo e o dedutivo. No processo indutivo, o pesquisador parte de um mapeamento da realidade, via observação ou pesquisa qualitativa, e identifica os aspectos que podem representar a variável latente. Esses aspectos, como variáveis manifestas, são transformados em itens compostos com ou sem uma estrutura de dimensões subjacentes a depender do conhecimento do pesquisador. Por exemplo, para pesquisar o construto ‘bom professor’ sem usar as teorias disponíveis, posso entrevistar numerosos alunos com a pergunta ‘como é um bom professor?’ O resultado será uma lista de qualidades e comportamentos desejáveis pelo grupo indagado que serão transformados em itens de uma escala, que pode, posteriormente, revelar uma ou mais dimensões desse construto. Situações novas ou áreas de estudo desconhecidas ou pouco mapeadas são mais propícias a terem escalas desenvolvidas com essa abordagem indutiva (HINKIN, 1998).

Já no processo dedutivo, o pesquisador parte de uma teoria amadurecida em um campo a partir de numerosas pesquisas qualitativas e, respeitando as dimensões identificadas no mapeamento do campo, desenvolve itens que capturem essas dimensões (HINKIN, 1998). Assim, uma vez definido o construto a ser contemplado na escala, cabe ao pesquisador proceder uma revisão da literatura científica e mapear os principais autores e as propostas teóricas disponíveis. Para construtos mais maduros, como os saberes docentes, presentes na literatura desde a década de 1980 e fartamente desenvolvido na década de 1990, a revisão deve cobrir as principais linhas de investigação e autores da área. Definida uma linha teórica para o construto, identifica-se a sua dimensionalidade, caso já tenha sido mapeado pela teoria. Como muitos construtos trazem da teoria uma proposta prévia de dimensionalidade, cabe ao pesquisador verificar e, se for o caso, confirmar empiricamente a ocorrência dessas dimensões. A partir das dimensões identificadas previamente na literatura, a tarefa do pesquisador é definir como essas dimensões, que são variáveis latentes, podem gerar comportamentos, percepções, opiniões, disposições e atitudes que podem ser observadas e mensuradas. Essa etapa lista, portanto, os comportamentos manifestos, ou variável manifesta, pela variável latente. Essa variável manifesta é também chamada de definição operacional e “a passagem do terreno abstrato para o concreto é

precisamente viabilizada pela definição operacional do construto” (PASQUALI, 1998, p. 211). Assim, a importância da variável manifesta está no fato de que ela é a ligação entre a concepção teórica do construto e sua ocorrência no sujeito ou objeto pesquisado. Nesse sentido, a Figura 3 apresenta o caminho dedutivo e a interface entre a teoria e a empiria para um construto.

Figura 3 – Transição entre teoria e os itens em uma escala

Fonte: O autor.

A próxima etapa na confecção da escala de medida é a composição do item a partir da variável manifesta que se pretende medir. Compor um item significa construir uma frase que verifique a ocorrência/intensidade da variável manifesta, permitindo ao respondente posicionar-se com uma resposta previamente definida pelo pesquisador na escala de verificação. Assim, para a variável manifesta ‘aplicabilidade do assunto’ como manifestação da dimensão ‘conteúdo’ do saber da matéria para um professor, o item proposto é ‘eu conheço a aplicabilidade dos assuntos quem ensino’, com o respondente registrando um grau de concordância para essa frase.

Uma série de cuidados são propostos na composição dos itens por Pasquali (1998) e inclui: (i) o item deve expressar uma concretude e não uma abstração, ou seja, algum aspecto sensível da realidade; (ii) o item deve ser objetivo e o mais direto possível; (iii) o item deve ser claro e inteligível para todos os estratos de respondentes; (iv) deve ser relevante para avaliar o

construto; (v) preciso, no sentido de cobrir somente um aspecto e (vi) único, sendo desnecessário usar dois itens para avaliar o mesmo aspecto do construto.

A partir da composição, a próxima etapa teórica é a avaliação dos itens compostos. Pasquali (1998) propõe duas avaliações: primeiro, uma avaliação semântica, quando o conjunto de itens é apresentado a um grupo de respondentes, entre 10 e 30 pessoas, que deve representar o público alvo da escala de medida, para verificar o entendimento de cada frase. Nessa etapa, palavras podem ser trocadas por sinônimos mais inteligíveis para o grupo, ou frases explicativas podem ser incluídas na composição. Essa avaliação e ajuste provê à escala validade de face, ou seja, ela mede algo que é reconhecido pela população de respondentes (COSTA, 2011).

A segunda avaliação dos itens é a análise dos juízes (HAIR et al., 2009). Nessa etapa, especialistas na área de estudo, preferencialmente pesquisadores com doutorado, são convidados a avaliar cada item sob os seguintes critérios:

a) O conjunto de itens apresenta coerência teórica com o construto? b) O grupo de itens de cada dimensão/categoria cobre os seus atributos? c) O item pertence à dimensão/categoria a que está associado?

d) O item apresenta redação clara e inequívoca?

A partir da análise, cada juiz pode propor: (a) excluir um item; (b) mudar a redação de algum item; (c) rearranjar a posição de alguns itens para outra dimensão/categoria; e (d) manter o instrumento como proposto pelo autor.

Essa etapa busca dar à escala de medida o que é chamada de validade de conteúdo, ou seja, os itens da escala realmente medem aspectos do construto teórico estudado. Junto com a validade de face, a validade de conteúdo confere à escala uma validade teórica, o que indica que, de fato, ela mede o que pretende medir (COSTA, 2011; PASQUALI, 2017)

Após a análise dos juízes e referidos ajustes, o conjunto de itens passa a compor o instrumento de pesquisa que será aplicado ao público pesquisado. Ao instrumento, será associada uma escala de verificação para respostas e as normas de aplicação e recomendações dos autores (se existirem) compondo a escala de medida e ser testada no contexto empírico.

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