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Segundo Triviños (1987), o pesquisador que considera a participação do sujeito um dos elementos de seu fazer científico, apóia-se em técnicas e métodos que reúnem

características sui generis, que ressaltam sua implicação e da pessoa que fornece as

informações. Neste sentido, o autor destaca, entre outros métodos, a entrevista semi-estruturada, a observação livre e o método de análise de conteúdo, instrumentos decisivos para estudar os processos e produtos nos quais está interessado o investigador qualitativo.

A utilização de diferentes recursos pelo investigador na realização de seus estudos, ou seja, a técnica de triangulação de dados, tem por objetivo abranger a máxima amplitude na

obter os dados através de mais de um instrumento de pesquisa, para, posteriormente, triangular os dados, a fim de ampliar nossa compreensão sobre o “objeto” de estudo e apresentar a visão êmica das participantes da pesquisa.

Como se trata de um contexto de pesquisa complexo, a preparação que antecedeu o trabalho de campo exigiu um cuidado redobrado. Primeiramente, o projeto de dissertação que está vinculado ao Projeto de Pesquisa intitulado “Eventos de letramento em situações multiculturais”, sob orientação da professora Dra Neiva Maria Jung, passou pelo comitê de ética da Universidade Estadual de Maringá e sua realização foi autorizada.

Após os trâmites burocráticos, havia uma preocupação centrada na realização da pesquisa em relação à coleta de dados e em relação ao posicionamento das mulheres que poderia ser favorável ou não à participação no estudo.

Todo esse processo exigiu cuidado, paciência, empenho e conquista, pois as participantes encontram-se em situação de exclusão social, ou seja, estão reclusas em uma instituição penal, local considerado complexo para a realização de pesquisas.

Sendo assim, seguimos alguns encaminhamentos prévios, recomendados por Erickson (1989) e que podem ajudar a estabelecer uma relação de confiança: a) procuramos adquirir o maior conhecimento possível a respeito das relações interpessoais, a fim de evitar conflitos; b) apresentamos às participantes, sempre que necessário, os objetivos da pesquisa; c) deixamos claro que as gravações e o conteúdo das entrevistas seriam usados somente com o devido consentimento das participantes; d) explicamos que seus nomes seriam substituídos por nomes fictícios.

Estes cuidados foram antecipados durante uma conversa informal, em junho de 2007, com o delegado Dr. Nilson Rodrigues da Silva, que sempre nos recebeu educadamente e desde o início viu a pesquisa de forma amistosa e positiva. Durante a conversa com o Dr. Nilson, apresentamos os objetivos do estudo, a necessidade de entrarmos no presídio e conversarmos com as detentas. A partir de sua autorização escrita em um consentimento informado, iniciamos o trabalho de campo.

O passo seguinte foi conhecer a carceragem. O primeiro contato com o chefe da carceragem foi facilitado com o telefonema do delegado, que informou sobre a autorização para a realização da pesquisa.

Ao chegar à carceragem, o funcionário já nos aguardava. Muito simpático, respondeu a algumas perguntas sobre os horários de funcionamento da delegacia e carceragem. Ficamos de retornar no dia seguinte para a primeira entrevista.

No dia 13/06/2007, pela manhã, ao chegar à delegacia, falamos com o carcereiro, que nos encaminhou para falar com Paula, uma “presa de confiança” (mulher que não está presa dentro do presídio. Ajuda no trabalho da cozinha ou na limpeza e dorme em um alojamento existente na delegacia). Paula havia concedido entrevista ao jornal O Diário de Maringá, que publicou uma matéria de capa cujo título era “Cúmplices, na prisão” e dentro do jornal “tráfico de drogas lota cadeia feminina em Maringá”. Ela tem 23 anos e 6 filhos. O mais novo é recém-nascido e está com ela no presídio.

Ao encontrar Paula, nos apresentamos, explicamos os objetivos da pesquisa e ela aceitou participar, autorizando a realização da entrevista. Decidimos juntas onde faríamos a entrevista, conversamos um pouco e, em seguida, iniciamos a gravação.

Como Paula está com um recém-nascido, ela fica em um quarto separado das outras detentas. Ela pode ficar também em um espaço que há ao lado da cozinha, onde existem uma horta, árvores, bancos, mesa e cadeiras. Neste lugar, ficam os presos de confiança, ajudando a preparar o almoço ou o jantar.

Sentamos em um banco embaixo de uma árvore. Próximos de nós, estavam cerca de cinco presos descascando batatas e, um pouco mais distante, havia duas mulheres ajudando nos preparativos do almoço.

Essa primeira entrevista com Paula teve como objetivo a aplicação de um roteiro de perguntas prévias e o conhecimento geral sobre as mulheres que cumprem pena na delegacia, para que pudéssemos readequar o roteiro da entrevista semi-estruturada e também conhecer melhor a organização e rotina das mulheres.

Após alguns dias, retornamos à delegacia. Desta vez, entramos no presídio e tivemos o primeiro encontro com as internas, no qual conversamos com as mulheres e apresentamos o objetivo da pesquisa. A princípio, elas se mostraram desconfiadas, queriam saber o que ganhariam em troca, mas depois de um tempo de conversa e de perguntarem algumas coisas sobre nós, elas se mostraram favoráveis em conceder entrevista e um laço de cooperação foi iniciado.

Antes de iniciar as entrevistas, foram coletadas informações das fichas cadastrais e feitas anotações de campo, a partir de conversas informais com os funcionários e presos de confiança, os quais tinham acesso e contato com o presídio feminino.

As entrevistas aconteceram no consultório odontológico, único local considerado seguro e possível pelos funcionários, e sem muita interferência sonora.

Dentre as possíveis participantes para a concessão das entrevistas, não conseguimos nos aproximar de uma delas. Ela era freqüentemente citada durante as entrevistas, pois

escrevia cartas por encomenda – “carta de metro”, lia os processos para as outras detentas e era considerada muito inteligente. Por não conseguir interagir com ela, encomendamos duas cartas, em dois momentos distintos. Primeiro solicitamos que escrevesse uma carta com o tema “liberdade”, que teria como destinatário a sociedade e como remetente alguém dali de dentro do presídio. Após alguns dias, pagamos uma certa quantia, calculada por folha e recebemos a carta. Em um segundo momento, solicitamos que escrevesse uma carta cujo tema seria “a mulher”, o remetente seriam as internas e a carta teria como interlocutor a sociedade, desta vez pedimos para que escrevesse a quantidade de folhas que achasse necessário. Essas

cartas seguem como anexo 2, deste trabalho.

Ao realizar o trabalho de campo na 9ª Subdivisão policial de Maringá, realizamos conversas informais com o delegado, com os funcionários e com as mulheres que se encontravam detidas; observamos, na medida do possível, o cotidiano neste contexto prisional; coletamos cartas, realizamos entrevistas semi-estruturadas; coletamos informações das fichas cadastrais. Em nenhum momento nos deparamos com situações que dificultassem nossa entrada e permanência naquele local; em alguns momentos, claro, tivemos que ter paciência em esperar um tempo livre dos funcionários que estavam sempre sobrecarregados de trabalho. Mas diferentemente de alguns trabalhos realizados em presídios, o delegado e os funcionários estavam sempre empenhados em ajudar.