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Processo de envelhecimento em diferentes contextos

PARTE I – Uma abordagem dinâmica ao estado nutricional dos idosos

CAPÍTULO 1 – Envelhecimento e respostas sociais

1.2. Processo de envelhecimento em diferentes contextos

Envelhecer é, já de si, um fenómeno heterogéneo individual. Envelhecer em Portugal depende, também, da zona onde se vive e dos recursos existentes. Viver numa aldeia ou numa cidade exige aos idosos, diferentes capacidades de adaptação às dificuldades próprias mas, também, apresenta características comuns inerentes ao processo de envelhecimento.

Viver numa região rural implica, entre nós, viver numa zona fundamentalmente envelhecida, com diminutos serviços sociais, com dificuldade no acesso aos serviços de saúde e deficientes meios de transporte. Grande parte dos idosos vive com o cônjuge, ajudando-se mutuamente. Os vizinhos representam um grande suporte, principalmente instrumental, que se foi fortificando ao longo dos anos. Enquanto estes idosos usufruem das capacidades básicas e instrumentais ficam em suas casas, quando já as não possuem podem ter que recorrer à institucionalização que, muitas vezes, pode não se situar na sua zona de residência (Fonseca, Paúl, Martín & Amado, 2005).

Um estudo, elaborado por Paúl, Fonseca, Martín e Amado (2005), analisou o que distingue e o que identifica, neste processo de envelhecimento, os idosos que vivem

29 na cidade ou num ambiente rural. De comum, de forma geral, eram idosos desfavorecidos, possuíam uma baixa escolaridade e um baixo rendimento económico e todos manifestaram a intenção de continuarem a morar nas suas casas. A autonomia era grande, sendo maior nos idosos rurais. Os autores atribuem esta maior autonomia ao facto de levarem uma vida mais ativa pois, de forma geral, trabalhavam na agricultura. A rede de suporte social é mais alargada nos idosos rurais possuindo uma rede de familiares e amigos. Na qualidade de vida não se encontram diferenças, nos dois tipos de idosos, salientando que, um terço deles refere que esta é má ou muito má. A ansiedade e a solidão são constantes encontradas e é mais intensa na mulher. A atitude face ao envelhecimento é mais negativa nos idosos urbanos. A nível de satisfação de vida e qualidade de vida não se encontraram diferenças de fundo entre os dois sexos e nos dois grupos de idosos. O problema do isolamento aparece tanto na cidade como nas regiões rurais, intensificando-se quando há uma diminuição da rede de contactos sociais e as atividades diárias quase desaparecem. Combatendo o isolamento diminui-se a solidão (Silva, M.E.D., 2005).

Viver na comunidade depende muito da vontade e da autonomia dos idosos. Porém, muitos deles vivem sós. 12% da população residente vive só. Relativamente às pessoas idosas este número aumenta exponencialmente. 60% dos idosos vive só ou em companhia exclusiva de pessoas também elas idosas. Este fenómeno teve um crescimento de 28% na última década (INE, 2012a).

Com o aumento da idade os idosos confrontam-se com várias limitações mas também com uma experiencia de vida que lhe permitirá adaptar-se e construir novos objetivos. As famílias ficam, muitas vezes, confusas com a necessidade de troca de papéis. De pessoas cuidadas pelos pais passam a cuidadores. Serão eles a providenciar segurança, alimentação, controlo e saúde (…). Esta troca de papéis nem sempre é fácil e é necessário também preparar a família para estas alterações (Zimerman, 2000).

Com o envelhecimento as doenças crónicas aumentam. Estima-se que, 80% dos idosos tenham, a partir dos 65 anos de idade, pelo menos, uma doença crónica e 60% tenham incapacidades. Conforme a idade avança a probabilidade de surgirem doenças e limitações, com uma diminuição ou perda da autonomia, aumenta. Nesta altura pode ter que se recorrer à institucionalização ou, a manter o idoso no seu meio, exigir que familiares ou amigos colaborem no seu cuidado. Nestas situações a família ocupa um papel primordial no auxílio. Os familiares são, conjuntamente com a rede de amigos e vizinhos, os principais cuidadores informais. Em muitos locais onde o apoio

30 social é inexistente ou diminuto este auxílio trona-se crucial. Cônjuge, filhos e, dentro destes, as pessoas do sexo feminino, serão os principais cuidadores informais, tendo em conta a proximidade física e afetiva. Motivações para assumir este papel são diversas e vão desde a tradição, normas sociais, noção do dever, tanto social como moral, solidariedade conjugal e filial, o amor e a recompensa material. Estes cuidados são prestados, a maior parte das vezes, durante vários anos (Figueiredo, 2006). O papel de cuidador pode ser assumido pelos dois sexos; porém, é à mulher que está reservado, a maioria das vezes, o papel de cuidadora no seio da família: cuida dos filhos, marido, netos, pais. Com o adiar da maternidade e o aumento da esperança de vida pode acontecer que, na mesma altura, possa ter a seu cuidado mais do que uma pessoa (Sousa, 2006 b). Com o aumento do envelhecimento e dos grandes idosos perspetiva-se o aumento da necessidade de cuidados.

O relatório emanado pela União Europeia, há já 19 anos, chama a atenção de todos os países membros, para que este aumento de cuidados pode levar à incapacidade de resposta por parte das instituições. Refere que as mulheres, pela sua maior longevidade, maior dependência, baixos rendimentos, risco de abandono serão as que mais necessitarão de cuidados. Uma forma de diminuir este problema será trabalhar com a família e apoiá-la no necessário. Os cuidadores informais assumem um papel importante e insubstituível e que é necessário valorizar (European Foundation for improvement of living and working conditions, 1995).

Portugal é visto a nível europeu como tendo uma oferta mediana em cuidados informais e baixa oferta em cuidados formais. Os cuidados formais são prestados fundamentalmente por instituições privadas de Solidariedade Social. Os idosos em Portugal estão particularmente vulneráveis. A percentagem de idosos pobres é de 26,1% e os pensionistas da Segurança Social têm uma reforma mensal menor que o salário mínimo (Paúl, 2014).

Poder-se-á dizer que, o local ideal para viver e envelhecer é na família e com a rede de amigos, criados ao longo dos anos, se tal for possível. A família, ao longo de toda a existência desempenha um papel preponderante. Ao longo da vida as relações familiares vão-se modificando. A continuidade destas relações, durante o processo de envelhecimento, é imprescindível. A construção e transmissão de legado (biológico, crenças, valores, tradições e material) são uma forma do idoso dar sentido à vida e sobreviver à morte (Sousa, Patrão & Vicente, 2012).

31 Para o idoso viver na sua casa representa independência, segurança, intimidade, privacidade, identidade, local de lembranças e de ligação entre o passado e o presente. Permite continuidade no estilo de vida e a ligação com a comunidade. Criar relações positivas com os familiares, amigos e rede social ajuda a promover um envelhecimento bem-sucedido e a diminuir sintomas de depressão que podem estar relacionados com todo o percurso de vida. A interseção de várias crises vai definir a forma de envelhecer. Os problemas vivenciados na infância, as dificuldades socioeconómicas, os problemas emocionais, os problemas com filhos e netos, juntamente com as doenças que, nesta fase, são mais propícias a surgir, tudo pode contribuir para viver melhor ou pior a velhice (Sousa, 2006b).

Assistimos à transferência da assistência dos idosos dos filhos para a sociedade (Correia, 2003). Com o aumento da idade e dependência pode ser difícil continuar a viver em casa. Continuar na sua habitação simbolizava, até aqui, independência, autonomia; pode passar a representar aumento da dependência e da fragilidade. O viver só, após a morte do cônjuge, o medo de necessitar de ajuda, o viver em casas sem condições pode apressar o ingresso num lar. Esta decisão pode partir do idoso, pode fazer parte de um planeamento muito anterior e pode ser por imposição de outros. Este processo pode ser acelerado quando as condições de saúde se agravam e, muitas vezes, pela exaustão do cuidador ou, por não existir ninguém que cuide do idoso. A adaptação ao lar vai depender de vários fatores. Quando a decisão parte do idoso a integração é mais fácil. Quando é imposta a rejeição e a depressão podem ocorrer mais facilmente (Sousa, 2006b).

Apesar de a sociedade, já há longos anos, ter vindo a refletir sobre o envelhecimento e a forma de promover um envelhecimento saudável e inclusivo, ainda se denotam muitas carências e grandes dificuldades nesta faixa de população. Muitos idosos sentem-se discriminados só pelo facto de serem velhos. Combater estas atitudes é importante pois vai contra os direitos fundamentais de todas as pessoas. Em 1969 surge o termo idadismo para tentar explicar as atitudes negativas da comunidade para com as pessoas idosas. Existem diferentes manifestações deste fenómeno e umas são mais difíceis de detetar do que outras. A ajuda excessiva, promovendo a incapacidade e a dependência também é uma manifestação de idadismo (Marques, 2011).

No estudo, já antes referido por Paúl (2012), “I relatório sobre o idadismo na europa, do European Research Group on Attitudes to Age” surgem vários estereótipos relacionados com os idosos: serem benevolentes, mais simpáticos do que

32 competentes, desencadeando sentimentos de paternalismo e compaixão. No mesmo estudo 61% dos portugueses apontam a discriminação pela idade como um problema grave ou bastante grave. Referem que esta tendência tende a aumentar com a idade. Pessoas com mais de 80 anos referem que em 31,6% já foi vítima de discriminação. O envelhecimento também tem muito a ver com o facto de ser homem ou mulher (Paúl, 2012). Nestas últimas, para além de viverem mais anos, mais dependentes e com pior poder económico, quando questionadas sobre a sua saúde, qualidade de vida e sofrimento psicológico obtêm pior classificação do que o homem (Ribeiro & Paúl, 2011). Na mulher, a ansiedade e a solidão são mais experimentadas (Paúl, Fonseca, Martín & Amado, 2005), a funcionalidade e incapacidade também é superior (INE, 2012a). O isolamento e a depressão são mais intensos (Botelho, 2005) e, relativamente, ao analfabetismo a percentagem é maior (Pordata, 2014b).