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Processo de neutraliza¸c˜ao dos ´ıons adsorvidos na superf´ıcie

6.2 Adsor¸c˜ao induzida por laser

6.2.2 Processo de neutraliza¸c˜ao dos ´ıons adsorvidos na superf´ıcie

O processo de adsor¸c˜ao de ´atomos alcalinos em superf´ıcies met´alicas ´e estudado h´a bas- tante tempo, sendo anterior a publica¸c˜ao do modelo de Langmuir de adsor¸c˜ao. No caso da adsor¸c˜ao de c´esio em uma superf´ıcie de tungstˆenio, observou-se que, a adsor¸c˜ao desses ´ato- mos, causa uma diminui¸c˜ao na fun¸c˜ao trabalho desse material (Kingdon & Langmuir 1924). Com o aprofundamento das pesquisas nesse campo, v´arios experimentos foram realiza- dos com diferentes tipos de superf´ıcies e adsorvatos, n˜ao se restringindo apenas a superf´ı- cies met´alicas. Assim, foram tamb´em estudadas superf´ıcies diel´etricas e semi-condutoras.

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Observando-se o mesmo comportamento, a diminui¸c˜ao da fun¸c˜ao trabalho das superf´ıcies com o aumento de ´atomos alcalinos adsorvidos (Brause et al. 1997), (Brison et al. 2007). Al- guns modelos te´oricos foram propostos para explicar esse fenˆomeno, sendo o primeiro modelo em primeiros princ´ıpios formulado por R. W. Gurney, baseado na superposi¸c˜ao da fun¸c˜ao de onda do ´atomo e da superf´ıcie (Gurney 1935).

Vamos ent˜ao examinar a situa¸c˜ao em que um ´ıon se aproxima de uma superf´ıcie met´alica, caracterizada por uma distribui¸c˜ao eletrˆonica com energia de Fermi ǫF. Lembramos que, no

caso que n´os estudamos, i) a superf´ıcie n˜ao ´e puramente met´alica, mas diel´etrica, eventual- mente com um certo grau de cobertura t´ermica por ´atomos de c´esio; ii) a energia de Fermi pode depender desse grau de cobertura, ou seja, ter um valor diferente de uma superf´ıcie limpa. Na figura 6.1, ilustramos o potencial de intera¸c˜ao de um el´etron com uma superf´ıcie met´alica na presen¸ca de um ´ıon, mostrando uma superposi¸c˜ao entre as fun¸c˜oes de onda do

Figura 6.1– Potencial de intera¸c˜ao entre um el´etron e uma superf´ıcie com um ´ıon localizado `

a distˆancia z0 da superf´ıcie. O s´olido ocupa o espa¸co z < 0. ψse ψas˜ao as fun¸c˜oes de onda do

el´etron no substrato e no ´atomo, respectivamente. ǫF ´e a energia de Fermi do substrato s´olido

e ǫa a energia do n´ıvel atˆomico dispon´ıvel [Figura adaptada da referˆencia (Gadzuk 1967)].

el´etron no metal e a no ´atomo, o que aumenta a probabilidade de transi¸c˜ao de um el´etron da superf´ıcie para o ´ıon. Podemos ent˜ao calcular a probabilidade do ´ıon ser neutralizado, ou probabilidade de transi¸c˜ao de um el´etron da estrutura de banda da superf´ıcie para um n´ıvel

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eletrˆonico dispon´ıvel do ´atomo.

Essa probabilidade depende da diferen¸ca de energia entre o n´ıvel de Fermi da superf´ıcie ǫF e o n´ıvel eletrˆonico do ´ıon ǫa, como tamb´em da largura ∆ desse n´ıvel. Podemos escrever

que a probabilidade ´e dada por

p = X ~k |T~ka|2L ǫ~k, ǫa, ∆f (ǫ~k, ǫF, T ) X ~k |T~ka|2L ǫ~k, ǫa, ∆ (6.17)

onde, T~ka = h~k |V | ai ´e a probabilidade de transi¸c˜ao do n´ıvel |~ki da superf´ıcie para o n´ıvel |ai do ´ıon, V ´e o potencial de intera¸c˜ao ´ıon superf´ıcie, f(ǫk, ǫF, T ) ´e a distribui¸c˜ao de Fermi

da superf´ıcie e L ǫ~k, ǫa, ∆ ´e uma lorentziana de largura ∆ centrada em ǫa (van Wunnik &

Los 1983).

Consideramos um el´etron de massa m, confinado em duas dimens˜oes na regi˜ao de ´area l2.

A energia ǫ e o vetor de onda k do el´etron s˜ao relacionados atrav´es da rela¸c˜ao de dispers˜ao,

ǫ = ~

2k2

2m . (6.18)

As condi¸c˜oes de contorno d˜ao origem `a quantiza¸c˜ao da energia, onde k pode assumir os valores,

k = 2π l (q

2+ s2) (6.19)

com q e s n´umeros inteiros. Para valores grandes de l, o intervalo entre estados ~k torna-se praticamente cont´ınuo. Os somat´orios em ~k, na equa¸c˜ao6.17, podem assim ser substitu´ıdos por uma integral no espa¸co ~k:

X ~k (...) →  l 2π 2Z (...) d2k. (6.20)

Reescrevemos a equa¸c˜ao6.20 em coordenadas polares, cujo elemento de ´area ´e dado por d2k = dkxdky = kdθdk obtemos, X ~k (...) → 2π  l 2π 2Z (...) kdk, (6.21)

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onde o fator 2π ´e devido `a integra¸c˜ao em θ. Diferenciando a equa¸c˜ao 6.18, dǫ = 2  ~2

2m 

kdk e substituindo em6.21, trocamos a vari´avel de integra¸c˜ao no espa¸co k para a energia, obtendo:

X ~k (...) → π  l 2π 2 2m ~2  Z (...) dǫ. (6.22)

Substituindo 6.22 na equa¸c˜ao 6.17, obtemos

p = Z |T (ǫ) |2L (ǫ, ǫ a, ∆) f (ǫ, ǫF, T )dǫ Z |T (ǫ) |2L (ǫ, ǫa, ∆) dǫ , (6.23)

onde as constantes s˜ao canceladas e escrevemos T~ka como uma fun¸c˜ao da energia T (ǫ). Para obtermos uma solu¸c˜ao anal´ıtica, consideramos que a lorentziana L (ǫ, ǫa, ∆), pode ser

aproximada por uma fun¸c˜ao delta,

L (ǫ, ǫa, ∆) = δ (ǫ − ǫa) . (6.24)

Essa aproxima¸c˜ao ´e bastante grosseira, pois a lorentziana ´e consideravelmente alargada pela intera¸c˜ao ´atomo-superf´ıcie (van Wunnik & Los 1983). Entretanto essa aproxima¸c˜ao permite obter express˜oes simples que n˜ao afetam de maneira significativa as conclus˜oes obtidas para interpreta¸c˜ao das medidas experimentais. A fun¸c˜ao f (ǫ, ǫF, T ) ´e dada pela equa¸c˜ao,

f (ǫ, ǫF, T ) =

1

1 + exp(ǫ − ǫF)/kBT

, (6.25)

que d´a a distribui¸c˜ao de el´etrons dentro da estrutura de banda da superf´ıcie. Essa fun¸c˜ao ´e usada para descrever a distribui¸c˜ao de el´etrons em um superf´ıcie met´alica. Para superf´ıcies diel´etricas e semi-condutoras, devemos fazer algumas modifica¸c˜oes devido `a estrutura de bandas ser mais complexa.

Substituindo 6.24 e 6.25 na equa¸c˜ao, 6.23 obtemos

p = Z |T (ǫ)|2 1 + exp(ǫ − ǫF)/kBTδ (ǫ − ǫa ) dǫ Z |T (ǫ)|2δ (ǫ − ǫa) dǫ . (6.26)

onde o denominador ´e a integral de normaliza¸c˜ao, que d´a a probabilidade de transi¸c˜ao consi- derando uma completa sobreposi¸c˜ao do n´ıvel do ´ıon (que, rigorosamente, tem uma distribui- ¸c˜ao lorentziana), com os el´etrons da estrutura de banda. O numerador d´a a probabilidade

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das transi¸c˜oes que est˜ao dentro da superposi¸c˜ao entre as fun¸c˜oes L (ǫ, ǫa, ∆) e f (ǫ, ǫF, T ).

Integrando a equa¸c˜ao 6.26, obtemos

p = 1

1 + exp(ǫa− ǫF)/kBT

. (6.27)

A equa¸c˜ao 6.27 d´a a probabilidade de neutraliza¸c˜ao do ´ıon em fun¸c˜ao da diferen¸ca de energia (ǫa− ǫF) entre o n´ıvel dispon´ıvel do ´ıon e a energia do n´ıvel de Fermi. Quando

essa diferen¸ca de energia ´e muito grande (e positiva), a probabilidade de neutraliza¸c˜ao ´e nula. Por´em, como discutimos no inicio da se¸c˜ao, ´e conhecido que a fun¸c˜ao trabalho de uma superf´ıcie diminui com a adsor¸c˜ao de ´atomos alcalinos. Considerando esse efeito da diminui¸c˜ao da fun¸c˜ao trabalho em fun¸c˜ao do n´umero de ´atomos adsorvidos, reescrevemos a equa¸c˜ao 6.27, usando a rela¸c˜ao Φ = −ǫF, onde Φ ´e a fun¸c˜ao trabalho, e obtemos:

p = 1

1 + exp(Φ + ǫa)/kBT

. (6.28)

Existem v´arios modelos dos quais se pode obter uma express˜ao anal´ıtica para a varia¸c˜ao da fun¸c˜ao trabalho em fun¸c˜ao do grau de cobertura da superf´ıcie (Brison et al. 2007). O modelo atualmente mais usado ´e conhecido na literatura como o modelo de Topping, derivado por J. Topping (Topping 1927). Do modelo de Topping, obt´em-se que a varia¸c˜ao da fun¸c˜ao trabalho ´e dada por

∆Φ = −ǫd 0 nad×  1 + 9α0 4πǫ0 n3/2ad −1 (6.29)

onde nad ´e a densidade de ´atomos adsorvidos, ǫ0 ´e a permissividade el´etrica do v´acuo, α0

´e a polarizabilidade do c´esio e d ´e o momento de dipolo induzido. Esse modelo ´e baseado no fato de que o ´atomo alcalino, quando adsorvido, forma uma liga¸c˜ao iˆonica parcial com a superf´ıcie, criando uma camada dipolar. O campo el´etrico gerado pela camada dipolar modifica a estrutura de banda da superf´ıcie, diminuindo a fun¸c˜ao trabalho (Ishida 1991).

Como primeira aproxima¸c˜ao, consideramos apenas a dependˆencia linear da varia¸c˜ao da fun¸c˜ao trabalho com a densidade de ´atomos adsorvidos,

∆Φ = −ǫd 0 nad = −  d nm ǫ0  θ, (6.30)

onde usamos a rela¸c˜ao nad = nmθ, com nm a densidade de ´atomos em uma monocamada e θ

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Φ = Φ0+ ∆Φ na forma:

Φ = −γθ + Φ0, (6.31)

onde definimos γ = (d nm/ǫ0) e Φ0 ´e a fun¸c˜ao trabalho da superf´ıcie limpa. Substituindo a

equa¸c˜ao 6.31 em 6.28, e lembrando que ǫa< 0, podemos escrever ǫa= −|ǫa| e obtemos,

p = 1

1 + exp [−(γθ + |ǫa| − Φ0)/kBT ]

. (6.32)

A equa¸c˜ao6.32 descreve a varia¸c˜ao da probabilidade de neutraliza¸c˜ao em fun¸c˜ao do grau de cobertura da superf´ıcie. Essa probabilidade depende da temperatura da superf´ıcie, da estrutura eletrˆonica do adsorvato e da estrutura de banda da superf´ıcie. Analisaremos a seguir as caracter´ısticas da fun¸c˜ao p dada pela equa¸c˜ao 6.32. Primeiro, analisamos a fun¸c˜ao p em fun¸c˜ao de γθ, onde as faixas de varia¸c˜ao de γθ foram estimadas a partir de (Brison

et al. 2007). Para diferentes valores (Φ0− |ǫa|), plotamos as trˆes curvas mostradas na Figura

6.2. Essas curvas mostram que a fun¸c˜ao p (equa¸c˜ao 6.32) apresenta uma transi¸c˜ao de fase

0,2 0,0 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 0,4

p

(a)

(b)

(c)

0,6 0,8 1,0

Figura 6.2– Fun¸c˜ao p em fun¸c˜ao de γθ para v´arias condi¸c˜oes iniciais. Curva (a) Φ0−|ǫa| = 0, 0

eV, o sistema n˜ao apresenta limiar, (b) Φ0− |ǫa| = 0, 75 eV e (c) Φ0− |ǫa| = 1, 5 eV, o sistema

apresenta um limiar dado pela diferen¸ca dos parˆametros.

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limiar da transi¸c˜ao de fase e, dependendo dos valores, podemos prever comportamentos do processo de adsor¸c˜ao induzida, como mostrado pelas curvas Figura 6.2.

Podemos ent˜ao a partir da equa¸c˜ao6.32 estimar o n´umero de ´atomos adsorvidos quando ocorre a transi¸c˜ao de fase. Primeiro, escrevemos o grau de cobertura θ, em fun¸c˜ao do n´umero de ´atomos adsorvidos,

θ = N Nm

(6.33)

onde Nm ´e o n´umero de ´atomos em uma monocamada. O limiar ´e obtido tomando-se,

γθ + |ǫa| − Φ0 = 0. (6.34)

Substituindo 6.33 na equa¸c˜ao 6.34 obtemos, γ N

Nm + |ǫ

a| − Φ0 = 0. (6.35)

Isolando N na equa¸c˜ao 6.35 e definindo N = NL o n´umero de ´atomos no limiar, temos:

NL=

Nm

γ (Φ0− |ǫa|). (6.36)

Usando a equa¸c˜ao6.4, podemos determinar a densidade do vapor atˆomico para a qual temos NL ´atomos adsorvidos, a qual chamamos de densidade do limiar nL,

NL=

b

anL. (6.37)

Substituindo a equa¸c˜ao 6.36 em 6.37 obtemos, nL= aNm b  Φ0 − |ǫa| γ  . (6.38)

Portanto, o limiar depende dos parˆametros a e b, que s˜ao fun¸c˜oes da energia de adsor¸c˜ao E0,

da constante de tempo de residˆencia do ´atomo adsorvido τ0 e da temperatura da superf´ıcie,

assim como de parˆametros que dependem das propriedades eletrˆonicas da superf´ıcie e do adsorvato.

Substituindo6.32em6.16, obtemos a equa¸c˜ao de taxa que descreve o processo de adsor¸c˜ao induzida por laser,

dN

dt = σ(δ)

nI3

1 + exp [−(γθ + |ǫa| − Φ0)/kBT ] − aN + bn.