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DISCUSSÃO ÚNICA

PROCESSO DE VOTAÇÃO: NOMINAL

MENSAGEM Nº 5/2021

Senhor Presidente e Senhores Vereadores,

Trata-se de ofício do senhor presidente da Câmara Municipal de Americana, que encaminha o Autógrafo nº 17/2021, referente a projeto de lei de iniciativa parlamentar, aprovado pelo Poder Legislativo, que “Institui o Projeto de Prevenção da Violência Doméstica com a Estratégia de

Saúde da Família, e dá outras providências.”.

A propositura cria um novo programa de ação governamental, de execução obrigatória pelo Poder Executivo, com o objetivo de promover a proteção de mulheres em situação de violência, mediante a atuação preventiva dos Agentes Comunitários de Saúde.

O texto aprovado atribui às secretarias municipais de Saúde e de “Ação Social e

Desenvolvimento Humano” (sic), de forma articulada, a implementação e execução das ações

necessárias para a efetivação da proteção almejada.

Depois de relacionar as diretrizes que devem nortear a atuação do Poder Público, no âmbito do projeto, o texto relaciona, em pormenor, as ações que deverão ser executadas:

 capacitação permanente dos agentes envolvidos;

 disponibilização, na internet, de orientações relacionadas ao enfrentamento da violência doméstica;

 visitas domiciliares periódicas aos domicílios abrangidos, com o objetivo de difundir informações sobre a Lei Maria da Penha;

 orientação, às mulheres atendidas, sobre a rede de atendimento à mulher vítima de violência doméstica;

 realização de estudos e diagnósticos com o objetivo de compilar informações destinadas ao aperfeiçoamento das políticas protetivas.

A Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos manifestou-se apontando falhas no texto, inclusive no que se refere ao nome da secretaria, bem como sobre a necessidade de regulamentação para permitir a correta aplicação da lei.

A Secretaria de Saúde destacou a importância da propositura, sugeriu sua ampliação de modo a atacar a violência contra a família e não somente contra as mulheres e apresentou sugestões de alteração de vários dispositivos.

É a síntese do necessário.

Esclareça-se, de proêmio, que o Poder Executivo não necessita de autorização legislativa para criar um programa como o engendrado na propositura. Para isso bastaria que o senhor prefeito, convencido da conveniência e oportunidade da medida, determinasse aos órgãos técnicos da Administração Pública, que adotassem as providências e definissem os parâmetros necessários para a criação e funcionamento do projeto.

Dito isso, podemos acrescentar que se trata de propositura inconstitucional, que deve ser fulminada por veto total do chefe do Poder Executivo.

Ainda que houvesse necessidade de lei para regular a matéria, a iniciativa não seria do Poder Legislativo. Por se tratar de norma instituidora de um programa de governo, com indicação de atribuições para secretarias municipais e para servidores do Poder Executivo, a iniciativa pertenceria exclusivamente ao chefe Poder Executivo.

Sob esse aspecto temos a inconstitucionalidade formal, que decorre do vício de iniciativa. No plano material, a inconstitucionalidade surge da afronta ao princípio da separação de poderes, insculpido no artigo 5º da Constituição do Estado de São Paulo, bem como da violação direta e frontal das regras dos artigos 47, II, XIV e XIX, “a” e 144 da mesma Carta Constitucional.

No que diz com a iniciativa, a proposta é inconstitucional porque invade a esfera de competência privativa do chefe do Poder Executivo para iniciar o processo legislativo.

A simples leitura dos dispositivos constitucionais antes citados, leva à inexorável conclusão de que compete ao Chefe do Poder Executivo, com total exclusividade, a iniciativa para legislar sobre a gestão da administração pública e a organização e funcionamento do Ente sob o seu comando político, incluindo-se neste âmbito a criação de programas governamentais que deverão ser executados por órgãos integrantes da sua estrutura.

Isto porque a repartição das competências legislativas entre os entes federados, definida pela Constituição da República, reserva ao chefe do Poder Executivo, com total exclusividade, a iniciativa para legislar sobre a organização da administração pública. E a violação dessa regra implica na inconstitucionalidade do ato normativo.

Conforme a sempre abalizada lição de José Afonso da Silva, in verbis:

“A Constituição contém regras rígidas sobre a iniciativa das leis, regras que têm que ser observadas no processo de formação das leis, sob pena de estas padecerem do vício de inconstitucionalidade por defeito de iniciativa. Esse defeito é especialmente condenado quando haja desrespeito às regras de iniciativa exclusiva, que tem sido a causa mais comum de inconstitucionalidade formal, porque se dá, no caso, uma usurpação de competência constitucionalmente estabelecida. ” (in Processo Constitucional de Formação das Leis, Malheiros – São Paulo, 2ª Edição, 2007, página 346) –

grifo nosso

Em outra obra sua, o mestre arremata:

“... O fundamento dessa inconstitucionalidade está no fato de que do princípio da supremacia da constituição resulta o da compatibilidade vertical das normas da ordenação jurídica de um país, no sentido de que as normas de grau inferior somente valerão se forem compatíveis com as normas de grau superior, que é a constituição. As que não forem compatíveis com ela são inválidas, pois a incompatibilidade vertical resolve-se em favor das normas de grau mais elevado, que funcionam como fundamento de validade das inferiores.

Essa incompatibilidade vertical de normas inferiores (leis, decretos etc.) com a constituição é o que, tecnicamente, se chama inconstitucionalidade das leis ou dos atos do Poder Público, e que se manifesta sob dois aspectos: (a) formalmente, quando tais normas são formadas por autoridades incompetentes ou em desacordo com formalidades ou procedimentos estabelecidos pela constituição; (b) materialmente, quando o conteúdo de tais leis ou atos contraria preceito ou princípio da constituição. ” (Curso de Direito

Constitucional Positivo, Malheiros, SP, 10ª Ed., 1995, página 51) – grifos nossos

Demais disso, ao criar uma política pública que deverá ser executada pelo Poder Executivo, a propositura viola o art. 47, II, XIV e XIX, “a”, da Constituição Estadual, na medida em que cria regras relativas à direção da administração e à organização e funcionamento do Poder Executivo, matérias essas que são da alçada da reserva da Administração.

A questão, pois, para poder afirmar se houve, de fato, a violação da norma constitucional, é definir o conteúdo e a amplitude da expressão “organização administrativa” ou, “organização da administração pública”.

Deve-se entender por organização administrativa do Poder Executivo o conjunto integrado pela totalidade da sua estrutura, com os seus órgãos de atuação – envolvendo a administração direta e indireta, as respectivas atribuições e formas de funcionamento; os cargos públicos e respectivas atribuições, a política de pessoal; os programas de ação governamental, projetos e políticas de governo e, ainda, a normatização, o planejamento e o ordenamento urbano; bem como a organização, a execução e a direção dos serviços públicos de sua competência.

Em qualquer uma das matérias acima relacionadas não cabe ao Poder Legislativo a atribuição de iniciar o processo de elaboração legislativa.

De acordo com a sempre precisa lição de Hely Lopes Meirelles in verbis:

“... São, pois, de iniciativa exclusiva do prefeito, como chefe do Executivo local, os projetos de leis que disponham sobre a criação, estruturação e atribuição das secretarias, órgãos e entes da Administração Pública Municipal; matéria de organização administrativa e planejamento de execução de obras e serviços públicos; criação de cargos, funções ou empregos públicos na Administração direta, autárquica e fundacional do Município; regime jurídico e previdenciário dos servidores municipais, fixação e aumento de sua remuneração; plano plurianual, diretrizes orçamentárias, orçamento anual e créditos suplementares e especiais. Os demais projetos competem concorrentemente ao prefeito e à Câmara Municipal, na forma regimental. ” (in Direito Municipal Brasileiro, Ed. Malheiros, São Paulo, 2014, p. 633) –

grifos nossos

A propositura sob análise trata, justamente, da criação de um programa de ação governamental destinado a enfrentar os problemas decorrentes da violência doméstica que atinge as mulheres.

Em casos assim, que envolvem a criação de programas governamentais, a competência para iniciar o processo legislativo, quando há necessidade de lei, pertence exclusivamente ao prefeito municipal, como atribuição e prerrogativa do cargo para o qual foi eleito. E se o prefeito não toma a iniciativa, a Constituição não permite que o vereador o substitua. Ao contrário, o texto constitucional veda tal substituição.

É que, conforme destaca o ilustre Professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho:

“... o aspecto fundamental da iniciativa reservada está em resguardar a seu titular a decisão de propor direito novo em matérias confiadas à sua especial atenção, ou de seu interesse preponderante. ” (Do Processo Legislativo – Saraiva, São Paulo, p. 2004 – fls. 60) – grifo nosso

E isso tem razão de ser, posto que, invariavelmente, somente o destinatário da iniciativa reservada dispõe do conhecimento técnico e demais informações necessárias para comandar o processo de formação e elaboração legislativa. E não se está a falar aqui em termos meramente pessoais. Não é que o Prefeito saiba mais. O Poder Executivo, por força da sua natureza e das atribuições que desempenha é o único aparelhado para produzir o conhecimento técnico e compilar as informações necessárias para o bom e oportuno desenvolvimento dos projetos ou programas sob sua responsabilidade. Por isso a Constituição reserva exclusivamente a ele, em certos casos, o poder de iniciar o processo legislativo. Tal é o entendimento expressado, entre outros, por Ives Gandra Martins ao comentar a Constituição Federal, in verbis:

“... sobre tais matérias tem o Poder Executivo melhor visão do que o Legislativo, pôr as estar gerindo. A administração da coisa pública, não poucas vezes, exige conhecimento que o Legislativo não tem, e outorgar a este Poder o direito de apresentar os projetos que desejasse seria oferecer-lhe o poder de ter iniciativa sobre assuntos que refogem a sua maior especialidade. ” (in Comentários à Constituição do Brasil, Volume 4, Tomo I, 3ª edição, Saraiva, São Paulo, 2002) – grifamos.

Ao fim e ao cabo, o que se tem, no caso sob análise, é uma norma que obriga o prefeito a agir em matéria sujeita à sua discricionariedade ou, por outra, temos o legislador usurpando a competência do prefeito para fazer aquilo que ele pode fazer sem depender de autorização da Câmara Municipal, mediante a aplicação dos critérios de conveniência e oportunidade, com a simples edição de um decreto, conforme autoriza o disposto no artigo 47, inciso XIX, alínea “a” da Constituição do Estado de São Paulo.

No âmbito material, a inconstitucionalidade decorre tanto da violação do princípio da separação de poderes, insculpido no artigo 5º, quanto da inobservância das normas contidas no artigo 47, II, XIV e XIX, “a”, aplicáveis aos municípios paulistas por força do disposto no artigo 144, todos da Constituição Estadual Paulista.

A norma aprovada, em razão de ter sido proposta por parlamentar, produz indevida ingerência no exercício das atribuições acometidas ao Poder Executivo, na medida em que cria um programa de ação governamental, que deverá ser implementado e executado por ele, ultrapassando, com isso, o limite constitucional imposto à sua atuação.

A propósito do vício de inconstitucionalidade material, Luís Roberto Barroso afirma que ele: “...expressa uma incompatibilidade de conteúdo, substantiva, entre a lei ou ato normativo e a Constituição. Pode traduzir-se num confronto com uma regra constitucional (...) ou com um princípio constitucional (...). O controle material de constitucionalidade pode ter como parâmetro todas as categorias de normas constitucionais: de organização, definidoras de direitos e programáticas (...). O reconhecimento da inconstitucionalidade de um ato normativo, seja em decorrência de desvio formal ou material, produz a mesma consequência jurídica: a invalidade da norma...”. (in Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro – Saraiva – SP, 2009. 3ª Ed. rev. e atual. pag. 29) – grifo nosso

E, por força do disposto no artigo 144, os municípios paulistas estão jungidos à força vinculante da Constituição Estadual, da qual não podem se apartar.

Disso resulta que o princípio da separação dos poderes do Estado, insculpido no artigo 5º da Constituição Paulista, repetindo o que se encontra escrito no artigo 2º da Constituição da República, deve ser respeitado também no âmbito municipal, de modo a preservar as prerrogativas, funções e atribuições de cada um, sem possibilidade de renúncia, delegação ou transferência entre eles.

A observância desse princípio constitucional é essencial para o bom e adequado funcionamento dos poderes constituídos e para a saúde do Estado Democrático de Direito.

Resta evidente, portanto, que quando um dos poderes do Estado aprova lei de sua iniciativa, instituindo um projeto de ação governamental que deverá ser executado por outro, a regra de independência é violada e dessa violação exsurge a inconstitucionalidade material que macula e aniquila a norma aprovada, de tal sorte que ela deixa de ter viabilidade jurídica.

Da mesma forma, por força do já citado artigo 144 da Constituição Bandeirante, ao Chefe do Poder Executivo Municipal são asseguradas as mesmas prerrogativas garantidas ao Governador do Estado, no artigo 47, II, XIV e XIX, “a” da mesma Carta, o que equivale a dizer que são competências privativas do Prefeito:

 iniciar o processo legislativo em matéria de organização do Poder Executivo e da administração pública;

 exercer, com o auxílio dos secretários municipais, a superior direção da administração municipal;

 praticar os atos de administração do Município;

 dispor, mediante a edição de decreto, sobre a organização e o funcionamento da administração estadual, quando não implicar aumento da despesa, nem a criação ou extinção de órgãos públicos.

Portanto, como a propositura em análise trata de matéria atinente ao funcionamento da administração municipal, na medida em que cria um típico programa de ação governamental, cabe ao Chefe do Poder Executivo, quando e se entender que é oportuno e conveniente, adotar as providências necessárias para a sua execução.

E quando a Câmara, violando direta e frontalmente a norma constitucional, avança sobre a competência privativa do Poder Executivo, instala-se a mácula de inconstitucionalidade material, insuscetível de ser afastada, mesmo com a sanção do prefeito, eis que se trata de competência impossível de ser delegada.

A jurisprudência que confirma tudo o que ficou dito acima é farta, pacífica e uniforme. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, órgão jurisdicional com atribuição constitucional para julgar as ações de inconstitucionalidade de leis promulgadas por municípios paulistas, em face da Constituição Estadual, tem afirmado reiteradamente que a criação e organização de programas e projetos de ação governamental é atribuição exclusiva do chefe do Poder Executivo:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei nº 11.445, de 25 de outubro de 2016, de origem parlamentar, que acrescentou dispositivos à Lei Municipal nº 7.935, de 05 de outubro de 2006, obrigando a Administração Pública do Município de Sorocaba a disponibilizar, nas unidades de saúde do Município, profissionais da área de saúde capacitados para atender, acolher e orientar pacientes nas situações de violência doméstica sexual,

física ou psicológica, obrigando-a, ainda, a manter profissionais para acompanhamento das vítimas destas situações em plantões policiais. Promulgação da norma sem a especificação de dotação orçamentária ou indicação de sua fonte de custeio impede, quando muito, a exequibilidade dentro do mesmo exercício. Vício de iniciativa. Ocorrência. Norma impugnada que invade a esfera de competência exclusiva do Chefe do Executivo, elencada no art. 47, Incisos II, XIV e XIX da Carta Estadual, aplicável aos Municípios por força do art. 144 da citada Carta. Parlamento que, em agindo “ultra vires”, exorbita dos limites que definem o exercício de sua prerrogativa institucional. Não pode o Legislativo insinuar-se, muito menos interferir, ainda mais por iniciativa parlamentar, em domínio que se refira à própria organização administrativa do Poder Executivo, pois, nessa matéria, a prerrogativa de fazer instaurar o processo de formação das leis, quando tal se fizer necessário, competirá, exclusivamente, por efeito de expressa determinação constitucional, ao Chefe do Poder Executivo. Precedentes da Corte Suprema e do C. Órgão Especial. Ação procedente. (ADI TJ-SP nº

2089253-38.2018.8.26.0000 – Município de Sorocaba – relator Desembargador Xavier de Aquino – V. U. – j. 26/09/2018) – grifos nossos.

Do corpo do v. Acórdão trazemos o seguinte excerto, que elucida o entendimento do colendo TJSP:

“[...]

Não obstante, de iniciativa parlamentar, a lei guerreada invade a esfera de competência exclusiva do Chefe do Executivo local, elencada no artigo 47, II e XIV e XIX da Constituição Estadual, aplicável aos Municípios por força do artigo 144 da citada Carta, que assim dispõe:

“Artigo 47 - Compete privativamente ao Governador, além de outras atribuições previstas nesta Constituição:

(...)

II - exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção superior da administração estadual;

(...)

XIV - praticar os demais atos de administração, nos limites da competência do Executivo;

(...)

a) Organização e funcionamento da administração estadual, quando não implicar aumento de despesas, nem criação ou extinção de órgãos públicos;...”. (...)

Artigo 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto0organizaqrão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”

“Mais não fosse, a norma objurgada inseriu atribuições ao Poder Executivo, ao determinar, no artigo 2º e parágrafo único que, in verbis: “O Poder Público Municipal manterá profissionais disponíveis para o acompanhamento de vítimas de violência doméstica, sexual, física ou psicológica aos Plantões Policiais, quando tais vítimas a eles se dirigirem para registrar Boletins de Ocorrência, sempre que a Delegacia de Defesa da Mulher estiver fechada. Parágrafo único. Os profissionais acompanhantes das vítimas mencionadas no caput do artigo, serão devidamente capacitados pelo Centro de Referência da Mulher ou outro órgão devidamente qualificado."

Como sabido, ao Legislativo compete a edição de normas gerais, de caráter abstrato e coativo de observância pelos Munícipes. No dizer de Hely Lopes Meirelles, “Em sua função normal e predominante sobre as demais, a Câmara elabora leis, isto é, normas abstratas, gerais, e obrigatórias de conduta. Esta é sua função específica, bem diferenciada da do Executivo, que é a de praticar atos concretos de administração (...). Daí não ser permitido à Câmara intervir direta e concretamente nas atividades reservadas ao Executivo, que pedem provisões administrativas especiais manifestadas em ordens, proibições,

concessões, permissões, nomeações, pagamentos, recebimentos,

entendimentos verbais ou escritos com os interessados, contratos, realizações materiais da Administração e tudo o mais que se traduzir em atos ou medidas de execução governamental” (Direito Municipal Brasileiro, 1ª ed., São Paulo, Malheiros.2000. p. 506-507).

Em que pese a justificativa louvável para edição da norma, há evidente invasão da esfera reservada de ato da Administração, agindo o Legislativo ultra vires, consoante já observou a Corte Suprema, verbis:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.169 SÃO PAULO V O T O. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Peço vênia, Senhora Presidente, para acompanhar a divergência, eis que também entendo que a matéria veiculada na Lei paulista nº 10.877/2001 qualifica-se como tema sujeito à reserva de administração, o que basta para legitimar a declaração de inconstitucionalidade ora pretendida pelo Senhor Governador do Estado. Ainda que o legislador disponha do poder de conformação da atividade

administrativa, permitindo-se-lhe, nessa condição, estipular cláusulas gerais e fixar normas impessoais destinadas a reger e a condicionar o próprio comportamento da Administração Pública, não pode, o Parlamento, em agindo “ultra vires”, exorbitar dos limites que definem o exercício de sua prerrogativa institucional. Na realidade, o Legislativo não pode insinuar-se, muito menos interferir, ainda mais por iniciativa parlamentar, em domínio que se refira à própria organização administrativa do Poder Executivo, pois, nessa matéria, a prerrogativa de fazer instaurar o processo de formação das leis, quando tal se fizer necessário, competirá, exclusivamente, por efeito de expressa determinação constitucional, ao Chefe do Poder Executivo: “RESERVA DE ADMINISTRAÇÃO E SEPARAÇÃO DE PODERES . O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. (…). Essa prática legislativa, quando efetivada, subverte a função primária da lei, transgride o princípio da divisão funcional do poder, representa comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e importa em atuação 'ultra vires' do Poder Legislativo, que não pode, em sua atuação políticojurídica, exorbitar dos limites que definem o exercício de suas prerrogativas institucionais. ” (ADI 2.364- MC/AL, Rel. Min. CELSO DE MELLO).

É por isso que o magistério da doutrina adverte, na lição de J. J. GOMES CANOTILHO (“Direito Constitucional”, p. 810/811, 5ª ed., 1991, Almedina, Coimbra), que a reserva de administração constitui limite material à intervenção normativa do Poder Legislativo, pois , enquanto princípio fundado na separação orgânica e na especialização funcional das instituições do Estado, caracteriza-se pela identificação, no sistema constitucional, de um “núcleo funcional (...) reservado à administração contra as ingerências do parlamento”, por envolver matérias, que, diretamente atribuídas à instância executiva de poder, revelam-se insuscetíveis de deliberações concretas por parte do Legislativo. Como se sabe, e tal como adverte a jurisprudência do Supremo

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