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5.1 Pesquisa na base de dados da Scielo

5.1.1 Base Scielo – experiências intersetoriais com participação do MPT

5.1.1.2 Processo de trabalho e condições de trabalho em frigoríficos de aves: relato de uma

O estudo de Oliveira e Mendes (2014) decorre da experiência dos autores em atividades de vigilância em saúde desenvolvidas em frigoríficos de aves no sul do Brasil e buscou valorizar a intervenção interinstitucional, especialmente do MPT. O artigo destaca o relevante espaço que o setor ocupa na economia nacional e, em contraponto, o processo de produção em frigoríficos e o seu impacto na saúde do trabalhador, devido ao aumento de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho.

Segundo pesquisas dos autores, grande parte dos trabalhadores tem ensino fundamental incompleto, já que as exigências desse mercado focam na saúde e na resistência do trabalhador para o exercício de “tarefas repetitivas, desgastantes e insalubres,

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demonstrando a centralidade da saúde no processo de seleção de trabalhadores” (OLIVEIRA; MENDES, 2014, p. 3). Esse entendimento perverso de seleção dos trabalhadores também foi elucidado por Ribeiro (1999, p. 1999): “a produção não requer, obrigatoriamente, trabalhadores absolutamente saudáveis, mas que o sejam o suficiente para garantir a produtividade esperada. O que importa não é a saúde do trabalhador, mas a saúde necessária à produção”.

Ainda consoante os estudos de Oliveira e Mendes (2014), os frigoríficos diferem uns dos outros, mas, nesse ambiente, podem ser encontrados os mais diversos riscos, em virtude da postura para o trabalho, com movimentos repetitivos e trabalho em pé; do contato com carne, vísceras, glândulas e sangue; e da exposição à umidade, com trabalho em áreas frias ou refrigeradas ou, ainda, alternância entre ambiente quente e frio. Mas há também os riscos decorrentes da própria forma de organização e do ritmo do trabalho ditados pela empresa, que seguem os preceitos tayloristas e fordistas aliados à ausência de concessão de pausas, longas jornadas de trabalho e sobrecarga mecânica.

Nesse sentido, diante dos agravos à saúde decorrentes dos riscos identificados, o setor sempre demandou uma intervenção qualificada. Conforme Oliveira e Mendes (2014, p. 4),

Na presente experiência, os casos de intervenção mais produtivas em termos de promotora de modificações reais nos ambientes de trabalho foram aqueles onde havia maior integração interinstitucional. Os órgãos mais atuantes foram o Ministério do Trabalho e Emprego, em articulação com o Ministério Público do Trabalho. Os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerests) foram mais atuantes em matadouros municipais e em estabelecimentos maiores nos Estados do Sul do país a partir de um processo de formação de seus técnicos, transcorrido em 2013.

Um dos principais avanços relatados e decorrentes da atividade intersetorial e interinstitucional foi a própria edição da Norma Regulamentadora nº 36 do MTE, com normas referentes “à segurança e saúde no trabalho em empresas de abate e processamento de carnes e derivado, publicada pela Portaria MTE n.º 555, de 18 de abril de 2013, e que trouxe uma regulamentação bastante específica para o setor” (BRASIL, 2013b).

Após a normatização, relata-se que ocorreu um trabalho de capacitação no âmbito do SUS, alcançando servidores dos Cerests e das unidades de vigilância em saúde dos municípios da região, com o apoio da Fiocruz e financiamento do MS. Procuradores do trabalho e membros do MPT também participaram de algumas dessas capacitações.

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Aqui, vale citar a importante atuação do MPT para promoção da saúde dos trabalhadores de frigoríficos. Além das ações fiscais nas empresas, o MPT possui um Projeto de Adequação das Condições de Trabalho em Frigoríficos. No âmbito desse projeto, conforme esclarecido na 3ª Reunião da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, o MPT compôs um grupo de trabalho com o MTE, com discussões ao longo de dois anos que em muito influenciaram a produção e a redação da NR 36 (SENADO FEDERAL, 2017).

Além da atuação promocional que resultou na elaboração da referida NR, o MPT tem realizado audiências públicas com a participação de diversos atores sociais, como representantes do Departamento de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), coordenador do grupo de fiscalização em frigoríficos do MTE no Rio Grande do Sul (MTE/RS) e a Procuradoria Geral Federal (PGF), em que são esclarecidos os aspectos da norma considerados mais relevantes (PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO DO RIO GRANDE DO SUL , 2013).

Ainda no âmbito de uma atuação promocional, o MPT também tem expedido notificações recomendatórias às empresas, como a que segue transcrita:

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO dirige-se, através do presente

instrumento legal, com o objetivo de NOTIFICAR-LHE para que adote as seguintes condutas:

I – Instituir pausas de recuperação térmica em ambientes frios, nos termos do art. 253 da CLT e da Súmula 438 do TST.

II – Instituir pausas de recuperação psicofisiológica em atividades que geram sobrecarga osteomuscular estática ou dinâmica do pescoço, ombros, dorso e membros superiores ou inferiores. Deve ser assegurado pausas de, no mínimo, de 60 min para jornadas de até 8h48min. Em caso de labor excedente de 9h10min, deverá ser concedida uma pausa de 10min a cada 50 trabalhados, sendo a primeira pausa as 8h48min de jornada. Para jornada de 7h20minutos devem ser implementadas pausas de 50 min ao dia.

III – Abster-se de considerar como pausas de recuperação psicofisiológica os períodos destinados à ginástica laboral.

IV– Dotar os locais de trabalho de relógio de fácil visualização que possam controlar os períodos de pausas e afixar escala de pausas nos painéis de aviso aos trabalhadores.

V – Assegurar, a qualquer tempo, a saída dos postos de trabalho para satisfação das necessidades fisiológicas. (MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, 2017h).

Apesar de ressaltar a importância da articulação intersetorial, os autores fazem críticas apontando uma “fraca implementação de intervenções concretas do Estado nas condições de saúde no setor” (MENDES; OLIVEIRA, 2014, p. 1), como dificuldades de uma melhor

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articulação entre MS, MTE e MTPS, e ausência de uma capacitação geral dos quadros dos agentes públicos, especialmente na auditoria fiscal do trabalho.

5.1.1.3 Exposição ao benzeno em postos de revenda de combustíveis no Brasil: Rede de