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Produção Bibliográfica e Musical de Fábio de Melo: construindo uma nova

3. PADRE FÁBIO DE MELO E A SINALIZAÇÃO DO NOVO

3.3. Produção Bibliográfica e Musical de Fábio de Melo: construindo uma nova

Foto 24: Padre Fábio de Melo, na capa do CD Vida (2008).

Tendo como referencial Padre Zezinho, precursor dos padres cantores desde a década de 1960, padre Fábio de Melo lançou seu primeiro CD em 1997, com o título "De Deus um Cantador". Em seguida, em 1999, "Saudades do Céu", com a participação de diversos artistas católicos, reunindo os cantores de sua congregação, os padres Zezinho e Joãozinho. Em 2001, lançou ainda pelas Paulinas, “As Estações da Vida” e, em 2003, "Marcas do Eterno".

Desde então, foi ganhando espaço na “Talentos Produções”, sua produtora até hoje. Leo Medeiros, sua empresária, conta que a primeira vez em que viu Fábio cantar percebeu que ele tinha o carisma necessário e passou a investir na carreira dele, com aulas de canto e postura e, daí em diante, seu sucesso foi crescente.

No ano de 2004, o padre apresentou um projeto independente, o disco "Tom de Minas", de conteúdo autoral, no qual homenageou nomes e lugares de seu estado natal, Minas Gerais, contando com a participação do cantor e compositor popular Paulinho Pedra Azul.

Foto 25: Fábio de Melo autografando seu livro para Marília Pêra (São Paulo/SP 2008)

Fonte: http://padrefabiodemeloeueotempo.blogspot.com/

Em 2005, lançou o CD “Humano Demais”, que contém canções não só de sua autoria, mas também de outros compositores da música católica. Em 2006, já completando 10 anos de atuação na música católica, optou por um trabalho com composições próprias e canções sertanejas, no CD “Sou um Zé da Silva”. O CD de 2007, “Filho do Céu”, o primeiro fora das Paulinas, agora pela Canção Nova, aborda temas de vivências pessoais e lembra os que se foram, a exemplo do Padre Léo Tarcisio, seu formador durante o seminário e grande amigo, e do cantor e

compositor Robson Jr., dos Cantores de Deus, seu melhor amigo, ambos mortos na mesma época, vítimas de câncer.

Também em 2007, o CD “Enredos do Meu Povo Simples” retomou a ideia já experimentada em "Sou um Zé Da Silva", com canções sertanejas, apresentando as que ficaram fora do outro projeto, também lançado pelas Paulinas. Em virtude de estar fazendo sucesso, foi convidado pela Som Livre para gravar o álbum de 2008, “Vida”, que contou com mais de um milhão de cópias vendidas e, logo sem seguida, em 2009, gravou também pela Som Livre o DVD ao vivo “Eu e o Tempo” e, no final do mesmo ano, o CD “Iluminar”.

Foto 26: Ônibus da turnê “Eu e o Tempo” (Poços de Caldas/MG, 2009). Fonte: Ruth Barbosa

Fábio de Melo também conta com uma vasta produção de livros. Em 2006 publicou “Tempo: saudades e esquecimentos”, pela Paulinas; em 2007, “Amigo: somos muitos, mesmo sendo dois”, pela Editora Gente; em 2008, “Quem Me Roubou de Mim?” pela Canção Nova; ainda em 2008, “Mulheres de aço e de flores” pela editora Gente; novamente em 2008, “Quando o sofrimento bate a sua porta”, pela Canção Nova; em 2009, “Cartas entre Amigos - sobre medos contemporâneos”, tendo Gabriel Chalita como parceiro, pela editora Ediouro. Também em 2009, “Mulheres Cheias de Graça”, pela Ediouro e, em 2010, “Cartas entre Amigos - sobre ganhar e perder”, em parceria com Gabriel Chalita, pela editora Globo. Por fim, ainda em 2010, publicou “O Verso e a Cena”, pela editora Globo.

Com base no exame detalhado das obras, bem como de cinco CDs – considerados os principais de sua carreira – optou-se por organizar um quadro em que fossem destacados os temas principais de cada obra:

Obra Ano de Publicação Editora / Produtora Principais Temas Abordados CD “Humano Demais” 2005 Paulinas - Cotidiano

- Fé x Milagre

- Olhar humano x olhar divino - Liberdade - Presença do Espírito Santo Livro “Tempo: Saudades e Esquecimentos” 2006 Paulinas - Cotidiano - Memórias - Experiências múltiplas CD “Filho do Céu” 2007 Canção

Nova - Vitória - Perdas - Dor - Amor

- As várias faces do Homem - Avessos da vida

Livro “Amigos: somos muitos mesmo sendo

dois”

2007 Gente - Relacionamentos

CD “Vida” 2008 Som Livre - Família

- Olhar humano x olhar divino

- Avessos da vida Livro “Quem me

roubou de mim” 2008 Canção Nova - -O O “desafio de ser pessoa” sequestro da subjetividade

- Liberdade

- Superação das

Livro “Mulheres de Aço

e de Flores” 2008 Gente - Cotidiano - Fragilidades Livro “Quando o

sofrimento bater a sua porta”

2008 Canção

Nova - Sofrimento - Limites

- Conhecimento interior - Avessos da Vida

DVD “Eu e o Tempo” 2009 Som Livre - O milagre a partir da ação do homem e de Deus

- Valorização da vida - Sofrimento

- Cotidiano Livro “Cartas entre

amigos: sobre medos contemporâneos”

2009 Ediouro - Medos do Homem contemporâneo

CD “Iluminar” 2009 Som Livre - A presença do Espírito Santo

- Deus humano

- Dificuldades do cristão - Valorização da vida - Virgem Maria Livro “Mulheres cheias

de graça” 2009 Ediouro - Amor e a vontade amar Livro “Cartas entre

amigos: sobre ganhar e perder”

2010 Globo - Ritualidade da vida

- Perdas e ganhos cotidianos

Livro “O verso e a

cena” 2010 Globo - O belo no cotidiano

Dentre os temas listados, optou-se por elaborar uma tipologia, com o intuito de facilitar a abordagem de sua obra. Pode-se dizer que a reflexão de Fábio de Melo está centralizada em dois eixos, o cotidiano e o avesso, uma vez que tais expressões são frequentemente usadas nos aconselhamentos de padre Fábio aos seus fiéis, como ao dizer: “não esqueça, a gente tem que olhar o avesso das coisas”; “quando se é cristão não se para de lutar, a vida é assim, é nosso cotidiano!”. Essas características marcam a originalidade no campo do discurso veiculado por Fábio de

Melo, e, aos poucos, aparecem como marca de distinção entre seus seguidores e os demais.

a) O Cotidiano

Como mencionado acima, valorizar as experiências cotidianas é uma marca dos trabalhos de Fábio de Melo. Ao resgatar o que ele denomina de “ritualidade da vida”, procura apresentar o encanto do dia a dia. Para o autor, a consciência das ações cotidianas facilita a compreensão da vida e o entendimento do outro. O trecho transcrito a seguir ajuda a esclarecer:

“Tive um grande professor de História da Filosofia que fazia questão de nos dizer que foi na ágora que a filosofia assumiu o seu verdadeiro papel na sociedade. A filosofia do cotidiano, a reflexão nossa de cada dia. A arte de articular o pensamento como realidade dialética, que extrapola a verdade hermética, fechada, mas que se abre à percepção do outro. A filosofia que é construída a partir da vida concreta das pessoas. A trama da existência e seus fios tão cheios de nuances. A filosofia como tear que tece e favorece a compreensão do entrelaçamento das linhas” (MELO & CHALITA, 2010, p. 25).

Martins (2000), ao discutir o cotidiano na perspectiva sociológica, expõe que o interesse na vida cotidiana tem resultado diretamente do refluxo das esperanças da humanidade num mundo novo de justiça, de liberdade e de igualdade. De certo modo, há nessas origens uma descrença na história, uma renúncia de que o homem é o senhor de sua história e de que pode produzir seu próprio destino. Segundo o autor, a vida cotidiana se tornou um refúgio para o desencanto de um futuro improvável, de uma história bloqueada pelo capital e pelo poder. Nas palavras de Martins:

“Se a sociologia do século XIX e da primeira metade deste século descobriu o homem como criatura da sociedade, o período recente põe a sociologia ante a crise dessa concepção e crise dessa verdade relativa e transitória” (MARTINS, 2000, p. 56).

Uma vez que as grandes certezas terminaram, o homem comum imerso no cotidiano torna-se o novo herói. O referido autor alerta ainda para o fato de que só é possível uma sociologia da vida cotidiana se houver superação do que o senso comum tem sido para a interpretação acadêmica: ou apenas o conhecimento em que o homem comum define a vida cotidiana, dando-lhe realidade; ou apenas o conhecimento alienado da falsa consciência que separa o trabalhador do mundo que ele cria. O autor apresenta o senso comum como conhecimento compartilhado entre os sujeitos da relação social, produtores de significados. Dessa forma, nota-se que os significados são reinventados, em vez de serem continuamente copiados. Nesse contexto, revelado pelo homem comum na vida cotidiana, instalam-se as condições de transformação, para Martins, do impossível em possível.

Fábio de Melo trabalha ideia semelhante e tenta apresentar a simplicidade do cotidiano como reveladora das potencialidades da vida. Por essa razão, procura resgatar em seus discursos e obras suas raízes. Reforça amplamente o quanto a vida simples do interior é repleta de possibilidades e o quanto o povo simples tem a contribuir para uma vida mais “feliz”. Nos livros e letras de músicas, resgata histórias de sua infância e da simplicidade de sua mãe para cuidar dele e dos irmãos. Os títulos dos shows e dos CDs também remetem a essa ideia, como em “No meu interior tem Deus” e em “Enredos do Meu Povo Simples”. Tal proposta também contribui para o processo de formar novos habitus, garantindo sua constante internalização na comunidade religiosa, a partir de sua atuação na mídia.

Pais (2002) ajuda a refletir a proposta de Fábio de Melo. O autor menciona que, para a Sociologia, é necessário desenvolver a capacidade de flâneur, daquele que passeia entre a multidão, misturando-se nela36. De acordo com o autor, para

que se possa se encontrar, é necessário ter vivido algum tipo de desnorte. Ademais, ele lembra que a sociologia da vida cotidiana tem de saber penetrar o universo de mistificações para poder sair melhor dele e, acima de tudo, para melhor o

36 Pais (2002) elabora interessante contraposição entre o pesquisador turista e o pesquisador viajante. O pesquisador turista não viaja, circula apenas, adota circuitos que o fazem circular desta ou daquela maneira, de acordo com os roteiros turísticos, privilegiando o factual ao simbólico, o visível ao oculto, o holístico ao singular. A sociologia do cotidiano, por sua vez, segue outras rotas, a do pesquisador viajante: não as rotas preestabelecidas, as que condenam os percursos de pesquisa a uma viagem repetitiva e programada; afinal, o mundo não está contido em mapas ou roteiros, da mesma forma que não está pendente de teorias, embora estas o ajudem a criar.

compreender. Os "escuros-sociais" podem, então, se revelarem instrumentos preciosos para a compreensão da realidade. É nesse sentido que os enigmas podem ser usados como instrumentos potencialmente reveladores ou clarificadores da realidade: "para a sociologia do cotidiano, todo o social é, potencialmente, indiciante" (PAIS, 2002, p. 69).

No conto “O belo no trágico”, publicado no livro “Tempo: Saudades e Esquecimentos” (2007), Fábio de Melo versa sobre ideia semelhante à apresentada por Pais (2002), lembrando a importância dos “desnortes” para o Homem se colocar no mundo e amadurecer. Dito pelo autor:

“Faz parte do processo de aperfeiçoamento humano o olhar-se sem hipocrisias, sem máscaras. É bom poder admitir que em algum momento da vida tivemos a oportunidade de tocar as realidades mais frias e calculistas do nosso coração. Quem sabe, assim, possamos ser mais verdadeiros diante de nós mesmos” (MELO, 2007, p. 19).

Segundo os fiéis, essa valorização do cotidiano apresentada por Fábio de Melo eleva a autoestima, como mostra trecho da entrevista a seguir:

“Quando o padre fala do dia a dia pra gente, que a gente tem que valorizar as pequenas coisas, tudo que acontece, tipo uma flor que nasce, uma música que ouvimos, isso faz a gente ver que nossa vida é importante. É importante pra Deus, e é importante pra todo mundo que nos rodeia. Pensar nisso me ajudou e ajuda muito. Quando estou mais desanimada, logo lembro quanta coisa legal tem ao meu redor, mesmo diante dos problemas” (Flora, seguidora do padre Fábio de Melo).

Ao sair do discurso milagroso, extracotidiano, e se fixar no simples dia a dia dos fiéis, Fábio de Melo consegue fixar com mais facilidade o habitus de ser cristão, recuperando, inclusive, propostas do catolicismo tradicional. Nesse exemplo, fica claro o movimento de interiorização das estruturas exteriores, ao mesmo tempo em que as práticas dos fiéis exteriorizam os sistemas de disposição incorporados.

b) O Avesso

Enquanto a reflexão a respeito do cotidiano, realizada por Fábio de Melo, opera para a objetividade dos fiéis, a ideia de avesso trabalha com o que há de mais subjetivo neles. Em suas pregações, a orientação para visualizar os avessos das situações mais difíceis da vida é uma marca. A poesia demonstra tal reflexão:

CONTRÁRIOS

(Fábio de Melo) Só quem já provou a dor Quem sofreu, se amargurou Viu a cruz e a vida em tons reais

Quem no certo procurou Mas no errado se perdeu Precisou saber recomeçar

Só quem já perdeu na vida sabe o que é ganhar Porque encontrou na derrota o motivo para lutar

E assim viu no outono a primavera

Descobriu que é no conflito que a vida faz crescer Que o verso tem reverso

Que o direito tem avesso Que o de graça tem seu preço

Que a vida tem contrários E a saudade é um lugar Que só chega quem amou

E que o ódio é uma forma tão estranha de amar Que o perto tem distâncias

Que esquerdo tem direito Que a resposta tem pergunta

E o problema solução E que o amor começa aqui No contrário que há em mim

E a sombra só existe quando brilha alguma luz. Só quem soube duvidar

Pôde enfim acreditar

Quem no pouco se encontrou Aprendeu multiplicar Descobriu o dom de eternizar

Só quem perdoou na vida sabe o que é amar Porque aprendeu que o amor só é amor

Se já provou alguma dor E assim viu grandeza na miséria

Descobriu que é no limite Que o amor pode nascer

Novamente se observa a construção de um habitus próprio dos seguidores de Fábio de Melo, que não visa às transformações milagrosas dos problemas, mas sim, objetiva um novo tipo de compreensão da relação com a vida. Parece estar implícita nessa preocupação de Fábio de Melo a vontade de levar amparo para o desamparo natural da condição humana – oriundo de sua subjetividade – somado ao desamparo social típico da sociedade capitalista.

Ruggiero (1999) observa que a angústia proveniente desses tempos de incerteza pode ser aliviada de várias maneiras: pela dedicação excessiva ao trabalho, pela adesão veemente a cultos religiosos, pelo culto do corpo, pelo uso de drogas, e também pela busca da chamada autoajuda.

Pode-se dizer que Fábio de Melo se apresenta aos fiéis como uma saída para as tensões da sociedade contemporânea. Apesar de não se enquadrar exatamente no gênero de autoajuda, é possível aferir que seus discursos e obras operam aspectos desse tipo de produção. Bessa (2010) e Ruggiero (1999) sugerem que uma das principais razões para a busca da literatura de autoajuda é a falta de condições financeiras, pois, não podendo pagar por terapias e tratamentos prolongados, as pessoas procuram tais livros em momentos de angústia e desamparo. A afirmação de Balandier (1997) ajuda a compreender o contexto em que estamos inseridos:

“... a modernidade apresenta-se como uma espécie de quebra-cabeças cujas peças estão misturadas, algumas faltam e a maioria, além disso, está em movimento. Tudo se agita e os indivíduos se encontram mergulhados em incertezas, porque os sinais que

orientavam o curso de uma vida são frequentemente modificados ou deslocados”. (BALANDIER, 1997, p. 230).

Nesse contexto incerto e angustiante para os indivíduos, ganhou espaço a literatura de autoajuda. Para Ruggiero (1999), esse gênero divide-se em três tipos de texto. Embora baseados nos mesmos princípios – a mobilização de recursos internos – tais tipos de livros veiculam propostas distintas. Desse modo, há aqueles que ensinam a desenvolver capacidades objetivas do indivíduo, os que se propõem a desenvolver capacidades subjetivas, ampliando o autoconhecimento, e, por último, aqueles que visam desenvolver capacidades extrassensoriais do indivíduo, conduzindo-o a experiências espirituais ou místicas. Conforme a mesma autora, a ideologia liberal amplia os horizontes da literatura de autoajuda, visto que deposita na autonomia do sujeito a responsabilidade pelo próprio destino, supondo que todos os indivíduos são iguais e têm os mesmos direitos.

As Ciências Sociais já demonstram que o excesso de individualismo do sujeito moderno tende a transformá-lo em alguém permanentemente insatisfeito consigo próprio e, ao mesmo tempo, com dificuldades para reconhecer o outro. Nesse sentido, o sujeito empobrece, reduzido a seu mundo autocentrado; afinal, sem aceitação das diferenças, não há troca possível. Como expõe Bessa (2010): “O discurso que sustenta esse mercado responde à indústria da cultura que defende o consumismo e a aquisição de bens como resposta à sensação de inadequação” (BESSA, 2010, p. 34).

A mesma autora sustenta que a literatura de autoajuda, ao fazer a apologia de um sujeito sobre-humano, tenta construir um protótipo de sujeito cada vez mais semelhante a outros e cada vez menos interessado no outro. Tal posicionamento ocorre em virtude de tal literatura fortalecer nos leitores a pressuposição de que podem e devem ser felizes mediante a aquisição de bens de consumo, fornecendo- lhes orientações a respeito de como proceder.

Diante de uma “vida líquida”, no dizer de Bauman, “uma vida precária, vivida em condições de incerteza constante” (BAUMAN, 2007, p. 08), encontrar modelos para fixar parâmetros parece uma boa saída.

Nesse contexto, ao apresentar a proposta de viver os “avessos” da vida, Fábio de Melo contribui para a fixação de parâmetros para seus fiéis, bem como para a progressiva incorporação de distintos comportamentos, novas ações sociais estruturadas, e, como já comentado, novos habitus. No entanto, tal proposta não se baseia em superações milagrosas, mas na aceitação e vivência de tudo que compõe a vida. Além disso, para Melo, assumir a postura de viver os “avessos” com confiança em Deus é característica que distingue o que ele considera um verdadeiro cristão dos demais, como demonstra a letra de uma das músicas por ele interpretada:

“Viver pra mim é Cristo, morrer pra mim é ganho. Não há outra questão, quando se é cristão não se para de lutar. Triunfarei sobre o mar, conquistarei troféus, não há outra questão, quando se é cristão não se para de lutar, até chegar aos céus” (“Viver pra mim é Cristo” – Anderson Freire).

Observa-se que, assim como a literatura de autoajuda remete o leitor à ideia de conquistas e vitórias sobre os problemas, a obra de Fábio de Melo também apresenta tal perspectiva, de forma que os fiéis tendem a “comprar” essa ideia ao se tornarem fãs seguidores de suas propostas. Não se trata aqui de um consumo de bens concretos, mas sim, de um novo estilo de vida, mais reconfortante e com parâmetros que ajudam os fiéis a se situarem no mundo. Constatou-se que o diferencial do projeto de Fábio de Melo em relação à tendência dos livros de autoajuda e até mesmo das principais lideranças do movimento carismático – como padre Marcelo Rossi – está em que tais propostas de superação não estão vinculadas às soluções milagrosas e imediatas, contudo, sugerem a vivência simples do cotidiano de um “verdadeiro cristão”, aqui remetido aos moldes do catolicismo devocional.

Dessa forma, nota-se que o catolicismo tem vivido uma série de transformações, passando pela experiência do movimento carismático, do investimento nas mídias e de uma constante disputa simbólica tanto interna quanto externa. Fábio de Melo simboliza uma nova transformação e, por que não, uma

reprogramação da conduta de setores da Igreja Católica diante da tentativa de fixar um campo sólido e de reconstruir o habitus nos fiéis.

CONSIDERAÇÕES FINAIS ____________________________

Esta dissertação teve como meta contribuir com o pensamento acadêmico a respeito do papel da instituição católica e, mais do que isso, da religião como campo de relevância central nos estudos e reflexões sobre a sociedade contemporânea.

Em contextos de uma modernidade complexa e instável, muitas são as respostas societárias aos processos de transformações sociais. Espaço e tempo são separados, razão pela qual vivemos em uma sociedade fragmentada. Como lembra Bauman (1999), a existência moderna trava uma luta da determinação contra a ambivalência, esforçando-se para definir com precisão e suprimir ou eliminar tudo o que não poderia ser ou não fosse precisamente definido. No entanto, segundo o mesmo autor, ao mesmo tempo em que a modernidade é marcada por essa tentativa de produção da ordem, ela sofre com a constante ruptura de fronteiras das relações sociais.

Os padrões e regras de outrora, moldes que auxiliavam os indivíduos nas diretrizes das ações, são constantemente quebrados, faltando, cada vez mais, padrões e regras para conformação dos sujeitos sociais. Não se trata do ganho de espaço para construções pessoais livres, mas sim, do confronto de padrões e instituições, bem como de um aumento da responsabilidade dos indivíduos sobre seu próprio fracasso ou vitória. Apoiando-se em Balandier (1997), que afirma serem