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valorizada e trabalhada paralelamente à escrita.

2.2 PRODUÇÃO DE TEXTOS ESCRITOS: UM BREVE HISTÓRICO DE SEU ENSINO

Se comparada à oralidade, a escrita é um modo recente do qual o ser humano dispõe para suas relações e interações verbais no mundo no qual está imerso, se caracterizando como um acontecimento histórico e datado. Segundo Marcuschi (2001), a entrada da escrita no Ocidente se deu por volta de 600 A.C., chegando atualmente há pouco mais de 2.500 anos. Quanto à história de seu ensino, no Brasil, é extremamente recente e é sobre ele que passo a tratar, traçando alguns apontamentos, especialmente no que diz respeito à produção de textos escritos. Procedo assim por considerar, assim como Soares (2002), que a perspectiva histórica pode auxiliar a elucidar e explicar a configuração atual de uma disciplina curricular. No caso, configuração atual da LP.

Durante muito tempo, mais precisamente no período compreendido entre 1895 e 1969, esteve vigente nas escolas secundárias do Brasil (antigo ginásio e colegial) a chamada Antologia Nacional12. Segundo Fiorin, “a Anthologia destinava-

12 Segundo Razini (2000), trata-se de um livro contendo textos escolhidos para leitura (e para

exercícios), que foi aprovado pela Congregação do Colégio Pedro II para ser adotado nas aulas de Português. Ele é considerado uma das compilações literárias mais usadas pelos brasileiros que passaram pela escola secundária até 1969, quando a última edição foi publicada. Quanto ao Colégio Pedro II, conforme Soares (2002), durante décadas, foi o modelo quanto ao que se ensinar em língua portuguesa: retórica, poética, essa última abrangendo a literatura e a gramática nacional, inserida no currículo do Colégio um ano após a sua criação.

se a ensinar a língua e a formar moralmente os jovens” (FIORIN, 1999, p. 152). Quanto à concepção de ensino-aprendizagem de língua implícita nesse material era a de que a aprendizagem se dá pela imitação dos bons autores: “As regras lingüísticas são os usos que eles consagraram. Ao mesmo tempo, aprende-se a articular o texto seguindo o exemplo desses autores. Lê-se para fazer composições que imitem os textos lidos” (FIORIN, 1999, p.154).

Portanto, em um período de 74 anos, no pouco espaço que se destinou à tarefa de escrever textos, em escolas brasileiras, os alunos faziam a composição, que significava escrever tendo como base os textos modelos que eram apresentados, ou seja, compor um texto se limitava “a imitar, a partir de um fragmento, os mais belos trechos das obras primas nacionais que eram apresentados aos educandos como modelos” (MORETTO, 2014, p. 89).

Conforme análise da Antologia feita por Razini (2000), tanto “na "composição oral" quanto na "composição escrita", os alunos aprendiam primeiro a descrever, depois a narrar e, por último, a dissertar” (RAZINI, 2000, p. 98, aspas no original). Nesse período, ainda segundo constatação dessa estudiosa, uma das maiores novidades percebidas no ensino de português se deu após 1961: a “permissão e até estímulo da "liberdade de expressão individual" nos exercícios escritos de redação” (RAZINI, 2000, p.179) e, embora modelos continuassem a ser ofertados, a escola passou a reconhecer “a criatividade do aluno no ensino de redação, a qual seria, cada vez mais, incentivada e exigida nas décadas seguintes” (RAZINI, 2000, p.179, aspas no original).

Prado (1999) é outro pesquisador que faz importante levantamento sobre as propostas curriculares oficiais na área de ensino de LP, levantando, em documentos produzidos entre os anos 1930 e 1990, as orientações relativas aos objetivos, aos conteúdos, à concepção de linguagem e às atividades que fundamentam tais propostas. Com relação aos documentos das décadas de 30 a 60, a concepção de escrita que esse pesquisador encontra está muito associada à expressão do pensamento e, ao ser assim tratada, “o conjunto de atividades [...] parece privilegiar um determinado modo de expressão do pensamento, que geralmente está associado à cópia de modelos” (PRADO, 1999, p. 60).

O autor aponta também que, ao ser enfatizada a escrita via modelo, está pressuposta a existência de uma escrita dada, que precisa ser atingida e, nesse

caso, é um só modelo de língua e de uso da linguagem que está sendo privilegiado. Essas constatações o levam a entender que “a escrita nos documentos é vista como um trabalho de atingir padrões de escrita propostos pela escola, padrões estes associados à literatura canônica deste período, que acaba servindo de modelo de escrita para os alunos” (PRADO, 1999, p. 60).

De acordo com Bunzen (2005), foi somente a partir dos anos 70 que começaram a ser discutidas questões metodológicas e técnicas de ensino de redação, assim como questões referentes aos modos e critérios de avaliação. Cabe lembrar que, em 1971, foram aprovadas novas Diretrizes e Bases da Educação Nacional (a Lei 5692/71), com reorganização das séries e reorganização curricular; após essa lei, conforme Razini (2000), no ensino de português passou a haver a aceitação de maior quantidade e variedade textual para leitura, que incluíam, além dos tradicionais excertos literários, consideravelmente ampliados com a literatura contemporânea, textos das outras disciplinas do currículo (sociais, científicos), textos de jornais, revistas, quadrinhos, propaganda etc..

Ainda de acordo com Bunzen (2005) outro motivo pelo qual se começa a enfatizar o ensino da redação, que não estava em primeiro plano, vincula-se ao preparo dos alunos para o concurso do vestibular. O autor explica que, a partir de janeiro de 1978, com o Decreto Federal Nº 79.298, de 24 de fevereiro de 1977, passou a ser obrigatória no vestibular a prova de redação em LP e, inclusive, nessa época, introduz-se uma disciplina “nova” na grade curricular do Ensino Médio (com denominações variadas, entre elas Técnicas de Redação), com o intento de prepará-los para o concurso que se torna obrigatório.

Cabe destacar também que, com base nas redações dos vestibulandos, começaram a surgir inúmeros estudos no final da década de 1970 e início dos anos 1980 que traziam um diagnóstico da produção escrita dos alunos concluintes do Ensino Médio. Dentre esses estudos se destaca o estudo de Pécora, Problemas de

Redação na Universidade (1980), que três anos depois tornou-se o livro intitulado Problemas de Redação. Ao discorrer sobre os problemas encontrados nos textos

analisados, esse pesquisador revela que a problemática não se encontrava em uma possível falha linguística dos alunos, mas muito mais nas condições de produção e de ensino-aprendizagem dessa modalidade de linguagem, que é essencialmente escolar.

Segundo ele, se tratava de um fracasso nutrido “a fermento pela concepção de língua que condiciona todo o ensino oficial do português e que ao desconhecer a complexidade vital de seus usos, torna-se incapaz de garantir o aprendizado adequado de um só deles” (PÉCORA, 1999, p. 45). Conforme lembrança de Rodrigues (2008), embora esse seja um trabalho que analisa as produções de textos dos alunos sob os aspectos de conteúdo e de forma, é importantíssimo e cumpre o seu objetivo no sentido de apontar os problemas nessas produções, para se pensar em possíveis alternativas para saná-los.

Segundo Bunzen (2011), a transição dos anos 70 para os anos 80 foi marcada por inúmeras denúncias contra o ensino de Português das escolas públicas de nosso país; se nessas instituições o objetivo de ensinar a ler e a escrever não estava sendo atingido, havia uma crise nesse ensino. Sobre essa problemática, a opinião de Geraldi (1996), é a de que “o ensino tradicional de LP investiu, erroneamente, no conhecimento da descrição da língua, supondo que a partir desse conhecimento cada um de nós melhoria seu desempenho no uso da língua” (GERALDI, 1996, p. 71).

Também Pietri (2003), em sua tese de doutoramento, explicita que em fins dos anos 70, se constitui, no território brasileiro, um discurso de mudança nas concepções de linguagem e de ensino de língua materna, respaldado pela divulgação de teorias linguísticas, sociológicas e/ou sociolinguísticas. Esse discurso, segundo ele, se inicia afirmando a necessidade de:

i.considerar a diferença entre a língua da escola e a língua das camadas populares que começavam a chegar à escola; ii. considerar a realidade da variação lingüística e respeitar a variedade do aluno; iii. relacionar ensino de linguagem e condições socioeconômicas com o objetivo de produzir práticas pedagógicas democráticas e transformadoras; iv. divulgar informações produzidas pela Lingüística e outras ciências, a fim de alterar as práticas pedagógicas existentes. (PIETRI, 2003, p.7)

Desse modo, uma série de inovações e de discursos em prol do ensino da linguagem na escola, que, na opinião de Faraco e Castro (1999), foram originais e críticos, deu um novo tom às discussões referentes a esse ensino quando foram apontadas “as fragilidades encontradas no ensino tradicional ao lidar com as diferenças culturais e linguísticas dos novos alunos que se integraram à escola

pública brasileira” (FARACO; CASTRO, 1999, p.109). E são algumas dessas discussões trazidas por estudiosos da área de linguagem, pertinentes para o ensino