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CAPÍTULO I – CONCEITOS JURÍDICOS BÁSICOS

1.4. PRODUTO

1.4.1. Produto como objeto das relações de consumo

Produto é toda coisa ou utilidade que se extraiu de outra coisa ou que dela se obteve; é o resultado obtido da ação de produzir. E quando tais produtos forem trazidos ao comércio, para que se permutem ou se troquem, a fim de que sejam utilizados ou consumidos, dizem-se produtos econômicos. 124

João Marcelo de Araújo Júnior, citado por Antônio Carlos Efing, diz que no CDC, a palavra produto tem um sentido econômico, como fruto da produção.125

Já no âmbito do Direito Civil, segundo Maria Helena Diniz126, “os produtos são utilidades que podem se retirar da coisa, alterando a sua substância, com a diminuição da quantidade até o esgotamento, porque não se reproduzem periodicamente”. Diferenciam-se dos frutos, que vale ressaltar, também são categorias de bens acessórios (art. 95 do CC), porque “as frutas são as utilidades que a coisa produz periodicamente, cuja percepção mantém intacta a substância do bem que as gera”. 127

Desse modo, verifica-se que o conceito de frutos engloba tanto as utilidades naturais, quanto aquelas que são produzidas pela ação do homem, pela transformação e pelo trabalho. Subdivide-se em naturais (quando é proveniente da natureza) e industriais (quando resultante da ação do homem ou de seu trabalho).

124 SANTANA, Hector V. Prescrição e Decadência nas Relações de Consumo. Biblioteca de Direito do Consumidor, v. 22. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 69.

125 EFING, Antônio Carlos. Contratos e Procedimentos Bancários à Luz do CDC. 1º Edição, 3ª Tiragem. Biblioteca de Direito do Consumidor, v. 12. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 66.

126

DINIZ. Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, Teoria Geral do Direito Civil. 20ªEdição Revista e Ampliada. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p. 296.

No que tange a relação de consumo, a Lei 8.078, de 11/09/1990, define produto em seu artigo 3º, parágrafo 1º, dispondo o seguinte:

Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

Vê-se, portanto, que o conceito acima exposto é muito amplo, pois “bens móvel ou imóvel, materiais e imateriais” são, na verdade, as duas grandes classificações de bens. Sendo assim, produto, na concepção do CDC, seria qualquer bem objeto da relação de consumo.128

De acordo com o conceito de produto econômico já visto, parece-nos que foi este o sentido que o legislador quis imprimir ao conceito legal de produto. Considerando-se que, para que haja uma relação de consumo, é necessário, antes de tudo, que haja o consumo do bem, não se incluindo a utilização de um bem produzido pela própria pessoa que o utiliza. É necessário que o bem seja inserido em um processo de circulação.

Além do mais, a definição de produto econômico traz, ainda, um elemento importante que é a introdução do bem no comércio, para que seja utilizado ou consumido.

Todavia, não podemos levar em conta, unicamente, a presença do produto na atividade de comercialização, pois o comércio é apenas um segmento do processo de circulação e o que amplia o seu raio de alcance é justamente o conceito de fornecedor constante do caput do artigo 3° (produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços). O que dá maior amplitude ainda à noção de

128 SANTANA, Hector V. Prescrição e Decadência nas Relações de Consumo. Biblioteca de Direito do Consumidor, v. 22. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 68.

produto é a sua definição como "qualquer bem".129 E este possui um significado muito mais abrangente, como veremos a seguir.

O conceito de "produto" é criticado por alguns autores. José Geraldo Brito Filomeno130 entende que melhor seria falar em bem e não em produto, pois o primeiro é muito mais abrangente e técnico do que o segundo, tanto do ponto de vista jurídico, como do ponto de vista da economia política.

Observa Washington Peluso Albino de Souza131que o legislador repetiu o conceito econômico, faltando observar a capacidade do bem em satisfazer a necessidade do consumidor, isto porque há bens que escapam da amplitude do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Questiona ele o tratamento dado ao empréstimo em dinheiro e aos juros considerados como serviço e não como produto do capital.

Luiz Gastão Paes de Barros Leães132 coloca que qualquer bem pode ser considerado como produto para os efeitos da proteção da lei, desde que resulte de uma atividade empresarial de transformação econômica e que seja produzido em série. Com isto, ficam excluídos os produtos agropecuários brutos. A Lei 8.078, de 11/09/1990, os inclui, excepcionalmente, no artigo 18, parágrafo 5°, quando se refere aos produtos in natura.

Toshio Mukail133 crítica a definição de produto, que ao seu entender, apesar de ampla, não inclui os produtos incorporados a outro produto ou a um imóvel.

129 SANTANA, Hector V. Prescrição e Decadência nas Relações de Consumo. Biblioteca de Direito do Consumidor, v. 22. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 68.

130FILOMENO, Geraldo B. Manual de Direitos do Consumidor. 7ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2003, p. 57. 131

SOUZA, Washington P.A. de. Primeiras Linhas de Direito Econômico. 3 ed. São Paulo: Editora Ltr, 1994, p. 472

132 LEÃES, Luiz G.P. de B. As Relações de Consumo e o Crédito ao Consumidor. In: Lei de Defesa do

Consumidor. Caderno IBCB 22, Coordenação Geraldo Vidigal, São Paulo, IBCB, 1991, p. 63.

133MUKAI, Toshio. Comentários ao Código de Proteção ao Consumidor. Coordenação de Juarez de Oliveira, São Paulo: Saraiva, 1991, p. 9.

1.4.2. Produtos bancários: dinheiro, crédito e poupança.

Muito se questiona sobre a qualidade do dinheiro, do crédito e da poupança como bem de consumo, sujeito às normas do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Esses questionamentos merecem ser analisados, para que possamos chegar a uma conclusão mais concreta sobre o seu enquadramento.

Segundo Geraldo de Camargo Vidigal 134, não estão incluídos na definição do §1°, para os fins do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, máquinas, equipamentos, mobiliário, veículos e moedas, mesmo sendo bens móveis materiais, como também as instalações e edificações industriais, assim como bens imóveis materiais e, ainda, como bem móvel imaterial, o crédito.

Arnoldo Wald135 nega-os também como bem de consumo e, portanto, como produto para os fins da lei especial, afirmando que não se incluem nos bens especificados no art. 3° nem o dinheiro, nem o crédito. A moeda é sujeita ao repasse para terceiros, por isso é circulante, e, assim, só seria bem de consumo no contexto analisado, se o destinatário final fosse um colecionador de moedas.

Adalberto Pasqualotto expõe que:

O dinheiro, em si mesmo, não é objeto de consumo, mas, ao funcionar como elemento de troca, adquire a natureza de bem de consumo. As operações de crédito ao consumidor são classificadas como negócio de consumo por conexão, quando ocorre deferimento da prestação monetária, como é próprio dos cartões de crédito, dos cheques-presente etc.136

134

VIDIGAL, Geraldo. A Lei de Defesa do Consumidor – sua abrangência. Parecer publicado no Cadernos IBCB 22.

135 WALD, Arnoldo. O Direito do Consumidor e suas Repercussões em Relação às Instituições Financeiras. In:

Revista dos Tribunais, São Paulo, nº 666, abril de 1991, p.15.

136 PASQUALOTTO, Adalberto. Defesa do Consumidor. In: Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, nº 666, abril de 1991. p. 42.

Pedro Paulo Cristofaro considera que a conta corrente, o empréstimo e a cobrança de título enquadram-se no conceito de serviço bancário, mas o investimento e a poupança não são nem produto nem serviço. "O correntista do banco, o tomador de empréstimo, o segurado não são investidores e, por isso, certamente, foram incluídos pelo Código de Defesa do Consumidor dentro da categoria por ele tutelada, a dos consumidores."137

Contrário a esta posição, é o argumento sustentado pelo Professor Newton de Lucca138que relembra, com base no artigo 86 do Código Civil Brasileiro, ser o dinheiro um bem juridicamente consumível e afirma que "o banco é fornecedor de produtos (dinheiro)."

As operações bancárias são “a série de atos realizados pelo banco para a consecução de sua finalidade econômica”139. As operações de bancos são formadas em negócios, cujo objetivo é o lucro. “Inserem-se, pois, as operações bancárias na atividade empresária, como sendo aquela economicamente organizada para a prestação de serviços, alume do art. 966, do Código Civil vigente”.140

Dentro da moderna concepção do Direito Comercial, tendo por base a teoria da empresa, os bancos são empresas, ou melhor, organizações harmônicas de capital e trabalho para o exercício de uma atividade econômica de produção ou de troca de bens ou serviços, e não mero estabelecimento, que se traduz no complexo de bens, materiais e imateriais, de que dispõe o empresário para o exercício de sua atividade.141

137 CRISTOFARO, Pedro P. Limites do Campo de Incidência da Lei 8.078, de 11.9.90 – O Código de Defesa do Consumidor e os Investidores ou Poupadores. In: RDMIEF-92. São Paulo: 32 (92), 1993, p. 91.

138 LUCCA, Newton, de. Direito do Consumidor - Aspectos Práticos - Perguntas e Respostas. Biblioteca de Direito do Consumidor – 10. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. p. 160.

139 ABRÃO, Nelson. Direito Bancário. 9º Edição Rev. Atual e Ampliada. São Paulo: Editora Saraiva, 2005, p.51.

140

Ibidem, p. 51.

141 ABRÃO, Nelson. Direito Bancário. 9º Edição Rev. Atual e Ampliada. São Paulo: Editora Saraiva, 2005, pp. 20 e 21.

Assim, concluímos, à primeira vista, que o bem, objeto de comercialização dos bancos, é a moeda e o crédito. A moeda é bem móvel e consumível142. Washington de Barros Monteiro143, ao classificar a consuntibilidade do bem, de fato e de direito, destaca o dinheiro como exemplo de consuntibilidade de direito. O crédito, por sua vez, é bem móvel imaterial. Seguindo este raciocínio, tanto o dinheiro, como o crédito, podem ser objeto de relação de consumo, desde que não sejam utilizados como ingrediente do processo produtivo.

Vê-se, portanto, que a conceituação de produto é mais uma evidência da existência de uma relação de consumo entre os bancos/fornecedores e os clientes/consumidores.