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2.2 Estratégias de desenvolvimento do turismo

2.2.1 Produtos turísticos

Segundo Jenkins (1991), o desenvolvimento do turismo contaria com determinantes que lhe seriam francamente favoráveis, pois dificilmente encontrar-se-ia um uso econômico alternativo para o conjunto de elementos como praias, clima e paisagens, ou ainda para os atrativos de ordem étnica e cultural. Na curiosa visão do autor, esta singularidade representaria um custo de oportunidade baixo, ou mesmo nulo, dos atributos naturais e culturais de um local com vocação para ser uma destinação turística.20

Notadamente, as investigações sobre a trajetória de crescimento do turismo nas últimas décadas reconhecem ser os atributos naturais fatores decisivos para explicar o aparecimento do turismo de massa. A literatura que trata do tema acentua o peso dos elementos sol, areia e mar, na consolidação de grandes destinos turísticos do mediterrâneo, incluindo as costas litorâneas da Espanha, França, Itália, Grécia e Turquia. Estes atrativos, que foram designados como produto 3S´s21, eram os mais procurados durante as

férias de verão. Mas, países com regiões montanhosas e de clima frio, como a Áustria e Suíça aproveitaram-se também de suas condições ambientais para especializarem-se no chamado produto “ neve e esqui”.

A América Latina e Caribe seguiram o mesmo caminho, possivelmente em decorrência da tentativa de inserção de seus destinos turísticos no mercado internacional. Para Schluter (1998), o que ocorreu nessas partes do continente americano foi a adaptação de seus padrões de oferta turística aos gostos e hábitos prevalecentes externamente, pois o México e os países do Caribe erigiram seus empreendimentos em torno do produto “sol, areia e mar”, tão ao gosto dos turistas procedentes dos países desenvolvidos. Outros, na falta desses produtos, como a Argentina e o Chile, buscaram basear suas ofertas turísticas nos produtos “ neve e esqui.”

É certo que o modelo de desenvolvimento turístico baseado no chamado produto “sol, areia e mar” vem sendo alvo de críticas nos últimos anos, em vários países. Dentre os argumentos arrolados que servem à sua contestação encontram-se: i) o baixo volume de gastos efetuados no local por seu turista típico; ii) o afastamento de visitantes com maior poder aquisitivo que esta especialização enseja; e iii) o risco de saturação

19 Os produtos turísticos considerados estão baseados em definições de atrações que servem para caracterizar

o tipo de turismo que despontará nas destinações turísticas.

20 Todavia, Jenkins (1991) reconhece que os custos de construção da infra-estrutura necessária e das

instalações de empreendimento turísticos tenderiam a compensar as vantagens iniciais oferecidas pela natureza.

de mercado, de envelhecimento precoce, com ameaça à sobrevivência de tais destinos turísticos.22

Certas destinações famosas podem ser citadas como exemplo desse processo de decadência, dentre as quais encontram-se algumas estâncias balneárias da costa espanhola, em Maiorca, e do Reino Unido, em Brighton e Bournemouth. As políticas de recuperação da imagem destes locais geralmente incluem propostas de aberturas de novos mercados com o sentido de atrair turistas com maior nível de renda e que, portanto, escapem ao perfil tradicional dos compradores de pacotes turísticos que gastam pouco em tais destinos.23

Todavia, outros questionamentos menos afeitos às motivações da lógica mercantil podem ser citados como crítica ao produto 3S´s. Bauer (1993:203) menciona a tentativa de entidades francesas firmarem, ainda nos anos sessenta, uma estratégia de desenvolvimento do turismo baseado no chamado modelo 3D (Developpement, Délassement, Divertissement), de cunho educativo e cultural, em oposição ao modelo de 3S’s.24

Por outro lado, a degradação ambiental deixada no rastro daqueles modelos de crescimento turístico25 e a

pressão de movimentos ecológicos impuseram a conveniência de países, localidades e empresas considerarem uma nova estratégia de ação, marcada pela busca do desenvolvimento sustentável26. Esta orientação defendia

que o turismo sustentável, ou durável, introduzisse plenamente a questão do resguardo do meio ambiente, e ainda, incorporasse outras dimensões: estendendo sua preocupação para os padrões sócio-econômicos das populações locais e à satisfação do turista. 27

Paralelamente, na Europa, nos anos oitenta, definiam-se estratégias de desenvolvimento turístico, sobretudo nos países com forte tradição neste setor, amparadas em uma visão sistêmica de todos atributos locais. Na visão de Silveira (1997), esta trajetória culminou com a criação do ‘Plan de Medidas Comunitárias a favor del Turismo’, da Comunidade Européia, em 1991. Mas, foi em 1995, através do chamado ‘Livro Verde da Comissão’ que foi alçada a proposta de uma política de turismo sustentável para a União Européia. Desde então, a estruturação de formas alternativas de turismo - como turismo natural, ecoturismo, turismo

22 Como ocorre com qualquer produto industrial, os atrativos turísticos- físicos, ambientais e culturais -,

responsáveis pela inserção do destino nos grandes circuitos de comercialização das operadoras, podem envelhecer e acarretar perda da capacidade competitiva deste espaço: estes produtos têm ciclo de vida.

23 Swarbrooke (2000a).

24 Pode-se identificar no que hoje é conhecido como turismo cultural alguns elementos que apenas

remotamente se aproximariam desta perspectiva.

25 Esta observação se aplica igualmente ao modelo “neve e esqui”.

26 Para Sachs apud Silveira (1997), o turismo sustentável está fundado em cinco princípios: sustentabilidade

ecológica; sustentabilidade social; sustentabilidade cultural; sustentabilidade econômica; e sustentabilidade espacial. Esta noção é fruto de discussões iniciadas na Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada em Estocolmo, em 1972. No ano de 1987, seu conceito foi melhor definido no Relatório Brundtland, que entendia ser o desenvolvimento sustentável ‘um processo de transformação, no qual a exploração de recursos, a direção dos investimentos, a orientação da evolução tecnológica e a mudança institucional se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim de atender às necessidades e aspirações humanas’ (Ruschmann, 1999: 72). Mas, foi na Cnumad 92, no Rio de Janeiro, que este conceito passou a ser amplamente difundido (Silveira, 1997).

27 No marco destas questões, apareceram tentativas de estabelecer critérios de avaliação quanto ao limite da

capacidade de absorção de turistas por uma destinação, acima do qual é possível identificar a ocorrência do turismo predatório. Segundo Boo apud Ruschmann (1999), a capacidade de carga do recurso turístico pode ser definida pelo número máximo de visitantes em um dado período, que pode ser dia, mês, e ano, passível de ser recebido por uma certa área, sem que seu meio físico e sociocultural seja comprometido.

verde, turismo responsável, turismo rural, agroturismo -, passou a ser pensada como ‘formas de turismo que

em princípio respeitam as capacidades de absorção dos espaços de recepção, em termos naturais, culturais e sociais, promovem a conservação dos recursos locais físicos e humanos, incluindo os de interesse turísticos, diminuem custos e elevam benefícios e, não menos importante reduzem as saídas de divisas’

(Cavaco apud Silveira, 1997: 95).

Para Swarbrooke (2000a), a experiência da França na implantação de políticas de estímulo ao turismo rural - com obediência a certos requisitos próprios do turismo sustentável como: o cuidado em preservar o estilo arquitetônico das instalações originais da localidade, o respeito à tradição gastronômica, aliados à cobrança de preços que refletissem a simplicidade da hospedagem no campo - serviu de modelo para a busca do desenvolvimento rural por meio do turismo em outros países europeus. Neste sentido, a Espanha, Portugal, Polônia, Hungria e República Tcheca e a ilha de Chipre tomaram o mesmo caminho para amparar a criação deste novo produto turístico.

Nos últimos anos, teria alcançado relevância um novo tipo de produto turístico, o ecoturismo, que poderia ser vinculado ao modelo de turismo sustentável. A estruturação desta nova forma de turismo não ficou limitada à Comunidade Européia. Segundo Silveira (1997:95), a modalidade de ecoturismo estendeu-se para muitos países do continente americano, como Estados Unidos, Canadá, Costa Rica, Venezuela e Brasil, e ainda, da África e Ásia como Quênia, Zimbabwe, Tailândia, Filipinas, dentre outros.

As similitudes observadas entre os tipos de exploração do turismo rural e ecoturismo permitiram que se caracterizasse um novo produto turístico: o eco-rural. Esta modalidade é analisada por Rodrigues (2000:123): “(...) trata-se de uma forma alternativa ao turismo de massa e atende, por conseguinte, a nichos de demanda; propõe visitas de pequenos grupos dirigidos a áreas ‘naturais’ protegidas e a espaços ditos rurais, porque suas características fisionômicas e as atividades aí praticadas fogem aos padrões dos territórios urbanos; as empresas que comercializam essas formas alternativas de turismo negociam a imagem, como qualquer outra firma convencional, pois, tratando-se de um empreendimento comercial, o marketing é concebido para vender (...)”

Certamente, há aqui uma clara diferenciação dos produtos anteriores, e que perpassa não só por questões de ordem ética, que se estendem inclusive à visão da natureza a ser incorporada na modalidade eco-rural, mas da escala de operação e comercialização compatíveis com este produto. É notável que o termo turismo sustentável tenha sido identificado, no mais das vezes, com o ecoturismo e o turismo rural, o que sugere que o modelo que se estrutura a partir destes produtos comporta apenas a afluência de um pequeno número de turistas a uma destinação. Mas, entre os especialistas há controvérsia sobre a sustentabilidade estar necessariamente vinculada à condição da presença de um reduzido número de turistas em uma localidade28.

Neste caso, eles parecem estar considerando a possibilidade de ocorrência de turismo sustentável mesmo em áreas urbanas.

Por fim, cabe relacionar um outro tipo de produto turístico característico de áreas urbanas e que tem se revelado um nicho de mercado capaz de garantir a renovação de algumas cidades industriais em declínio: é o turismo de negócios que, segundo Lickorish & Jenkins (2000: 170), pode ser dividido em três grandes

segmentos: turismo associado a exposições, turismo de conferências, e turismo de incentivo.29

O turismo de negócios, nos segmentos de exposições e conferências, tem sido visto com muita atenção por políticas turísticas dos mais variados países e locais nos últimos anos. Não por acaso, algumas grandes cidades têm investido na construção de importantes centros de exposição e conferências, com o objetivo de firmar sua marca no mercado internacional, e assim atrair expositores e visitantes nacionais e estrangeiros para seus eventos.

Segundo Swarbrooke (2000a), esta parece ter sido a trajetória escolhida nas últimas duas décadas por algumas cidades tradicionais do mundo desenvolvido que perderam importância diante das mudanças ocorridas na base industrial, com graves conseqüências para seus níveis de emprego. Ele cita o exemplo de Birmingham, no Reino Unido, que teria apostado decisivamente nesta estratégia de revitalização nos últimos vinte anos, e conseguira superar Londres como “maior destinação de turismo de negócios no Reino Unido”. (Swarbrooke, 2000a: 44).

O turismo de negócios freqüentemente impõe mudanças nas condições da oferta turística da destinação, sobretudo, em decorrência de sua adaptação às exigências deste mercado. Este tipo de produto exige a incorporação de serviços e técnica de porte sofisticado, e a escala de operação dos empreendimentos turísticos tende a ser significativa. Por outro lado, o volume de gasto que o visitante costuma fazer na destinação é maior que no caso do turismo de massa litorâneo, do tipo sol, areia, mar. Em parte, isto ocorre porque, em geral, são as empresas que costumam pagar pela estada do visitante, deixando-lhe em maior condição de poder efetuar despesas com outros serviços no local.

Ademais, os tipos de recursos técnicos exigidos para atender as atividades empresariais costumam requerer uma gama de serviços complementares, induzindo os gastos em outros setores da economia. Mas, ao que tudo indica, sua maior vantagem econômica reside em assegurar a continuidade de demanda mesmo nos períodos de baixa estação, ao contrário dos outros modelos descritos que são suscetíveis à ocorrência das estações que lhe são propícias. Assim, o turismo de negócios apresenta maior flexibilidade em relação ao período em que pode ocorrer.