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Professora Daniela

No documento Casos de ensino e professoras iniciantes (páginas 110-112)

5 PROFESSORAS INICIANTES E PROCESSOS DE DESENVOLVIMENTO

5.1 A TRAJETÓRIA PROFISSIONAL DE STEFÂNIA, PROFESSORA DE

5.1.2 Professora Daniela

Assim como a professora Fabiana, Daniela também trabalha há cinco anos na mesma escola particular onde, quando ingressou, não lecionava, assumindo diversas outras funções, dentre as quais, recepcionista das crianças no portão de entrada da escola, ajudante de secretaria, recreacionista. Atuou também na biblioteca e no almoxarifado da instituição. Algumas vezes, substituía professores que faltavam. Em suas análises, toda essa experiência trouxe diversas aprendizagens fundamentais para sua carreira. Afirma: “[...] ganhei experiência profissional e experiência de vida, porque passei a lutar pelos meus interesses e não dar ouvidos a muita coisa que me falavam [...] não eram todos que se podia confiar”. Daniela destaca o ano de 2001 como o mais difícil da carreira. Nesse ano, ela foi “[...] literalmente colocada à prova [...]” diante da proposta da escola de que assumisse uma licença-gestante em uma primeira série do Ensino Fundamental. Trata-se de uma experiência que ilustra sua iniciação profissional e que mostra a determinação da professora iniciante.

O ano de 2001 foi o mais difícil pra mim em termos de resistência, pois literalmente fui colocada à prova. Iria substituir a professora da 1a. série no segundo semestre que estaria de licença gestante e a proposta da escola foi que eu ficaria desde o começo do ano na sala como ajudante para eu “pegar o jeito da coisa” – conforme disse a diretora, e também fazer um trabalho diversificado com uma criança portadora de Síndrome de Down que freqüentava a mesma sala. O primeiro semestre foi difícil porque era tudo novo para mim (até a coordenadora era nova na escola

e estávamos nos adaptando a ela), mas consegui levar numa boa porque tinha a ajuda da professora. O segundo semestre foi massacrante, sentia- me pressionada e avaliada o tempo inteiro. Isso fez com que minha auto-

estima ficasse lá embaixo e estava tendo quase a certeza de que eu era

incapaz de assumir essa classe. A coordenadora me indicava alguns

livros para ler, resumir e entregar a ela a resenha com prazo determinado; pedia para eu assistir filmes e fazer comparações por escrito entre os professores do próprio filme; pedia-me para ler e explicar nas supervisões as apostilas que me emprestava com prazo; entrava nas aulas e assistia mais ou menos uns vinte (20) minutos por dia; na supervisão só cobrava e nada que eu fazia estava bom para ela, querendo sempre mais e mais. Eu

estava quase desistindo porque não agüentava mais tanta pressão e cobrança, mas não podia desistir, pois estava trabalhando o dia todo para

poder pagar a minha Faculdade que estava terminando. Estava me vendo num beco sem saída, não saía de casa aos finais de semana para ficar adiantando as atividades e tarefas da semana seguinte. Meus pensamentos

sobre toda a profissão que eu idealizava estavam se transformando em sacrifícios. Saia de casa para trabalhar com uma tristeza no coração.

muito esforçada e batalhadora. Ao final de tudo isso veio a gratificação no final do ano. Soube que tinha uma chance de pegar uma classe na educação infantil no próximo ano. E realmente foi o que aconteceu! Eles me chamaram para dar a classe de Infantil III (pré-escola) de uma professora que estava saindo da escola. Topei mais esse desafio! Há dois

anos dou aula nessa classe e posso lhe dizer que as cobranças não cessaram. Agüentamos firmes e fortes porque sabemos que as exigências

de uma escola particular são diferentes de uma escola pública. (Daniela)

O depoimento explicita todas as dificuldades enfrentadas por Daniela em seu primeiro ano de docência, mostrando os sentimentos que experimentou ao enfrentar a situação criada pela coordenadora da escola. Ansiedade, fracasso, falta de confiança em si mesma, insegurança, insatisfação e persistência. A imagem ideal da profissão se transformando em sacrifício. Interessante notar, nesse depoimento, que a professora não chega a mencionar dificuldades para lecionar. Suas preocupações estavam voltadas às cobranças e avaliações da coordenadora. Dela dependia sua permanência no emprego. Nesse aspecto, Daniela sugere a “[...] diferença entre as duas realidades (da escola particular e pública)”. No ano seguinte, ela lecionou também em escolas municipais e, aparentemente, a experiência não teve esse caráter negativo. As maiores dificuldades que encontrou nesse sistema de ensino se referem à falta de materiais didáticos básicos, como folhas e lápis. Já em relação ao sistema particular, enumera diversas dificuldades enfrentadas como, por exemplo, o fato de não ter autonomia com sua classe, sendo constantemente vigiada pelos diretores e coordenadores, baixo salário, falta de reconhecimento profissional e burocratização excessiva. “Fichas, avaliações, relatórios para preenchimento mensal, quinzenal, semanal e até diário... e muitas vezes isso é superficial apenas para mostrar aos pais que a escola se preocupa com seus filhos. Como isso é exigência da ‘casa’, precisamos cumprir, mesmo achando um exagero” (Daniela).

Dedicação, responsabilidade, força de vontade, dinamismo, jogo de cintura são as palavras que traduzem os primeiros anos de Daniela como professora. Aparentemente, os desafios iniciais foram superados e os novos desafios que surgem diariamente são enfrentados. A partir do caso de ensino proposto, Daniela faz importantes análises de seu processo de aprendizagem da docência. Relembra momentos vividos na infância quando gostava de brincar de escolinha e resolveu ser professora nas aulas de catecismo. Destaca a importância do curso de formação inicial nesse processo, afirmando ter vivenciado ali aprendizagens “[...] tanto na teoria com as discussões e reflexões em sala de aula, quanto na prática com os estágios que fazíamos”. Nesse curso, confirmou seu desejo de ser

professora. Ao analisar seu processo de desenvolvimento profissional, Daniela também destaca a sala de aula em que leciona e os seus alunos como fontes de aprendizagem da profissão. Considera que, no trabalho diário com as crianças, resolvendo dúvidas e tomando decisões, está sempre se sujeitando a novas aprendizagens, mesmo que de maneira inconsciente. Acredita que cursos também são importantes para a aprendizagem do professor, desde que sejam adaptados à realidade da escola em que se trabalha. Afirma ser a escola “[...] o espaço principal para a formação do professor. É nela que as discussões sobre a própria realidade aparecem e são refletidas para que haja mudança de comportamentos e atitudes”.

Assume possuir defasagens nas áreas de Matemática e Expressão Corporal. Responsabiliza seus professores por não gostar destas disciplinas e por não ter se aprofundado nelas em seu tempo de estudante. Para diminuir essas defasagens, diz ter freqüentado cursos, grupos de estudo e realizado pesquisas. Ao tratar dos conhecimentos necessários ao seu trabalho como professora, destaca a importância, na atuação em Educação Infantil, de saberes relacionados à alfabetização, às formas como a criança pensa, quais são suas habilidades, suas dificuldades e como avaliá-las. Aponta Emília Ferreiro, Ana Teberosky, Paulo Freire, Philippe Perrenoud e Celso Antunes como autores que tem lido e com os quais tem aprendido.

No documento Casos de ensino e professoras iniciantes (páginas 110-112)