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Professores de história: um certo coro minoritário de descontentes

2 A EDUCAÇÃO DE ADULTOS: BREVE HISTÓRICO DE SUA

2.5 Dos meados dos anos 80 ao tempo presente: propostas do ensino de História para a

2.5.3 Professores de história: um certo coro minoritário de descontentes

Como se viu acima, os finais dos anos 70 e início dos 80 foram marcados por lutas sociais, políticas, culturais e ideológicas, que tiveram a sua feição mais radical somente depois do fim da ditadura militar, com a eleição indireta de Tancredo Neves, em 1984.

A partir das greves dos metalúrgicos do ABC paulista, várias categorias profissionais, espalhadas pelo Brasil, desencadearam movimentos grevistas. Dentre eles, os profissionais da educação, que, desde 1978, haviam assumido o espaço público das ruas através do novo sindicalismo. Descobriram-se componentes das classes trabalhadoras, de carteira assinada, e desvencilharam-se das vestes do magistério como sacerdócio.

Natural e simultaneamente à descoberta de se assumirem como classe trabalhadora, grupos minoritários de professores, dentre eles os de História, se viram às voltas não somente com as lutas corporativas

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Consultar, além de Caminhos da História ensinada, de Selva Fonseca Guimarães, da mesma autora, Didática e prática de ensino de História. São Paulo: Papirus, 2003, e, em especial, Abordagens historiográficas recorrentes no ensino fundamental e médio. São Paulo: Papirus, 2003. p.39-48.

(salário/condições de trabalho), mas, também, descobriram a dimensão política da prática pedagógica, em sala de aula.

Existem várias dissertações de mestrado produzidas nos cursos de pós-graduação no País, incluindo os de faculdades de educação, que apontam, nesse contexto, um descontentamento por parte de parcelas de professores de História em relação às suas práticas de ensino dos conteúdos históricos transmitidos, críticas aos livros didáticos e aos conteúdos veiculados, a proletarização da categoria, com a desqualificação do papel social dos professores, conteúdos inadequados dos currículos tradicionais oficiais, etc. Essas pesquisas evidenciam uma série de renovações ocorridas no ensino de História.19

Para sair da passividade e operacionalizar mudanças, ou seja, a busca de alternativas, segmentos dos profissionais de História adotaram, em suas salas de aula, a “teoria das brechas”, ou as práticas “heréticas”. Isso demonstra a não-passividade de certos profissionais de História, que questionavam os conteúdos dos livros didáticos e faziam uso de outras fontes para desenvolver reflexões históricas, críticas à metodologia tecnicista, verborrágica e à lógica da transmissão, adotando o trabalho pedagógico de assumir o aluno como sujeito da aprendizagem e portador de experiências sociais; críticas ao enfoque histórico tradicional ao adotar a visão plural de história, a história como portadora de múltiplas possibilidades.

Todo esse processo de crítica e proposta de alternativas visava a mudar o trabalho rotineiro; repensar os conteúdos há anos repetidos; rever a concepção de história e a maneira de ver o mundo; abandonar a linearidade dos fatos, a “lógica” que sistematizou os fatos históricos e buscar a apreensão de outras realidades, no tempo e no espaço. Enfim, outros modos de abordagem foram sendo introduzidos — leitura e análise de documentos, pesquisa de campo, adoção de novas linguagens (fotos, revistas, jornais, filmes, vídeos, música, poesia); adoção de outros procedimentos teórico-metodológicos e a incorporação das experiências dos alunos nas reflexões históricas em sala de aula, etc.

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Em Minas Gerais, por exemplo, a partir de 2000, o Programa de Pós-Graduação em Educação da UFMG: Conhecimento e inclusão social, em sua linha de pesquisa Espaços educativos, produção e apropriação de conhecimentos, assume a “investigação dos espaços educativos e da produção e socialização de conhecimentos, saberes e práticas pedagógicas”, no caso, no ensino de História, sob a orientação da professora Drª Lana Mara de Castro Siman; várias dissertações foram produzidas, a saber: COELHO, Araci Rodrigues. Escolarização do tempo histórico pelos livros didáticos de História para crianças: uma análise dos livros didáticos de História (1° a 4° anos) do PNLD 2000/2001. 2002. 226f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2002; DUTRA, Soraia de Freitas. As crianças e o desenvolvimento da temporalidade histórica. 2003. 245f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2003.

É importante refletir sobre os possíveis significados históricos de todas aquelas lutas sociais, políticas, culturais e ideológicas, nas quais estiveram envolvidas as classes trabalhadoras brasileiras, dentre elas o professorado. Ao que tudo indica, duas influências podem ter produzido nos professores de História parâmetros para as suas experiências alternativas no ensino de sua disciplina em sala de aula.

Uma, de natureza mais ampla, diz respeito à prática social, voltada para a luta contra a ditadura. Trata-se de uma espécie de conhecimento social, relacionado ao envolvimento do indivíduo professor nos movimentos sociais. Portanto, relacionado às circunstâncias sociais vividas, experienciadas e elaboradas em suas consciências. Professores, inseridos na prática social dos movimentos, vivenciam um processo de assimilação da realidade social que buscam transformar e, assim, interpretam a sua ação e a de seus pares como prática sócio- histórica. Ampliam a sua consciência social pela articulação de sua vontade individual de enfrentar o instituído, pela sua percepção crítica do social, e enunciam a sua própria historicidade, a partir da realidade sócio-histórica que experimentam e expressam pela linguagem, sob a forma de discurso pedagógico.

Uma outra, vem de um lugar específico, de uma instituição, a universidade. De um determinado segmento dessa instituição, de um certo campo do saber, a História, através de parcelas de professores, historiadores de ofício que redescobrem a existência de movimentos sociais, reais, inexplicáveis em seu retorno ao espaço público, devido ao forte controle repressivo, e que despontam como novidade no cenário. Os esquemas explicativos já não conseguem dar conta do “novo”. Novas lentes, novas abordagens, novas obras em circulação.

Toda essa reflexão historiográfica crítica, produzida na academia e, fragmentariamente, em circulação no campo da formação de professores, chega, de uma forma ou de outra, às mãos de professores de História, minorias militantes, ávidas pelo fazer história. Pode-se supor que esses professores leram, absorveram ensinamentos e os transpuseram, didática e metodologicamente, para as suas aulas. Estão dadas as condições de produção do discurso pedagógico dos professores de História, que podem estar presentes também nos discursos dos sujeitos desta pesquisa. Esta pesquisa pretendeu desvendar o que dizem as representações sociais construídas pelos alunos adultos, enunciadas em seus discursos, no que se refere às relações entre suas histórias vividas socialmente e as histórias que lhes foram ensinadas em suas trajetórias escolares, em especial, no momento em que a pesquisa se realizou.

2.6 A proposta curricular de História para a Educação de Jovens e Adultos: prescrição e