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3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.4 PROGRAMA DE COMPARTIMENTAÇÃO DA AVICULTURA

No ano de 2008, no Brasil, iniciavam estudos para a implantação do Programa de Compartimentação da Avicultura. Projeto elaborado pela OIE teve a cadeia da avicultura brasileira escolhida para que fosse realizado o projeto piloto do sistema, sob coordenação do Ministério da Agricultura e da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA, 2013).

O sistema consiste na esquematização da produção nacional em compartimentos, criando subpopulações, com um status sanitário diferenciado para uma ou mais doenças específicas, principalmente a Influenza Aviária e a Doença de Newcastle, fazendo com que eventos epidemiológicos se tornem mais fáceis de serem controlados através de normas de biossegurança mais rigorosas, auditorias de risco periódicas, sistema de rastreabilidade e vigilância dos planteis e dos animais domésticos próximos às unidades, assim, reduzindo impactos econômicos provocados pelo bloqueio das exportações devido a possíveis surtos e garantindo uma maior segurança sanitária à produção brasileira (ABPA, 2013; AVICULTURA INDUSTRIAL, 2014a). A implantação do conceito trás uma garantia adicional de segurança sanitária a outros processos de certificação já existentes (MAPA, 2014b).

O conceito de um compartimento amplia a aplicação de um limite de risco além de uma questão apenas geográfica e considera todos os fatores epidemiológicos que contribuem para a separação específica da doença entre as subpopulações.

O compartimento pode se estabelecer com respeito à determinada enfermidade ou até determinadas enfermidades. Este compartimento deve ser definido claramente, indicando a localização de todos os seus componentes, explorações incluídas e suas unidades funcionais relacionadas como fábricas de rações e abatedouros e sua inter-relação e contribuição para uma separação epidemiológica entre os animais em um compartimento (OIE, 2016a).

FIGURA 1 – ESQUEMATIZAÇÃO DE UM COMPARTIMENTO

FONTE: MAPA (2014a)

Os procedimentos utilizados para estabelecer um programa de compartimentação dependem diretamente da epidemiologia da enfermidade, da presença e do papel de espécies suscetíveis presentes na fauna silvestre e os fatores de meio ambiente.

Para que se defina um compartimento é necessário levar em consideração certos fatores, como a aplicação de medidas para que se evite a entrada do agente infeccioso além de sua rápida detecção de acordo com sua epidemiologia.

A compartimentação permite que uma subpopulação animal seja separada de demais animais, sejam eles domésticos ou silvestres. Isso é viável graças a medidas de biosseguridade que o conceito de regionalização não permitiria. No caso da ocorrência de um surto de alguma doença, o sistema de compartimentação permite ao país que o emprega o conceito de tirar proveito das relações epidemiológicas entre os compartimentos e das medidas de biosseguridade para facilitar o controle da doença e/ou a continuidade do comércio (OIE, 2016b).

A gestão e medidas de biosseguridade são os pilares principais de um compartimento, os fatores geográficos também possuem um papel importante na separação adequada do compartimento e das populações animais circulantes e de diferente situação sanitária (OIE, 2016a).

O plano de biosseguridade de um sistema de compartimentação irá descrever as devidas funções tanto do setor privado quanto do Serviço Veterinário Oficial para o andamento e a gestão ideal dos compartimentos. Também conterá as informações sobre o controle do deslocamento dos animais, registros de produção dos lotes, origem de rações, resultados provenientes da vigilância epidemiológica, natalidade e mortalidade dos animais, visitantes, histórico de morbidade, medicações e vacinações realizadas, documentação referente à formação do pessoal envolvido com a produção dos animais e qualquer outro critério que se julgue necessário para a avalição de redução de risco. As medidas para garantir a reavaliação periódica de riscos e ajuste conceitos também estrão descritas no plano de biosseguridade.

É indispensável à existência de um sistema confiável de identificação e rastreabilidade dos animais para validar a integridade sanitária do compartimento

Deve-se também ser levado em consideração fatores em torno do compartimento que possam levar risco sanitário para o mesmo como, por exemplo, a presença de animais domésticos e silvestres de diferente status sanitário, feiras e exposições agrícolas, zoológicos e quaisquer pontos de concentração de animais (OIE, 2016b).

Os fatores de infraestrutura dos núcleos de produção animal que compõem um compartimento também possuem grande contribuição para a eficácia da biosseguridade do mesmo (OIE, 2016a).

A responsabilidade do setor pecuário dentro do programa correspondem a aplicação de medidas de biosseguridade, documentação e registro dos deslocamento de pessoas e animais, sistemas de garantia de qualidade, monitoramento da eficácia e das medidas aplicadas, aplicação de medidas corretivas, vigilância dos compartimentos, comunicação rápida com os órgãos públicos e fácil acessibilidade dos registros.

Já a os serviços veterinários oficiais tem como função a emissão de certificados para o deslocamento dos animais, realização periódica de inspeção das instalações de alojamento, das medidas de biosseguridade além dos registros e

métodos de vigilância. Possuem também a responsabilidade da vigilância, notificação e diagnóstico de um possível surto.

O estabelecimento e manutenção da diferença de status sanitário entre compartimentos devem ser compatíveis com as características do compartimento em questão, levando em consideração fatores sanitários, condição sanitária das áreas limitantes, medidas de biosseguridade empregadas que englobam o controle do trânsito dos animais, utilização de fronteiras naturais e artificiais, segregação física dos animais, gestão comercial e os métodos de exploração, além da vigilância constante da enfermidade (OIE, 2016b).

Caso seja observado o descumprimento das medidas de biosseguridade determinadas, será suspensa a certificação de exportação do compartimento mesmo que não haja um surto estabelecido. O status de compartimento livre da doença não será concedido até que o compartimento tenha adotado as medidas necessárias para o restabelecimento do nível da biosseguridade original e a sua situação sanitária seja novamente aprovada por uma autoridade veterinária responsável.

Na ocasião de um compartimento considerado livre de certa enfermidade esteja em risco devido a uma alteração da situação sanitária de uma região próxima, ficará a cargo da autoridade veterinária avaliar imediatamente o status do compartimento em questão e determinar se haverá necessidade de adoção de medidas de biosseguridade adicionais para se preserve a integridade sanitária do mesmo.

A autoridade veterinária que possui autonomia para conceder, suspender e revogar o status de um compartimento deverá verificar continuamente o cumprimento de todos os requisitos essenciais para que se mantenha o status do compartimento e para assegurar que os países importadores tenham acesso a todas as informações necessárias (OIE, 2016a).

No início do ano de 2014, o Ministério da Agricultura reuniu um corpo técnico para que fosse desenvolvida uma normativa nacional que estabelecesse questões operacionais referentes à certificação sanitária, auditorias e supervisões além dos procedimentos de biosseguridade e vigilância epidemiológica para a prevenção de casos de Influenza Aviária e Doença de Newcastle (MAPA, 2014b). Doenças essas consideradas como emergenciais e com potencial de gerar grandes impactos econômicos, devido às restrições comerciais consequentes aos surtos, e sanitários tanto para a população humana quanto a população animal (MAPA, 2011).

Segundo Martins (2012), o preparo do setor avícola de cada país para enfrentar surtos de influenza Aviária é de extrema importância para diferir os impactos e consequências socioeconômicas visto que em frente a um surto na Ásia, o país do Vietnã teve uma estimativa nove vezes maior em perdas econômicas quando comparado ao Japão, com um setor avícola considerado melhor preparado do que o do país vietnamita. O autor ainda cita, em relação a investimentos para a prevenção de surtos, que na década passada foi estimada a quantia de 247 milhões de dólares para a melhora do sistema de controle da Influenza Aviária na América Latina. Investimento esse que poderia prevenir custos de mais de US$ 1,2 bilhão para que um possível surto fosse controlado, além de perdas entre 12 e 85 bilhões de dólares caso uma pandemia se alastrasse pelos países latino-americanos.

Segundo Marques (2013), entre os anos de 2012 e 2013, o México, teve aproximadamente uma perda de US$ 930 milhões devido a um surto de Influenza Aviária inicialmente detectado em granjas produtoras de ovos e causado pelo vírus A/H7N3.

Devido a um surto de IA ocorrido em 2004, a Tailândia teve sua produção reduzida em mais de 50% e as suas exportações de produtos in natura proibidas em todo o mundo. Somente em 2012 o país conseguiu equiparar seus números em exportações com os mesmos de dez anos anteriores. Para esta recuperação, o país tailandês lançou mão de vários investimentos principalmente na adequação das plantas de processamento, que passaram a produzir um número muito maior de produtos industrializados do que produtos in natura. Além disso, novas e mais rigorosas medidas de biosseguridade foram estabelecidas, sejam elas em relação ao trânsito de aves, período de vazio entre lotes nos aviários, auditorias anuais em todo o sistema produtivo. Estima-se que somente nas propriedades produtoras foram investidos aproximadamente 500 milhões de dólares pelas companhias avícolas (BUTLAND, 2013).

Ainda no ano de 2014, o Brasil se torna o primeiro país a elaborar uma legislação que regulamente o sistema de compartimentação na cadeia avícola. Tal fato ocorreu através da publicação da Instrução Normativa nº 21, de 21 de outubro de 2014 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, oficializando o modelo produtivo e estabelecendo premissas a serem seguidas para que a empresa

interessada a seguir o modelo de compartimentação seja certificada como tal (AVICULTURA INDUSTRIAL, 2014b).

As normas estabelecidas pela Instrução Normativa são de caráter facultativo e a mesma estabelece as normas técnicas de Certificação Sanitária da Compartimentação da Cadeia Produtiva Avícola de granjas de reprodução, corte e incubatórios, sejam de galinhas ou perus, para a infecção pelo vírus da Influenza Aviária e Doença de Newcastle.

A certificação definida pela IN tem como objetivo reconhecer e atestar subpopulações de aves com status sanitário diferenciado, por meio da implantação de procedimentos complementares de biosseguridade, vigilância epidemiológica, supervisões e auditorias.

Inicialmente, a IN trata das exigências para a certificação medida que engloba a instituição de uma Equipe de Gestão de Compartimento (EGC), entrega da documentação necessária para o Serviço Veterinário Oficial, registro de granjas e incubatórios, instituição de POPs (Procedimentos Operacionais Padrão) para as medidas de biosseguridade, promover registros auditáveis de todos os procedimentos de biosseguridade, capacitação de todos os profissionais envolvidos e a não realização da vacinação para DN em aves de corte. Além disso, os núcleos e incubatórios devem manter registros quanto ao consumo de água e ração, ganho de peso no caso da aptidão de corte, produção e aproveitamento de ovos, números quanto a eclosão nos incubatórios e os medicamentos utilizados.

A certificação sanitária ocorrerá através de auditorias do SVO e terá validade de dois anos devendo ser realizada a promoção de supervisões internas pela equipe de gestão do compartimento a cada quatro meses nos núcleos de corte e a cada três meses nos núcleos de reprodução, incubatórios e Unidades Funcionais Associadas (UFA). O SVO ficará responsável por auditorias anuais amostrais. Quanto às não conformidades, caso forem existentes deverão ser submetidas a medidas corretivas imediatas ou implantando um plano de ação para resolução do problema em até dois dias. A existência de não conformidades pode resultar desde advertência formal até o cancelamento da certificação do compartimento. O cancelamento imediato da certificação do compartimento pode ocorrer devido a

entrada de aves, ovos, material para cama ou forração de ninho que não sejam provenientes de compartimentos ou locais autorizados pela EGC ou pela ocorrência de infecção por Influenza Aviária ou Doença de Newcastle.

O processo de vigilância epidemiológica incluirá a vigilância sorológica de triagem das aves presentes nas unidades de produção e também das que estiverem presentes no raio de um quilometro dos compartimentos, testes realizados por laboratórios públicos credenciados. Avaliações clínicas por meio de necropsias poderão ser realizadas. Granjas de reprodução deverão realizar vacinação contra a Doença de Newcastle. Caso necessário, metodologias moleculares e de isolamento serão utilizadas para fins confirmatórios por meio dos laboratórios oficiais. Os custos provenientes dos exames laboratoriais serão arcados pela empresa voluntária.

Em caso de alerta sanitário, serão intensificadas as medidas de vigilância clínico-epidemiológica e as coletas de amostras nas unidades de produção.

As medidas de biosseguridade determinadas pela Instrução Normativa giram em torno do abastecimento de água, fornecimento de ração, proximidade de espécies suscetíveis a IA e DN em relação ao núcleo de produção, acesso de pessoas e veículos, entrada de materiais e equipamentos, uso de vacinas e produtos biológicos, e, por fim, o controle de pragas sejam essas insetos ou roedores (BRASIL, 2014).

A iniciativa para implantação do projeto contou com a contribuição de grandes empresas produtoras da cadeia avícola brasileira, e no ano de 2014, uma das companhias envolvidas teve a aprovação do seu projeto de compartimentação, sendo a primeira do Brasil a conseguir tal feito. A companhia em questão desenvolveu todo seu projeto seguindo estritamente as regras formuladas pela OIE. Vários fatores foram avaliados durante o desenvolvimento do projeto, como o fluxo de pessoas e veículos, qualidade da água, controle de pragas, localização e planta das fazendas. Equipamentos, instalações de desinfecção, tratamento de resíduos, vacinas e medicamentos e o movimento de animais de criação também foram elementos avaliados.

Todo o levantamento realizado pela empresa foi para que em alguma possível emergência sanitária as medidas para combatê-la possam ser feitas da maneira

mais rápida possível. Além disso, a companhia promoveu treinamento para os colaboradores para que os mesmos tenham capacidade de agir corretamente em possíveis surtos (AVICULTURA INDUSTRIAL, 2014a).

Frente ao cenário de implantação do sistema, o IPC (International Poultry Council), solicitou a OIE e seus países membros, no início do ano de 2015, o reconhecimento do programa de compartimentação como uma ferramenta que garanta o fluxo do comércio de carnes e material genético. Desta forma, países que tenham o programa implantado não teriam suas exportações suspensas mesmo com um caso de Influenza Aviária em seu território, porém, de produtos provenientes de compartimentos que estejam em uma distância segura dos afetados pelo surto da doença. Para que o reconhecimento aconteça é necessário que haja uma revisão das regras definidas pelo OIE Terrestrial Animal Health Code, código da organização que rege os sistemas de regionalização das produções (AVE WORLD, 2015),

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