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Programa Nacional do Livro Didático: princípios avaliativos

CAPÍTULO 3 – LIVRO DIDÁTICO: UM PANORAMA DO SEU PROCESSO

3.1 Programa Nacional do Livro Didático: princípios avaliativos

O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) foi criado pelo MEC com o objetivo de fazer a compra e a distribuição gratuita de livros didáticos para todas as escolas públicas brasileiras. Desde 1996 o programa vem se preocupando com a qualidade desses materiais adquiridos, passando a fazer uma revisão contínua e sistemática para que se efetive a sua aquisição. Antes, quando o MEC tinha a função apenas de comprar e repassar os livros para a escola, a qualidade e a correção não eram preocupações explícitas. Esse descuido permitia que alguns livros adquiridos trouxessem em seu conteúdo metodologias inconsistentes, elementos discriminatórios e ideológicos, conteúdos descontextualizados, conceitos incorretos (BATISTA, 2001).

Assim, mesmo com todos as deficiências, os LDs estavam presentes no cotidiano da sala de aula, se constituindo, às vezes, como elemento organizador do trabalho do professor, como instrumento privilegiado sendo, em alguns casos, o único meio de acesso do aluno ao mundo da escrita. Autores como Freitag (1988) afirmam que os LDs vêm funcionando em algumas salas de aula não como um instrumento auxiliador no processo de ensino e transmissão do conhecimento, “mas como modelo-padrão, a autoridade absoluta, o critério último de verdade”. Dessa forma, a presença dos LDs supera a função de material de apoio e figura como elemento central nas aulas, substituindo planejamento, apontando o caminho a ser seguido pelos professores, preenchendo as lacunas deixadas pela falta de tempo do docente na elaboração das aulas e na pesquisa de conteúdos.

No inicio da década de 1990, o MEC criou uma equipe de especialistas encarregada de avaliar a qualidade dos livros mais solicitados pelos professores25 e estabelecer critérios em ralação a avaliação dos manuais. Mas só partir de 1996, o PNLD começou a abarcar

25 Os professores foram capacitados para avaliar e solicitar os livros que queriam que fossem adotados nas

todas as disciplinas curriculares do ensino fundamental. A comissão de especialistas formada para estabelecer critérios de avaliação, e a avaliação propriamente dita dos LDs, é constituída por professores de diferentes áreas do conhecimento, com experiência nos três níveis de ensino26. Deveriam ser seguidos alguns critérios para a aprovação, entre eles ausência de elementos discriminatórios e preconceituosos, assim como não conter erros conceituais, tampouco a indução do aluno ao erro.

Foram então analisados livros de 1ª a 4ª séries inscritos no PNLD 1997. De acordo com a classificação, os livros foram distribuídos em quatro categorias, a saber:

ƒ Excluídos – livros que não atendiam às normas expostas, tendo conteúdos com problemas de conceituação, desatualização, com elementos preconceituosos ou discriminatórios;

ƒ Não – Recomendados (NR) – livros que apresentaram insuficiência conceitual, podendo comprometer a eficácia do ensino;

ƒ Recomendados com Ressalva (RR) – livros apresentados nessa categoria demonstravam alguns problemas que não comprometiam o ensino e que poderiam ser superados pelo professor.

ƒ Recomendados (R) – livros que satisfizessem os critérios estabelecidos pelo PNLD, assegurando a possibilidade de um trabalho didático correto e eficaz por parte do professor.

Cada coleção era indicada em uma dessas classificações de acordo com o grau de cumprimento das exigências estabelecidas pelos parâmetros avaliativos. As editoras que tiveram livros Excluídos ou Não-recomendados recebiam laudos técnicos compostos de uma ficha avaliativa e um parecer da comissão. Os livros que passaram pela avaliação foram publicados no Guia do Livro Didático para que os professores tivessem acesso e pudessem escolher os que melhor se adaptassem às necessidades da escola.

A fim de indicar os livros que seriam adotados em 1998, o PNLD deu prosseguimento a avaliação incluindo algumas modificações, entre elas a introdução de uma nova categoria classificatória:

26 A comissão de especialista do MEC recebia assessoria do CENPEC e era coordenada pela Secretaria de

ƒ Recomendado com Distinção (RD) – nesta categoria foram inclusos os manuais que apresentavam propostas pedagógicas satisfatórias, mais próximas o possível do ideal representado pelos princípios e critérios adotados nas avaliações pedagógicas, sendo materiais que possuem propostas elogiáveis, criativas e instigantes.

Para dar melhor visibilidade aos resultados da avaliação e possibilitar uma melhor escolha por parte do professor, o MEC anexou ao Guia uma coletânea de resenhas dos livros recomendados com distinção (RD), recomendados (REC) e recomendados com ressalvas (RR), seguidos de convenções gráficas que iam de três estrelas para os livros RD, duas estrelas para os livros REC e uma para aqueles RR. Vale salientar que os livros não- recomendados eram apresentados em uma relação no final do Guia, sendo esta categoria extinta a partir do PNLD – 1999.

Outro fato importante ocorreu na avaliação dos livros que seriam distribuídos nas escolas em 1999, foi incluído mais um critério, este de natureza metodológica. Portanto, além de serem regulados no campo conceitual e político, os livros também deveriam propiciar um ambiente favorável ao ensino-aprendizagem, sendo coerentes em suas propostas metodológicas e possibilitando o desenvolvimento das competências cognitivas, tais como a observação, a análise, a elaboração de hipóteses, a memorização e o planejamento (BATISTA & COSTA VAL, 2004. BATISTA, 2001).

A criação do PNLD veio orientar a relação do Estado com os Livros Didáticos, segundo Batista (2001), foram estabelecidas diretrizes baseadas em alguns pontos:

i. centralização das ações de planejamento, compra e distribuição; ii. utilização exclusiva de recursos federais;

iii. atuação restrita a compra de livros, sem participação no campo da produção editorial, deixada a cargo da iniciativa privada;

iv. escolha do livro pela comunidade escolar; v. distribuição gratuita do livro aos alunos.

Podemos ver nos itens i, ii, iii que o Estado chama para si a responsabilidade pela filtragem dos manuais escolares, estabelecendo critérios para a aquisição e distribuição dos manuais. Poderíamos dizer que o mercado editorial passou a ser regulado. A partir dos pontos iv e v, percebemos que a escolha pelo professor e a utilização pelo aluno também sofreu regulações. Isto porque os LDs só poderiam ser comprados se passassem pela avaliação, os

professores só poderiam solicitar os livros que fossem indicados, logo os alunos só teriam acesso aos LDs aprovados pelo PNLD. Foi produzido um efeito em cadeia, a aprovação, a indicação pelo professor, a compra e a distribuição passou a estar sob o olhar governamental.

O controle exercido pelo PNLD trouxe algumas modificações que contribuíram para a melhoria na qualidade do ensino. No campo editorial, cada vez mais as editoras buscaram ampliar a qualidade dos livros que indicavam para a avaliação. Houve a ampliação de novos títulos, provocada pelo surgimento de novos autores assim como pela introdução de novas editoras no processo de avaliação. Foi ampliada a compra de LDs para diferentes disciplinas, assim como a distribuição dos mesmos para as escolas. Um fato a ser mencionado foi que o PNLD mobilizou diferentes seguimentos sociais, as Universidades, a comunidade escolar e as editoras, a se envolverem no debate sobre a qualidade dos livros escolares (BATISTA, 2001).

Mesmo os LDs tendo avançado em sua qualidade, há muito por ser feito em virtude das inúmeras demandas advindas da sociedade. De acordo com Batista (2001), as novas exigências estão representadas em quatro documentos oficiais orientadores de uma melhor qualidade do ensino, são eles: a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, 1988), as novas Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e as Diretrizes do Conselho Nacional de Educação. Esses documentos sinalizam para uma educação que valorize às práticas sociais e volte-se para responder as novas exigências das instituições escolares. Sob esta perspectiva, os LDs devem auxiliar a aprendizagem do aluno contribuindo para o domínio do conhecimento, da reflexão no uso dos conhecimentos escolares, na ampliação da compreensão da realidade, formulando hipóteses de soluções dos problemas atuais. Desta forma, promovendo o exercício da cidadania, engajado em um projeto coletivo fundamental para a construção e fortificação da escola (cf. BATISTA, 2001).

Mas, será que as novas demandas tanto sociais quanto escolares apontadas pelos documentos oficiais estão sendo efetivamente atendidas pelas propostas dos livros didáticos recomendados pelo PNLD? Será que os manuais que passam pelo crivo avaliativo apresentam orientações teórico-metodológicas consistentes que possam auxiliar o professor no desenvolvimento de um trabalho baseado nessa nova perspectiva de ensino de língua?

Marcuschi (2001) responde alguns desses questionamentos ao afirmar que, por não saberem como desenvolver um trabalho com a fala, alguns autores dos LDs abordam a língua como instrumento de comunicação transparente, a-histórica e deslocada da realidade dos seus usuários. Por não levarem em conta a relação entre fala e escrita, não apresentam as diversas formas de uso da oralidade e legitimam a secundarização com que é tratado o

ensino da oralidade nas escolas. Para o autor, os LDs selecionam textos escritos e desenvolvem um trabalho contextualizado com as regras gramaticais, porém são poucas as atividades de reflexão sobre a língua e quando ocorrem “claudicam a teoria, a terminologia e as observações empíricas” (MARCUSCHI, 2001, p. 21). Estas constatações nos impulsionam a investigar duas coleções de LDs, em busca de observar suas propostas de ensino da linguagem oral e se estas instrumentam o aluno nas práticas discursivas da oralidade.

CAPÍTULO 4. ANÁLISE DOS RESULTADOS: estratégias de ensino para o trabalho

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