2. O Museu Em Tempo Real
2.2. Programas Participativos 2.0 em Instituições Museológicas de Referência
Um Museu que tem por objetivo comunicar construtivamente com os seus públicos, encontra nas ferramentas da Web 2.0 um meio privilegiado instantâneo para o diálogo participativo e co‐criativo. É necessário, por isso, que esteja consciente que esse processo participativo implica receber e aceitar conteúdos e comentários, produzidos por todos os utilizadores, aos programas e conteúdos por si concebidos e disponibilizados online. Como referiu Elisa Noronha e Alice Semedo (2009: 3) “os Museus são cada vez mais compreendidos como recursos de conhecimento e instrumentos relevantes para que cada visitante possa explorar as suas próprias ideias”.
Existem por todo o mundo instituições museológicas que atualmente desenvolvem programas participativos de extrema relevância junto das suas comunidades online, contribuindo, exponencialmente, para o melhoramento das suas vidas. Por questões relacionadas com o cumprimento de número de páginas nesta dissertação, não foi possível abordar todas as instituições que melhor o fazem, todavia foram selecionadas aquelas que são mais emblemáticas em termos de comunidades online, segundo nos demonstrou a Museum Analytics, uma plataforma da Web que se dedica à discussão de temas sobre os Museus e à partilha de questões relacionadas com estas instituições culturais e os seus públicos, que conquistou em 2012 os prémios People's Choice e Museum Professional na Conferência Museums and the Web 201220. Foram analisados três Museus que marcam
presença significativa no ranking da Museum Analytics, como sendo: o The Metropolitan Museum of Art (MET), o Guggenheim Museum (GM) e o Brooklyn Museum (BM), todos em Nova Iorque. A variedade de programas que desenvolvem através das plataformas 2.0 é inspiradora, importa, por isso, conhecê‐los.
The Metropolitan Museum of Art, em Nova Iorque (MET)
O The Metropolitan Museum of Art oferece aos seus usuários a possibilidade conhecer as obras da coleção, artistas, curadores e funcionários através do uso das redes sociais. No seu canal na rede social Facebook, os visitantes podem associar‐se a outros usuários amigos do Museu e visitar o grupo escolar The College Group at the Met Facebook Page. Já no Twitter o Museu convida os usuários a participar na discussão sobre temas
podem visualizar vídeos sobre o Museu, as suas exposições, desde a construção à concretização, mas também o discurso dos curadores. Na rede social Delicious os visitantes podem visualizar ligações online relacionadas com Arte, cuja pesquisa pode ser feita através de palavras‐chave. No Flickr o Museu permite visualizar e partilhar fotos relacionadas com as suas exposições e atividades, tendo criado grupos específicos, com vista aos seus utilizadores partilharem fotos com a mesma temática, ou não. O Museu possui também FourSquare, que facilita aos utilizadores conhecer o espaço segundo o ponto de vista dos seus funcionários e usuários, e publica também vídeos de palestras e simpósios académicos no iTunes U21. Todos os espaços participativos são moderados. O MET possui ainda uma APP gratuita para os dispositivo móveis (IOS ou Android) da Google Goggles, que permite ao utilizador pesquisar qualquer temática, textual ou visual, por meio do conhecimento da imagem captada por uma fotografia. Através da tecnologia de reconhecimento de imagens, a aplicação permite aos usuários acederem à informação desejada armazenada online22.
O espaço no seu website chamado Met Media. See the Museum in New Ways, permite aos seus usuários online visualizar os objetos, exposições e atividades que realiza, por meio de vídeos23, e ouvi‐los, por meio de podcasts descarregáveis24. Estas informações podem ainda ser associadas ao espaço MyMet e partilhadas nas redes sociais. No espaço Met Media, existe também uma área de jogos interativos, dedicada às mais diversificadas temáticas, um espaço para a aprendizagem das crianças e uma área que contém todas as ferramentas Web 2.0 a que está associado25. Para que os visitantes do Museu possam
conhecer os objetos da coleção, mais de 2 milhões de peças, o emblemático MET criou o espaço online MyMet. A Place to Collect And Connect. Este espaço possibilita os usuários online “colecionar” os seus objetos e artistas preferidos, permitindo‐os construir, de acordo com as suas preferências, o seu próprio Museu, mas também conhecer os curadores e os
21 Vide MetShare Disponível em: http://www.metmuseum.org/metmedia/metshare [Consultado a 14 de Maio
de 2012].
22 Vide MetShare Disponível em: http://www.metmuseum.org/metmedia/metshare [Consultado a 14 de Maio
de 2012].
23 Vide Video Disponível em: http://www.metmuseum.org/metmedia/video [Consultado a 14 de Maio de
2012].
24 Vide Podcasts & Audio Disponível em: http://www.metmuseum.org/metmedia/audio [Consultado a 14 de
Maio de 2012].
25 Vide Interactives Disponível em: http://www.metmuseum.org/metmedia/interactives [Consultado a 14 de
funcionários do MET, distribuídos por 17 departamentos. A opção MyMet. A Place to Collect And Connect admite selecionar e guardar as obras numa galeria pessoal, à qual se pode aceder a qualquer momento, sem ser necessário percorrer toda a coleção. Os objetos fazem‐se acompanhar de informação específica sobre as suas principais características. Os utilizadores podem também conhecer as coleções de outros usuários do MyMet e partilhar as suas escolhas nas redes sociais, entre elas o Facebook, o Twitter, o Blogger, o YouTube ou o WordPress, mas também planear itinerários de visita, completá‐los após a visita, tomar conhecimento dos seminários a realizar, através de lembretes, ou ter acesso a receitas confecionadas no Museu. Para aceder a esta opção, o utilizador deverá de registar‐se online26. O MET também dedica às crianças uma área no seu website, que lhes permite conhecer o Museu, os objetos, os artistas e outras culturas de uma forma divertida27. Guggenheim Museum, Nova Iorque (GM) O Guggenheim Museum Nova Iorque dedica na página principal do seu website um espaço para os seus usuários online, designado por Community. Nesta área o utilizador pode aceder aos canais da Web 2.0 aos quais o Museu se associou, entre os quais se encontra o Facebook, onde possui 7 canais com temáticas diferenciadas: o Solomon R. Guggenheim Museum, relacionado com o Museu propriamente dito; o BMW Guggenheim Lab, que convida as comunidades a discutirem ideias acerca da vida urbana; o Works & Process at the Guggenheim, que permite aos seus usuários conversar com artistas e intelectuais; o Young Collectors Council, dedicado aos artistas contemporâneos emergentes e figuras importantes do mundo da arte, perfil concebido e gerido pelos curadores do Museu; o Guggenheim Members, para os usuários do Museu que pretendem ter benefícios nos preços de entrada, entre outros, como convites para inaugurações de exposições ou festas; o Learning Through Art, pertencente ao programa de residências artísticas do Museu; e o canal The Wright, pertencente ao restaurante e café do Museu.
Estes grupos de discussão também têm presença no Twitter, no YouTube, onde os usuários podem visualizar vídeos acerca do Museu, das suas exposições e discurso dos curadores; no Flickr, partilhando as suas fotos com o utilizador e aprovando as suas por meio
26 Vide MyMet. A Place to Collect And Connect. What is MyMet? Watch the Video to Find Out Disponível em:
https://www.metmuseum.org/mymet/sign‐up [Consultado a 14 de Maio de 2012].
27 Vide Kids’ Zone Disponível em: http://www.metmuseum.org/metmedia/kids‐zone [Consultado a 14 de Maio
uma plataforma no Ustream, que possibilita ao Museu anunciar conteúdos em direto e online, como se de uma televisão ou rádio se tratasse; e no ArtBabble, uma plataforma dedicada unicamente à Arte Contemporânea28.
Brooklyn Museum, Nova Iorque (BM)
O Brooklyn Museum possui um blogue designado por Community: bloggers@brooklynmuseum, que apresenta as atividades visíveis e invisíveis do Museu, cujos autores são os curadores que colaboram com o Museu29.O Museu está também associado ao Tumblr, que consiste numa mescla entre o Blogue e o Twitter, a que chamam tublelog, tlog ou scrapbook, que permite publicar e partilhar conteúdos em formato de texto, áudio, vídeo ou imagem de forma simplificada e imediata, sendo necessário apenas carregar no seu ícone30. Utiliza também a ferramenta Wiki, nomeadamente na Wikipédia, onde insere conteúdos biográficos e bibliográficos dos artistas representados nas exposições31. Online
pode igualmente encontrar‐se informações sobre alguns objetos do Museu32. Para além de estar presente no Facebook, Twitter, Flickr, no Flickr Commons, no Youtube e FourSquare, onde produz conteúdos relacionados com o Museu, as suas atividades e exposições, o BM possui na área Community o espaço Comment, onde os utilizadores podem produzir comentários sobre as exposições, que são submetidos a moderação33. Este Museu está
também presente no perfil social Yelp, uma rede social utilizada para encontrar locais ou empresas relevantes e cuja referência é feita pelos seus utilizadores34. O BM encoraja
frequentemente os seus usuários no sentido de associar novas e relevantes palavras aos objetos, designadas por tags. Entre estes programas, apelidados de “jogos” pelo Museu,
28 Vide Communities Disponível em: http://www.guggenheim.org/new‐york/interact/guggenheim‐online‐
communities [Consultado a 14 de Maio de 2012].
29 Vide Blog Disponível em: http://www.brooklynmuseum.org/community/blogosphere/ [Consultado a 14 de
Maio de 2012].
30 Vide Network Disponível em: http://www.yelp.com/biz/brooklyn‐museum‐brooklyn‐2 [Consultado a 14 de
Maio de 2012].
31 Vide Welcome to WikiPop Disponível em:
http://www.brooklynmuseum.org/exhibitions/seductive_subversion/wiki/ [Consultado a 14 de Maio de 2012].
32 Vide WikiLink (QR Redux) Disponível em:
http://www.brooklynmuseum.org/community/blogosphere/2012/04/24/wikilink‐qr‐redux/ [Consultado a 14 de Maio de 2012].
33 Vide Comment Disponível em: http://www.brooklynmuseum.org/community/comment/ [Consultado a 14 de
Maio de 2012].
34 Vide Network Disponível em: http://www.yelp.com/biz/brooklyn‐museum‐brooklyn‐2 [Consultado a 14 de
encontram‐se o Tag! You’re It, o Posse, o Freeze tag!35 ou o projeto Gallery tag!36,
consistindo, este último programa, numa versão do website do BM para ser utilizada em dispositivos móveis. Com estes programas o Museu pretende dar voz aos interesses das comunidades online no sentido de melhorar a sua coleção online.
O BM foi analisado por inúmeros outros autores, quer Nacionais como Internacionais, uma vez que se afigura como um bom exemplo no que concerne à utilização das redes sociais junto dos seus públicos. Dedicou um espaço às suas comunidades, designado por Community, onde possui o grupo Posse, que permite aos seus usuários contribuir para construção da coleção online, no sentido de lhes atribuir novas designações ou tags, que constarão nas fichas de inventário37. No seu espaço Community, o BM possibilita aos seus utilizadores a publicação dos seus vídeos, desde o YouTube, sendo que os mesmos são submetidos a aprovação via email, uma vez que devem cumprir determinadas condições38. O BM possui igualmente ficheiros áudio, desde 2006 até à
atualidade, dedicados aos mais variados temas relacionados com as actividades que promove. Estes conteúdos podem ser escutados a partir do iTunes U, mas também do YouTube39. Todos estes conteúdos podem ser descarregados, ser partilhados e subscritos
através de RSS Feeds.
Até 2011, o BM era bastante crítico em relação à introdução do QR Code no seu espaço, uma vez que considerava que esta ferramenta oferecia poucas opções técnicas para os seus utilizadores e que não passava de uma mera ferramenta de marketing. Após alguma resistência inicial, e pensando nas questões relacionadas com a acessibilidade, que muito preza na sua missão, o Museu decidiu realizar um período experimental de utilização desta ferramenta e avaliar, através da observação, de que forma os visitantes se comportavam. Concluiu que a experiência não foi muito bem conseguida, uma vez que a percentagem de utilização foi demasiada baixa, porém considera que estas ferramentas podem ser utilizadas
35 Vide Crowdsourcing the Clean‐Up with Freeze Tag! Disponível em:
http://www.brooklynmuseum.org/community/blogosphere/2009/05/21/crowdsourcing‐the‐clean‐up‐with‐ freeze‐tag/ [Consultado a 14 de Maio de 2012].
36 Vide Gallery Tag! Disponível em:
http://www.brooklynmuseum.org/community/blogosphere/2010/03/25/gallery‐tag/ [Consultado a 14 de Maio de 2012].
37 Vide Community: Posse Disponível em: http://www.brooklynmuseum.org/community/posse/ [Consultado a
14 de Maio de 2012].
38 Vide Videos em: http://www.brooklynmuseum.org/community/videos/ [Consultado a 14 de Maio de 2012]. 39 Vide Podcast Archive Disponível em: http://www.brooklynmuseum.org/community/podcasts/ [Consultado a
a partilharem as suas experiências na sua utilização, assim como a partilhar as percentagens obtidas40. Os QR Codes foram também utilizados num outro projeto que o Museu concebeu,
designado por WikiLink, que consiste na associação do QR Code aos conteúdos da Wikipédia, produzidos pelos curadores, sobre duas galerias do BM: The Egyptian e a Near East Art. Os resultados deste investimento tecnológico serão revelados no fim do verão de 2012. A partir desta experiência, o Museu irá aferir se compensa em termos estatísticos este investimento41.
Estes três exemplos de programas multidirecionais e participativos online espelham que as mudanças produzidas pela introdução das novas tecnologias nos Museus são absolutamente notórias, desde a difícil implementação das plataformas estáticas até às plataformas mais interativas e partilháveis, nomeadamente as ferramentas da Web 2.0 (que cedo dará lugar às Web 3.0 e 4.0). As comunidades virtuais, especializadas ou não especializadas, podem contribuir para a construção de significados dentro dos Museus, basta que estes estejam disponíveis para essa partilha e tornem os seus conteúdos acessíveis (Jenkins, 2006: 26 a 31). Como observou Parry (2007:140), o Museu têm mais públicos online do que in situ, pelo que deverá centrar‐se também na interação com os seus visitantes virtuais, estabelecendo um diálogo personalizado e incentivando‐o a participar e a reinterpretar a experiência museológica segundo os seus interesses. Todavia, para que a participação em ambientes online seja sustentável, como vimos, os Museus devem conhecer as motivações, estímulos e recompensas que os usuários online desejam, quer ao nível individual, quer ao nível coletivo, tal como o fazem em relação aos visitantes in situ. Existe uma sociedade de consumidores que não pode ser considerada anónima. Estes inúmeros segmentos de mercado, com interesses diversificados, têm de ser tomados em consideração, pois representam públicos heterogéneos, onde se inserem também as minorias, e não um público homogéneo (Ames, 2004: 94). Significa isto que os Museus
40 Vide QR in the New Year? Disponível em:
http://www.brooklynmuseum.org/community/blogosphere/2012/01/04/qr‐in‐the‐new‐year/ [Consultado a 14 de Maio de 2012].
41 Vide WikiLink (QR Redux) Disponível em:
http://www.brooklynmuseum.org/community/blogosphere/2012/04/24/wikilink‐qr‐redux/ [Consultado a 14 de Maio de 2012].
devem procurar nichos de interação (Russo; Peacock, 2009), como sendo participantes ativos interessados em novos programas e projetos via digital (Richardson, 2011).
O Museu que não tenha esta perspetiva de renovação e mudança de atuação face às comunidades, apenas se servirá dessas ferramentas como meio de divulgação dos conteúdos que produz ou então porque é um tema em voga, anulando o fundamento das ferramentas da Web 2.0. Assim, mais do que ter a preocupação de promover experiências aos seus visitantes, o Museu deve desprover‐se da sua aura de instituição e pensar em proporcionar e consumir conteúdos personalizados e com significado, para seu próprio benefício, mas também das comunidades. Porém, há também que acautelar, como referiu Simon (2010), que uma margem de visitantes terá sempre uma atitude passiva em prejuízo da interatividade. O visitante tradicional, chamemo‐lo assim, aguarda pacientemente que o Museu educador lhe forneça o conhecimento absoluto a partir das suas exibições estáticas. O Museu deve ser um exemplo para a comunidade, pelo que deverá reexaminar‐se constantemente, em termos de estratégias, objetivos, leis internas e até na direção, para responder às suas transformações e necessidades. Um Museu que não está preparado para este tipo de mudança pode facilmente ser ultrapassado por outra organização semelhante, mais atenta às questões das comunidades (Skramstad, 2004: 126), e auto‐condenar‐se ao isolamento e fracasso, podendo, no limite, ter de encerrar as suas portas por falta de públicos. Deve, por esse motivo, promover a filiação dos mesmos pela valorização das suas vidas.
O terceiro capítulo desta dissertação enquadrará os contextos da introdução das novas tecnologias e das ferramentas 2.0 nas principais instituições de Espanha, particularizando a cidade de Barcelona, a capital da Catalunha, Comunidade Autónoma Espanhola, onde se localiza o MACBA, o Museu Internacional que se intuiu estudar.