Segundo Azevedo (1994, p. 201) “O desenvolvimento de uma comunidade não é um produto, que se compra e se vende, é um processo social em que se envolvem actores e grupos, com conflitos e relações de força variáveis, tendo em vista melhorar a qualidade de vida geral da comunidade (...) deve ser endógeno, auto-centrado e aberto sobre o exterior (...)”.
10.1 · Conceito de Projecto Educativo
Segundo Barroso (1992, p. 20) um projecto pode ser enten- dido como etapa de planificação estratégia que “(...) surge assim como o “processo de conceber um futuro desejado, bem como os meios reais par o alcançar” (...)”. Esta necessidade de preparar o futuro leva a que nesta fase a escola, de uma forma global, integrada, flexível e dinâmica, faça o diagnóstico da situação, quer a nível interno quer a nível externo, detecte os constrangimentos e as sinergias, encontrando estratégias adequadas ao seu desenvolvimento e evolução.
Para o Autor (ibidem, pp. 28-30) “(...) a existência de um projecto decorre de duas lógicas distintas que por vezes podem ser conflituais (...) a lógica do desejo e a lógica da acção. A primeira assenta no primado da “ideologia” e valoriza a dimensão simbólica
do projecto, a segunda assenta no primado da “racionalidade técnica” e valoriza a sua dimensão operatória”.
Se o projecto umas vezes vai de encontro a actos espontâne- os, deficientemente estruturados, actos individuais de reacção a uma ordem estabelecida, em que domina o aspecto afectivo, outras vezes ele nasce de uma necessidade de criar de forma coerente e racional algo de novo, apresentando objectivos bem definidos.
Contudo, a evolução, quer num quer noutro caso, pode não ser a desejada, havendo pois que conciliar “(...) a atracção pelo futuro e a acção no presente”.
Na perspectiva do Autor (ibidem, ibidem) há uma “(...) com- plementaridade entre conceber e produzir, entre desejo e acção, entre simbólico e operatório (...)”, pelo que o projecto surge “(...) como um
processo e como um produto de uma planificação (...)” que orienta e
organiza a escola visando determinados objectivos.
“Enquanto processo, o projecto de escola corresponde
ao tempo e às actividades necessárias à emergência de um núcleo agregador de princípios, valores e políticas capazes de orientarem e mobilizarem os diferentes membros da organização-escola. É um processo lento, interactivo, por vezes conflitual, de ajustamentos de estratégias individuais e de grupos, em que se vai sedimentando um sentimento de pertença a uma mesma comunidade educativa e construindo os espaços de autonomia da própria escola”;
“Enquanto produto, o projecto de escola constitui uma
metodologia e um instrumento de planificação a longo prazo que enquadra a definição e a formulação de estratÉgias de gestão e do qual decorrem os planos operacionais de médio e de curto prazo”.
Por tudo isto, o projecto de escola deve ser formalizado num documento orientador da acção da escola. Nele devem constar os objectivos a atingir, as estratégias consonantes com o diagnóstico de valores e de políticas necessários à formalização e, também, a sua execução através de uma planificação operacional.
Para Barroso (ibidem, p. 37) “o projecto é um processo de construção de consensos”. Nasce da vontade colectiva de todos os elementos que constituem a escola e que se devem identificar com os mesmos valores e políticas. Estas devem ser canalizadas para a tomada de decisões e resolução de problemas, através de uma gestão participativa e de uma liderança eficaz. A avaliação dos processos e dos resultados será a possibilidade de impedir que o projecto estagne.
Mas Barroso (1997, p. 32) considera que projecto engloba, em simultâneo,
- “uma atitude face ao futuro (desejo de mudança)
gia) - um modo de coordenar a acção (gestão por objectivos)”. Alves (1992, p. 63) considera que o Projecto Educativo “Estabelece linhas orientadoras do tipo de educação (instrução/socia- lização/estimulação) que se quer proporcionar às gerações jovens”. Mas “Determina os valores que devem ser trabalhados no currículo explícito e oculto”, impondo uma estratégia de inovação.
10.2 · Currículo e projectos curriculares de escola
Zabalza (1992, pp. 88-90) refere que o “(...) currículo cons-
titui o projecto educativo que desenvolve a escola (...). Uma escola
centrada no currículo é uma escola que consegue definir com clareza em que tipo de projecto educativo se encontra empenhada (...) uma escola não curricular é uma escola onde esse “projecto educativo” não pode ter clareza (...) sem (...) um sentido unitário e de conjunto”.
O currículo deverá ser visto como:
“(...) articulação coerente entre os princípios teóricos e/ou de doutrina (...)”, que servirão de base à selecção de conteúdos e orientarão a prática educativa; “(...) baseado nas necessidades reais da população escolar (...)”, o que pressupõe um currículo aberto, flexível e não um currículo standardizado; “(...) realista (...)”, não utópico.
Assim, currículo e projecto estarão interrelacionados, se o ensino for concebido como um projecto educativo colectivo, em que cada escola possuiria o seu próprio projecto curricular de acordo com o seu contexto específico. Tal implica um desenho curricular de acção em que os professores serão os principais protagonistas, sendo deles que depende um ensino de qualidade. Estes terão que mudar a concepção que têm de si mesmos, das suas motivações e das suas capacidades. O currículo ao ser entendido como algo provisório, sente a necessidade de um aperfeiçoamento ao qual deve ser incorporada uma dimensão investigativa.
O Autor (ibidem, p. 92) frisa que
“Cada professor ensina com base num processo complexo de assimilação pessoal de regras e par‚metros de actuação. Por mais “receitas” ou “métodos” novos que lhe prescrevam, nada assegura ou deixa prever uma mudança no seu próprio “estilo docente” Como estratégia para a mudança, afigura-se mais eficaz (...) “ensinar a avaliar”.
Para a mudança os professores deveriam aprender a utilizar a informação para alterar as suas acções quotidianas.
Para Zabalza (ibidem, pp. 93-96) a teoria do currículo pode contribuir para melhorar o ensino, na medida em que:
“A. O currículo deverá sublinhar a integralidade do processo
formativo (...)”, pois além de integrar aspectos teóricos com
procedimentos e estratégias que tornam viável o ensino de assuntos específicos, integra também intervenções distintas que a escola oferece como um projecto unitário, não sendo cada acção isolada das outras, antes todas contribuindo para um processo formativo.
“B. O currículo deverá colocar em destaque e tecnificação
do processo de instrução (...)” indo mais além do que as
determinações de política educativa, pois adicionou ao conceito e à prática de ensinar a ideia de que “(...) não basta saber o que ensinar e/ou saber aquilo que se ensina; é indispensável saber para que se ensina e como se ensina (...)”.
“C. O currículo é uma proposta de acçıes instrutivas (...), mas
é também uma estrutura de referência, um marco de re- flexão sobre a acção”, onde se combate a ideia obsessiva
dos professores em cumprir o programa e as actividades prescritas e dando uma abertura a modelos mais dirigidos para a investigação e para a resolução de problemas. Os professores passam assim a construir o currículo, adaptando- o às necessidades reais e específicas de cada situação. No dizer do Autor (1992, pp. 97-99) os projectos curriculares
concretos de cada escola “(...) representam a adaptação do programa oficial às características particulares de cada escola. (...), cumpre falar de programação”, que mais não é do que a interpretação e adaptação que cada escola faz do programa oficial.
“D. O currículo deverá permitir que a escola principie a ter
um forte protagonismo (...)”, quer a nível de construção
quer a nível de implementação dos currículos;
“E. O currículo exige uma visão dinâmica dos estabelecimentos
de ensino”.
Vários dilemas subsistem na função curricular das esco- las. Zabalza (ibidem, pp. 99-102) fala do: “Dilema básico entre regulação estatal e flexibilidade lo- cal”, em que modelos curriculares centralizados aliam-se a modelos organizativos burocráticos. Mas se a ideia é flexibilizar o desenho curricular aposta nas necessidades específicas de cada situação social, geográfica e cultural.
A abertura da escola quer em relação ao seu próprio interior ou ao exterior são problemas reais que devem ser combatidos.
A relação de abertura com o interior tem a ver com a quan- tidade e qualidade de conexões entre os diferentes elementos que constituem a escola e que se traduzirão ou não em possibilidades de projectos inovadores de melhoria do ensino na própria escola, desde que se crie uma mentalidade curricular que vise um projecto formativo integrado.
A relação com o exterior não pode continuar com fronteiras marcantes em que a escola mostra claramente “(...) que os seus ele- mentos defendem firmemente o conceito de “interior” e “exterior”, “os de dentro “ e “os de fora”. Tal postura acarreta escassez de fluxos inovadores. Contudo, uma abertura exagerada leva também a que a escola perca a sua própria identidade, tornando-se refém de influên- cias exteriores.
O Autor (ibidem, pp. 103-104) expõe que no “Dilema da eficácia da escola”, é importante referenciar “(...) o papel de liderança
efectiva desempenhado pelo director nas escolas. (...) o clima da escola
(...). A articulação e organização curricular (...). A participação das
famílias (...). O professorado (...) a continuidade, a promoção (...) e as oportunidades de formação. (...) o sentimento de vinculação à escola (...), o nível de expectativas de êxito generalizado (...)”.
Tudo isto são condições para a escola aderir e poder ser dinamizado um projecto curricular de escola.
10.3 · Paradigmas metodológicos para elaboração de um Projecto Educativo de Escola
Broch e Cros (1992, pp. 144-145) referem os paradigmas metodológicos ligados aos projectos de escola que se interligam e influenciam.
“A. Um paradigma de racionalidade e unilinearidade (...)” que tem a ver com uma visão progressista do social e da história, onde está presente o processo de resolução de problemas;
“B. Um paradigma de lógica social (...)” aliado aos conceitos de interacção e interdependência, aberto ao colectivo e à pluralidade de caminhos, “(...) numa pesquisa de não-con- tradição entendida como a não-destruição ou a não-anulação através de uma acção empenhada”;
“C. Um paradigma do aleatório (...)” que assenta na possibi- lidade de fins múltiplos em simultâneo e em fractura, sem regras cognitivas, em que o saber não é objectivo porque faz parte do jogo da vida social.
As escolas elaboram os seus projectos tendo por base alguns pressupostos.
Os Autores (ibidem, pp. 146-147) referem que podem basear-se em:
“1. Projectos que se apoiam numa “análise das necessidades”
como “- Análises de tipo sociológico”, “Análises “estudo-
descoberta” do meio”, “Análises do funcionamento do estabelecimento” e “Análises de dados estatísticos” que
se apoiam em dados qualitativos e quantitativos.
“2. Projectos que visam a formulação de finalidades” que coin- cidem com orientações nacionais, mas que os professores ao conhecerem bem a realidade local dão ênfase a aspectos educativos e pedagógicos locais.
Há princípios básicos a considerar na elaboração de um projecto educativo e que Broch e Cros (1992, pp. 148-150) conside- ram como sendo:
“1. O projecto de escola tem por vocação essencial procurar
sinergias das vontades nas direcções por ele determinadas”
o que implica que o projecto deverá ser aceite pelo maior número possível de intervenientes;
“2. O projecto apoia-se em dados” objectivos, em opiniões, em descrição de situações;
“3. O projecto de escola está centrado no próprio aluno – ob-
jecto do inquérito”;
“4. O projecto de escola abrange directamente actores muito
diferentes”, com diferentes estatutos e que desempenham
diferentes papéis;
“5. O projecto indica os objectivos gerais e os objectivos
operacionais”;
“6. O projecto associa a concretização prática e a apropriação
dos objectivos” de forma a que todos compreendam as suas
causas e consequências;
“7. O projecto de escola conduz à assunção da responsabili-
dade pela sua concretização”, em que cada uma assume a
responsabilidade das actividades que produz;
“8. O projecto de escola depende da responsabilidade da
direcção do estabelecimento de ensino”.
Os autores (ibidem, pp. 170-171) consideram que não exis- tem saberes particulares para construir um projecto de escola, mas um conjunto de saberes que se articulam e esclarecem as práticas e as relações dos protagonistas.
“- saberes teóricos (...)” que permitem adquirir conhecimentos sobre projectos;
“- saberes processuais (...)” que visam as formas de elaboração dos projectos;
“- saberes práticos (...)” que se ligam directamente à acção. Cada protagonista deverá ter a capacidade de comunicar aos outros elementos da comunidade escolar e da comunidade local
“(...) o que faz, por que razão o faz e como o faz”.
“Tudo isto conduz a uma visão de elaboração do projecto
global (e não fragmentada), formalizada (e não tarefista), reflexiva (e não linear)”.
Para Alves (1992, p. 65) a construção do Projecto Educa- tivo passa por várias formas de abordar o problema de construção do mesmo. Como requisitos necessários de “(...) uma abordagem transformacional (...)” salientam-se, entre outros, “Reconhecer e valorizar os actores da comunidade educativa (...)”, “Identificação e exploração dos fenómenos de sinergia (energia colectiva) (...); reconhecimento dos fenómenos de entropia (...)” e “Criar condições para investigar as práticas”.
A prática educativa deve ser perspectivada numa metodolo- gia na e pela acção, no sentido de proporcionar a realização pessoal e social dos alunos e o sucesso educativo.
Para o Autor (ibidem, p. 66) é importante o ciclo “Agir - interagir - investigar - interagir - agir: ciclo em espiral”, pois através dele obtém-se resposta para os problemas da comunidade.