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O Projeto Bidal ('Bienes Incautados y Decomisados en América Latina') 54

2. GESTÃO DOS BENS APREENDIDOS NO PROCESSO PENAL 43

2.2. DIRETRIZES INTERNACIONAIS RELACIONADAS À GESTÃO DE BENS

2.2.2 O Projeto Bidal ('Bienes Incautados y Decomisados en América Latina') 54

O projeto Bidal83, conforme já referido acima, é uma iniciativa da

CICAD/OEA que tem por objetivo ajudar as comissões antidrogas dos Estados- membros americanos a solucionar o problema de falta de fundos para financiar seus programas e contribuir com o objetivo de privar os criminosos dos lucros gerados por suas atividades ilegais.

Oferece, além disso, assistência técnica aos países interessados por meio do estabelecimento de normas de boa gestão e transparência na administração de bens de origem ilícita, com o objetivo de procurar o máximo de benefício e evitar desvios.

Um dos produtos do Projeto Bidal foi a realização de um estudo específico84 sobre o sistema de administração de bens na América Latina e um guia para administração de bens apreendidos do crime organizado, publicado 2011, coordenado por Isidoro Blanco Cordero.

O Manual acima referido diagnostica a existência de dois mecanismos, no âmbito do direito comparado, para garantir uma administração eficaz e rentável de bens85, que serão descritos a seguir.

O primeiro deles é um modelo segundo o qual os organismos responsáveis pela administração de bens possuem funções muito amplas, que compreendem tudo quanto relacionado com os aspectos patrimoniais de qualquer delito. Tais organismos se dedicam, também, a efetuar uma investigação patrimonial dos acusados para identificar e localizar o patrimônio decorrente de atividades ilícitas. Além da investigação patrimonial, tais órgãos também se dedicam à gestão dos bens

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Disponível em:<http://www.cicad.oas.org/Main/Template.asp?File=/lavado_activos/bidal_spa.asp> Acesso em: 15 jun. 2015.

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PROJETO BIDAL, op. cit.

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apreendidos, da execução das sentenças e da destinação dos bens, uma vez decretado seu perdimento.

O segundo modelo é mais restrito e atribui ao órgão apenas a tarefa de administrar os bens apreendidos. Tal organismo é encarregado de custodiar, administrar, manter e dispor dos bens acautelados de acordo com a legislação nacional. Assim ocorre, na América Latina, com os países de Honduras, com a Oficina Administradora de Bienes Incautados (OABI); Colômbia, com a Dirección Nacional de Estupe- facientes (DNE); República Dominicana, com a Oficina Encargada de la Custodia y Cuidado de los Bienes Incautados; Costa Rica, com a Unidad de Administración de Bienes Decomisados y Comisados (UAB); México, com o Servicio de Administración y Enajenación de Bienes (SAE); Bolívia, com a Dirección de Registro, Control y Administración de Bienes Incautados (DIRCABI); Equador, com el Consejo Nacional de Control de Sustancias Estupefacientes y Psicotrópicas (CONSEP); e Perú, com la Oficina Ejecutiva de Control de Drogas (OFECOD).

Outros modelos também são apontados no estudo, como o Criminal Assets Bureau (CAB), da Irlanda, que possui natureza policial; o Organo Central para el Embargo y la Confiscación (Organe Central pour la Saisie et la Confiscation- OCSC), da Bélgica, que possui natureza judicial e outros órgãos administrativos, independentes, tais como o Reino Unido-Assets Recovery Agency (ARA).

São apontadas, pelo mesmo manual, boas práticas que deveriam ser adotadas por toda agência de administração de bens.

Em primeiro lugar, a agência ou órgão deve tomar posse ou receber os bens apreendidos, executando um inventário detalhado deles, que deve conter uma descrição do estado em que se encontram.

Na sequência, deve-se abrir um registro dos bens, que devem ser identificados, utilizando-se todos os meios tecnológicos disponíveis para tanto. Deve, também, a agência, promover as medidas adequadas para que os bens não sejam destruídos, alterados, deteriorados ou perdidos. Em relação àqueles bens que possuem registros públicos, deve ser providenciada a anotação de restrição. A seguir, deve-se proceder a uma avalição dos bens acautelados.

Em casos excepcionais, deve-se proceder à alienação antecipada. Tal alienação deve ser levada a efeito: quando se trate de bens perecíveis; quando seu proprietário os abandonou; quando os gastos de conservação e depósito sejam superiores ao valor do objeto em si e quando, devidamente instado o proprietário, ele tenha se quedado inerte.

Em 2014, foi lançado o projeto ‘Bidal Brasil’, uma parceria da Secretaria Nacional de Justiça e da Secretaria Executiva da ENCCLA com a OEA e UNODC, que objetiva desenvolver e melhorar os sistemas de identificação, localização e gestão de bens apreendidos e confiscados, pelo estabelecimento de normas de boa governança, para garantir o máximo benefício e evitar atos de corrupção e desvios no uso e disposição dos bens86.

A primeira fase do projeto consistirá em diagnóstico do sistema brasileiro. Para tanto, foi contratado um consultor que desenvolveu alguns questionários, os quais devem ser respondidos por servidores que tenham alguma experiência com investigação patrimonial, apreensão ou administração de bens. O projeto já foi

desenvolvido em outros países como Argentina, Uruguai, Chile e El Salvador.

Um dos produtos do projeto no Brasil foi a elaboração de um diagnóstico efetuado pelo consultor local Flávio Pimenta87, cujos resultados foram apresentados por ocasião do Seminário Nacional sobre investigação patrimonial, administração e destinação de bens apreendidos e confiscados/perdidos – Projeto Bidal-Brasil, realizado nos dias 13 e 14 de maio de 2015, do qual a subscritora participou.

Segundo a avaliação do consultor88,

[...] a investigação criminal no Brasil tem seu foco principal na apreensão de objetos necessários à prova da infração, relegando-se a investigação patrimonial para momento posterior. Portanto, ainda há uma predominância da apreensão de coisas de escasso ou reduzido valor econômico simplesmente por constituirem instrumento do crime.

Conforme ressaltado por Flávio Pimenta, durante a apresentação dos

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Disponível em:<http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2014/08/organizacao-americana-presta- consultoria-sobre-gestao-de-bens-apreendidos>. Acesso em: 14 dez. 2014.

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PIMENTA, Flávio. Resultado da avalição diagnóstica do Projeto Bidal CICAD/OEA. Disponível em:< http://cicad.oas.org/apps/Document.aspx?Id=3285>. Acesso em: 14 jun. 2015.

88

resultados, o Brasil possui alguns pontos fortes, tais como excelentes investigações patrimoniais efetuadas em alguns casos concretos. No entanto, trata-se de uma experiência localizada e quanto a crimes muito específicos. Nao existe uma investigação patrimonial global para todo tipo de crime.

O consultor afirma, ao final, que o SNBA – Sistema Nacional de Bens Apreendidos – não contém dados necessários para uma pesquisa adequada. Por exemplo, não se sabe o estado de conservação dos bens e não há registro de sentenças.

Ademais, há inscrições de bens irrelevantes no SNBA, como garrafas de cerveja, lata de leite etc... que não têm qualquer interesse econômico, o que demonstra falta de um filtro adequado dos operadores do sistema, que deveriam ser mais bem orientados quanto ao que lançar.

Fonte: Flávio Pimenta89.

É tida como certa, tanto nos resultados do diagnóstico, como no estudo

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Resultado do diagnostico situacional efetuado pelo Consultor Flávio Pimenta, apresentados por ocasião do Seminário Nacional sobre investigação patrimonial, administração e destinação de bens apreendidos e confiscados/perdidos – PROJETO BIDAL - Brasil, realizado nos dias 13 e 14 de maio de 2015. Disponível em: <http://cicad.oas.org/apps/Document.aspx?Id=3285>. Acesso em: 15. jun. 2015.

específico90 sobre o sistema de administração de bens na América Latina e guia para administração de bens apreendidos do crime organizado, coordenado por Isidoro Blanco Cordero91, a importância de um órgão, quer seja ele com atribuições amplas quer restritas, que tenha como objetivo a administração de bens, como garantia de eficiência do sistema:

Es imprescindible que los Estados administren los bienes decomisados de una forma eficiente y rentable. Un elemento importante en la adminis- tración de activos decomisados es la designación de un organismo responsable de tal administración. Algunos Estados (entre ellos algunos miembros del G8) han creado para la administración de bienes de- comisados organismos gubernamentales especiales con autoridad para custodiar, administrar, mantener y disponer de los bienes incautados.92

.

Infelizmente o Brasil não conta, até o presente momento, com um órgão ou agência para a administração de bens acautelados, o que ocupa sobremaneira o já assoberbado Poder Judiciário, atribuindo-lhe uma função que não é típica e para o qual não está minimamente aparelhado. Tal função deveria, como a boa prática internacional recomenda, ser efetuada por uma agência ou órgão especializado.

2.3 DIAGNÓSTICO DO ATUAL SISTEMA EFETUADO PELA FUNDAÇÃO