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CAPÍTULO 1. A FORMAÇÃO DA GLEBA JORGE TEIXEIRA DE OLIVEIRA E A

1.5 PROJETO DO LOTEAMENTO RURAL E SERVIÇOS TOPOGRÁFICOS

Com um mapa da GJTO em mãos, fornecido pelo INCRA, com todos os limites e confrontações, os dissidentes do MST foram à procura de um técnico indicado pela autarquia fundiária para projetar o loteamento. Foi-lhes apresentado o técnico em topografia e geógrafo, Luiz Cláudio Fernandes, funcionário do Governo do Estado de Rondônia. Acertaram com ele as bases do contrato para concepção de um anteprojeto de loteamento rural para atender cerca de 1880 parcelas de 50 hectares, nos moldes e padrões geralmente adotados no INCRA.

Sobre a contratação do pré-projeto do loteamento e ocupação da Gleba, Édmo Ferreira Pinto (Dindim), em audiência realizada no dia 10 de abril de 2002, na Procuradoria da República no Estado de Rondônia, consignou nos autos de processo administrativo nº 1.31.000.000212/2001-54, o seguinte38:

A Associação39 fez uma reunião e decidiram, não sabendo informar o

38Cópia do termo de declarações extraído do livro “A verdadeira Historia de União Bandeirantes”, contada por

Edmilson Penha da Silva (JB), acervo da Família de Júnior Baiano.

39 Um reparo: A associação de que fala fora criada informalmente em Jaru em 06 de agosto de 2000, para fins de

recrutamento e arrecadação de fundos dos futuros ocupantes da Gleba Jorge Teixeira. Ela só foi constituída formalmente, depois disso, com a colaboração do SEBRAE, que elaborou os seus Estatutos, registrado em Porto Velho no dia 9 de agosto de 2000, no Livro A-30, com o numero de ordem 5693. Documento anexo.

declarante se foi por orientação do INCRA ou não, contratar uma pessoa para fazer um anteprojeto de divisão da área. Sendo que em meados de junho de 2000 contrataram o senhor Luiz Cláudio Fernandes, Chefe Projetista da SEDAM, para a realização de um pré-projeto no início do mês de julho de 2000 (Depoimento de Édmo Ferreira Pinto, Procuradoria da República no Estado de Rondônia, 2002).

Estabelecidas as bases do contrato e do projeto, o técnico contratado “tirou uma imagem de satélite da área e na imagem do satélite mostrava o local aonde iria, no futuro, ter a projeção de uma RO [rodovia estadual] e, nesse local já havia, na imagem do satélite, uma derrubada, que provavelmente era pasto...” (SILVA. Depoimento, 06/09/2013).

Depois de algum tempo, durante uma inspeção em toda a área da Gleba, puderam constatar que a derrubada mostrada na carta imagem era, de fato, uma grande área de pastagem, porém inexplorada e abandonada. Decidiram, então, pela escolha do descampado como local aonde iriam instalar as bases da agrovila, o Núcleo Urbano, hoje Distrito União Bandeirante.

Com o pré-projeto contratado para a demarcação dos 104 mil hectares remanescente dos Seringais Bom Futuro, Janaiaco e São Francisco, (Cf. Anexo IV) efetuaram o pagamento da primeira parcela dos serviços contratados, no valor R$ 1.000,00. Os R$ 4.000,00 restantes foram quitados na entrega definitiva do projeto. Serviram de testemunhas, assinando o recibo de pagamento, juntamente com o contratado, os associados Edmilson Penha da Silva, José da Silva Pires e Orlenildo Souza da Silva, (Nildo), secretário da ASCOAGRO, (Cf. Anexo IV).

Com o croqui em mãos, (Cf. Figura 5), os idealizadores do projeto deram início ao recrutamento dos posseiros, primeiramente, nas regiões de Jaru e Ouro Preto, onde residiam Édmo, Júnior Baiano, Orlenildo, Vilson Marques e outros integrantes do grupo e, depois, em todo o Estado de Rondônia, conforme eram procurados por outros interessados, em razão da disseminação da fofoca, do disse me disse sobre as terras férteis do Mutum Paraná, no município de Porto Velho.

Simultaneamente contrataram os serviços de topografia e de demarcação dos lotes rurais com o topógrafo Takanobu Kogarasu, (15/05/1948), imigrante japonês. Ele, conforme sua declaração, imigrou do Japão, da região de Osaka, entrando no Brasil pelo Porto de Belém, indo depois se fixar na região de Manaus e, finalmente, em Porto Velho, por volta de 1978. Durante todo esse tempo no Brasil, prestou serviços de topografia na demarcação de lotes rurais para o INCRA e particulares, familiarizando-se com os desafios da floresta Amazônica e o seu clima tropical.

Em Jaru, revelou-nos Kogarasu, conheceu Édmo Ferreira, Orlenildo Souza e Edmilson Penha da Silva que lhes apresentaram o projeto de abertura da GJTO. Interessou-se de pronto pelo desafio, sendo imediatamente contratado pela equipe para demarcar parte da área. Foram estabelecidos como honorários profissionais R$ 600,00, por km abertos de linhas e travessões, demarcados segundo o projeto de execução do loteamento.

Colhem-se, sobre isso, das declarações de Édmo Ferreira Pinto, prestadas ao Ministério Público Federal:

O senhor Luiz Cláudio Fernandes, após contatos com o INCRA concluiu o pré-projeto no meio do mês de julho de 200040. Ainda no mês julho de 2000

a Associação contratou um topógrafo, conhecido por Takanobu, e já começaram os trabalhos para demarcar as terras. Foram também contratados o topógrafo Dirceu e outros (Depoimento de Édmo Ferreira Pinto, Procuradoria da República no Estado de Rondônia, 2002).

Então, no dia 25 de junho de 2000, pela hora do almoço, Kogarasu bem observou o posicionamento do sol a pique e consignou na sua “Caderneta de Campo” os diversos horários daquele dia em que se colheram os azimutes, (graus, minutos e segundos), projetados entre o seu teodolito e as balizas de frente e ré, medidas que lhes serviram para dar início à demarcação das Linhas 4, F, Triângulo e Travessões. No dia da entrevista (10/04/2014), trouxe consigo quatro “Cadernetas de Campo” entregando-as com discrição e muita emoção. O relicário, guardado por tanto tempo pelo zeloso profissional, carcomido pelas intempéries do clima úmido da Amazônia, serviria, agora, à historiografia, como fonte primária. Diria a mais importante e original “Certidão de Nascimento” do Núcleo rural União Bandeirante, conforme se vê nas Figuras 6 e 7.

Os honorários profissionais, explica o entrevistado, eram-lhe pagos sem nenhum desconto, livres de tudo, de deslocamentos, ranchos, alimentação, remédio, combustível e barraco. A equipe de trabalho, formada de oito pessoas, era constituída de carregadores, mateiros, roceiros, balizadores, piqueteros e cozinheiro. Eram os próprios sem-terra interessados nos lotes que ajudavam a demarcá-los. Não havia trabalho remunerado no acampamento. Em razão disso, depois de algum tempo trabalhando no local podiam escolher no trecho que abriam e demarcavam o seu próprio lote, antecipando-se à distribuição, com prioridade sobre os demais interessados contribuintes. A escolha dos lotes era feita mediante

40 Certamente há equívoco de sua parte quando mencionou o mês de julho em lugar do mês de junho/2000.

Prova disso é que o serviço de topografia teve inicio no dia 25/06/2000, conforme anotações do próprio punho de Takanobu Kogarasu em sua “caderneta de campo.”

sorteio entre os inscritos. Os membros de uma mesma família, ou religião, podiam escolher parcelas juntas, vizinhas. (Depoimentos de SILVA, 2013; PINTO, 2013 e OLIVEIRA, 2013).

Ainda quanto à divisão dos lotes e a forma de trabalhos adotados pela ASCOAGRO, bastante esclarecedor é o registro feito pelo Édmo Ferreira, Dindinho, em 2002, no Ministério Público Federal:

1º - Separavam os associados por grupo; 2º os grupos eram divididos de acordo com o interesse das pessoas em determinado perímetro; 3º quando o topógrafo se dirigia para demarcar um perímetro o respectivo grupo auxiliava os trabalhos; 4º a pessoa do grupo, de acordo com que ia sendo demarcado os lotes, escolhiam o lote de seu interesse; 5º A ASCOAGRO atuava somente quando havia problemas como duas pessoas interessadas pelo mesmo lote; 6º quando o dono do lote saia para trabalhar fora, com intenção de juntar dinheiro para investir no lote, a ASCOAGRO protegia o lote para que ninguém invadisse; 7º a associação também organizava os mapas, anotando para cada lote o respectivo nome do proprietário... (depoimento de Édmo Ferreira Pinto, Procuradoria da República no Estado de Rondônia, 2002). (SILVA, JB, s/d).

Inicialmente, havia a cobrança de uma taxa dos pretendentes adquirentes de lotes, em valores fixados entre R$ 5,00, R$ 15,00 até R$ 75,00, mensal, por lote de 50 hectares (500 metros de frente por 2.000, de fundos); esse valor era arrecadado para pagamento dos serviços de topografia e demais despesas de rancho, medicamentos, barracão, combustíveis e outros, entregues às lideranças do acampamento, como doação à ASCOAGRO. Ver sobre isso os esclarecimentos de Orlenildo:

Era exatamente a liderança que arrecadava esse dinheiro, porque a gente tinha que vir ao INCRA procurando alguns outros meios de angariar recursos, inclusive na CONABE, para ver se conseguia alguma alimentação para o acampamento, que começava aquele fluxo de gente, indo e voltando e a gente tinha que manter essa alimentação. Então essa pequena ajuda era para custear tanto de passagem, tanto como a despesa da própria organização, e do próprio movimento. (SILVA. Depoimento, 06/09/2013).

Houve, igualmente, contribuições financeiras e materiais de empresários, madeireiros, fazendeiros e outros interessados, com maior poder aquisitivo, na abertura de estradas e comércio em União Bandeirante. Os terrenos, tanto rural quanto urbano, eram adquiridos diretamente com os diretores da ASCOAGRO, encarregados da ocupação. É o que ouvi de entrevistados e diversos moradores radicados no Distrito.