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Projeto Geo-Escola: enquadramento em espirais de inovação

Capítulo 5: ETAPAS DE UMA BUSCA POR INOVAÇÃO EDUCACIONAL

5.1 Projeto Geo-Escola: enquadramento em espirais de inovação

Desde os primeiros movimentos do projeto Geo-Escola até agora, ao longo de cerca de dez anos, buscamos dialogar com professores e estudantes das escolas para promover melhor aproveitamento das Geociências com apoio das TICs (BARBOSA, 2003; PIRANHA, 2006; MALAQUIAS JR, 2013; LIMA, 2013). Embora não utilizássemos diretamente referenciais teóricos de inovação, buscamos em todas as oportunidades, em conjunto com os professores, facilitar a criação de situações novas de ensinoaprendizagem. Os caminhos para isso evoluíram de, em um primeiro momento, desenvolver os materiais de apoio didático em “off” e enviar os CDs com os materiais aos professores de diferentes escolas pelo correio (BARBOSA, 2003), até compartilhar com os professores e estudantes a experiência de trabalhos de campo, de elaboração de mapas e de elaborar atividades abertas disponíveis no website, perdendo-se de vista como o material seria efetivamente aproveitado (MALAQUIAS, JR, 2013). Esse conjunto de experiências converge para uma das dimensões da proposta: a de que a inovação deveria partir de iniciativas internas das instituições mas que apoio externo de equipe da universidade em projeto colaborativo pode em muito facilitar.

Inicialmente preocupados com a aferição inicial de requisitos, buscamos os interesses dos professores de Geografia e Ciências na escolha de temas geocientíficos a serem abordados (BARBOSA, 2003). Em consulta por meio de cartas enviadas a mais de uma centena de instituições de nove municípios diferentes, os professores mostraram-se interessados em desenvolver tais temas com os estudantes e sugeriram conteúdos e uma ordem de prioridade para aplicação. Nas respostas que obtivemos, afloraram os primeiros desafios: indícios claros de que os professores quisessem tratar de temas geocientíficos mas faltavam-lhes materiais de apoio, suporte técnico e formação específica. Para responder aos desafios, passamos a organizar os primeiros materiais solicitados. Produzimos mapas, algumas atividades relacionadas aos mapas, informações geológicas de interesse local, roteiros de campo, sequências didáticas, álbuns de fotografias e textos de apoio. O álbum de fotografias apresentava imagens significativas das áreas estudadas, acompanhado de textos relacionados ao significado geológico de cada uma das fotografias. Interesse maior residia na possibilidade dos próprios professores e estudantes elaborarem seus materiais. Para isso desenvolvemos o “dual” dos materiais: editor de mapas,

editor de álbum de fotografias, editor de sequências de imagens. Desenvolver aulas com base em imagens e sequências de imagens poderia conferir um rico arsenal de novos recursos nas mãos dos professores se se procurasse formas de “pensar por imagens”, e decidir nas estratégias de aula quais imagens e quais discussões deveriam empreender. Entendíamos que isso estaria ao alcance dos professores.

Assim, o desenvolvimento dos materiais teve objetivos diversos: prover os professores de uma base mínima sobre temas geocientíficos; permitir que eles se sentissem mais encorajados a desenvolver seus próprios materiais didáticos e que vivenciassem como as TICs poderiam ser extremamente facilitadoras dessa produção e aplicação. Todos os materiais foram enviados aos professores selecionados em CDs pelo correio; a essa altura, a interação direta resumia-se a e- mails e telefonemas. Necessitávamos de feedback a respeito dos materiais, do que precisaria ser refeito, reelaborado e, sobretudo, quais os melhores caminhos a seguir de acordo com potencial de aplicação real em sala de aula ou laboratório de informática. Devido ao baixo retorno que obtivemos acerca do aproveitamento efetivo do material junto aos estudantes, ficou clara a necessidade de maior aproximação com os professores; deveríamos ter momentos de interlocução direta e comparecer pessoalmente nas escolas. Isso permitiria mapas mais detalhados, álbuns mais focados nas situações de interesse local e outras iniciativas vinculadas às necessidades específicas dos professores. Evitávamos receitas prontas e buscávamos estar o mais próximo possível da realidade das escolas, de forma a ajustar as estratégias de acordo com os rumos que as interações pudessem sugerir. O Projeto Geo-Escola passava a mirar um coletivo de escolas em um mesmo município, sem discriminar disciplinas dos professores ou séries com as quais estivessem envolvidos. Isso resultou em um conjunto de bases teóricas que a partir dali procuraríamos perseguir (CARNEIRO et al., 2007).

No Projeto Geo-Escola, a cada “giro” do projeto em um mesmo município, ou a cada novo módulo (conjunto de ciclos) em novo município, aperfeiçoamentos foram feitos e discutidos junto aos professores das escolas com crescente riqueza de detalhes: possibilidade de criação de uma cultura de sustentabilidade (PIRANHA, 2006); de envolver professores de um mesmo município com interesses voltados a questões ambientais (MALAQUIAS JR, 2012); de aproximar estudantes conteúdos da Geologia por meio de aulas de Geografia (LIMA, 2013).

Podemos dividir a maturação do material produzido e das experiências em cada módulo em ciclos de vida compostos por: extrair necessidades, desenvolver protótipos, obter a validação dos professores e estudantes, planejar novos passos e repetir o processo até obter versões aproveitáveis dos “produtos”. Evidentemente, estávamos diante de processo cíclico, autoinclusivo, claramente evolutivo, que poderia ser representado por uma espiral, baseado, por exemplo, em quatro quadrantes que lembram desenvolvimentos de produtos em empresas: (i) objetivos e requisitos dos clientes são delineados, (ii) riscos são calculados; (iii) protótipos são desenvolvidos e (iv) ocorre validação do produto pelos clientes. Todos esses estágios se repetem em ciclos de espiral e convergem a um protótipo-produto e o término do projeto (BOHEM, 1998) junto a um grupo, escola ou município, ficando disponível para a comunidade. Entretanto, as interações humanas em ambiente educacional não cabem em esquemas de desenvolvimento de produtos. Como seria de esperar em um ambiente educacional, havia ambivalências e algo dialético envolvido: em certos momentos, por exemplo nas saídas de campo, concepções mudavam de lado, professores das escolas ajudavam a definir as atividades esclarecendo particularidades dos locais visitados, o tempo todo conversavam sobre como seria voltar ali e conduzir seus próprios estudantes em trabalhos de campo. A equipe da universidade, “perturbada” por descobertas em campo junto aos professores, retornou posteriormente ao campo em duas ocasiões, em Campinas e em Monte Mor. O conhecimento dos professores inicialmente oculto, em meio a experiências compartilhadas, aflorava de diversas outras formas. Sentíamos que o projeto poderia se aprofundar, movimentar mais pesquisadores, estudantes e professores, gerar mais reflexões sobre as acões e a própria razão das Geociências e da tecnologia na escola, por exemplo30.

Quando encerramos a experiência em Monte Mor (MALAQUIAS, JR, 2012) necessitávamos de categorias de análise comuns para avaliar os sucessivos módulos do projeto e para avançar o trabalho em outras direções. Encontramos suporte em uma lógica de desenvolvimento de inovação em empresas, com valorização de fatores humanos, entre eles o conhecimento pessoal. A ressonância com o Projeto Geo-Escola surgiu da percepção de que estávamos contribuindo para converter conhecimentos tácitos dos professores em conhecimentos

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explícitos sem perceber, de que alimentávamos processos de conversão quando procurávamos expandir as descobertas por meio do website, das reuniões, dos trabalhos de campo, de que os fatores de inovação estavam presentes em todos os momentos da interação com as escolas conveniadas nas conquistas e derrotas, apenas não os tínhamos identificado de forma sistematizada.

Em lugar de ser um output final, o término do Projeto Geo-Escola poderia ser o input para iniciativas de inovação mais abrangentes e aprofundados, concebidos, planejados e executados pelos professores (figura 10).

Podemos estimar que realizávamos os primeiros ciclos na espiral de inovação e que os giros subsequentes resultariam das ações dos professores sem depender demasiadamente dos pesquisadores da universidade, a inovação poderia prosseguir tendo a equipe da universidade como suporte. Sob a perspectiva da inovação educacional, isso se torno um princípio para estabelecer parceria entre universidade e escolas por meio de projetos colaborativos: gerar frutos que possibilitassem caminhadas de inovação independentes pelas escolas parceiras.

Figura 10. Projeto Geo-Escola desenvolve colaborativamente inovações incrementais que podem convergir para inovações radicais ou disruptivas

Ainda sem aplicar diretamente o modelo de inovação de Nonaka (2008) ou as ideias de Polanyi (1963) que desconhecíamos, extraímos um conjunto de padrões ou fatores de interferência que se repetiram entre os módulos e mesmo as lacunas que detectávamos apareciam de formas semelhantes. Ao conhecer os modelos de Nonaka e adaptá-los, pudemos empregá-los como um conjunto de categorias para interpretar experiências passadas e também planejar ações futuras.

A seguir adotaremos a tabela de inovação como uma matriz interpretativa, para focalizar aspectos das experiências vivenciadas, e, em um continuum, no capítulo 6, propor um modelo de articulação entre professores, Geociências e as TICs na perspectiva da inovação. Dependendo da experiência (Campinas, Teia do Saber ou Monte Mor) alguns fatores aparecem com maior ou menor relevância; quando um fator não é considerado, não significa que não exista, apenas que não fomos capazes de apurá-lo. Além disso, uma mesma situação pode estar ligada a mais de um fator e o grau das correlações entre eles pode variar. Embora o uso dessas referenciais seja utilizado para avaliar experiências passadas, entendemos que os fatores além de categorias de analise, podem servir como parâmetros interessantes em novos desenvolvimentos.