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Capítulo 4 Projetos do setor educacional entre o Banco Mundial e o Brasil:

2. Projetos do setor educacional

2.1 A fase de ajustamento da parceria Banco Mundial e Brasil

2.1.1 Projeto de Inovações em Educação Básica

O projeto de inovações em educação básica (IEB) começou a ser formulado em 1988, com o intuito de apoiar a reforma curricular operada no ensino fundamental da Grande São Paulo – ciclo básico - e o aumento do tempo do estudante na escola para 5horas – jornada única. Aprovado em junho de 1991 e efetivado a partir de janeiro do ano seguinte, o projeto visava melhorar a aprendizagem do ensino primário e a retenção escolar entre as famílias pobres, e de imigrantes, por meio:

• De nova abordagem curricular – o ciclo básico – e jornada única para os dois primeiros anos da escola primária;

• Da expansão da pré-escola para crianças pobres;

• Do reforço a programas de saúde;

• Do fortalecimento das instituições que gerenciam o ensino primário no Estado de São Paulo e municípios.

O custo final da operacionalização de tais metas alcançou a cifra de 601,3 milhões de dólares, 58% desembolsados pelo governo brasileiro, 2% por municípios e 40% de contrapartida do BM. O valor das emissões foi dividido em seis componentes:

• Incremento da qualidade (80%) – treinamento de professores, construção e expansão das unidades escolares, programa de alimentação.

• Educação pré-escolar (11,9%) – com foco em crianças pobres e apoio de ONGs.

• Saúde na escola (5,7%) – testes anuais de visão e prevenção de saúde bucal.

• Avaliação (0,6%) – acompanhamento da execução do projeto e seus resultados.

• Desenvolvimento institucional (1,4%) – assistência técnica no planejamento e avaliação escolar, estudos sobre municipalização da educação primária e parcerias público-privadas.

• Administração do projeto (0,3%) - suporte de gerenciamento por meio da Unidade de Coordenação de Projetos.

Nos componentes mencionados, a qualidade proposta pelo IEB relaciona-se com infraestrutura educacional e em menor medida melhoramento de recursos humanos. Delineando assim a educação baseada em resultados e sistemas avaliativos, em observância às diretrizes de retorno financeiro estimuladas pelo staff do BM em 1980. O investimento em capital humano, que adquire retórica abrangente no fim do século XX, sinaliza a incorporação do viés economicista nas diretrizes educacionais propostas pelo Banco, e ganha reflexo na denominação de qualidade como “espaço propício para aprendizagem”. Tal percepção demonstra que, para o BM, o crescimento econômico e o incremento da infraestrutura – sinalizados na primeira agenda do desenvolvimento quando da afirmação e consolidação da instituição – ainda persistem como condicionantes de sua ação prática.

O IEB previa uma abordagem “holística” – termo utilizado pelo BM no relatório de avaliação – congregando setor privado, ONGs, governo federal e municipal como agentes no movimento de realização dos componentes acima listados. Tal “crença otimista” resultou, na visão do Banco, em problemas de efetivação do projeto, em particular entre 1991 e 1995. Isso, porque, a falta de capacidade administrativa para integrar os diferentes atores, bem como a reduzida capacidade do Estado brasileiro em cumprir com a contrapartida financeira esperada, fizeram com que o BM propusesse o cancelamento da iniciativa, em 1995.

No entanto, a alteração nas diretrizes da Secretaria de Educação do estado de São Paulo fez com que o projeto fosse executado de forma efetiva a partir de 1996 (WORLD BANK, 1999). Segundo relatório do Banco, a administração local e o apoio

da ONU, entre outros atores, foram fundamentais para a continuidade do IEB depois das negociações e pressões do BM para otimizar os custos e o tempo de execução do projeto. Este foi encerrado em abril de 1999, tendo alcançado, de modo geral, os objetivos assinalados inicialmente (WORLD BANK, 1999).

Percebe-se na exposição do Banco acerca da realização do projeto, a crítica à ineficiência do Estado brasileiro, que somente com reformas garantiu a sustentação do IEB. Ademais, o Banco caracteriza seu papel tutelar como indutor de tais transformações institucionais, realizando pressões junto às instâncias deliberativas. Vale mencionar, que no fim da parceria de ajustamento entre BM e Brasil, a visão da OI acerca do cenário político e econômico do país balizava-se no descontentamento e no incentivo a reordenações.

Segundo avaliação do Banco, o IEB contribui com a redução das taxas de evasão e repetência a partir da implementação de um sistema contínuo de avaliação dos estudantes (WORLD BANK, 1999). Ademais, o projeto superou suas metas de investimento para treinamento de professores e materiais didáticos; apoiou alunos repetentes; contribuiu para aumentar a eficiência da educação por meio de emissões em tecnologia da informação; e colaborou para a redução da segregação por renda a

partir do financiamento de escolas de reabilitação (WORLD BANK, 1999). Para o

Banco, somente as questões de saúde e educação infantil não alcançaram resultados esperados.

Destaca-se aí que, a equidade para o BM é tratada em termos de acesso ou incremento em capital humano, gerando oportunidades para o pobre inserir-se economicamente. A educação, portanto, é admitida como um serviço que capacita o indivíduo, desvinculando-se da noção de educação como um direito básico – como afirmado pelas agências das Nações Unidas – apresentado no capítulo 1.

Ao primar por educação e saúde, o IEB dialoga com o RDM de 1990, que apresenta tais temas como centrais para o combate à pobreza. No entanto, a avaliação do projeto demonstrou a fragilidade como tais questões são abordadas no caso particular, as quais dependem de condições favoráveis de execução no mutuário e diálogo do BM com o parceiro, a fim de diminuir os riscos da operação.

O Banco salienta os programas estruturados pela secretaria de educação e sustentados pelo IEB, os quais em sua maioria lograram continuidade: classe de aceleração, com atendimento especial para crianças repetentes; educação continuada, para treinamento de professores no decorrer do ano letivo; sistema de avaliação do rendimento escolar (SARESP), instrumentalizado em testes anuais realizados sequencialmente por estudantes de um determinado grau; reorganização escolar, revitalização do espaço escolar e reordenamento dos turnos por idade escolar etc.; gestão educacional, instrumentalizada na criação de delegacias de ensino, no movimento de descentralização e uso de tecnologias da informação; merenda escolar, a fim de incrementar a nutrição dos estudantes (WORLD BANK, 1999). Estes evocam o caráter “spill-over” 214 dos projetos educacionais do Banco, que se caracterizam por

medidas de impacto que transcendem as ações da OI, tornando-se prática do Estado brasileiro.

No que se refere às partes envolvidas no convênio, o BM define sua atuação como satisfatória, entretanto, reitera que o governo brasileiro não realizou seu compromisso antes de 1995 (WORLD BANK, 1999). Tal fato provocou, segundo avaliação do Banco, atraso na efetivação das melhorias para a aprendizagem no ensino primário da grande São Paulo. Nesse sentido, define-se como prejudicial o excesso de rotatividade dos envolvidos no IEB junto às instâncias federais e municipais. Ademais, a OI sinaliza que as iniciativas necessitam de maior flexibilidade, acompanhamento e apreciação contínuos, a fim de que os mutuários cumpram os acordos assumidos e priorizem a viabilização e otimização dos projetos (WORLD BANK, 1999).

Ou seja: o Banco prescreve o caráter fulcral da eficiência externa e interna da educação e seus projetos, mas na prática tal ideal não encontra eco. Como saída de tal impasse, a crítica incide sobre o Estado brasileiro e sua ineficiência administrativa; reservando ao BM a imagem positiva de agência promotora do desenvolvimento, com vantagem comparativa para induzir políticas sociais em âmbito internacional – assertiva que evidencia-se no documento de políticas educacionais de 1999, RDM 2000/2001 e no CAS publicado em 2000.

214 Referência à idéia do spill-over effect, construída pelos teóricos funcionalistas das RI. Esta faz menção

ao efeito gradual da obtenção de vantagens por meio da cooperação internacional que corroboraria com práticas legitimadas, com base na escolha racional.