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5 EDUCAÇÃO ESCOLAR QUILOMBOLA NA ESCOLA DE EDUCAÇÃO

5.2 O Projeto Político Pedagógico

O Projeto Político Pedagógico da Escola Maria Virgem da Silva está orientado pela Política educacional vigente, sobretudo pelos planos Nacional, Estadual e Municipal de educação, com orientações do MEC, Secretaria da Educação Básica do Ceará – SEDUC, Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educação – CREDE 18/ Crato – CE, Secretaria Municipal da Educação e na contribuição de renomados teóricos, tais como Piaget e Vygotsky, assim consta no Projeto Político Pedagógico da escola.

Respaldado na Resolução 451/2014 do Conselho Estadual de Educação / CEE – CE, em consonância com o disposto na Constituição Federal, Artigo 206 a 208, Inciso IV, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, em conformidade a Lei nº. 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente e na Lei 12.796/2013.

As escolas quilombolas devem ser regidas pelas leis que regem a educação no Brasil, pelo Plano Nacional de Educação, Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9.396/1996 (LDB), observando principalmente o artigo 26 A, que torna obrigatório o ensino sobre História da África, dos africanos e dos afro-brasileiros, assim como a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, enfatizando a sua contribuição nas áreas sociais, econômicas e políticas, incluídos pela Lei 10.639/3003.

Devem também observar o artigo 79 B da LBD, que fica garantida a inclusão no calendário escolar o dia 20 de novembro como o dia da Consciência Negra. O Projeto Político Pedagógico das escolas quilombolas deve rejeitar os moldes de currículo padronizado. É importante saber que o que guia a escola são as relações étnico-raciais, considerando a identidade dos educandos e dos que frequentam o seu espaço.

No entanto, o que tem ocorrido com os currículos das escolas quilombolas é que seguem o mesmo padrão de uma escola regular, e isso esbarra diretamente na formação continuada de professores e gestores, assim como na distribuição de materiais específicos pelo MEC e Secretarias de Educação Estadual e Municipal. Ressalvamos que a formação para fundamentar a educação escolar quilombola é específica, é para além da formação oferecida para educação no campo, pois é necessário observar as questões étnicas, embora haja pontos de confluências.

O sistema educacional nacional representa um modelo de currículo que tenta uniformizar uma ideia de sujeito e de sociedade com uma representação identitária pautada em uma suposta igualdade. A escola acaba impondo, através do currículo e da prática pedagógica, assim como a partir de todas as relações construídas no seu interior, uma violência que dita uma cultura diferente da realidade a qual os educandos estão inseridos, negando, principalmente, suas experiências étnicas, históricas, social, cultural e econômicas, ou seja, o Projeto Político Pedagógico deve ser, como informa Gomes (2012, p.26),

O projeto político-pedagógico a ser construído é aquele em que os estudantes quilombolas e demais estudantes presentes nas escolas da Educação Escolar Quilombola possam estudar a respeito dessa realidade de forma aprofundada, ética e contextualizada. possam estudar a respeito dessa realidade de forma aprofundada, ética e contextualizada. Quanto mais avançarem nas etapas e modalidades da Educação Básica e na Educação Superior, se esses estudantes forem quilombolas, mais deverão ser respeitados enquanto tais no ambiente escolar e, se não o forem, deverão aprender a tratar dignamente seus colegas quilombolas, sua história e cultura, assim como conhecer suas tradições, relação com o trabalho, questões de etnodesenvolvimento, lutas e desafios.

É preciso considerar uma outra opção de sociedade, independente ou uma sociedade que se descolonizasse cada vez mais, que cortasse as correntes que a faz permanecer como objeto de outras. Hoje isso pode ser considerado um dilema básico que se apresenta de forma iniludível nos países subdesenvolvidos, pois a educação tem a urgência de ser desvestida da roupagem alienada e alienante, para que seja uma força de mudança e de libertação (FREIRE, 2011).

Os conteúdos não podem reforçar os estereótipos dessa sociedade racista, classicista e patriarcal. Para as crianças negras, muitas vezes, o espaço escolar já não é um lugar de prática da liberdade, de prazer ou de ensino-aprendizagem, é mais um ambiente de enfrentamentos ideológicos por não ter uma representação positiva nos livros, nas imagens que ornamentam a escola e na representatividade estética dos eventos que geralmente a escola organiza. Acaba sendo, também, um lugar onde essas crianças precisam buscar estratégias para se defender de atos racistas.

O Projeto Político Pedagógico precisa refletir a realidade social, histórica e cultural da comunidade escolar, precisa ter a “cara” do que acontece no dia-a-dia da escola e no entorno dela, é um reflexo das pessoas que compõem a escola, assim como dos que a frequentam, das narrativas, da história do lugar e, a partir disso, vai reunindo elementos para construir os princípios educacionais, as concepções, o perfil do educador, a metodologia, o planejamento, o funcionamento e a avaliação.

O Projeto Político Pedagógico reúne princípios que vão guiar os trabalhos na escola e que devem estar de acordo com as normas vigentes sobre a educação no Brasil. Neste sentido, o Projeto Político Pedagógico das escolas quilombolas deve estar norteado pelas concepções do que dita a Lei 10.639/2003, o Decreto 4.887 de 2003, o Parecer CNE/CEB, 16/2012, as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Escolar Quilombola (2012) e de acordo com o Concelho Nacional de Educação.

Portanto, diz respeito a um planejamento, que é mais do que uma ação técnica. O Projeto Político Pedagógico é, antes de tudo, o exercício de um ato político. E o projeto das escolas quilombolas e das que atendem alunos oriundos de territórios quilombolas deverá ter uma proposta “transgressora”, que induza um currículo também transgressor, que rompa com práticas ainda inflexíveis, com os tempos e os espaços escolares rígidos na relação entre o ensinar e o aprender e, principalmente, com a visão estereotipada e preconceituosa sobre a história e a cultura de matriz afro-brasileira e africana no Brasil (GOMES, 2012).

Ensinar pode vir a ser um ato teatral e, nesse sentido, o trabalho deve proporcionar mudanças. Para abraçar esse aspecto teatral do ensino, temos que interagir com a plateia, precisamos pensar e rever a questão da reciprocidade, no entanto, os professores não são atores no sentido tradicional do termo, pois nosso trabalho não é um espetáculo, mas deve ser um catalisador que conclame todos os presentes a se tornarem ativos no aprendizado, conhecendo o que está além das fronteiras do aceitável, que permita pensar, repensar e criar novas visões transgressoras que transformem a educação em uma prática libertadora e antirracista (HOOKS, 2017).

Os saberes da docência e os próprios docentes têm, por vezes, estado ausentes dos conhecimentos escolares. Desse modo, os currículos acumulam muitos saberes, mas pouco sabem dos adultos que os ensinam e menos ainda das crianças, adolescentes e jovens que aprendem, e o mais curioso dessa relação é que tanto os mestres como os educandos têm acumulado riquíssimas experiências e vivências de conhecimentos, narrativas, histórias da infância e do local, ou seja, são sujeitos de história sem o direito a conhecer a sua própria (ARROYO, 2013).

A fetichização do currículo para professores, alunos e teóricos educacionais é, antes de mais nada, uma coisa que se carrega, que se transmite, que se transfere, é uma lista de tópicos, de temas, de autores, é uma grade. No entanto, o currículo é um fetiche a ser exposto, revelado, denunciado e que a tarefa do crítico educacional é desfetichizá-lo e significa evitar um currículo esquizofrênico, em que certos tipos de conhecimentos são considerados como sujeitos à interpretação e ao conflito, enquanto outros são vistos como

relativamente independentes de controvérsias e disputas, portanto, ver o currículo como fetiche é reconhecer as características comuns de todas as formas de conhecimento (SILVA, 2010).

Tomando como referência o que tem sido considerado nos currículos, a partir das produções que regem Diretrizes e Parâmetros, percebe-se, pelo olhar da etnometodologia, que muitos atores sociais acabam sendo percebidos como “idiotas culturais” na cena curricular. Uma inflexão epistemológica e política quando nos propomos a trabalhar com o dispositivo teórico-prático e tratar não sobre pessoas e culturas, mas trabalhar com elas, faz muita diferença na medida em que os atos de currículos não são propriedades institucionais ou políticos, porque temos o entendimento de que essa perspectiva etnocêntrica e excludente realizou um grande e pesado projeto civilizatório que tomou para si o direito de falar sobre determinados conhecimentos (MACEDO, 2013).

5.3 A formação pedagógica de gestores e professores e a gestão da escola: do perfil