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A PROPOSTA DE FRANCO (1999)

No documento Clíticos no português brasileiro (páginas 53-59)

2. OS CLÍTICOS PRONOMINAIS À LUZ DA TEORIA DA GRAMÁTICA GERATIVA: I PARTE

2.2. AS QUESTÕES EM DESTAQUE: O ESTATUTO, A POSIÇÃO DE ORIGEM E O MOVIMENTO DO CLÍTICO

2.2.2. A PROPOSTA DE FRANCO (1999)

Franco (1999) postula que os clíticos objetos são morfemas de concordância verbal, isto é, afixos flexionais (cf. Zwicky (1985) e Everett (1996)), com o propósito de dar conta das construções com redobramento pelo clítico em espanhol. Mas, ao contrário da idéia de gerar o clítico como um tipo de afixo na posição em que aparece superficialmente, deduz que ele é gerado numa posição Agr. Desta posição o clítico se move para junto do verbo por necessitar checar traços.

Para sustentar sua proposta, Franco apresenta algumas evidências. Uma delas diz respeito à adjacência que se observa entre o clítico e o verbo, propriedade que pode ser notada em (10):

(10) a. *Juan lo ya vio. João o já viu. b. Juan ya lo vio. João já o viu.

Como revela a agramaticalidade de (10a), um outro constituinte não pode intervir entre o verbo e o clítico. Estes dois elementos devem ocorrer juntos formando uma única unidade, como em (10b).

Uma outra evidência que favorece a idéia de que o clítico é um afixo pode ser constatada em (11):

E, como o artigo (ic), o pronome demonstrativo também não se move (id) porque à direita de ambos, nas posições em que são gerados, há elementos acentuados com os quais são

(11) a. Alfredo la trajo del Perú. Alfredo a trouxe do Peru.

b. La trajo Alfredo del Perú de verdad? Trouxe-a Alfredo do Peru de verdade?

Se alguma operação sintática afeta o verbo, como o movimento que ele sofre na interrogativa de (11b), cujo resultado é uma ordem inversa daquela que se observa em (11a), o clítico também se submete ao processo já que permanece adjunto ao verbo.

Um processo semelhante ao de (11b) ocorre nas construções em que o verbo auxiliar se move para Comp (cf. Rizzi (1993)), como em (12a):

(12) a. Avendola Gianni restituita al direttore, ... Tendo-a Gianni restituída ao diretor, ... b.*Avendo Gianni la restituita al direttore. Tendo Gianni a restituída ao diretor, ...

A impossibilidade de uma estrutura como (12b) evidencia que, quando o verbo finito se move para uma posição mais alta do que aquela em que se encontra o clítico, o verbo o leva junto, resultando em (12a). Esse tipo de restrição também se verifica no português europeu, como em (13a) (cf. Torres Morais (1995)):

(13) a. Tendo-a o João encontrado no carro, ... b. *Tendo o João a encontrado no carro, ...

Outro argumento em favor da proposta de Franco é baseado na rigidez que se observa no posicionamento e na ordem dos clíticos quando mais de um ocorre na sentença. Essa particularidade se observa em algumas línguas românicas, por exemplo, no italiano, como vimos no primeiro capítulo, de onde retomamos (14):

(14) a. Emanuela glielo vuole presentare. Emanuela lho quer apresentar. b. Emanuela vuole presentar- glielo. Emanuela quer apresentar- lho. c. *Emanuela lo gli vuole presentare.

Emanuela o lhe quer apresentar. d. *Emanuela vuole presentare lo gli. Emanuela quer apresentá-lo lhe.

Se há dois verbos na sentença e mais de um clítico, eles poderão ocorrer apenas em dois lugares: em adjacência antes do verbo finito (14a) ou depois do verbo infinitivo (14b). Quanto à ordenação dos clíticos em italiano, o dativo tem sempre que preceder o acusativo, como vemos em (14a) e (14b), em contraste com (14c ) e (14d). No espanhol (15), a ordem dativo + acusativo também é verificada:

(15) a. Juan me las enviará. João me as enviará.

b. *Juan las me enviará. João as me enviará. c. Juan se lo mandó. João se o mandou. d. *Juan lo se mandó. João o se mandou.

Essa rigidez de ordem e de posicionamento que vimos em (14) e (15), segundo Franco, é um aspecto característico de afixos flexionais, fortalecendo então a proposta de que o clítico pertence a esse tipo de categoria.

Para explicar o lugar de origem dos clíticos que aparecem, por exemplo, em (15a), Franco, adotando Baker (1988), PollocK (1989) Chomsky (1993) e (1995), entre outros, propõe a estrutura (16):

Como se pode notar, o clítico é gerado no núcleo da projeção Agr: o acusativo no núcleo de AgrOD e o dativo no núcleo de AgrOI.

Quanto às posições canônicas dos objetos em (16), observe-se que elas são ocupadas por dois pro: um co-indexado com o clítico dativo e o outro com o acusativo. Quando a construção for de redobramento pelo clítico, a posição do objeto não será mais ocupada por um pro, mas sim por um DP lexical, como ilustra (17a), onde o objeto indireto é redobrado pelo clítico dativo, ou como ilustra (17b), com o objeto direto redobrado pelo clítico acusativo, ambas as estruturas representadas, parcialmente, em (18) e (19):

(17) a. Juan lei dio la nota a Pedroi.

b. Las i invitamos a ella i y su hija para el próximo martes.

As i convidamos a ela i e sua filha para a próxima terça.

De acordo com Franco não é somente o clítico que se move para checar traços. O objeto com qual o clítico está co-indexado também. O objeto indireto se move para o Spec de AgrOI e o direto, para o Spec de AgrOD, desencadeando a concordância entre Spec e núcleo, isto é, entre o clítico e o objeto.

Em suma, nesta proposta o autor defende que o clítico, por ser um morfema de concordância6, deve ser gerado no núcleo de um Agr

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Groppi (2000), ao analisar dados do espanhol, apresenta uma proposta que difere da de Franco. Ela defende que o clítico não é um elemento de concordância, baseando-se na opcionalidade da presença do clítico, como indicam os exemplos que se seguem:

(i) a. Lo vi. Vi- o. b. Vi a Juan. Vi ao João. c. Lo terminé. Terminei-o. d. Terminé el trabajo. Terminei o trabalho.

Se o clítico fosse um elemento de concordância não poderíamos ter as opções representadas em (ib) e (id), porque a presença do clítico seria constante, obrigatória. Segundo a autora, o clítico é um elemento lexical e, por isso, é gerado numa posição temática. Por razões morfológicas ele se move; caso contrário, a derivação não convergiria.

correspondente. Dada a sua natureza nuclear, o clítico deverá se mover e se incorporar ao lado de um verbo com o qual formará um amálgama.

No documento Clíticos no português brasileiro (páginas 53-59)