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CAPÍTULO I FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

6. PCN-LE e Proposta-LEM

6.2 Proposta LEM

Detalharemos, nesta seção, os objetivos e pressupostos teóricos que embasam a Proposta-LEM para podermos analisar, posteriormente, a abordagem do Caderno do Professor para o ensino de inglês na escola pública por meio das atividades propostas e orientações presentes nos mesmos.

A Proposta-LEM (2008) foi um documento criado pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP) para possibilitar a organização de um currículo de ensino para os níveis de Ensino Fundamental – Ciclo II e Médio, em todo o Estado de São Paulo. Além do currículo, integra a Proposta um documento de Orientações para Gestores do Currículo da Escola, dirigido aos diretores, assistentes técnico-pedagógicos, professores coordenadores e supervisores, assim como um LD destinado aos professores - os Cadernos do Professor e, a partir de 2009, também os Cadernos do Aluno, conforme mostra o Quadro 8 a seguir:

Quadro 8: Materiais que compõem a Proposta-LEM

Materiais que compõem a nova Proposta Curricular de LEM

Proposta Curricular Caderno do Professor

Caderno do Gestor Caderno do Aluno

A Proposta é constituída por um conjunto de princípios orientadores, cujo intuito é promover as competências indispensáveis ao enfrentamento dos desafios sociais, culturais e profissionais do mundo contemporâneo, priorizando as competências de leitura e escrita.

O intuito da Proposta é promover uma educação que possibilite a “construção da identidade, da autonomia e da liberdade” (SÃO PAULO, 2008, p. 11) do aprendiz, para que este transite entre o local e o mundial, tanto socioculturalmente quanto linguisticamente.

Para que este objetivo seja atingido, é necessário que o aprendiz participe de práticas sociais distintas com e na língua para ampliar suas possibilidades de interação e informação, uma vez que os conhecimentos exigidos na atualidade ultrapassam o simples domínio das regras da mesma forma que a comunicação por meio de funções, como podemos verificar no excerto:

o conhecimento de natureza enciclopédica, sem significação prática, é substituído por conteúdos e atividades que possibilitam não só a interação do aluno com sua sociedade e o meio ambiente, mas também o aumento do seu poder como cidadão, propiciando maior acesso às informações e melhores possibilidades de interpretação

das informações nos contextos sociais em que são apresentadas (SÃO PAULO, 2008, p. 37).

Além de promover a interação e ampliar seu poder como cidadão, de acordo com a Proposta-LEM é necessário que o ensino possibilite ao aprendiz ampliar sua capacidade de representação, comunicação e expressão por meio de outras linguagens, como gráficos, esquemas, diagramas, fotografias, desenhos, hiperlinks etc., uma vez que atualmente as formas de leitura e escrita não acontecem mais apenas por intermédio do texto.

Em razão da multimodalidade, da união de diversas formas de expressão em um mesmo meio, passou a ser necessário construir sentido a partir de um todo, como propõe Morin (2000) citado por Mattos e Valério (2010, p. 146), refutando, assim, o modo de “organização curricular conteudista, compartimentada no desenvolvimento de cada uma das quatro habilidades (leitura, escrita, compreensão e produção oral) de modo isolado”. Por esta razão, a linguagem passa a ser “uma forma de compreensão e ação sobre o mundo” (SÃO PAULO, 2008, p. 17) e não mais decodificação.

Especificamente para o ensino de língua inglesa, é importante “construir um conhecimento sistêmico sobre a organização textual e sobre como e quando utilizar a linguagem em situações de comunicação” (SÃO PAULO, 2008, p. 38). É preciso construir uma consciência linguística e uma consciência crítica dos usos da língua para poder agir no mundo.

É possível verificar no documento, ainda, uma perspectiva pluricêntrica de ensino, ou seja, nele é considerada a diversidade linguística dos diferentes povos falantes da língua-alvo e os conhecimentos e experiências que o aprendiz traz da sua língua materna.

Para elucidar a perspectiva teórica que embasa a Proposta-LEM, há uma breve discussão sobre a abordagem, nomeada pelo documento de “orientações metodológicas” (SÃO PAULO, 2008, p. 41), subjacente ao ensino de línguas em três diferentes épocas.

A primeira orientação consiste no ensino estruturalista, no qual era enfatizado o conhecimento das regras da língua (saber), sendo, para isso, propostos exercícios repetitivos de aplicação dessas regras, de forma descontextualizada, além da memorização de listas de vocabulário.

A segunda orientação consiste no ensino comunicativo (fazer), que, segundo a descrição do documento, tem como eixo organizador o uso da língua por meio de funções comunicativas. Há, nesse momento, o trabalho com as quatro habilidades, mas o foco principal recai na habilidade oral.

A terceira orientação consiste no letramento, que propõe uma associação entre o saber e o fazer por meio das múltiplas linguagens e gêneros discursivos, a fim de “promover a autonomia intelectual e maior capacidade de reflexão dos aprendizes, contribuindo decisivamente para a formação cidadã dos educandos” (SÃO PAULO, 2008, p.42). Portanto, o intuito é promover o conhecimento de si e do outro, por meio de diferentes formas de interpretação do mundo em atividades de produção oral e escrita, e não mais privilegiar apenas a gramática ou as funções comunicativas.

Não concordamos com a definição de ensino comunicativo como o uso da língua por meio de funções, como aponta o documento. Compreendemos que o ensino por meio de funções foi privilegiado apenas em um primeiro momento da abordagem comunicativa, mas, ao verificar sua ineficácia quanto ao uso real da língua, adotaram-se novos princípios definidores do ensino comunicativo que, a nosso ver, está em consonância com os pressupostos do letramento.

Para justificarmos o fato de ser possível a aproximação entre os dois conceitos (abordagem comunicativa e letramento), apresentamos a definição de letramento crítico de Norton (2007), citado por Mattos e Valério (2010, p. 138): “compreender o texto como um produto de forças ideológicas e sócio-políticas, e um „local de luta, negociação e mudança‟”. Para realizar críticas sociais, segundo as autoras, é preciso ter controle do código para negociar significados e transformar. Esse controle pode ser adquirido por meio de um ensino baseado na abordagem comunicativa. Coincidimos com Almeida Filho (2007, p. 36) quando o autor define esse tipo de ensino como sendo

aquele que organiza as experiências de aprender em termos de atividades relevantes/ tarefas de real interesse e/ ou necessidade do aluno para que ele se capacite a usar a língua-alvo para realizar ações de verdade na interação com outros falantes-usuários da língua.

Mais especificamente, segundo Mattos e Valério (2010, p. 139), a língua é um recurso dinâmico usado para criar significados tanto na abordagem comunicativa como no letramento crítico. A diferença está no fato de que a abordagem comunicativa se ocupa do “teor psico- social da comunicação, enquanto o letramento crítico se debruça sobre seu caráter ideológico, sendo o desenvolvimento da consciência crítica seu principal objetivo”, ou melhor, a primeira proporciona ao aluno de LE interpretar, expressar e negociar significados, sendo o segundo responsável por possibilitar ao aprendiz “transformar a si mesmo e a sociedade”.

Acreditamos, portanto, na complementaridade do ensino comunicativo e na prática do letramento para promover um ensino que priorize a formação do cidadão crítico, competente linguística e socioculturalmente para usar a língua. Por isso, concordamos com as autoras que o letramento crítico poderia ser incluído nas atividades comunicativas se nelas houvesse uma fase que servisse de “insumo para a problematização essencial à crítica social” (MATTOS; VALÉRIO, 2010, p. 149). Desta maneira, para elas, a nova fase enfocaria tanto o desenvolvimento da competência comunicativa como o desenvolvimento da consciência crítica.

Esta seção se destinou a elencar os conceitos principais materializados nos documentos oficiais, PCN-LE e Proposta-LEM, porém, eles não são os únicos documentos analisados nesta pesquisa. Como documentos também consideramos os livros didáticos Caderno do Professor e Keep in Mind, sendo importante, por esta razão, discutirmos algumas das principais características dos mesmos nos próximos tópicos.