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As proteínas do soro têm elevado valor funcional e nutricional não encontrado em outras proteínas utilizadas como aditivos na indústria alimentícia (a proteína de soja e de ovo, por exemplo) e por isso é relevante abordar tais aspectos.

2.4.1 Propriedades Nutricionais

A proteína é um nutriente essencial ao organismo animal e humano e como tal, deve estar presente na alimentação em quantidades adequadas. Além do aspecto quantitativo deve- se levar em conta o aspecto qualitativo das proteínas (SGARBIERI, 1996).

Um fato importante a respeito da nutrição é que oito (nove para crianças) dos 20 aminoácidos não podem ser sintetizados pelo organismo humano, eles são chamados aminoácidos essenciais. Como eles são necessários para manter o metabolismo, eles têm que ser providos através da alimentação (BYLUND, 1995). Uma proteína equilibrada, ou de alta

qualidade, contém aminoácidos essenciais em proporções correspondentes às necessidades humanas (FENNEMA, 1989).

A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) e a Organização Mundial de Saúde (WHO) especificaram a concentração ideal de aminoácidos essenciais que devem ser incluídos na dieta humana (FENNEMA, 1989).

A Tabela 2.5 mostra a concentração de aminoácidos essenciais na proteína de referência e nas proteínas do soro. As proteínas do soro de leite bovino são uma fonte excelente de aminoácidos essenciais: comparando a concentração de referência com a das proteínas do soro, pode-se observar que a fração protéica do soro contém mais aminoácidos essenciais do que a proteína de referência.

Tabela 2.5: Concentração de aminoácidos essenciais na proteína de referência, nas proteínas do soro, na β-Lg e na α-La. Aminoácido Proteína de Referência Proteína do Soro β-Lg α-La Triptófano 1,0 2,1 2,2 6,6 Fenilalanina+tirosina 6,0 7,3 7,3 9,6 Leucina 7,0 11,1 15,3 11,6 Isoleucina 4,0 6,8 6,7 6,8 Tionina 4,0 8,0 5,4 5,5 Metionina+cisteína 3,5 4,8 5,6 6,9 Lisina 5,5 9,9 11,7 11,4 Valina 5,0 6,8 5,9 4,8 Total 36,0 56,8 60,1 63,2

Fonte: adaptado de ZADOW (1992), MILLER et al. (2000)

O perfil de aminoácidos essenciais das proteínas do soro atende ou supera todas as exigências qualitativas e quantitativas estabelecidas pela FAO/WHO. O teor de aminoácidos essenciais de proteínas do soro é maior do que quaisquer outras fontes e correspondem a 60 % do valor protéico total do soro. As proteínas do soro contêm níveis elevados de leucina, lisina,

em comparação ao isolado protéico de soja e a clara de ovo desidratada, ainda possuem uma boa fonte de aminoácidos contendo enxofre, tais como cisteína e metionina(RICHARDS,2002).

Observando a Tabela 2.5 também é possível verificar que, isoladamente, a β-Lg e a α- La, têm um valor nutritivo superior ao da proteína de referência.

A qualidade, o valor ou o balanço de uma proteína alimentar além de depender do tipo e da quantidade de aminoácidos essenciais, depende da sua digestibilidade; representa a medida da eficácia com que pode ser utilizada pelo organismo. Portanto, além da concentração de aminoácidos, devemos ter em conta a sua disponibilidade biológica. A qualidade da proteína pode ser expressa pelos seguintes parâmetros: Valor Biológico (VB) - é a porção da proteína que é retida e absorvida pelo organismo; Digestibilidade Protéica (PD) - é a porção da proteína do alimento absorvida.........; Utilização Protéica Líquida (Net Protein Utilization- NPU) - é a porcentagem de nitrogênio ou proteína dietética que é retida; Coeficiente de Eficácia Protéica (Protein Efficiency Ratio- PER) é o ganho em massa obtido por grama de proteína consumida e PDCAAS (Protein Digestibility Corrected Amino Acid Score) que é a medida da digestibilidade e disponibilidade de aminoácidos essenciais. Na Tabela 2.6 são apresentados estes parâmetros relacionados às proteínas do soro, ao leite e à caseína.

Tabela 2.6: Valores que representam a qualidade nutricional do leite e das suas frações protéicas.

Componente BV* PD NPU PER PDCAAS

Leite 91 95 86 3,1 1,21

Proteínas do Soro 104 100 92 3,6 1,15

Caseínas 77 100 76 2,9 1,23

*BV da proteína do ovo é definido como 100.

Fonte: adaptado de MILLER et al.(2000); YADA (2004).

Como pode ser observado na Tabela 2.6, comparadas as do leite e à caseína, as proteínas do soro têm valores de BV, PD, NPU e PER maiores e valor de PDCAAS comparável, mostrando a elevada qualidade deste tipo de proteína. Devido ao seu elevado

valor biológico são necessárias apenas 14,5 gramas de proteínas do soro por dia para satisfazer as necessidades diárias protéicas, em comparação com 17,4 gramas de proteína do ovo (LAGRANGE &DALLAS, 1997).

Assim, devido à quantidade de aminoácidos essenciais e da elevada qualidade protéica, as proteínas do soro podem aumentar o valor nutricional dos alimentos usados na dieta humana. Muitas proteínas do soro são associadas a funções imunes ou digestivas. Além disso, o soro de leite é uma fonte natural de Ig e de BSA e, como tal oferece proteção contra infecções, pois estimula a produção de linfócitos. Proteínas do soro secundárias como a Lactoferrina e a Lactoperoxidase são consideradas proteínas antimicrobianas (YADA, 2004).

Recentemente, têm sido atribuídas às proteínas do soro propriedades funcionais fisiológicas, capazes de produzir um importante controle na modulação do metabolismo e nos

mecanismos de defesa dos organismos animal e humano (SGARBIERI & PACHECO, 1999;

MATTILA-SANDHOLM &SAARELA,2003).

Ainda, existem estudos sobre o possível papel da α-La na formulação de agentes antitumorais. Uma das funções in vivo da β-Lg parece ser a fixação de retinol e seu transporte ao intestino delgado. A β-Lg e o BSA também podem fixar ácidos graxos (MATTILA-

SANDHOLM &SAARELA,2003).

2.4.2 Propriedades Funcionais

Além das propriedades nutricionais, as proteínas do soro do leite são conhecidas pela versatilidade de suas propriedades funcionais tecnológicas como ingredientes em produtos alimentícios.

As propriedades funcionais das proteínas do soro são as propriedades físico-químicas, que contribuem para obter uma determinada característica no produto alimentar final em que são inseridas (SGARBIERI,1996).

As proteínas do soro têm propriedades físicas e funcionais no seu estado nativo e após tratamento físico, químico ou enzimático (absorção de água, solubilidade, emulsificação entre outras), devido às várias estruturas conformacionais que possuem e/ou adquirem. São moléculas estruturalmente ordenadas e qualquer alteração nessa conformação leva à desnaturação. As principais causas são: calor, mudanças de pH, radiação ultravioleta, concentração salina, luz ou ação mecânica. A desnaturação causa uma modificação da conformação globular ou pregueada das proteínas para a forma linear, causando, assim, um desenrolamento da cadeia peptídica. O resultado é a formação de novos enlaces entre moléculas, que tornam as proteínas quimicamente mais reativas (SGARBIERI,1996; BYLUND,

1995).

Depois de uma desnaturação fraca, as proteínas às vezes podem voltar ao estado original, com restauração das suas propriedades originais. Em muitos casos, porém, a desnaturação é irreversível (BYLUND, 1995).

O fenômeno da desnaturação não implica necessariamente diminuição da digestibilidade das proteínas nem à diminuição do seu valor biológico, porque a desnaturação promove a exposição de resíduos de aminoácidos essenciais, anteriormente protegidos da ação gástrica. Atualmente sustenta-se a hipótese de melhor digestibilidade da proteína desnaturada (PEREIRA, 2002; SGARBIERI,1996; BYLUND, 1995).

Descrevem-se a seguir outras propriedades funcionais importantes das proteínas do soro (ZADOW, 1992; HUFFMAN,1996;YADA,2004).

- Solubilidade – as proteínas do soro têm uma elevada solubilidade numa grande gama de valores de pH, desde que não tenham sido termicamente desnaturadas. A elevada

solubilidade destas proteínas a valores de pH ácido é importante na sua aplicação em bebidas, pois permitem um acréscimo de viscosidade e turbidez.

- Adsorção de água e viscosidade – quando comparadas com outras proteínas, as do soro têm uma viscosidade baixa, o que permite a sua incorporação na produção de produtos dietéticos. As proteínas concentradas do soro são geralmente muito solúveis e, portanto não têm grande capacidade de adsorver água na sua forma nativa. O tratamento térmico causa desnaturação aumentando a sua capacidade de retenção de água, bem como a sua viscosidade. Assim, as aplicações de produtos protéicos do soro como retentores de água e espessantes, restringem-se aos alimentos que recebam tratamentos térmicos, como, por exemplo, produtos de carne, sopas, bolos, entre outros.

- Gelificação – sob condições apropriadas de aquecimento, as proteínas concentradas do soro formam géis de uma forma irreversível, aumentando a capacidade de reter água e/ou outras moléculas. Podem ser aplicados na indústria alimentar para aumentar a capacidade de retenção de água e alterar a textura dos alimentos, como a elasticidade, a coesividade e a dureza.

- Emulsificação – as proteínas do soro podem atuar como emulsificantes, pois têm regiões hidrofóbicas e hidrofílicas. Esta propriedade, bem como o fato de se manterem solúveis em valores de pH ácido, permite a sua aplicação em molhos para saladas, café e formulações para crianças.

- Formação de espumas – a capacidade espumante das soluções de proteínas do soro aumenta com o tratamento térmico, uma vez que as proteínas do soro são melhores espumantes quando desnaturadas. A estabilidade da espuma depende do tipo de proteína, nível de desnaturação da proteína, conteúdo em gordura, concentração de proteína e carboidratos, concentração de cálcio e outros íons, pH, bem como do método e equipamento de processamento do soro. Esta propriedade é desejável em alguns produtos como merengues e sorvetes e indesejável em produtos como fiambres e sucos de fruta fortificados.