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2. PROVAS NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

3.3 NEMO TENETUR SE DETEGERE NA LEGISLAÇÃO PÁTRIA

3.4.6 Provas que (in)dependem de colaboração do acusado

O investigado ou acusado pode se negar a se submeter a uma prova invasiva, que são aquelas em que há uma penetração no corpo humano, para dele se extraírem células. Como exemplos, temos coleta de sangue, de saliva, extração de fio de cabelo, etc.

Isso não significa que as células do corpo humano não possam ser utilizadas sem o consentimento da pessoa. Por exemplo, se for encontrado um pouco de cabelo em uma cena

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de crime, esses cabelos poderão ser perfeitamente utilizados para exames laboratoriais e consequentemente como prova. O que não se permite é a coleta invasiva (LIMA, 2014).

O STJ, no HC 354068, onde foi chamado a julgar se a coleta de saliva de corpo humano em copo plástico violaria o princípio a não autoincriminação, assim decidiu:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO, EXTORSÃO E ESTUPRO. OCULTAÇÃO DE CADÁVER (ACOBERTADO PELA PRESCRIÇÃO). EXAME DE DNA EM MATERIAL DESCARTADO (COPO E COLHER DE

PLÁSTICO, UTILIZADOS E DISPENSADOS PELO PACIENTE).

VIOLAÇÃO DA INTIMIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. OBJETO EXAMINADO (SALIVA) FORA DO CORPO ÍNTIMO. PARTE DESINTEGRADA DO CORPO HUMANO. VIOLAÇÃO AO DIREITO DA NÃO AUTOINCRIMINAÇÃO (NEMO TENETUR SE DETEGERE). INEXISTÊNCIA. DOUTRINA E PRECEDENTE DO STF. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO (BRASIL, 2018, grifou-se).

Desta forma, quando o investigado deixa de ter o controle ao que em outro momento lhe pertencia, descartando-o em lugar estranho ao seu corpo, não há o que se falar sobre prova invasiva, sendo esta prova aceita como lícita, pois não há qualquer violação ao

nemo tenetur se detegere.

Não obstante, em outro caso envolvendo provas não invasivas, agora envolvendo o uso de raios-X, o STJ, no HC 149146, assim decidiu:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. PACIENTES SUBMETIDOS A EXAME DE RAIOS-X. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA PROVA POR OFENSA AO PRINCÍPIO DA NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO. INOCORRÊNCIA. APLICAÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06. IMPOSSIBILIDADE. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ELEVADA QUANTIDADE DE COCAÍNA. (BRASIL, 2011, grifou-se).

Neste presente caso, o STJ entendeu que não houve violação ao princípio da não autoincriminação pelo fato de não haver perigo a integridade física do acusado, e isso é importante, pois, em sua origem, percebemos que o nemo tenetur se detegere se firmou como uma forma de não permitir a coação física (tortura) do réu. Uma vez que aqui não há qualquer tipo de ofensa à integridade – justamente ao contrario, pois uma descoberta de entorpecentes no interior do corpo humano por forças policiais pode salvar a vida do determinado suspeito, pois daria subsídio para que ele pudesse ser levado rapidamente ao um pronto socorro.

Desta mesma forma, para subsidiar esta prova não invasiva, mas que se encontra no interior do corpo humano, o uso de gravações ambientais se mostra importante, pois ao filmar a pessoa ao se submeter ao raio-X, mostraria que esta não estaria sofrendo qualquer tipo de coação física, tornando a ação policial mais transparente.

54 4 PROVAS OBTIDAS POR MEIO DE GRAVAÇÕES AMBIENTAIS NO SERVIÇO POLICIAL MILITAR

Até esta parte do estudo, percebeu-se que há provas que não podem ser utilizadas pelo poder judiciário, ante a sua ilicitude, para a condenação do réu. Percebeu-se, também, que o nemo tenetur se detegere, é um limitador ao Estado na produção de provas, pois ele, o Estado, pode ao produzir as provas, ferir outros direitos fundamentais do ser humano, sendo necessárias regras que protejam as pessoas dos excessos estatais.

Essa realidade não é diferente no atendimento de ocorrências por policias militares que, além de utilizar as câmeras como meio defesa em futuras acusações de abuso de autoridade, usam as câmeras para subsidiar provas ao poder judiciário para que a persecução criminal seja realizada e o responsável por tal conduta típica seja condenado, sem que isso resulte na supressão de direitos ao cidadão abordado, ainda que alguns destes direitos sejam, no momento da abordagem, mitigados, como é o caso do direito de ir e vir.

Por sua vez, o uso de câmeras por policias nos atendimentos de ocorrência é uma realidade crescente em vários países do mundo. No entanto, poucas são as pesquisas científicas que norteiam as ações policias. Os poucos resultados que são obtidos, em grande parte não são documentados. Essa realidade é ainda maior na literatura nacional (SILVA; CAMPOS, 2015). Assim, a observância de procedimentos legais durante o atendimento de ocorrências policiais com o uso de câmeras, em especial as portáteis, fará com que as gravações possam ser utilizadas pelo poder judiciário, no que tange a produção de provas.

Quando câmeras são utilizadas sem que o policial tenha uma diretriz que especifica como ele deve agir, norteando suas ações, as gravações ambientais produzidas no atendimento de ocorrência podem não ser utilizadas como provas no processo penal, fazendo como que esse importante meio se torne inócuo, ante as regras de produção de provas lícitas.

Como base nisto, será utilizada o Procedimento Operacional Padrão (POP) nº 505 da Polícia Militar do Estado de Santa Catarina (PMSC) (SANTA CATARINA, 2018), que é um procedimento que os policiais militares do Estado de Santa Catarina devem utilizar para que possam gravar o atendimento de ocorrência. Com isso, ter-se-á uma ideia de como as gravações devem ser produzidas, podendo elas ser utilizadas como prova em um processo penal.

Outro ponto deste trabalho é procurar entender como a doutrina e, principalmente, a jurisprudência vem recebendo as gravações ambientais. Assim, verificar-se-á estas decisões,

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afim de que se encontre os fundamentos que tornam estas gravações lícitas, bem como qual a influência do nemo tenetur se detegere nelas.

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