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PSICOACÚSTICA E PAISAGEM SONORA EM MUSICOTERAPIA

No documento A física na música_compressed (páginas 66-89)

Jacila Maria da Silva3 Prelúdio ao capítulo

A dinâmica da vida é algo inusitado, por ser imprevisível

Este capítulo aborda as possibilidades discursivas, formas de linguagem e pensamentos sobre a linguagem que colocam indagações sobre o que advém do registro do sonoro, da quase ausência de som, do pianíssimo e da meia-voz. O que está em questão é o reconhecimento da musicalidade na constituição de subjetividades, e, portanto, a presença do musical na cultura, vale dizer, nos efeitos da sonoridade e do silêncio na experiência de existência.

Psicanálise, medicina científica e música: as ciências do vivente

As diferenças entre ciência e outras possibilidades de saber se colocam, por vezes, na disponibilidade de interesse do pesquisador cientista. Dito isso, podemos considerar que a psicanálise, a medicina e a música se constituíram desde seus primórdios, e, ainda podem se constituir, do solo da cultura. A cultura é, por assim dizer, produtora de saberes que podem se tornar conhecimento e, ainda, conhecimento científico. Cada conhecimento-saber está direcionado à cultura que o formulou, entretanto, suas dimensões espaço-temporais são imprevisíveis, ou seja, o conhecimento produzido pelo saber cultural não é específico, podendo surgir em diversas formas, em distintas culturas ao mesmo tempo ou tender ao infinito temporal em todo e qualquer tempo.

3 Grata ao convite da professora Dra. Maria Lúcia G. Perez Baptista para participar do livro fruto do

Projeto A Física na Música do Departamento de Eletrônica Quântica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Durante muito tempo, se falou em som por meio de linguagens específicas da acústica, da fonologia e da música. A partir do século XIX, foi necessário repensar a matéria musical para além das dimensões anteriormente citadas e, na segunda metade do século passado, surgiram dois conceitos básicos para estudarmos o sonoro em geral. São eles: o conceito de objeto sonoro e o conceito de paisagem sonora.4

Segundo Schaeffer, objeto sonoro não é o instrumento que tocou (corpo sonoro, fonte sonora ou instrumento); a fita magnética, pois poucos centímetros de fita magnética podem conter diferentes objetos sonoros; ou um estado de alma, pois não é subjetivo. Para este autor, “o objeto sonoro dá-se no encontro de uma ação acústica e de uma intenção de escuta”, 5 ou seja, o objeto sonoro é, por essa definição, o som.

No que tange à paisagem sonora, esta é abordada por Schafer como sendo os sons à nossa volta. Vamos ter uma paisagem sonora física e objetiva da cultura; e uma paisagem sonora interna de cada sujeito, segundo este autor. Portanto, paisagem sonora será os sons em torno e também aqueles que foram introjetados.6

Nossa proposta é pensar a experiência sonora considerando a dimensão da cultura, visando articular esta experiência com a potencialidade da criação. Estes conceitos, de objeto sonoro e de paisagem sonora, serão relevantes ao relacionarmos a escuta musical e a constituição do vivente. Poderemos pesquisar a relação compositor- criação musical; a estética musical e o sentido estilístico da expressão musical. Estas relações serão vistas no espaço e no tempo da criação que se configura, simultaneamente, entre sentidos, na direção do compositor-ação-criação musical e

criação-ação-compositor em interação.

O presente capítulo tem por objetivo desenvolver pontos importantes para o pensamento atual a partir das relações entre os saberes psicanalítico, musical e psicoacústico, considerando-os espaços de produção de linguagem científico-filosófico- cultural com inserção numa estilística da existência. Quer dizer, por meio dessas relações buscaremos tecer diálogos a respeito do corpo, da singularidade, da sublimação enquanto criação, do pensamento e da linguagem constitutivos de subjetividades e que possibilitam o enriquecimento da cultura.

4 Barcellos (1992). 5 Shaeffer, 1993, p. 248. 6 Shafer (1991).

Música, entre silêncios, ritmos e sons

Saber os benefícios do manejo da linguagem musical é algo que os estudos e técnicas da musicoterapia vêm contribuindo tanto no que tange à educação, quanto à saúde. Porém, os estudos da música vêm se expandindo em diversos saberes (acústica,

psicoacústica, musicologia e estética musical, história da música e cultura musical, técnicas dos instrumentos e das teorias musicais, dentre outros) e interagindo e constituindo saberes da matemática, física, psicologia, medicina, história, antropologia, dentre outros, desde a Antiguidade. A música faz parte da filosofia e da história da humanidade. Ela está presente nos primórdios das práticas terapêuticas e dos estudos da medicina, em rituais de curas, em manifestações culturais e em ritos sobre a existência. Ela foi e continua sendo estudada por muitos dos pensadores e cientistas dos diversos séculos e é certo que ela pode ser estudada por seu intenso conhecimento a respeito da história existencial da humanidade. Por isto, é certo também dizer que ela possui o poder de nos conduzir a um saber coletivo sobre a existência e, por vezes, nos possibilitar certa estilística da existência.

São muitas as definições de música e as mais tradicionais buscam definir a música por meio de seus elementos (ritmo, melodia e harmonia), outras definem a música pela história: de onde ela advém do recitativo, do canto, valorizando a voz e o coletivo. Mas, a partir dos estudos da acústica, das composições eletroacústicas, dentre outras composições, por exemplo, as românticas, que valorizam o som e o silêncio, podemos encarar a música como uma possibilidade de musicalidade proveniente de um brincar rítmico com sons e silêncios. Vale mencionar que os estudos do som e do silêncio, das ondas sonoras e das vibrações podem nos fazer pensar em algo digno de estudos e pesquisas sobre o meio ambiente e sobre uma ecologia da saúde, afastando definitivamente a progressão de poluição sonora das cidades e, ainda, tendências verborrágicas e melomaníacas de difusão quase “universal”. Cultivar ambientes silenciosos pode trazer benefícios à saúde da cultura em geral. Tal qual a água que bebemos e nos banhamos deve ser a mais “pura e cristalina”, o ar que respiramos deve ser o mais oxigenado, suave e silencioso possível. Os silêncios são os elementos que possibilitam a existência da musicalidade. São os elementos que nos fazem reconhecer uma composição de sons enquanto musical. Quer dizer, estão presentes no musical, sendo essenciais aos elementos que constituem a musica, a nossa musicalidade e a ritmicidade no mundo.

Exercício: a escuta musical

Sente-se de forma confortável.

Feche os olhos e leve a atenção aos sons ambientes. Do som mais próximo ao mais distante.

E dos sons mais distantes ao mais próximo. Até entrar em profundo silêncio.

Mantenha a sensação de silêncio até que você fique plenamente relaxado. Entre em contato com um estado silencioso de consciência e leve sua atenção à respiração.

E, se ainda sentir alguma sensação desagradável no corpo, faça uma inspiração suave e profunda e, ao expirar, relaxe mais e mais.

Você está em contato com seu silêncio interior.

Retorne gentilmente desse estado prestando a atenção a seu corpo e aos sons ambientes. Realize essa prática como preparo para

uma escuta musical.

O Canto, o idioma musical e a voz

Exemplo de escuta musical:7 músicas em coro infantil

O idioma musical

A linguagem musical é constituída de forma a acolher diversas possibilidades sonoras e ausências de sons, silêncios, pausas, espaços de tempo e entonações, nuances das ondas sonoras; expressões que causam impressões.

O instrumento musical voz

Vozes infantis = vozes de criança.

Vozes femininas (adultas) = soprano, meio-soprano e contralto. Vozes masculinas (adultas) = tenor, barítono e baixo.

Cada palavra que imaginamos ou pronunciamos gera um espectro de ondas sonoras que se confunde e mistura-se com diversas ondas constituindo o som ambiente que é inesgotável em possibilidades.

Por isso, devemos cuidar do ambiente sonoro que causa impressões corporais a partir do retorno das ondas sonoras que geramos no ambiente.

Acústica 8

• “A ciência do som e da audição. Trata das qualidades sônicas de recintos e edificações e da transmissão de som pela voz, por instrumentos musicais e por meios elétricos.”

• “O som é gerado por vibrações transmitidas à atmosfera pela fonte sonora como flutuações de pressão, e daí ao tímpano do ouvinte. Quanto mais rápida a vibração (ou maior sua ‘frequência’) mais agudo o som. Quanto maior a amplitude da vibração mais intenso será o som. A maioria dos sons musicais consiste não só de vibrações regulares em uma frequência particular, mas também de vibrações em vários múltiplos desta frequência. A frequência do dó central é de 256 ciclos por segundo (ou Hertz, Hz); mas quando se ouve um dó central, há componentes do som vibrando a 512Hz, 768Hz etc. (os Harmônicos). A presença e a força relativa desses harmônicos determinam a qualidade do som. A diferença de qualidade, por exemplo, entre uma flauta, um oboé e um clarinete tocando a mesma nota é que o timbre da flauta é relativamente ‘puro’ (tem poucos e fracos harmônicos), o do oboé é rico em harmônicos mais agudos e o do clarinete tem uma preponderância de harmônicos ímpares. O espectro harmônico característico a cada um deve-se basicamente ao modo pelo qual a vibração do som é ativada (na flauta, pela passagem de ar através de uma fenda; no oboé, pela palheta dupla e, no clarinete, pela palheta simples), além da forma

8 SADIE, Stanley. Dicionário Grove de música; editora assistente Alison Latham; trad. Eduardo

do tubo acústico. Quando os lábios dos executantes são o agente vibrador, como na maioria dos instrumentos da família dos metais, o tubo é capaz de produzir tanto a nota fundamental como os outros harmônicos, por meio da pressão labial do executante”.

• “A coluna de ar vibratória é apenas um dos meios tradicionais de se criar um som musical. Quanto mais longa a coluna, mais grave a altura do som; o executante pode elevar a altura do som destapando orifícios do tubo. No caso da voz humana, o ar é posto em movimento por meio das cordas vocais e circula na garganta, que converte em som a corrente de ar vinda dos pulmões, a altura desse som é controlada pelo tamanho e pela forma das cavidades na faringe e na boca. No caso de um instrumento de cordas, como o violino, o violão e o piano, a corda é posta em vibração por (respectivamente) fricção de um arco, dedilhado ou percussão de um martelo; quanto mais retesada e fina a corda, mais rápido ela vibrará. Ao prender a corda contra o espelho do instrumento, tornando assim mais curta a extensão de vibração da corda, o executante pode aumentar a altura do som. Com um instrumento de percussão, como o tímpano ou o xilofone, uma membrana ou um pedaço de madeira são postos em vibração por percussão; às vezes a vibração é regular e produz uma altura de som definida, mas na maioria dos instrumentos de percussão essa altura é indefinida”.

• “Na gravação do som, os padrões de vibração estabelecidos pelo instrumento ou instrumentos a serem registrados são codificados por meio analógico (ou, em gravações recentes, digitalmente), em termos de impulso elétrico. Esta informação pode então ser armazenada, em forma mecânica ou elétrica, e em seguida decodificada, amplificada e direcionada a alto-falantes que por sua vez transmitem o mesmo padrão de vibração ao ar”.

• “O estudo da acústica de edificações é deveras complicado em função da variação de modos através dos quais o som é emitido, refletido, difundido, absorvido etc. O projeto de edificações para apresentações musicais tem que levar em conta questões como a expansão uniforme e regular em todas as partes da edificação, equilibrando clareza e combinação de timbres, bem como a direção com que o som refletido poderá atingir a plateia. O uso de materiais

específicos (sobretudo madeira e material acústico artificial) e o fracionamento de superfícies, para evitar certos tipos de reverberação do som, desempenham função chave no projeto de salas de concerto; entretanto, ela continua sendo uma arte imprecisa, já que a experimentação e a ‘afinação’ (deslocando-se superfícies, acrescentando-se ressonadores etc.) costumam ser necessárias”. • “O termo ‘acústica’ às vezes é usado, no caso de uma gravação de instrumentos,

para significar ‘não elétrico’; quando métodos elétricos ainda não eram disponíveis (normalmente antes de 1926), eram feitas gravações acústicas; e um violão acústico é aquele não amplificado eletronicamente” .

A nota azul

A nota azul pode ser a nota cujo espectro nos faz vibrar em ressonância. Vejamos quais as questões que Alain Didier-Weill (1997), psicanalista e escritor francês, formula a partir da experiência do artista ao psicanalista. Estas que advêm da experiência artística.

A primeira pergunta que o analista recebe do artista, quando este é dançarino, é quanto à possibilidade de imaterialidade do corpo. Essa imaterialidade que surge mediante a “presentificação” do imaginário e da palavra9: “Não é o artista aquele que nos instrui sobre a aptidão do corpo para recusar o peso ao dar testemunho de sua parte de imaterialidade?” 10

A segunda questão que o artista coloca para o psicanalista surge quando o sintoma humano está ligado à perturbação da imagem. Essa questão é colocada pelo pintor.11 Diz Didier-Weill:

O sofrimento ligado à imagem do corpo prende-se ao fato de que esta imagem é estruturada como fundamentalmente dependente do olhar do outro.12

É neste ponto que o analista que se interroga sobre a estrutura do olhar que ele próprio pousa no analisando13 encontra a questão do olhar do pintor: não é o pintor

9 Didier-Weill, 1997, pp. 21-2. 10 Ibid., p. 22.

11 Ibid., p. 22. 12 Ibid.

aquele que sabe ouvir o invisível e sabe deixá-lo à mostra com algumas manchas de cor?14

A terceira pergunta que o analista recebe do artista, surge quando o sintoma se apresenta via palavra. Quando o sujeito, diz Didier-Weill:

[...] prefere esconder-se no silêncio para não correr o risco de fazer ouvir, para além do que as palavras poderiam fazer escutar, a dimensão do inaudito própria do inconsciente. [...] É à medida que é levado a reconhecer que o fato de não assumir o poder metafórico da palavra é indutor do sintoma humano, que o analisando é levado a recolher do poeta, do músico, a seguinte pergunta: de que é feita a sua relação com a linguagem se, por sua prática, ele é conduzido a subverter o que a prosa faz ouvir de sensato, fazendo ouvir, pelo poema e pela música, o que o poema e ou a música transmitam de propriamente inaudito?15

Nesta leitura, podemos entrever as possibilidades sonoras e metafóricas que o músico e o poeta atribuem à palavra. O poeta, por um lado, brinca com as palavras atribuindo a elas sentidos que não possuem, criando palavras novas, ou seja, ele tira a palavra do campo da linguística, da previsibilidade e fixidez da semântica, resgatando a possibilidade de dizer outras coisas. Ele resgata a flexibilidade, brincando com os ritmos e os sons que ela (palavra) pode conter. Ele dá à palavra a possibilidade de dizer o que ainda não foi dito, o que ainda não pôde ser escutado.

A figura do músico nos chega como uma figura que carrega a marca do inaudito. O músico é tido como o artista que ouve a música do mundo, das pessoas e das coisas e, para além de ouvir, ele toca e canta essa música para nós. O músico é aquele que é capaz de ouvir o inaudito e de transmiti-lo. É aquele que dá à palavra o seu tom e que afina as rijas cordas da palavra para que ela possa causar ressonância. É aquele que captura os ecos da palavra e os expressa nas várias vozes que ele acredita que ela comporta. Ele é aquele que, para além de explodir a semântica, como faz o poeta, explode a própria palavra, fazendo ouvir os seus ecos e as dimensões sonoras.

O poeta e o músico, portanto, formulam diversas questões para o psicanalista: Ouves as vozes que estão contidas na fala de seu analisando? Ouves o que está para além dos significados que as palavras do seu analisando parecem comportar? Ouves as

14 Ibid., pp. 24-5. 15 Ibid., pp. 25-6.

mudanças de tom e as dissonâncias do seu analisando? Ouves quando a sua voz causa ressonância nele? A fala do analisando tem ritmo, harmonia ou melodia? Está afinada com o conteúdo? Está ressonando em você? É uma variação em torno do mesmo tema?

Essas questões colocadas pelo músico e pelo poeta podem trazer para a análise a dimensão do inaudito, própria do inconsciente. Sem dúvida, elas dão ao analista o vislumbre do grau de “embolação” 16 do analisando: falas que não são as suas; afetação ou morbidez do analisando em relação às palavras, quer dizer, a utilização de palavras que foram desprovidas de afeto; dificuldade de expressão do analisando e de utilizar a palavra ou a voz como forma de expressão, ou seja, de fazer uso das possibilidades sonoras e mesmo de recursos como os de figuras de linguagem em sua fala; ambiguidade e incongruência presentes na fala do analisando; repetição, fixidez e rigidez do analisando. Enfim, essas questões nos fazem pensar na subjetividade do analisando e no que dele não está se fazendo audível nas suas relações.

Por meio desta formulação, Alain Didier-Weill coloca que, “as três faces do sintoma conduzem o analista a interrogar o inaudito, o invisível e o imaterial, dos quais o músico, o pintor, o dançarino são os embaixadores”. Em continuidade, sua preocupação vai mais além, quando ele amplia os horizontes da psicanálise, ampliando o setting, de forma a colocar a psicanálise no espaço social. Nesse espaço, portanto, a psicanálise não jogaria “o irracional contra o racional”, mas sim, “o racional com o irracional”. “Entre a clareza da razão e a exigência obscura da pulsão, a psicanálise põe em evidência um terceiro ponto: a palavra do sujeito do inconsciente [...]”.17

É no sentido de uma crítica à sociedade moderna, que Didier-Weill aborda o mal-estar do homem moderno como decorrente de um saber absoluto, de um “olho anônimo científico”, que tomou o lugar do olho divino. Somos olhados de todas as partes, diz Didier-Weill, de um olho macroscópico do satélite aos microscópios e endoscópios. Este “olho anônimo científico” parece poder medusar o olho humano, aniquilando o sujeito do inconsciente via desfalecimento do verbo. O humano, portanto, seria reduzido, por este olhar medusante, “à pura materialidade de um corpo petrificado, [...] destituído de qualquer habitação simbólica”.18

16 Embolada é uma forma poético-musical do Nordeste brasileiro, em compasso binário, melodia

declamatória e andamento rápido, usada pelos solistas nas peças com refrão coral ou diálogos (como desafios). Dicionário da Língua Portuguesa (1986).

17 Didier-Weill, 1997, p. 33. 18 Ibid. p. 34.

Assim, Didier-Weill conclui sua abordagem sobre o ato artístico, relevando a importância deste como destino para o mal-estar que a modernidade impõe e, sobretudo, como saída da massificação, resgatando a singularidade humana via reconhecimento do seu invisível, inaudito e imaterial.19 Vale transcrever suas palavras:

Como compreender o sentido do ato artístico senão como a tentativa feita pelo homem de lutar contra essa ameaça, substituindo ao homem, ameaçado de anonimato pelo saber absoluto, a parte de incógnito que é seu bem mais íntimo? Onde o homem observado de todos os lados, fica transparente, eis que o pintor recorda-lhe que ele continua habitado pelo invisível; onde o homem é ouvido de todos os lados por todas as mídias, pelas estatísticas, pelas pesquisas de opinião, a música vem lembrar-lhe que, ao contrário e contra tudo, o inaudito conserva suas exigências; onde os movimentos do homem são calibrados, por todos os lados, pelas marchas militares e, hoje em dia, sobretudo pela maneira de movimentar-se dos novos ídolos que são os stars, o dançarino é aquele que relembra ao homem o fato de que nele permanece um movimento original cujo caráter absolutamente inimitável ele tende a esquecer, dada a pregnância das imagens que sugerem a imitação massificada.20

O ouvido musical

Cada pessoa pode se beneficiar das impressões que recebeu durante toda vida a todo instante. As impressões, sensações da memória corporal, são ditas, em música, como percepção musical. E, o trabalho advindo dos exercícios de escuta musical, treinamento do ouvido, nos diz do ouvido musical.

Quer dizer, o ouvido musical se constitui em exercícios de escuta de registros sonoros, tais como, por exemplo, a percepção de intervalos musicais.

Podemos perceber diversas qualidades musicais. O timbre é uma qualidade que nos permite distinguir as nuances dos diversos tipos de produção sonora, por exemplo: se o instrumento que está tocando num registro sonoro é um instrumento de sopro, ou uma voz, ou ainda um instrumento de cordas.

19 Ibid., pp. 34-5. 20 Idem.

Um bom exercício de escuta musical é prestar a atenção aos instrumentos-solo

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