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No quadro 1.1, são apresentadas de forma resumida as principais informações sobre os genes e SNPs citados anteriormente Como esses genes atuam de

formas distintas, mas muitas vezes correlacionadas, a conecção entre os

genes e o metabolismo pode ser observada de forma esquematizada na figura

1.2.

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Grupo Subgrupo Gene Nome Localização SNP Consequência Associação Referências Função no

tecido adiposo

renovação

lipídica ADRB2 proteína receptora adrenérgica β 2

5q31-q32 rs1042713

(A>G) Arg16Gly Positiva: pressão arterial sistólica em mulheres, diabetes tipo 2, síndrome metabólica Negativa: obesidade, hipertensão

Gjesing e col., 2007; Jalba e col., 2008 rs1042714

(C>G) Gln27Glu Positiva: pressão arterial sistólica em mulheres e obesidade para a população da Ásia e Ilhas do Pacífico

Negativa: obesidade, hipertensão, diabetes tipo 2, síndrome metabólica

Gjesing e col., 2007; Jalba e col., 2008

haplótipo

Arg16Gln27 Positiva: pressão arterial, IMC, triacilgliceróis, frequência cardíaca e glicemia Castellano e col., 2003 adipocina APM1 adiponectina 3q27 rs17300539

(G>A) Positiva: diabetes tipo 2, insulina e HOMA-IR Negativa: hipertensão (?) adiponectina

Gong e col., 2010; Henneman e col., 2010; Ong e col., 2010

rs266729

(C>G) Positiva: diabetes tipo 2, IMC, acidente vascular cerebral e hipertensão Negativa: doença cardiovascular

(?) adiponectina

Gu e col., 2004; Hegener e col., 2006; Pischon e col., 2007; Ong e col., 2010; Gong e col., 2010; Zhang e col., 2012 Haplótipo G/G Positiva: adiponectina

(?) diabetes tipo 2 Vasseur e col., 2002; Gu e col., 2004 adipogênese PPARG receptor gama

ativado por proliferador no peroxisoma

3p25 rs1801282

(C>G) Pro12Ala Positiva: diabetes tipo 2, IMC e doença cardiovascular

(?) colesterol total, triacilgliceróis, HDL-C, insulina e HOMA-IR Masud e col., 2003; Ludovico e col., 2007; Dallongeville e col., 2009; Gouda e col., 2010 gasto energético

PPARGC1 coativador 1 alfa

do receptor gama ativado por proliferador no peroxisoma

4p15.1 rs8192678

(G>A) Gly482Ser Positiva: hipertensão, diabetes tipo 2, ácidos graxos não esterificados, LDL-C, triacilglicerídeos Negativa: IMC, glicose, insulina

Barroso e col., 2006; Franks e col., 2007; Shao-ling e col., 2007; Vimaleswaran e col., 2008 UCP2 proteína 2

desacopladora 11q13 rs659366 (G>A) Positiva: Negativa: diabetes tipo 2

(?) obesidade, triacilgliceróis, colesterol total, LDL-C

Reis e col., 2004; Xu e col., 2011 Função na célula β pancreática secreção de

insulina KCNJ11 subunidade kir6.2 do canal de potássio

11p15.1 rs5219

(G>A) Glu23Lys Positiva: diabetes tipo 2 (?) IMC, insulina Gloyn e col., 2003; Nielsen e col., 2003; van Dam e col., 2005; Fur e

25

sensível a ATP col., 2005; Florez e col.,

2007; Tabara e col., 2009; Cheung e col., 2011; Gong e col., 2012 Função em quase todos os tecidos proliferação e/ou diferenciaçã o celular IGF2 fator de crescimento 2 ligado à insulina 11p15.5 rs680

(G>A) Positiva: altura, comprimento do tronco, peso, peso ao nascer e distúrbios alimentares (?) IMC O’Dell e col., 1999; Gomes e col., 2005; Bachner-Melman e col., 2005; Heude e col., 2007;

Outro saciedade LEPR proteína

receptora da leptina

1p31 rs1137101

(A>G) Gln223Arg Positiva: fratura de vértebras, conteúdo mineral ósseo, massad e gordur, %GC Negativa: obesidade

(?) IMC, leptina, lipídios

Yiannakouris e col., 2001; Guízar-Mendonza e col., 2005; van der Vleuten e col., 2006; Mergen e col., 2007; Fairbrother e col., 2007; Pirzak e col., 2009; Riestra e col., 2010; Furusawa e col., 2011; Bender e col., 2011 POMC pro- opinomelanocort ina 2p23.3 rs28932472

(C>G) Arg236Gly Positiva: obesidade Challis e col., 2002

SLC6A14 transportador de aminoácido membro 14 da família 6 de carregadores de soluto Xq23-q24 rs2011162

(C>G) Positiva: obesidade em adultos, reduzida taxa de oxidação de gordura em mulheres obesas Negativa: obesidade em crianças

Suviolahti e col., 2003; Durand e col., 2004; Corpeleijn e col., 2010

26 Diagrama 1.2: Representação esquematizada dos mecanismos de ação dos genes ADRB2, APM1, IGF2, KCNJ11, LEPR, POMC, PPARG, PPARGC1, SLC6A14 e UCP2. Setas em verde indicam atividade estimulatória e as linhas em vermelho indicam atividade inibitória dos genes.

27 Marcadores indicativos de ancestralidade

Marcadores genéticos que apresentam diferenças nas freqüências alélicas entre populações parentais tem sido utilizados como marcadores indicativos de ancestralidade (MIAs) pela sua capacidade em inferir a origem étnica de populações (Shriver e col., 1997).

Existem diferentes marcadores genéticos, sendo eles classificados de acordo com a sua natureza molecular e localização genômica. Estes marcadores podem ser do tipo polimorfismo de nucleotídeo único - SNPs, inserção/deleção (também conhecidos como indels) ou de sequências repetidas em tandem de número variável – VNTRs (que incluem os microssatélites, também conhecidos como pequenas repetições em tandem - STRs). Os marcadores autossômicos biparental são considerados excelentes marcadores individuais devido à alta recombinação existente resultando em elevada variabilidade genética que permite distinguir indivíduos (Pena e col., 2009). Enquanto os marcadores uniparentais, que incluem o DNA mitocondrial (mtDNA) e a região não recombinante do cromossoma Y (NRY), são marcadores estáveis de linhagem por serem haplóides, não sofrem recombinação e formarem haplótiplos. Estes marcadores são frequentemente utilizados como marcadores geográficos trabalhando em nível de população por possibilitarem a reconstrução da história das migrações de mulheres (mtDNA) e homens (NRY) (Pena e col., 2009).

Estudos utilizando MIAs tem sido realizados em diferentes populações para conhecer a sua composição genética. Esses estudos são importantes, principalmente em populações miscigenadas, porque possibilitam um melhor entendimento de sua formação étnica. Estudos realizados com a população brasileira mostram que o Brasil é constituído atualmente por uma população miscigenada formada pela influência de três grupos ancestrais (Europeus, Africanos e Americanos Nativos) reflexo do processo de colonização. A contribuição Européia tem se mostrado a mais expressiva (70,7 a 77,1 %), enquanto a contribuição Africana tem sido intermediária (14,3 a 16,9 %) e a Amerindia a de menor proporção (8,5 a 11 %) (Callegari-Jacques e col., 2003; Lins e col., 2010; Pena e col., 2011). A revisão publicada em 2009 por Pena e colaboradores faz um apanhado histórico do processo de colonização do Brasil e sintetiza e entrelaça todos os resultados de ancestralidade da população brasileira realizados pelo grupo. Segundo a revisão, o período de colonização do Brasil pode ser dividido em 3 períodos marcantes: (1) contituído predominantemente por Ameríndios;

28 (2) seguido pela redução da população Ameríndia devido ao efeito combinado de armas branca, armas de fogo e doenças e alta “imigração” Africana para trabalho escravo e (3) subsequente redução da “imigração” Africana com o fim do tráfego negreiro e alta imigração Européia, resultando no chamado “branqueamento” da população brasileira. Estudos utilizando marcadores uniparentais NRY e mtDNA reveralam que os acasalamentos que originaram a população brasileira atual ocorreram preferencialmente entre homens Europeus e mulheres Amerindias e Africanas, enquanto que resultados obtidos pelo grupo utilizando marcadores autossômicos indicaram predominância de ancestralidade Européia, seguida de Africana e Amerindia assim como em outros estudos.

Adicionalmente, por possibilitar estudar a composição genética de uma população, o uso de MIAs tem se tornado uma prática padrão para resolver um dos grandes problemas dos estudos de associação que é a estratificação da população em estudos envolvendo populações miscigenadas. A estratificação da população se refere as diferenças nas freqüências alélicas entre casos e controles relacionados com a ancestralidade e não com a doença estudada (Myles e col., 2009). Quando detectada a estratificação na população, testes estatísticos podem ser utilizados para corrigir os seus efeitos (resultados falso-positivos e falso-negativos) viabilizando o estudo (Tiwari e col., 2008).

O Projeto Internacional HapMap, que é um banco de domínio público, tem sido uma poderosa ferramenta por disponibilizar uma série de informações sobre SNPs candidatos a MIAs. Entretanto, existe uma discussão com relação ao número mínimo de MIAs a ser utilizado para inferir as proporções das ancestralidades Africana, Ameríndia e Européia. Estudos realizados com amostras da população brasileira tem indicado resultados de proporção de ancestralidade Européia, Africana e Amerindia muito próximos, mesmo utilizando 40 a 12 MIAs (Pena e col., 2011; Lins e col., 2010; Callegari-Jacques e col., 2003) o que indica que a qualidade informativa do marcador é mais importante do que a quantidade. Além disso, resultados de proporção de ancestralidade podem diferir conforme o método de estimativa de ancestralidade escolhido (Parra e col., 2003; Lins e col., 2010). Conforme demonstrado por Lins e colaboradores (2010), os resultados de proporção de ancestralidade obtidos pelo método bayesiano realizado no programa Structure demonstrou ser mais provável de representar a estrutura da população brasileira utilizando 28 SNPs que o método maximum likelihood estimate (MLE).

29 Ouro Preto

O município de Ouro Preto, que completou recentemente 300 anos, é mundialmente conhecido por apresentar a mais impressionante arquitetura colonial do Brasil. O município, que foi instituído Patrimônio da Memória Nacional em 1933, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 1938 e considerado Patrimônio Cultural da Humanidade em 1980, é considerado roteiro obrigatório dos turistas (Carpeaux, 2000).

Ouro Preto apresenta um território montanhoso que corresponde a 1.245,114 km² localizado no Estado de Minas Gerais (a 20º23'08" sul de latitude e a 43º30'29" oeste de longitude). Sua paisagem é privilegiada pela diversidade florestal e animal protegida pelos Parque do Itacolomi, Parque das Andorinhas, Estação Ecológica do Tripuí, Floresta do Uaimi e Parque Municipal de Cachoeira do Campo.

A sua população, que atualmente é composta por 70.281 indivíduos (IBGE, 2010b), foi formada pela mistura de vários povos. A colonização de Ouro Preto iniciou com a descoberta de ouro em 1698, quando a região foi alvo de um povoamento desorganizado. Estima-se que 30.000 pessoas viviam na região naquela época (Bohrer, 2011), sendo europeus, paulistas, nordestinos, negros e indígenas (Werkema, 2010). Entre os anos de 1700 e 1701, o período de fome que ocorreu na região fez emergir vários arraiais em seu entorno dedicados à agricultura e ao comércio. Ao lado dos mineradores, um número expressivo de burocratas (ligados a Coroa Portuguesa), clérigos, militares, artistas, pedreiros, carpinteiros, ferreiros, mercadores tropeiros, ourives, boticários, moleiros, quitandeiras, prostitutas, escravos, salteadores, vadios, aventureiros e mendigos passaram a fazer parte da sociedade ouro-pretana. Os mestiços (pardos), na sua maioria fruto do concubinato com negras e mulatas, existiam em número expressivo e atuavam em todas as áreas, desde a mineração até as artes mais elaboradas (Bohrer, 2011). Em 1839, com a criação da Escola de Farmácia e, posteriormente, com a criação da Escola Técnica Federal de Ouro Preto (atualmente Instituto Federal de Ouro Preto) e da Universidade Federal de Ouro Preto, o município se tornou uma cidade universitária sem perder os ares do passado.

Conforme dados do censo demográfico realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010b), a população de Ouro Preto permanece

30 marcada pela mestiçagem, mesmo após três séculos de história. Notavelmente, a proporção de pardos (52,5 %) descrita para os ouropretanos, assim como a de pretos (14,4 %), amarelos (1,6 %) e indígenas (0,3 %) é superior ao observado para o Estado de Minas Gerais. Este aumento, que chega a 5,2 % para pretos e 8,2 % para pardos, chama a atenção para a estrutura da população deste município que reflete a história da colonização da região.

Estudos epidemiológicos em Ouro Preto

Nos últimos seis anos, as doenças relacionadas com os aparelhos circulatório e respiratório têm apresentado as mais altas taxas de morbidade em Ouro Preto (30 % e 26 %, respectivamente). As doenças infecciosas e parasitárias representam em média 11,5 % das morbidades. Entretanto, um aumento repentino dessa morbidade foi observado nos últimos dois anos (15,7 % em 2009 e 22,1 % em 2010). A morbidade média para as doenças relacionadas com o sistema digestivo corresponderam 9,8 %, seguida das neplasias (5,8 %) e das doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas (4,8 %). As demais causas de morbidade somam 11,8 %, sendo que nenhuma obteve valores de morbidade acima de 3 % (IBGE, 2006 a 2010).

Estudos epidemiológicos realizados com a população adulta têm indicado que o nível de lipoproteína A no soro está associado com a presença de doença cardíaca isquêmica, idade, colesterol total, LDL-C e gordura corporal (Cândido e col., 2007). As prevalências de sobrepeso (30%) e obesidade (11,9%) observadas na população variam conforme a faixa etária. Os sobrepesos correspondem a 13,4% para 15-19 anos, 27,6% para 20-39 anos, 38,9% para 40-59 anos e 43,5% para ≥60 anos, enquanto os obesos correspondem a 4,7% para 15-19 anos, 8,6% para 20-39 anos, 18,8% para ≥40 anos (Freitas e col., 2007). Estudos do polimorfismo do gene da apolipoproteína E (APOE) mostram freqüências dos alelos 2 (8%), 3 (72%) e 4 (20%) na população, tendo sido observado um maior risco de dislipidemia associado ao alelo 4 e menor risco associado ao alelo 2 (Mendes-Lana e col., 2007). Entre as crianças e adolescentes do município, tem sido observada uma prevalência de 8,7% para sobrepeso e 6,2% para obesidade, sendo que os indivíduos contendo níveis alterados de triacilgliceróis, LDL-C e HDL-C e aqueles cujos pais foram obesos apresentaram maior chance de possuirem obesidade. A prevalência de hipertensão arterial observada foi de 5%, sendo que os indivíduos que apresentaram menor renda familiar, baixo peso ao nascerem, elevadas medidas de índice de massa corporal e

31 circunferência da cintura e aqueles cuja mãe foi hipertensa apresentaram maior chance de possuirem hipertensão. O total de 44,4% dos participantes apresentaram 2 ou 3 fatores de risco para doenças cardiovasculares e 8,2% apresentaram 4 ou 6 fatores de risco. Além disso, elevadas concentrações de colesterol total e LDL-C e baixa concentração de HDL-C foram observadas em 36,9%, 5,8% e 18,6% da amostra, respectivamente e alta prevalência de sedentarismo (73,9%) foi observada na amostra (Cândido e col., 2009).

Estes resultados estimularam nosso grupo a realizar estudos que buscam avaliar a influência de interações entre fatores ambientais e genéticos que possam estar precocemente associados a marcadores de risco para doenças cardiovasculares e obesidade na população infanto-juvenil de Ouro Preto. Dentro deste contexto propusemo-nos nesta tese a conhecer a estrutura genética e a estudar as relações entre fenótipos de risco e polimorfismos genéticos nesta população.

32 1.2 – OBJETIVOS

1.2.1 – Objetivo Geral

Conhecer a composição genética da população e realizar estudos de associação entre ancestralidade genética e entre polimorfismos em genes candidatos com fatores de risco associados à obesidade em escolares de Ouro Preto.

1.2.2 – Objetivos Específicos

- Determinar a composição genética por meio de MIAs de uma amostra de escolares da população de Ouro Preto e verificar se existe concordância entre ancestralidade genética e a cor da pele auto-referida;

- Verificar nesta amostra se existe associação entre ancestralidade genética e fenótipos relacionados com a obesidade, anemia e dados demográficos;

- Realizar estudo de associação entre polimorfismos em genes candidatos e fenótipos associados à obesidade, componentes da síndrome metabólica em escolares.

33

CAPÍTULO 2

Composição genética de uma população Brasileira: a pegada do Ciclo do Ouro

Introdução

Os estudos com marcadores indicativos de ancestralidade (MIAs) têm sido realizados em populações miscigenadas para diversas aplicações: antropologia, investigações forenses, estudos de correlação entre raça, etnia e ancestralidade, pesquisa biomédica e farmacogenética (Via e col., 2009). Em estudos de associação genética com populações miscigenadas, a estratificação da população é um potencial fator de confusão e pode levar a resultados falso-positivos ou falso-negativos (Thomas e Witte, 2002). Conhecendo a ancestralidade é possível verificar a existência de estratificação na população e corrigir o seu efeito em estudos de associação utilizando métodos estatísticos específicos (Tiwari e col., 2008).

Os estudos com MIAs abriram a discussão se o sistema de classificação social de raça através da cor da pele auto-referida seria ou não um método adequado para ser utilizado em populações miscigenadas. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por exemplo, se utiliza do sistema de classificação por cor em suas pesquisas domiciliares e atualmente considera cinco grupos de cor da pele: branca, preta, amarela, parda e indígena (IBGE, 2011). Entretanto, a validade do sistema de classificação por cor é questionada para ser utilizada em indivíduos heterogêneos por ser baseada em uma característica subjetiva e, aparentemente, não discernir os indivíduos por grupos ancestrais (Lins e col., 2011; Pena e col., 2011). Além disso, estudos mostram que a auto-classificação pode mudar ao longo do tempo (Hitlin e col., 2006). Segundo Pena (2007), traços morfológicos seriam indicadores muito pobres de sua origem ancestral e, portanto, este tipo de classificação só existiria socialmente podendo levar a interpretações errôneas em estudos epidemiológicos.

Nos últimos 10 anos, tem sido realizados estudos sobre a estrutura genética da população brasileira que mostram que o Brasil é constituído por uma população miscigenada formada basicamente pela influência de três grupos ancestrais (Europeus, Africanos e Amerindios). A contribuição Européia tem se mostrado a mais expressiva (70,7 a 77,1%), enquanto a contribuição Africana tem sido intermediária (14,3 a 16,9%) e a de Amerindios a de menor proporção (8,5 a 11%) (Callegari-

34 Jacques e col., 2003; Lins e col., 2010; Pena e col., 2011). Entretanto, como o Brasil apresenta um território extenso, os estudos para inferir a ancestralidade da população brasileira também têm sido realizados considerando amostras de indivíduos das cinco regiões geopolíticas (Norte, Sul, Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste) (Lins e col., 2010; Pena e col., 2011). Desta forma, tem sido possível traçar o perfil da população brasileira e ressaltar a participação de cada região destacando as suas particularidades. A região Sul do Brasil, por exemplo, apresenta uma proporção de ancestralidade Européia (87,7%) superior à observada para o país (Lins e col., 2010), corroborando com o forte impacto imigratório europeu ocorrido na região. Apesar de estudos por regiões proporcionarem um maior refinamento no estudo da população brasileira, estes estudos geralmente usam amostras de indivíduos das capitais. Assim, as particularidades de pequenas localidades como as cidades ainda passam despercebidas. Essas particularidades estão diretamente relacionadas com o isolamento geográfico, influência de outras regiões pela proximidade de territórios e/ou pelo processo de colonização. É o que acontece com a cidade de Montes Claros no Estado de Minas Gerais que apresenta uma contribuição ancestral Africana (39%, como determinado por Silva e col., 2010) superior à observada para a região Sudeste do Brasil (14,1 – 17,3%) (Lins e col., 2010; Pena e col., 2011). Neste caso, a proximidade geopolítica com o estado da Bahia (localizado na região Nordeste) pode ter influenciado a estrutura da população, uma vez que o estado da Bahia foi historicamente ponto de desembarque de vários navios negreiros no período da escravidão e apresenta uma maior proporção de ancestralidade Africana (29,3%), como determinado por Pena e colaboradores (2011).

Dados do censo realizado em 2010 pelo IBGE, revelam que o número de indivíduos da cidade de Ouro Preto (localizado na região Sudeste) que se auto-declaram como tendo a cor da pele preta (14,4%), parda (52,5%), amarela (1,6%) e indígena (0,3%) é superior ao descrito para o Estado de Minas Gerais. Esta diferença, que é 5,2% maior para pretos e 8,2% maior para pardos, chama a atenção para a estrutura desta população. A população de Ouro Preto foi formada pela mistura de vários povos e atualmente corresponde a 70.281 indivíduos (IBGE, 2010b). A colonização de Ouro Preto iniciou com a descoberta de ouro em 1698 quando a região montanhosa foi alvo de um povoamento desordenado. Estima-se que 30 mil pessoas viviam na região naquela época (Bohrer, 2011), sendo a população formada por europeus, imigrantes paulistas e nordestinos, negros e ameríndios (Werkema, 2010). Havia um número significativo de mestiços, principalmente resultantes do concubinato com mulheres

35 pretas e mulatas, sendo que esses mestiços trabalhavam em todas as áreas, desde a mineração até as artes mais desenvolvidas (Bohrer, 2011).

O estudo da composição genética de especificas populações é importante tanto para estudos antropológicos quanto para estudos de associação, onde tem sido demonstrado que a prevalência de algumas doenças pode variar de acordo com a ancestralidade da população. É o que acontece, por exemplo, com a obesidade (Basu e col., 2009; Cheng e col., 2009; Cheng e col., 2010a; Carbel e col., 2011), hipertensão (Cheng e col., 2010b) e diabetes tipo 2 (Permutt e col., 2005). O melhor entendimento da prevalência de doenças complexas relacionadas com a ancestralidade genética pode ajudar na proposta de abordagens específicas para reduzir sua ocorrência.

Assim, afim de determinar a composição genética de uma amostra da população de Ouro Preto e verificar se existe concordância entre ancestralidade genética e a cor da pele auto-referida, no presente estudo, utilizamos 15 MIAs para estimar as proporções da contribuição Européia, Africana e Amerindia nesta. Adicionalmente, verificarmos se existe concordância entre a ancestralidade genética e a cor da pele auto-referida.

36 Material e métodos

População do estudo

A amostra deste estudo foi composta por 189 indivíduos (10,6 ± 2,04 anos) aleatoriamente selecionados do estudo transversal realizado em 2006 na cidade de Ouro Preto - Brasil (Cândido e col., 2009). Os voluntários doaram uma amostra de sangue que foi usada para a extração de DNA genômico (como determinado por Miller e col., 1988) e responderam a um questionário contendo questões de múltipla escolha sobre a cor da pele onde se auto-definiram como sendo de cor branca, morena clara, morena escura, preta ou não-declarada. Para realizar o estudo, os responsáveis legais dos participantes assinaram o formulário de consentimento (anexo 2) e o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Ouro Preto.

População parental

Três grupos de indivíduos (Africanos, Europeus e Amerindios) foram utilizados como populações parentais neste estudo. A amostra de Africanos (AFR, N = 120) foi composta por indivíduos de Senegal, Ghana, Cameroon e Botswana. A amostra de Europeus (EUR, N = 78) foi composta por indivíduos de Chicago e Baltimore, enquanto a amostra de Amerindios (AMR, N = 29) foi composta por indivíduos do Mexican Zapotec. Os genótipos das populações parentais foram cedidos por Smith e colaboradores (2004).

Marcadores selecionados

Quinze MIAs foram selecionados para avaliar o padrão de mistura genética da população da cidade de Ouro Preto (rs1426654, rs2065160, rs730570, rs1129038, rs1240709, rs3796384, rs2278354, rs2814778, rs1480642, rs6034866, rs7349, rs803733, rs222541, rs267071 e rs730086). Os marcadores estão distribuídos nos cromossomos 1, 3, 5, 6, 9,10, 14 e 15 e fazem parte do painel de marcadores testados por Lins e colaboradores (2010) que apresentaram resultados de estimativa da ancestralidade consistente com a heterogeneidade esperada para a população brasileira. Estes marcadores genéticos foram escolhidos, porque apresentam diferenças nas frequências alélicas entre as populações parentais (Europeus e Africanos) superiores a 40 % (Lins e col., 2010). Maiores informações sobre os

37 marcadores, tais como localização cromossômica, alelo polimórfico e frequência nas populações parentais, estão indicadas no quadro 2.1.

Quadro 2.1: Localização, alelos polimórficos e frequência nas populações parentais dos 15 MIAs.

dbSNP(rs) Cromossomo Alelo AFR* AMR* EUR*

rs2065160 1 C 0,487 0,875 0,088 rs1240709 1 A 0,050 0,103 0,766 rs2814778 1 G 0,983 0,018 0,006 rs3796384 3 C 0,783 0,875 0,154 rs2278354 5 T 0,703 0,839 0,120 rs267071 5 C 0,088 1,000 0,654 rs1480642 6 C 0,121 0,621 0,993 rs222541 6 G 0,971 0,018 0,257 rs803733 9 C 0,013 0,410 0,880 rs7349 10 T 0,969 0,000 0,067 rs730570 14 A 0,197 0,054 0,896 rs1129038 15 C 0,996 0,983 0,224 rs1426654 15 C 0,967 0,931 0,013 rs730086 17 C 0,063 1,000 0,667 rs6034866 20 A 0,954 0,143 0,083

AFR (Africano), EUR (Europeu), AMR (Amerindio). *LINS e col., 2010.

Ensaio de genotipagem

Os fragmentos gênicos foram co-amplificados em volume de 5 µl contendo 30 ng de

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