• Nenhum resultado encontrado

Qualidade da intereção pais-bebé e psicopatologia parental

CAPÍTULO DOIS: ARTIGO UM

5.4. Qualidade da intereção pais-bebé e psicopatologia parental

Depressão.

A sintomatologia depressiva clinicamente significativa durante a gravidez e aos 2 meses pós-parto, encontra-se associada com a qualidade da interação aos 6 meses. Assim a sintomatologia parece exercer um efeito não a curto, mas a longo prazo na qualidade de interação. Já outros estudos sugerem que a presença de sintomatologia depressiva clinicamente significativa tem um impacto negativo ao nível da qualidade da interação global (Schwengber, 2002; Schwengber, & Piccinini, 2004). No entanto, também seria de prever que o impacto fosse negativo ao nível do padrão de comportamento da criança (Schwengber, 2002; Schwengber, & Piccinini, 2004; Figueiredo, Pacheco, Costa, Conde, & Teixeira, 2010; Pacheco e Figueiredo, 2012).

Os sentimentos autocentrados de tristeza, instabilidade emocional, irritabilidade, choro e cansaço característicos dos indivíduos com sintomatologia depressiva, dificultam a capacidade dos pais em estabelecer um vínculo afetivo saudável com os filhos (Faria, & Fuertes, 2007; Costa, 2012; Pacheco, & Figueiredo, 2012), na medida em que dificultam a captação, a interpretação e a capacidade de responder adequadamente aos sinais do bebé (Costa-Silva, LePendu, Pontes, & Dubois, 2002; Faria, & Fuertes, 2007; Mesman, IJzendoorn, & Bakermans-Kranenburg, 2009). Contudo é de salientar a importância da articulação da psicopatologia com outros fatores moderadores da

75

qualidade da interação pais-bebé, como os fatores sociodemográficos e culturais dos pais, os eventos de vida adversos, ou o próprio temperamento dos filhos (Bifulco, et. al, 2004; Dietz, Jennings, Kelly, & Marshal, 2009).

Ansiedade.

No que concerne à sintomatologia ansiosa clinicamente significativa durante a gravidez, esta encontra-se associada à qualidade da interação nas mães e nos pais; sendo que, quando verificada nos pais, se associa à qualidade global da interação aos 2 meses; e quando verificada nas mães, se associa ao padrão de comportamento do bebé aos 6 meses.

Outros autores também observaram variações no comportamento infantil de acordo com a presença de sintomatologia ansiosa clinicamente significativa das mães durante a gravidez (Bogels, & Perotti, 2010; Stein, et. al, 2012; Braeken, et. al, 2013; Conde, & Figueiredo, 2005; Glover, 2014; Graignic-Philippe, Dayan, Chokron, Jacquet, & Tordjman, 2014; Raposa, Hammen, Brennan, & Najman, 2014). Tais resultados sugerem a vulnerabilidade do desenvolvimento fetal face à presença de fatores de risco como a presença de psicopatologia na mãe (Conde, Figueiredo, Tendais, Teixeira, Costa, Pacheco, Rodrigues, & Nogueira, 2010; McMahon, Boivin, Gibson, Hammarberg, Wynter, Saunders, & Fisher, 2013; Qiu, Rifkin-Graboi, Chen, Chong, Kwek, Gluckman, Fortier, & Meaney, 2013; Uguz, Sonmez, Sahingoz, Gokmen, Basaran, Gezginc, Sonmez, Kaya, Erdem, Cicekler, & Tasyurek, 2013). Aos 6 meses os bebés já deveriam ter adquirido um conjunto de competências que estão claramente visíveis em bebés de mães não ansiosas durante a gravidez e não estão visíveis em bebés de mães ansiosas durante a gravidez. Esta dinâmica parece associar-se a alterações na função endócrina e imunológica materna em situação de stresse e ser

76

preditora de problemas emocionais e comportamentais na prole a longo prazo (Conde, & Figueiredo, 2005).

A literatura apresenta evidências de que a exposição fetal à ansiedade materna tem consequências adversas a longo prazo para o desenvolvimento neurológico, comportamental e cognitivo infantil (Glover, 2014; Graignic-Philippe, Dayan, Chokron, Jacquet, & Tordjman, 2014; Raposa, Hammen, Brennan, & Najman, 2014; McMahon, Boivin, Gibson, Hammarberg, Wynter, Saunders, & Fisher, 2013; Qiu, Rifkin-Graboi, Chen, Chong, Kwek, Gluckman, Fortier, & Meaney, 2013; Uguz, Sonmez, Sahingoz, Gokmen, Basaran, Gezginc, Sonmez, Kaya, Erdem, Cicekler, & Tasyurek, 2013). Apesar de, ainda, pouco de conhecer sobre os mecanismos envolvidos nesta dinâmica, estudos demonstram que a alteração dos níveis de glucocorticoides e o comprometimento do fluxo sanguíneo na placenta provocados por ansiedade da mãe no terceiro trimestre de gravidez têm um impacto direto no desenvolvimento do eixo hipotalâmico-pituitário-adrenal e do sistema nervoso central do feto (Conde, & Figueiredo, 2005; Glover, 2014; McMahon, Boivin, Gibson, Hammarberg, Wynter, Saunders, & Fisher, 2013). O ambiente intra-uterino, em particular, a sobreexposição a elevados níveis de cortisol materno, resultante da experienciação de ansiedade, prediz, assim, dificuldades de temperamento no recém-nascido (McMahon, Boivin, Gibson, Hammarberg, Wynter, Saunders, & Fisher, 2013).

No entanto, a vulnerabilidade do feto é mediada por uma interação genética-ambiente, que condiciona o grau de impacto da ansiedade materna durante a gravidez e o próprio desenvolvimento infantil (McMahon, Boivin, Gibson, Hammarberg, Wynter, Saunders, & Fisher, 2013). Neste sentido, também os autores referem ser a ansiedade traço o tipo de ansiedade que mais impacto tem ao nível desta dinâmica (Glover, 2014; McMahon, Boivin, Gibson, Hammarberg, Wynter, Saunders, & Fisher, 2013).

77

Como já foi referido a ansiedade da mãe durante a gravidez pode associar-se às preocupações derivadas à aproximação do momento do parto e à saúde do bebé. No entanto, no caso do pai, a ansiedade pode dever-se ao próprio bebé que vai nascer, pelo que se reflete na interação a curto prazo. Claramente neste estudo seria importante continuar a monitorizar a sintomatologia ansiosa depois do parto para perceber a evolução desta dimensão a longo do tempo.

6. Conclusão

Os resultados observados ao nível da relação entre psicopatologia e qualidade de interação pais-bebé enfatizam não só o impacto das relações primárias ao nível do padrão de comportamento do individuo, mas também o interesse em alargar a investigação dos fatores que influenciam a qualidade do comportamento interativo dos próprios pais, em busca de uma compreensão mais aprofundada sobre esta dinâmica. Por outro lado, estes resultados sugerem também a importância de implementar intervenções ao nível da saúde mental no programa de rotina da saúde perinatal.

Em forma de sugestão, propõe-se que as investigações futuras enquadrem análises que englobem outros fatores influenciadores da qualidade da interação (dados sociodemográficos dos pais e do bebé, dados psicofisiológicos, consumo de substâncias, eventos de vida, gestação múltipla etc.), que possam estar a interferir articuladamente com a presença de psicopatologia.

78

Documentos relacionados