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4 PROCESSOS DE TRANSPORTE NA RIA DE AVEIRO

6.4 Qualidade dos sedimentos

A caracterização física do sedimento, designadamente no que respeita à contaminação por metais pesados, está associada por um lado, às fontes de poluição e, por outro à constituição dos próprios sedimentos (JAPA, 1993).

No sedimento, os minerais de argila e a matéria orgânica são os fixadores por excelência dos poluentes na forma iónica, dada a sua elevada superfície específica, carga eléctrica e reactividade química. Para além das superfícies externas, os cristais de certos minerais argilosos como a esmectite, vermiculite e interestratificados onde intervenham estes dois minerais, possuem superfícies internas onde a fixação é também possível. A concentração de metais pesados e outros constituintes varia, normalmente, de forma inversa com a granulometria do sedimento (JAPA, 1993). A granulometria dos sedimentos, em conjunto com a distribuição de minerais argilosos na Ria de Aveiro, permite concluir que os Canais da parte Norte da Ria têm uma maior capacidade de retenção de metais do que os Canais a Sul da barra (JAPA, 1993). Por outro lado, a parte Norte foi mais sujeita às descargas industriais susceptíveis de contribuírem para os teores de metais encontrados.

As principais fontes de mercúrio para a Ria foram a Uniteca e os esgotos domésticos. No primeiro caso a concentração máxima encontrada foi de 850 mg/kg de sedimento superficial seco diminuindo estes valores com a distância: 100 mg/kg na parte Norte do Largo do Laranjo, cerca de 10 mg/kg na rede de Esteiros de Canelas e 1 mg/kg na região a Sul do Chegado. Nas zonas afectadas pelas descargas de águas residuais domésticas a concentração de mercúrio (Hg) nos sedimentos tem sempre valores superiores a 1 mg/kg, valor superior à média da Ria que é de 0,72 mg/kg (exclusão do largo do Laranjo). Este valor é superior ao encontrado em sedimentos de zonas não sujeitas a contaminação, em que as concentrações se situam entre 0,13 e 0,26 µg/g. Nas areias das praias Oceânicas a concentração do metal é inferior a 0,1 µg/g, sendo este valor típico de áreas não sujeitas a contaminação. Os efluentes domésticos contribuem para os sedimentos com quantidades de mercúrio nitidamente superiores a todas as outras fontes, antropogénicas ou naturais, excepção feita à produção de

cloro (Universidade de Aveiro, 2001b).

Relativamente ao teor de matéria orgânica, e sabendo que as camadas mais profundas estão mais mineralizadas, verifica-se um impacte positivo e localizado na qualidade dos sedimentos.

Após as dragagens, a contaminação por metais é função das características físicas e químicas dos sedimentos encontrados na camada subjacente à camada dragada. Assim, conforme a sua granulometria e teor em argila, terá maior ou menor capacidade para reter novos metais depositados.

Nas áreas envolventes aos canais dragados, a possível lexiviação de metais dos dragados depositados nas áreas marginais poderá conduzir a um acréscimo do teor em metais nos sedimentos do fundo. Neste caso ter-se-á verificado, como resultado final do desassoreamento, a mera deslocação dos metais dos sedimentos da área dragada para as áreas adjacentes ao Canal.

Segundo Universidade de Aveiro (2001b) a diminuição dos teores de mercúrio ao longo do Esteiro indica que ocorre sedimentação do metal nas zonas próximas da sua descarga. Verificou nos seus trabalhos, um decréscimo da concentração do mercúrio nos sedimentos superficiais no período de amostragens (entre 1993 a 1995). A concentração máxima de mercúrio nos sedimentos recolhidos em profundidade, foi determinada a cerca de 40 cm, o que indica que os sedimentos mais contaminados foram parcialmente cobertos por camadas menos contaminadas. Esta observação indica que têm decrescido as descargas do metal para a Ria.

Pereira (1996) concluiu que a existência do Largo do Laranjo, a 4200 m da descarga do metal, funciona como bacia de retenção do mercúrio contribuindo para a sua diminuição e dispersão para o restante sistema estuarino (Universidade de Aveiro, 2001b).

Duarte et al. (1996) estudaram o perfil de variação da concentração de mercúrio nos sedimentos em profundidade, recolhidos a cerca de 2000 m do início do Esteiro do Barbosa. Obtiveram uma concentração à superfície de mercúrio de 2,6 µg/g, verificando-se o maior valor de concentração do metal a uma profundidade de aproximadamente 30 cm (10,7 µg/g). A uma profundidade de 50 cm os valores de concentração de mercúrio eram apenas cerca de quatro vezes superiores aos níveis considerados de base (0,05 µg/g). Desta forma, os autores concluíram que os sedimentos recolhidos no Esteiro da Barbosa, da camada com 50 cm de profundidade, poderiam corresponder aos sedimentos existentes no local antes de ocorrer o problema da contaminação industrial (Universidade de Aveiro, 2001b).

O pico máximo de concentração de mercúrio em termos de profundidade encontrava-se a cerca de 30 cm. Nos anos 80 o pico máximo de concentração encontrava-se à superfície, com uma tendência para contínuo enriquecimento. A actual posição do pico máximo revela que o Esteiro da Barbosa é uma zona de sedimentação, mas que a matéria suspensa que se tem depositado neste Esteiro é cada vez menos contaminada (Universidade de Aveiro, 2001b).

6.5 Síntese

Estudos da dinâmica lagunar e de qualidade da água revelam de forma inequívoca o aumento da intrusão salina no BVL assim como a existência de zonas de influência diferenciadas das marés no seu interior e em toda a área envolvente da laguna. As intervenções sucessivas decorrentes das obras do porto de Aveiro e de dragagem dos canais da Ria têm sido responsáveis pela intrusão salina no BVL que é seguramente o problema mais denunciado pela maioria dos intervenientes. Independentemente da salinidade, a qualidade das águas, de um modo geral, não é boa sendo sobretudo afectada pela contaminação orgânica provavelmente de origem pecuária e por fertilização com chorumes o que simultaneamente não é compensado por uma reoxigenação natural devida à pouca circulação das águas, sobretudo em algumas das áreas do BVL. A contaminação orgânica de origem doméstica, embora constituísse um problema, deixou de o ser com a entrada em funcionamento do SIMRIA. Sob o ponto de vista da qualidade do ambiente, o problema mais grave será, no entanto, os níveis de concentração de mercúrio nos sedimentos nomeadamente nos esteiros do Barbosa e de Estarreja embora a descarga de mercúrio para a Ria tenha decrescido.