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2. INTERVENÇÃO PROFISSIONAL MAJOR

2.2. Enquadramento Conceptual e Teórico

2.2.2. Qualidade em saúde e a segurança dos cuidados

A preocupação com a qualidade dos cuidados de saúde não é novidade, uma vez que “atravessa toda a história da Medicina, desde Hipócrates, passando por Florence Nightingale e Ernest Codman” (Campos, Saturno & Carneiro, 2010: 11), contudo, tem merecido um enfoque crescente nos últimos anos, a nível internacional e nacional.

Segundo a Constituição da República Portuguesa, no n.º 3, alínea d), do artigo 64.º (Saúde), na defesa do direito à proteção da saúde, cabe ao estado “Disciplinar e fiscalizar as formas empresariais e privadas da medicina, articulando-as com o serviço nacional de saúde, por forma a assegurar, nas instituições de saúde públicas e privadas, adequados padrões de eficiência e de qualidade” (Assembleia da República, 2005a: 4652).

Também a Lei de Bases da Saúde, Lei n.º 48/90, estabelece na Base XXX, n.º2, que para a avaliação permanente do SNS “É igualmente colhida informação sobre a qualidade dos serviços, o seu grau de aceitação pela população utente, o nível de satisfação dos profissionais e a razoabilidade da utilização dos recursos em termos de custos e benefícios” (Assembleia da República, 1990: 3457).

Como elemento basilar das políticas de saúde em Portugal surge o Plano Nacional de Saúde, que na sua versão atual, alinhada com as orientações estratégicas demarcadas pela Organização Mundial

da Saúde (OMS) para a região europeia, adota um modelo concetual com quatro eixos estratégicos: cidadania, acesso, políticas saudáveis e qualidade (DGS, 2015a).

Relativamente à definição de qualidade em saúde, entende-se que esta se encontra dependente da visão e dos valores de quem a define (Campos, et al. 2010), pelo que têm sido apresentadas múltiplas definições.

O Institute of Medicine [IOM] (1990: 4), define qualidade em saúde como “o grau em que os serviços de saúde para os indivíduos e populações aumentam a probabilidade de se atingirem os resultados de saúde desejados de acordo com o conhecimento profissional corrente”4.

Segundo a OMS, a qualidade em saúde consiste na prestação de cuidados de saúde eficazes, oportunos, eficientes, equitativos, centrados nas pessoas e seguros, tendo em vista a melhoria dos resultados de saúde desejados pelos indivíduos e comunidades (OMS, 2006).

A DGS (2015a: 16) e o MS (2015a: 15551) referem que a qualidade em saúde consiste na “prestação de cuidados de saúde acessíveis e equitativos, com um nível profissional ótimo, que tenha em conta os recursos disponíveis e consiga a adesão e satisfação do cidadão”, tendo em consideração as suas necessidades e expectativas, mediante a adequação dos cuidados.

Decorrente do Plano Nacional de Saúde, o MS, através do Despacho n.º 5613/2015, publicou a Estratégia Nacional para a Qualidade na Saúde 2015-2020, onde consigna que

“A qualidade e a segurança no sistema de saúde são uma obrigação ética porque contribuem decisivamente para a redução dos riscos evitáveis, para a melhoria do acesso aos cuidados de saúde, das escolhas da inovação, da equidade e do respeito com que esses cuidados são prestados.” (MS, 2015a: 13551).

Corroborando o supracitado, Larrabee (2011: 15) refere que a qualidade dos cuidados é assumida como uma responsabilidade ética do exercício profissional do enfermeiro, na medida em que “a qualidade integra os princípios éticos de valor, beneficência, prudência e justiça e, quando aplicada ao cuidado de saúde, pode inferir-se que a busca de uma assistência de alta qualidade ou excelente é uma obrigação ética”.

Constatamos assim que, a segurança e a qualidade dos cuidados são fatores indissociáveis, na medida em que a segurança é considerada imprescindível para que sejam prestados cuidados de qualidade (Internacional Council of Nurses [ICN],2012a).

A segurança, quando associada aos cuidados de saúde, pode ser definida como “redução do risco de danos desnecessários a um mínimo aceitável”, sendo que, “Um mínimo aceitável refere-se à noção coletiva em face do conhecimento atual, recursos disponíveis e no contexto em que os cuidados foram prestados em oposição ao risco do não tratamento ou de outro tratamento.” (DGS,2011: 14).

A publicação do relatório “To err is human: building a safer health system”, pelo IOM, em 1999, foi um marco importante para a sensibilização quanto à problemática da segurança do doente, na medida em que até então não se conheciam dados objetivos sobre o impacto dos erros médicos evitáveis (Kohn, Corrigan & Donaldson, 2000).

A OMS e União Europeia, com o objetivo de melhorar a qualidade dos cuidados de saúde, recomendam que seja implementada uma cultura de segurança que impulsione alterações comportamentais nos profissionais e nas organizações prestadoras de cuidados de saúde (DGS, 2015b). Em resposta às recomendações internacionais, em Portugal, foi desenvolvido o Plano Nacional para a Segurança dos Doentes 2015-2020, coordenado pelo Departamento da Qualidade na saúde da DGS (MS, 2015b).

Em 2009, a problemática da segurança do doente foi reconhecida também pelas sociedades de medicina intensiva de todo o mundo que, por iniciativa da European Society of Intensive Care Medicine, se reuniram nesse ano e assinaram a Declaração de Viena, em que assumem investir na prevenção, vigilância e implementação de medidas, com vista ao aumento da segurança do doente crítico (Moreno, Rhodes & Donchin, 2009).

Posto isto, a promoção da segurança e qualidade dos cuidados envolve um vasto conjunto de ações, entre as quais, o investimento na formação dos profissionais no que diz respeito à gestão de risco e melhoria de desempenho, prática clínica segura e incorporação de conhecimento científico (ICN, 2012b). Contudo, apesar do desenvolvimento da ciência e crescente disponibilidade de informação, verifica-se ainda uma lacuna entre a evidência e a ação, o que justifica o investimento na mudança da PBE, por forma a minimizar tomadas de decisão com deficiente fundamentação, que poderão comprometer a segurança e qualidade dos cuidados de saúde, através de variações na prática que se traduzem em cuidados desiguais e com menor eficácia e eficiência (ICN, 2012b).