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QUANTO À RESOLUÇÃO DAS PROVAS PIAGETIANAS

CAPÍTULO 3 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

3.2 QUANTO À RESOLUÇÃO DAS PROVAS PIAGETIANAS

As três provas clássicas piagetianas aplicadas durante o experimento apresentaram resultados similares nos dois grupos da amostra31. Em ambos verificou-se um crescimento estatisticamente significativo das notas dos alunos. O comportamento equivalente do GE e do GC descarta a intervenção psicopedagógica como um fator de influência sobre as mudanças cognitivas ocorridas no GE. Embora não tenham sido submetidos ao processo de intervenção psicopedagógica os alunos do GC apresentaram mudanças cognitivas importantes nos três domínios avaliados nas provas. No GE tais mudanças estiveram relacionadas, de alguma maneira, ao desempenho dos sujeitos nas provas de problemas.

O estudo das relações entre as notas dos problemas multiplicativos e das provas piagetianas dos dois grupos32 mostrou que, embora o desempenho nas provas piagetianas tenha sido o fator que melhor explicou as mudanças cognitivas ocorridas nos grupos, o desempenho nos testes de problemas parece ter sido capaz de explicar, embora com menor consistência, o crescimento do GE nessa área. Neste grupo sair-se melhor nos testes de problemas garantiu, em parte, um desempenho correspondente nas provas piagetianas33. No GC, o mesmo aconteceu em apenas uma prova piagetiana (correspondência dupla e multiplicação numérica).

Os dados de comparação do desempenho da amostra nas provas piagetianas antes e depois da realização da intervenção psicopedagógica qualificam suas aquisições como decorrentes das características do experimento. A neutralização da influência das variáveis dos sujeitos sobre as notas dos testes, obtida pelo tratamento estatístico dos dados não autoriza relacionar-se o crescimento dos grupos a variáveis não controladas na pesquisa, como o desenvolvimento espontâneo e maturacional dos alunos. A experiência física com o material e a situação experimental vivenciada pelos sujeitos durante a realização dos testes surgem como prováveis fatores de influência sobre o desempenho dos grupos. A definição dessas variáveis foi tomada emprestada de Sisto (1997, p.105): experiência física refere-se à interação dos sujeitos com o

31 Para fins de análise estatística as notas das provas piagetianas foram padronizadas segundo uma escala numérica

de 0 a 10, válida para os três testes, assegurando, entretanto, a qualidade das respostas de cada um. A descrição deste processo de padronização está contida no tópico “Provas piagetianas” do capítulo referente à Metodologia da pesquisa.

32 Este estudo foi realizado por meio de análise fatorial por componentes principais descrito no tópico “Relações

entre varáveis” deste capítulo.

33 A influência é considerada parcial tendo em vista os baixos coeficientes de correlação e a separação dos dois

conjuntos de variáveis (aritmética e provas piagetianas) nos gráficos de fatores que mostram a baixa condição de explicação dos fatores 1 e 2 (69% na prova de correspondência dupla e multiplicação numérica, 65% na prova de permutas e 66% na prova de matrizes) sobre a variabilidade das variáveis contidas no segundo fator (mudanças cognitivas) GE, embora não neguem sua existência.

material utilizado nas provas piagetianas, e situação experimental à interação estabelecida entre o experimentador e o sujeito investigado, mediada pelo material apresentado, as questões colocadas e as respostas dadas.

No GC os dados da aplicação repetida das provas piagetianas (pré-teste, pós-teste 1 e pós-teste postergado) forneceram informações sobre as mudanças cognitivas produzidas pela manipulação do material da prova e pela interação dos alunos com o experimentador. Estas mudanças significaram a distância que cada criança faltava percorrer em relação à construção de cada um dos domínios cognitivos avaliados nas provas. Os dados da influência destas variáveis sobre o desempenho da amostra antecipam os encontrados no estudo das relações entre o desempenho dos testes de problemas e das provas piagetianas. Os resultados mostraram que o desempenho nas provas piagetianas foi melhor explicado pelas mudanças cognitivas dos sujeitos. Isto significa que o crescimento dos sujeitos em cada um dos testes foi fortemente influenciado pelos anteriores.

Na prova de matrizes, a amostra apresentou um crescimento significativo de suas notas (no GE p=0,002 entre pré e pós 1, p=0,0009 entre pós 1 e pós 2, e p=6,01E-06 entre pré e pós 2; no GC p=0,005 entre o pré e o pós 1, p=2,86E-06 entre o pós 1 e o pós 2, e p=1,07E-08 entre o pré e o pós 2). O crescimento do GC durante o experimento abrangeu uma maior amplitude de notas (notas 1 a 5) em comparação com o GE (notas de 1 a 4). No GE a nota 1 (Gráfico 6) reduziu sua freqüência de 68,8% (31) para 48,8% (22) e 31,1% (14) no pós-teste postergado; a nota 2 aumentou de 28,8% (13) para 44,4% (20) e 48,8% (22); e a nota 3 aumentou fortemente sua freqüência no último pós-teste passando de 2,2% (1) para 4,4% (2) e 20% (9). A nota mais alta alcançada pelo grupo, a nota 4, obteve apenas uma incidência no pós-teste 1 e retornou ao nível do pré-teste, zero, no pós-teste 2.

Gráfico 6: Notas das provas de matrizes – GE

Na prova de matrizes o GC (Gráfico 7) apresentou resultados similares aos do GE: a nota 1 teve sua freqüência reduzida de 70% (42) para 56,6% (34) e 28,3% (17); a nota 2 aumentou a freqüência de 30% (18) para 36,6% (22) e 53,3% (32). A faixa de notas 3 atingiu, em valores absolutos, o mesmo crescimento do grupo experimental, de 1,6% (1) para 5% (3) e 15% (9) no pós-teste postergado. As notas 4 e 5 obtiveram, a primeira, 1,6% (1) nos dois pós-testes, e a segunda, 1,6% (1) no pós-teste postergado. A média das notas na prova de matrizes cresceu de modo equivalente nos dois grupos. Ambos iniciaram o experimento com média de 1,33, e enquanto o GC aumentou suas médias para 1,51 e 1,95 nos dois pós-testes; o GE aumentou para 1,60 para 1,88. O desvio padrão das notas mostra um distanciamento ligeiramente superior das notas do GC em relação às médias. No GE os limites inferiores e superiores do intervalo das notas foram mantidos ao longo do experimento (no GC dp.0,50 no pré-teste, 0,67 e 0,81 nos dois pós-testes; no GE dp.0,66 no pré-teste, e 0,68 e 0,71 nos dois pós-testes).

Gráfico 7: Notas das provas de matrizes – GC

0 10 20 30 40 50 1 2 3 4 5 Notas GC nº de alunos PRÉ PÓS1 PÓS2 0 5 10 15 20 25 30 35 1 2 3 4 Notas GE nº de alunos PRÉ PÓS1 PÓS2

Na prova de correspondência dupla e multiplicação numérica a amostra apresentou aumento significativo de suas notas (no GC p=0,0008 entre pré e pós-teste 1, p=0,002 entre o pós 1 e pós-teste 2, e p=8,09E-06 entre o pré e o pós-teste 2; no GE p=0,08 entre pré-teste e primeiro pós-teste, p=0,0004 entre os dois pós-testes, e p=0,0002 entre pré-teste e pós-teste 2). Nesta prova os grupos apresentaram uma maior concentração da freqüência nas faixas superiores de notas, 3 e 4. As médias das notas dos grupos mantiveram-se altas durante todo o experimento: 2,7; 3 e 3,23 no GC; 3 ; 3,11 e 3,33 no GE, ratificando os dados de freqüência. Contrariamente, porém, às duas outras provas piagetianas, nesta, as notas concentraram-se mais fortemente em torna da média (no GC dp.0,78 no pré-teste e 0,46 nos dois pós-testes; no GE dp.0,52 no pré-teste e 0,53 e 0,47 nos dois pós-testes).

O GC (Gráfico 8) teve a freqüência das duas faixas superiores de notas (3 e 4) aumentadas: a primeira, de 63,3% (38) para 78,3% (47) e 73,3% (44); a segunda, de 11,6% (7) para 15% (9) e 25% (15). As duas faixas inferiores, 1 e 2, tiveram uma redução importante: a primeira reduziu a freqüência de 10% (6) para zero nos dois pós-testes; e a segunda reduziu de 15% (9) para 6,6% (9) e 1,6% (1) no pós-teste postergado.

Gráfico 8: Notas das provas de correspondência dupla e multiplicação numérica – GC

No GE (Gráfico 9) apenas a faixa de notas mais altas (nota 4) teve sua freqüência aumentada: passou de 11,1% (5) para 20% (9) e 33,3% (15) no pós-teste postergado. Nas três outras faixas o grupo reduziu sua freqüência, embora com algumas oscilações: na nota 1, a mais baixa, o grupo passou de 2,2% (1) para zero nos dois pós-testes; na nota 2, passou de 6,6% (3) para 8,8% (4) e zero no pós-teste 2; e, finalmente, na nota 3 reduziu sua freqüência de 80% (36) para 71,1% (32) e 66,6% (30) no pós-teste postergado.

0 10 20 30 40 50 60 70 1 2 3 4 5 Notas GC nº de alunos PRE POS1 POS2

Gráfico 9: Notas das provas de correspondência dupla e multiplicação numérica – GE

Na prova de permutas a amostra apresentou resultados opostos: o GC apresentou um aumento significativo de suas notas (entre pré-teste e pós-teste 1, p=0,003; e entre pré e pós-teste postergado, p=0,0001), enquanto no GE o crescimento não foi significativo (do pré-teste para pós 1, nível de significância 0,19; do pós 1 para pós-teste 2, p=0,18; e do pré para pós-teste 2, p=0,05). O GC (Gráfico 10) apresentou redução gradativa das notas da faixa inferior (nota 1) do primeiro ao último teste: de 73,3% (44) para 56,6% (34) e 51,6% (31). Esta redução foi acompanhada pelo aumento da freqüência nas demais faixas de notas, em particular da segunda (nota 2), que aumentou de 23,3% (14) para 38,3% (23) e 41,6% (25) no último pós-teste. As faixas de notas mais altas 3, 4 e 5 também obtiveram algum crescimento, embora um pouco oscilante: 3,3% (2), 3,3% (2) e 5% (3), na primeira faixa de nota; 0%, 1,6% (1) e 0%, na segunda; e 0%, 0% e 1,6% (1), na terceira.

Gráfico 10: Notas das provas de permutas – GC

O GE (Gráfico 11) apresentou uma migração menos intensa que a do grupo controle. Na faixa inferior (nota 1) o GE apresentou uma pequena redução passando de 66,6% (30) para 57,7% (26) e 53,3% (24). A migração desta faixa foi acompanhada por um aumento na quantidade de

0 10 20 30 40 50 1 2 3 4 5 Notas GC nº de alunos PRE PÓS1 PÓS2 0 10 20 30 40 50 1 2 3 4 5 Notas GE nº de alunos PRÉ PÓS1 PÓS2

notas imediatamente superior: a freqüência da nota 2 passou de 33,3% (15) para 42,2% (19) e 44,4% (20); a nota 3 apresentou apenas uma incidência no pós-teste 2 passando de 0 para 1.

Gráfico 11: Notas das provas de permutas – GE

A média das notas do GC apresentou certa vantagem em relação ao GE. No primeiro teste o GC apresentou uma média de 1,30 e nos dois pós-testes, 1,50 e 1,58. O GE iniciou o experimento com média 1,30 passando para 1,42 e 1,48 no segundo pós-teste. Os dados de desvio padrão dos grupos evidenciam um distanciamento discreto de suas notas em torno da média (no GC dp.0,53 no pré-teste, 0,65 e 0,74 nos dois pós-testes; no GE dp.0,47 no pré-teste, 0,49 e 0,54 nos dois pós-testes).

Os dois grupos da amostra apresentaram características similares dos alunos que mais se beneficiaram do experimento. Nas provas de matrizes e permutas os alunos que mais se beneficiaram da interação com o material e o experimentador parecem ter sido aqueles com desempenho mais baixo. Na prova de matrizes os alunos que obtiveram nota 1 no pré-teste chegaram ao segundo pós-teste com uma redução de sua freqüência de 50% no GE e 42% no GC; os que haviam obtido nota 2 tiveram redução de 20% no GE e 23,3% no GC; e aqueles com nota 3, redução de 18% no GE e 13,5% no GC. Isto significa que, nesta prova para os alunos situados em um nível inferior de desenvolvimento no início da prova, a interação proporcionada pelos testes foi suficiente para promover mudanças cognitivas neste domínio. Aos alunos que iniciaram o experimento com notas mais altas, entre 4 e 5, a interação com o material e o experimentador foi quase indiferente.

Na prova de permutas os resultados foram bastante próximos da anterior: nos dois grupos, os alunos que mais se beneficiaram do experimento foram os que haviam obtido as notas mais baixas no início do experimento. No GC os alunos que obtiveram nota 1 no pré-teste tiveram sua

0 5 10 15 20 25 30 35 1 2 3 Notas GE nº de alunos PRE PÓS1 PÓS2

freqüência reduzida nesta faixa de notas em 21% no pós-teste postergado, no GE tiverem redução de 23%. Os alunos que obtiveram nota 2 no pré-teste reduziram sua freqüência nesta faixa em 18% no GC e 11% no GE. Mais uma vez, aos alunos que iniciaram o experimento em um nível de desenvolvimento mais baixo, a interação com o material e o experimentador foi suficiente para desencadear mudanças cognitivas no domínio de permutas. Para os alunos com níveis de desenvolvimento mais alto, entre 3 e 5, o experimento foi quase indiferente.

Na prova de correspondência dupla e multiplicação numérica os resultados foram opostos aos dois anteriores. Desta vez, os alunos que mais se beneficiaram do experimento foram diferentes. No GC os alunos com notas mais altas e mais baixas parecem ter se beneficiado igualmente. Entre o pré-teste e o segundo pós-teste, todas as faixas de notas, desde 1 até 4, tiveram redução entre 10% e 14% de freqüência. No GE os alunos que iniciaram o experimento com notas mais altas, entre 3 e 4, aumentaram mais fortemente sua participação nestas faixas, de 14% para 22%. Os alunos com notas mais baixas, entre 1 e 2, tiveram redução de apenas 2% e 6% (pós–teste 1 e pós-teste postergado) nesta faixa de notas, após o período de intervenção.

O crescimento equivalente dos dois grupos nas provas, com exceção da prova de correspondência dupla e multiplicação numérica parece resultar da interação entre desenvolvimento maturacional, experiência física com o material da prova e situação experimental. O crescimento das notas dos grupos evidenciou a distância a ser percorrida pelos sujeitos na construção destes domínios. A avaliação do quanto significou este crescimento em relação ao desenvolvimento natural dos sujeitos não foi possível ser realizada, em razão da inexistência de uma população de referência dentro dos limites da pesquisa. As razões da diferença de comportamento dos dois grupos na prova de correspondência dupla e multiplicação numérica não foi objetivo deste trabalho. Contudo, a verificação de seu caráter casual ou de sua relação com o conteúdo da intervenção psicopedagógica merecem um estudo posterior, mais detalhado.