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CAPÍTULO 3 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS

3.5 Quanto ao êxodo rural

Outro assunto que preocupa muito os agricultores é a sucessão familiar nas propriedades, o êxodo rural, considerado por alguns entrevistados um dos principais problemas. Atualmente, o jovem pouco se interessa pela vida no campo. Podemos começar falando deste problema pela educação: hoje quase não possuímos escolas no interior, apenas 5, uma em cada localidade do nosso município. As crianças precisam acordar às vezes às cinco ou às seis horas da manhã a fim de pegar o transporte para poder estudar.

Chegam à escola com sono, cansadas, com pouco interesse no estudo. Depois, no ensino médio, precisam vir até a cidade estudar, então precisam acordar ainda mais cedo. As dificuldades são enormes, e posteriormente, no ensino técnico ou superior, precisam buscar outra cidade para continuar os estudos. Então, pensando pelo lado da educação é assim que funcionam as coisas.

Mas também tem outras questões, como, por exemplo, no interior não existe feriado, com chuva ou sol o trabalho precisa ser feito, e muitas vezes o jovem não quer ter este compromisso, como diz um entrevistado:

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Hoje em dia o pessoal na cidade querem comodidade, querem fazer tipo trabalho 8 horas está livre, final de semana, feriado, está livre. No interior, não, no interior é 24 horas por dia de segunda a segunda, chovendo, choveu, feriado e fim de semana, não tem, tu faz no interior o teu horário. Na cidade, não, na cidade tem que cumprir horário. Só que o pessoal não veja as vantagens que tem no interior. No interior tu tem tu, é dono do teu próprio negócio. Na cidade, não, na cidade de trabalhar para os outros comprei as 8 horas de jornada e está livre. No interior, não, precisa fazer oito, se tu precisa fazer 12 ou mais tu passa. Na cidade, não, na cidade eles querem a juventude de hoje em dia é que é comodidade.

Outro entrevistado atribui o êxodo rural à falta de incentivo:

O êxodo rural, ele já vem de anos, e eu também tenho filhas e eu não jamais eu vou dizer para um jovem ficar no interior, porque nós não temos apoio nem Municipal nem Estadual nem Federal. Porque, quando um filho e um pai não têm para comprar uma área de terra e o filho não consegue adquirir uma área de terra, então ele trabalha uma vida toda pagando arrendamento ou mensalmente ou anualmente, e ele é muito dificultoso. As pessoas vão lá por 50 60 ano para adquirir uma areazinha de terra. Foi o nosso caso, meu caso, que eu não tive apoio. Nós éramos uma família grande no interior, eu, meu pai faleceu e tinha 13 para 14 anos, eu tinha que me virar na vida e Graças a Deus que a minha finada mãe criou os filhos e todos eles sobreviveram. E tem alguns que foram para a cidade. Eu tive duas filhas e as duas a gente fez o máximo possível pelas para estudar, entrar no concurso público e hoje tão bem empregada. Eu não, jamais eu quero que elas passem o que a gente passou e está passando durante essa vida.

A estrutura reduzida das famílias de hoje é também um fator a considerar: “Então os jovens foram atrás fábrica, e o que não foi está aqui, aqui na cidade não fica ninguém aqui, pode andar nessas propriedades, como era uma. Vez veja o casal hoje só tem dois filhos, nem nós temos, todos trabalhar na cidade”.

Já o secretário municipal de agricultura atribui o êxodo rural a vários fatores, mas observa que, independentemente de incentivos, este jovem precisa gostar de sua vida na agricultura:

O município vem trabalhando alternativas através de bons programas municipais, bons projetos que precisam chegar até este jovem rural, até estas famílias, quando que o jovem sai do campo, quando não tem renda nem perspectiva, primeira coisa. Uma outra situação é que o jovem precisa gostar da agricultura e se identificar, então permanecer no campo tem que ser uma alternativa para o jovem, não uma obrigação, porque muitas vezes se coloca como se o jovem tivesse obrigação de permanecer no campo. Mas se ele quer ficar a gente tem que dar alternativas para ele. Então, o município de Três Passos, a gente sabe que precisaria mais apoio, precisaria mais projetos, mais programas, mas historicamente o município de Três Passos tem um trabalho muito forte nessa questão, principalmente com o Semeando, os programas da agricultura.

63 Hoje vários jovens estão envolvidos na cadeia do leite, eles estão presentes nas propriedades que geram renda e que possibilitam que este jovem também tenha renda. Assim, a possibilidade de permanência nestes casos está acontecendo, nas propriedades de suinocultura, avicultura, em algumas produtoras de leite, algumas produtoras de grãos, horticultura e também na produção de fumo.

Outro fator fundamental é o apoio familiar, sem dúvida muito importante: a discussão entre a família deste jovem. Pois de nada vai adiantar a existência de programas no município se o jovem não pode discutir este assunto com a família e ter o apoio da própria família:

Outro fator muito importante é que a família tem que dar essa abertura pro jovem, né. Então quer dizer, se o pai e a mãe e a família não discutir isso, não levar essa discussão para dentro e dar essa possibilidade pro jovem, ele também não vai ficar. Então não é só o programa municipal, não é só o apoio das entidades, se lá no seio da família não existe o diálogo não existe essa possibilidade do jovem ficar. Então é toda essa ação integrada, todas estas questões somados que vão possibilitar e dar condições pro jovem permanecer no campo.

Atualmente, no dia a dia, vamos percebendo que a vida é muito corrida, e que as famílias cada vez mais estão diminuindo – o que constato pela minha própria família, que antes era muito grande, mas que, com o passar das gerações, foi diminuindo. As famílias no campo também estão diminuindo. Para constatar isso, não precisamos de entrevistas, é só fazermos um passeio pelo interior, e perceber que quase não temos mais casas, e sim enormes lavouras, quase não há pessoas. Eis a percepção de um dos entrevistados:

As famílias quando no meu tempo era criança nós éramos em oito irmão, nós tinha vizinho de que tinha 10 filhos, 12 filhos. O mínimo que na nossa localidade onde eu me criei, o mínimo que tinha era 5, então a população, as comunidades eram fortes, os colégios de 1º Grau tinham 70 alunos em sala de aula de primeira a quarta série. No meu caso tinha 72 alunos numa sala de aula.

Podemos perceber isso nas festas da comunidade, com a escola, como mencionado por um entrevistado acima, e o futebol, que foi muito importante na união da comunidade:

Não se integre mais como antigamente, e eu em casa, depois que eu me casei, eu fui 22 anos presidente clube de futebol de colégio. Depois que tive filho, anos cuidando colégio. Então, no interior, se tinha 23 times num campo, hoje não se arruma mais cinco ou seis para um futsal. Caminhão cheio de gente não existe mais, porque o interior, como já disse, o êxodo rural afetou.

64 Outro fato apontado é que “nos dia de hoje ficou muito difícil, a gente cria os filho, não sei, parece que antigamente era mais fácil, hoje pra tu pensar em ter 2, 3 filhos e olhe lá, porque as coisas estão difíceis”.

O futuro é incerto, mas estes agricultores estão preocupados com o futuro de suas propriedades, os mais novos que estão na agricultura pretendem dar continuidade à sucessão familiar, e também passar para seus filhos tudo que aprenderam com seus pais:

o futuro da propriedade tem que ser crescente, tem que crescer. Se hoje está com uma condição, a meta é para daqui 10, 15 anos, poder dobrar a produção. E a questão da sucessão, minha filha tem vai fazer 9 meses, eu torço que ela siga os meus passos, mas, se for comparar, meu pai, minha mãe, eu estou sucedendo ele, eu estou tocando para frente a propriedade.

Percebemos pelos depoimentos dos agricultores que a questão da sucessão é uma das mais sensíveis fontes de preocupação da comunidade. Por outro lado, também se percebe que ela está tentando se adaptar aos novos tempos, levando em conta por exemplo a opinião dos mais jovens nesse processo.

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