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A última modalidade do controle de constitucionalidade a ser tratada se relaciona ao

seu aspecto processual. Em outras palavras, trata-se da forma pela qual a questão da

inconstitucionalidade será arguida perante o juízo competente para sua apreciação.

Identifica-se enquanto controle incidental, subjetivo ou incidenter tantum, o controle

de constitucionalidade desempenhado pelos juízes quando da apreciação do caso concreto.

Ante o exposto anteriormente, podemos concluir que é um modelo próprio do sistema

estadunidense de controle de constitucionalidade, no qual todos os juízes têm poder de

64 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 36ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2013, p. 11.

65CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado. Porto Alegre: Fabris, 1984, p. 103.

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apreciar a adequação constitucional do ato normativo e, em consequência, de aplica-lo ou não

ao caso. Conforme explica Cappelletti

(...) os tribunais norte-americanos, não excluída a Supreme Court, enfrentam e resolvem as questões de constitucionalidade das leis “only within the context of concrete adversary litigation” e tão-só na medida em que isto se torne necessário para a decisão do caso concreto (...) a questão de constitucionalidade pode ser incidentalmente arguida no curso de qualquer tipo de procedimento judiciário: “regardlsess of the nature of the proceeding”.66

Com efeito, será incidental “a fiscalização inserida em processo que converge para

outro resultado que não a garantia da Constituição”

67

. De outra sorte, segundo a doutrina de

Peña de Moraes:

A questão constitucional é suscitada como causa de pedir, devendo a inconstitucionalidade ser declarada na fundamentação da decisão, não fazendo, por conseguinte, coisa julgada material, cuja finalidade é subtrair certo caso concreto da incidência da norma reputada inválida.68

Assim, em termos processualistas, a questão constitucional atua enquanto prejudicial

de mérito. Em outras palavras, a resolução do litígio tem como premissa necessária a decisão

de adequação. Esta ligação subjetiva entre a inconstitucionalidade e o caso concreto faz com

que o controle por via incidental também seja identificado como controle de exceção, “porque

normalmente a inconstitucionalidade era invocada pela parte demandada, para escusar-se do

cumprimento da norma que reputava inválida”

69

.

De outra forma, é reconhecido como controle em via principal aquele que é posto em

prática por meio de ação direta, ou de ação própria, cuja finalidade seja a fiscalização da

adequação da lei ou ato normativo em si frente à Constituição. Conforme Barroso, “não se

cuida de mecanismos de tutela de direitos subjetivos, mas de preservação da harmonia do

sistema jurídico, do qual deverá ser eliminada qualquer norma incompatível com a

Constituição”

70

. Assim, não há lide em sentido próprio no controle de constitucionalidade por

via principal, vez que não há pretensão resistida senão a defesa da integridade do

Ordenamento Jurídico. Destarte, como consequência processual de se tratar de pedido e não

66 Ibid, p. 104. 67

MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 464. 68 MORAES, Guilherme Peña de. Curso de Direito Constitucional. 5ª Ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 149. 69BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no Direito brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 6ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 72.

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somente causa de pedir, a declaração de inconstitucionalidade deve constar no dispositivo da

decisão judicial e, portanto, fará coisa julgada material.

Esta via de cognição é ligada ao controle de constitucionalidade austríaco, tendo em

vista que, ao criar órgão especial para a fiscalização constitucional, também determinou que o

Poder de Controle a ser exercido por aquele necessitaria “de um pedido especial (“Antrag”),

isto é, do exercício de uma ação especial por parte de alguns órgãos políticos. Prossegue a

lição:

Desta sorte, o controle de legitimidade das leis vinha a ser, na Áustria, diversamente dos Estados Unidos da América, inteiramente desvinculado dos casos concretos, vale dizer, dos processos comuns (civis, penais, administrativos); ele, por conseguinte, em vez de poder ser exercido, como na América, tão-só “em via incidental”, isto é, (como, também, com certa impropriedade se diz) “em via de exceção”, devia ser exercido, na Áustria, sempre “em via principal”, ou seja, “em via de ação”, mediante um adequado e autônomo recurso e com a instauração de adequado e autônomo processo ad hoc perante a Corte Constitucional.71

Finalmente, numa leitura crítica de ambos os modelos, Cappelletti

72

ressalta a

limitação implicada pelo conhecimento da inconstitucionalidade por via incidental, vez que se

confia tão somente naquilo que seja aplicável ao caso em voga. Do controle por via direta, de

outra maneira, o doutrinador ressalta a tendência de uma atuação política das cortes, para

além ou mesmo aquém de uma atuação judicial. Em suas palavras:

Ele pode, em outras e possivelmente mais corretas palavras, efetivamente dar consistência aos temores daqueles que veem no poder de controle de constitucionalidade das leis exercido – mesmo que em via de ação – pelas Cortes Constitucionais europeias uma muito grave ameaça de interferência das próprias Cortes na esfera do poder legislativo e, indiretamente, também na do poder executivo e de governo.73

No entanto, o autor também alerta que tal conotação não pode ser completamente

extirpada do mecanismo do controle de constitucionalidade, mesmo quando em via incidental.

In verbis,

Mas é, afinal, um dado de fato absolutamente insuprimível, amplamente reconhecido até mesmo nos Estados Unidos da América, ou seja, até em um sistema de controle meramente incidental, que, por sua própria natureza, o fenômeno que nós estamos examinando, “can never be scientific or completely disinterested and neutral”. Isto é, que o controle judicial de constitucionalidade das leis sempre é

71CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado. Porto Alegre: Fabris, 1984, p. 104.

72 Ibid, p. 112. 73

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destinado, por sua própria natureza, a ter também uma coloração “política” mais ou menos evidente, mais ou menos acentuada, vale dizer, a comportar uma ativa, criativa intervenção das Cortes, investidas daquela função de controle, na dialética das forças políticas do Estado.74

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