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111que de forma embrionária, nos marcos das forças produtivas desenvolvidas a

No documento História da Educação Brasileira (páginas 112-114)

partir da Revolução Industrial do século XIX. O esboço dessa pedagogia ficou consubstanciado no seguinte excerto da sua obra O Capital:

[...] do sistema fabril, conforme expõe pormenorizadamente Robert Owen, bro- tou o germe da educação do futuro que conjugará o trabalho produtivo de todos os meninos além de certa idade com o ensino [educação escolar] e a ginástica, constituindo-se em método de elevar a produção social e de único meio de pro- duzir seres humanos plenamente desenvolvidos (MARX, 1984, p. 554).

No Brasil da revolução burguesa tardia e periférica, a educação/instrução foi concebida por meio de políticas estatais que separaram essas duas dimensões do processo formativo do ser humano, pelos seguintes condicionamentos históri- cos que se complementavam: a) a transição da condição econômica agrícola para a sociedade urbano-industrial foi conduzida não por uma burguesia que tivesse processado a acumulação primitiva do capital, mas sim por uma fração da própria aristocracia agrária de origem escravocrata; e b) a lógica do desenvolvimento industrial brasileiro deu-se por meio da associação e da dependência científica e tecnológica em relação aos países centrais do sistema capitalista mundial, princi- palmente dos Estados Unidos. Ou seja, o Brasil importou toda a base científica e técnica que permitiu, num primeiro momento, a montagem da chamada indústria pesada (siderurgia, hidrelétrica e fábricas de caminhões e tratores, por exemplo) e, depois, a indústria leve a partir da década de 1950 (notadamente a indústria automobilística e de bens de consumo).

Foi nesse contexto de modernização econômica acelerada e autoritária que as escolas técnicas engendradas pela Reforma Capanema (1942-1946) não conseguiram atender as demandas impostas pela sociedade urbano-industrial que estava se formando. Assim a crescente necessidade por mão de obra rápi- da e barata impusera novas exigências por qualificação profissional técnica. A saída encontrada pela burguesia industrial nascente foi a criação de um sistema de instituições de instrução técnica desvinculadas do Ministério da Educação, cujo objetivo exclusivo era atender aos interesses dos sindicatos patronais por trabalhadores minimamente qualificados, tal como foi o caso emblemático do SENAI (1942) e SENAC (1946). Portanto, o dualismo que se estabeleceu entre a educação secundária propedêutica destinada aos cursos superiores (Medici- na, Direito e Engenharia), originados no Colégio D. Pedro II (1837), e a instrução técnica reservada aos filhos das camadas populares guardava correspondência com a própria lógica da estrutura de classes da sociedade brasileira, ou seja, a divisão social existente entre as elites econômicas, de um lado, e as massas subalternas, do outro. Em síntese: as elites econômicas e políticas que dirigiram a transição da sociedade agrícola para a urbano-industrial não foram capazes

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de criar uma escola de Estado, pública, laica e única para todos, concebida por meio de um projeto pedagógico que reunisse educação geral com formação tecnológica voltada para o mundo do trabalho.

Depois, no início da década de 1950, quando se estabeleceu a equivalência entre o secundário propedêutico e os cursos profissionais técnicos para o aces- so ao ensino superior, a dicotomia entre elitismo e exclusão começou a assumir uma nova face: escolas particulares para os filhos das classes dirigentes versus escola pública primária para as classes trabalhadoras. A batalha ideológica que se travou entre os partidários da escola pública e os da escola particular, a partir da segunda metade da década de 1950, paralisou o trâmite do projeto da LDB no âmbito do Congresso Nacional, cuja aprovação levou mais de uma década. Dessa feita, os protagonistas eram, basicamente, os mesmos dos conflitos po- líticos que se manifestaram entre liberais (signatários dos Manifesto de 1932) e católicos (aliados aos interesses das oligarquias agrárias) durante a década de 1930. Agora, a novidade era a aliança que se estabeleceu entre os liberais e os setores da esquerda em defesa da escola pública e laica. Podemos destacar, entre eles, três atores emblemáticos, com perfis ideológicos distintos, e protago- nistas dos episódios que culminaram na publicação do Manifesto de 1959 e apro- vação da LDB/1961: Anísio Teixeira (liberal), Florestan Fernandes (esquerda) e Carlos Lacerda (direita conservadora). O resultado do embate ficou traduzido no famoso título que Anísio Teixeira deu ao artigo que publicou nos jornais da época após a aprovação da LDB: “Meia vitória, mas vitória”. Ou seja, nem os liberais e as esquerdas, de um lado, e nem os conservadores, de outro, conseguiram aprovar um projeto de LDB tal qual cada tendência política propugnava integralmente. Assim a Lei de 1961 possibilitou a coabitação da escola pública e da particular. O sistema nacional de ensino dual (público e privado) engendrou uma nova fase no binômio baseado no elitismo e na exclusão educacional. A partir de então a escolaridade dos filhos das elites passou, grosso modo, a ser assim: educação básica nas escolas particulares de excelente qualidade de ensino, cujas mensa- lidades eram (e são até hoje) elevadíssimas para os padrões da grande maioria da população brasileira, e escola pública fundamental para os filhos das massas populares. Os primeiros têm acesso às melhores universidades públicas, aque- las que realizam a indissociabilidade entre ensino e pesquisa desde os cursos de graduação. Já os segundos mal concluem a educação obrigatória (hoje, de 9 anos) e são forçados a ingressar no mundo do trabalho com ou sem instru- ção profissional técnica. Ou seja, os velhos e bons cursos superiores públicos de Direito, Medicina e Engenharia continuam sendo privativos dos filhos das elites econômicas e políticas que secularmente governam o Brasil.

Em síntese, no decorrer desta unidade verificamos que a revolução burgue- sa realizada pelas elites, de cima para baixo, impôs profundas transformações

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