• Nenhum resultado encontrado

O estudo das representações sociais tem sido desenvolvido por vários autores como Jodelet, Abric, Flament, Doise, Alves-Mazzotti, Madeira, Sá entre outros, mas quem inaugurou a Teoria das Representações Sociais, foi o psicólogo francês Serge Moscovici em 1961, com o lançamento de sua obra La psychanalyse,

son image et son public, traduzido no Brasil com o título Representação Social da Psicanálise. Nesta obra, o autor divulga os resultados de sua tese de doutorado, que

foi realizada na França com o objetivo de investigar as representações que a sociedade francesa tinha sobre a psicanálise. Buscava, assim, estudar cientificamente o senso comum. Desde então, o assunto vem sendo discutido, analisado e até mesmo criticado no cenário acadêmico, mas é importante salientar que o tema está cada vez mais presente nos trabalhos científicos (CORREIA, 2012).

A conceituação de representações sociais, por Moscovici, se inspira no conceito de representações coletivas, elaborado por Durkheim (1858 - 1917), que entendia as representações coletivas como uma forma de compreensão coletiva e tinha como ambição compreender a sociedade em todas as suas dimensões, acreditando na prioridade da sociedade sobre o indivíduo.

Durkheim acreditava em dois tipos de representações: individuais que têm como base a consciência de cada sujeito, e as coletivas, que são mais amplas e homogêneas, partilhadas por todos os membros do grupo, têm a função de prepará- los a pensar e agir de maneira coletiva. Esta representação é transmitida de uma geração à outra, reproduzindo o modo de pensar e agir das pessoas de um mesmo grupo (MOSCOVICI, 2001).

O conceito de representações coletivas proposto por Durkheim mostra-se bastante estático, não se adequando ao estudo das sociedades modernas que estão em constante e rápida transformação. Além disso, nas sociedades atuais há uma intensa circulação de conhecimentos científicos que são rapidamente difundidos pelos meios de comunicação e internet e dos quais as pessoas vão se apropriando de acordo com sua compreensão, de tal forma que passam a fazer parte das conversas diárias, sendo modificados nessas trocas informais. Essa penetração dos

conhecimentos científicos no senso comum não acontecia na época em que Durkheim cunhou o conceito de representações coletivas, por isso este não dá conta dessas especificidades.

A noção de representação social proposta por Moscovici corresponde à busca desta especificidade, através da elaboração de um conceito verdadeiramente psicossocial, na medida em que procura dialetizar as relações entre indivíduo e sociedade, afastando-se igualmente da visão sociologizante de Durkheim e da perspectiva psicologizante da Psicologia Social da época (ALVES-MAZZOTTI, 2008, p. 22).

As representações sociais possuem um caráter mais dinâmico, sendo entendidas como um fenômeno onde as duas dimensões individuais e coletivas estão interligadas. Elas entram no mundo em que nós habitamos, circulam na mídia que escutamos, lemos e vemos, são sustentadas pela influência da comunicação, constituem a realidade de nossas vidas e servem como ligação entre os indivíduos. Não são criadas por um indivíduo isoladamente, mas sim por pessoas e grupos através da comunicação e da cooperação ocorrida entre os sujeitos (MOSCOVICI, 2012).

Para Moscovici, as representações sociais devem ser vistas como:

[...] uma maneira específica de compreender e comunicar o que nós sabemos. Elas ocupam, com efeito, uma posição curiosa, em algum ponto entre conceitos, que têm como seu objetivo abstrair o sentido do mundo e introduzir nele ordem, e percepções, que reproduzam o mundo de forma significativa (MOSCOVICI, 2012, p. 46).

As representações sociais são valores, ideias ou conceitos compartilhados num determinado grupos, que possuem uma lógica e uma linguagem particulares, que definem uma forma de comunicação pelos indivíduos desse mesmo grupo, por isso, não devem ser consideradas apenas como meras opiniões ou imagens, mas sim como teorias coletivas (ALVES-MAZZOTTI, 2008).

A comunicação tem grande influência no processo de geração e transformação das representações sociais e é um dos principais meios que estabelece associações que ligam um sujeito a outro. As representações entram no mundo comum em que habitamos e circulam na mídia (MOSCOVICI, 2012).

Para Alves-Mazzotti (2008), novas representações são produzidas e comunicadas nas interações diárias que fazemos em nosso trabalho, em casa ou

com amigos. Destas interações e trocas de ideias surgem novos “universos consensuais” que passam a fazer parte desse universo, não mais como opiniões, mas como teorias do senso comum. Os sujeitos exprimem em suas representações o sentido que dão à sua experiência social, projetando valores e aspirações sociais.

Para a psicologia social, o conhecimento emerge do mundo onde as pessoas interagem entre si, no mundo onde os interesses humanos e as frustrações se encontram. Esses interesses mudam com o passar do tempo e essa mudança pode gerar novas formas de comunicação e, consequentemente, novas representações (MOSCOVICI, 2012).

O autor afirma ainda que:

[...] pessoas e grupos, longe de serem receptores passivos, pensam por si mesmos, produzem e comunicam incessantemente suas próprias e específicas representações e soluções às questões que eles mesmos colocam. Nas ruas, bares, escritórios, hospitais, laboratórios, etc. as pessoas analisam, comentam, formulam “filosofias” espontâneas, não oficiais, que têm um impacto decisivo em suas relações sociais [...] (MOSCOVICI, 2012, p. 45)

As representações que os indivíduos possuem sobre determinados assuntos influenciam diretamente seu modo de pensar e agir no meio em que vivem. Essas representações é que determinam o modo como educam seus filhos, como planejam seu futuro, enfim todas as decisões que devem tomar no dia a dia são embasadas nas representações que cada indivíduo possui. A ciência serve como alimento para esse pensamento (MOSCOVICI, 2012).

Para Jodelet (2001), as representações sociais nos ajudam a definir e compreender os diferentes aspectos da vida diária, a tomar decisões e nos posicionar frente aos acontecimentos de forma defensiva. É possível observá-las em múltiplas ocasiões, como nos discursos trazidos pelas mensagens midiáticas. A autora também ressalta que a falta de informações e incertezas da ciência sobre determinados assuntos favorecem o surgimento das representações sociais que vão circular de boca em boca.

Jodelet (2001) caracteriza as representações sociais como

[...] uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social. Igualmente designada como saber de senso comum ou ainda saber ingênuo, natural, esta forma de conhecimento é

diferenciada, entre outras, do conhecimento científico (JODELET, 2001, p. 22).

Em suas análises, a autora deixa claro que as representações não são conhecimentos científicos, mas constituem um objeto de estudo relevante para a Ciência, devido a sua importância na vida social, como possibilitadoras de processos cognitivos e devido às interações que favorecem no meio social.

Moscovici (2011, p. 71) evidencia que existem dois processos que dão origem às representações: a objetivação e a ancoragem. A objetivação seria uma operação formadora de imagens, o processo no qual as noções abstratas são transformadas em algo concreto. Nas palavras do próprio autor, objetivar é transformar um conceito abstrato em uma imagem real.

Encontramos também o conceito de objetivação nos estudos de Alves- Mazzotti (2000, p. 60) que afirma que:

A objetivação consiste na transformação de um conceito ou ideia em algo concreto. Nesse processo, as informações que circulam sobre o objeto sofrem uma triagem em função de condicionantes culturais [...] e, sobretudo, de critérios normativos [...] de modo a proporcionar uma imagem coerente e facilmente exprimível do objeto da representação. O resultado dessa organização é chamado de núcleo ou esquema figurativo.

Moscovici (2011) afirma que a objetivação une a ideia do não familiar com a realidade, tornando-se a verdadeira essência da realidade. Neste cenário surgem novas formas de representar o desconhecido que se fazem necessárias para nossa vida social. Para nosso estudo consideramos importante tratar, mesmo que superficialmente, da ideia de ancoragem.

Para definirmos o conceito de ancoragem, nos reportamos aos estudos de Spink (1993, p. 306) que conceitua da seguinte forma:

A ancoragem refere-se a inserção orgânica do que é estranho no pensamento já constituído. Ou seja, ancoramos o desconhecido em representações já existentes. Moscovici (1978) a concebe como um processo de domesticação da novidade sob a pressão dos valores do grupo, transformando-a em um saber capaz de influenciar.

No processo de ancoragem, recorremos ao que é familiar para fazer uma transformação do que é novidade, utilizando classes/esquemas já existentes e

ampliando-os para incluir as novas informações. Trata-se de um processo de categorização.

Jodelet (2001, p. 39), afirma ainda que:

A naturalização das noções lhes dá valor de realidades concretas, diretamente legíveis e utilizáveis na ação sobre o mundo e os outros. De outra parte, a estrutura imagética da representação se torna guia de leitura e, por generalização funcional, teoria de referência para compreender a realidade.

Assim, a ancoragem serve para instrumentalizar um saber, dando-lhe um valor significativo e funcional para a compreensão e gestão do cotidiano, dando continuidade ao processo de objetivação (JODELET, 2001).