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Quem sai e quem fica? A evasão nos assentamentos rurais de reforma agrária

2 CAPÍTULO II – A OCUPAÇÃO FUNDIÁRIA E A COLONIZAÇÃO AGRÍCOLA DO

3.6 Quem sai e quem fica? A evasão nos assentamentos rurais de reforma agrária

A evasão é uma problemática vivenciada na política de assentamentos, bastante significativa nos projetos pesquisados. Segundo o estudo Percentuais e causas da evasão nos

assentamentos rurais, de Guanziroli et al. (2001), o estado de Mato Grosso possui uma média

de evasão de 47,3%. Em comparação à média nacional, que é de 29,7%, percebe-se a enorme disparidade em relação à evasão nos assentamentos.

Os pesquisadores afirmaram que essa evasão ocorre em razão da baixa infraestrutura disponibilizada nos assentamentos, associada a uma forte ausência dos órgãos do Estado, que deveriam assistir essas famílias beneficiárias, além da grande diferenciação social existente entre os assentados, em relação a posse de “capital”, que neste caso não se resume somente a bens materiais, mas também, ao capital cultural, como estudo, experiência no meio rural, parentesco com outros assentados. Dessa forma, a evasão não pode ser entendida como um processo único, nem ocasionado por uma gama restrita de fatores, mas como um conjunto de

situações que a tornam significativa nos projetos de reforma agrária (GUANZIROLI et.al., 2001).

Nos quatro projetos de assentamentos estudados, a evasão média era de 57,3%, uma taxa superior às médias estadual e nacional. Questionados sobre o conhecimento de moradores do assentamento que se evadiram, 96% dos entrevistados afirmaram conhecer algum caso. Na visão dos entrevistados (neste caso, os permanentes), os principais motivos para a saída destas pessoas foram a idade avançada, que impossibilitava a vida no campo, a saúde debilitada e a incapacidade de tratamento no assentamento, a falta de recursos financeiros, a ilusão de viver na cidade e o cansaço de permanecer no assentamento.

Diante disso, para os assentados permanentes, a ausência de estruturas mínimas e a falta de recursos financeiros são os principais fatores relacionados ao abandono dos lotes nos projetos de reforma agrária. A Figura 16 a seguir apresenta os principais motivos da evasão na opinião dos assentados permanentes.

Figura 16. Motivo da evasão dos ex-beneficiários dos projetos de assentamento, Vale do Araguaia, MT, 2014.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2015.

Buscou-se também, juntos aos entrevistados, investigar a opinião sobre o desejo de abandonar/evadir do assentamento. Neste caso, 28% dos entrevistados afirmaram ter vontade de ir embora, sendo que se destacam, deste total, os projetos Ilha do Coco e Martins I, onde

20,0% 4,0% 28,0% 24,0% 4,0% 4,0% 4,0% 2,0% 4,0% 2,0% 4,0%

Sem recurso para permanecer (Renda) Cansado de viver no assentamento Idade avançada (Velho) Saúde/Doença A ilusão de viver na cidade Procura de melhorias Não sabe não poderia ser regularizado pelo incra não queria trabalhar Briga com os vizinhos do assentamento Não se aplica

40% e 60% dos entrevistados demostraram esse desejo, respectivamente. Os principais motivos relacionados a esta questão são a saudade da cidade (28%), a dificuldade de acesso a saúde (21%), e doenças (14%).

O que se observa é uma relação próxima entre as dificuldades estruturais existentes nos assentamentos com a precariedade de geração de renda nos lotes, criando uma situação de instabilidade na qual as famílias desprovidas de capital são mais suscetíveis ao abandono da área. Somente as dificuldades na infraestrutura, tanto coletiva quanto individual, não são fatores definidores da evasão, nem tampouco, a ausência do Estado em termos de apoio financeiro e técnico; o que se nota é a existência desses condicionantes juntamente com a fragilidade financeira. E por fragilidade financeira, entende-se a ausência de uma fonte de renda fixa mensal, que garanta a subsistência da família, o que cria um ambiente propício para o abandono do lote como uma alternativa.

Compreender os mecanismos da permanência é, também, entender os processos de evasão nos assentamentos rurais, e neste trabalho se observou que a existência de uma renda mensal que consiga cobrir os custos de vida é um mecanismo mais importante do que propriamente a existência de infraestrutura mínima ou a presença dos órgãos governamentais. Isto porque essas dificuldades são realidade em todo o meio rural brasileiro, não sendo, portanto, determinantes dos processos de evasão.

3.7 “Meu sonho era ter uma terra, agora que tenho não largo”. O perfil dos beneficiários permanentes nos assentamentos rurais

Traçar o perfil dos beneficiários permanentes, nos projetos de assentamento é o principal objetivo deste trabalho. Deste modo, identificar os fatores que permitem a permanência no meio rural destes assentados é fundamental para a política de assentamentos, uma vez que, a manutenção dos beneficiários nas áreas reformadas é um dos grandes desafios desta política.

Ao longo deste capítulo, foram analisadas diversas características dos beneficiários, desde a composição e formação do grupo familiar até as infraestruturas coletivas e individuais presentes nos assentamentos. Dentre todas estas, existem algumas que auxiliam significativamente na permanência do trabalhador no meio rural, como, por exemplo, a diversificação de renda, que nada mais é do que o acesso a outras fontes de renda que não somente a proveniente do lote.

O acesso a uma renda externa é uma das principais características da permanência nos assentamentos, uma vez que ela possibilita o acesso a um recurso mensal, em geral, proveniente de prestação de serviço ou aposentadoria. Assim, como apontado por Lamera & Figueiredo (2008), em estudo feito com assentamentos rurais de Mato Grosso, grande parte da renda dos beneficiários desta política no estado era proveniente de atividades complementares, como trabalho de diarista, safrista, empregado rural ou artesanato. Essa renda externa garante estabilidade econômica da família, e a produção agropecuária complementa a renda, de modo que, se comparadas às famílias com mesma condição econômica na zona urbana, as assentadas dispõem de uma renda maior.

Outro fator de permanência nos assentamentos, diz respeito às atividades continuadas de geração de renda monetária, ou seja, atividades agropecuárias que possibilitem a geração de renda frequente, como, por exemplo, a produção de leite, que fornecida aos laticínios produz uma renda mensal. Além disso, a venda de frangos, ovos e farinha de mandioca permite uma fonte de renda constante aos beneficiários, e auxilia na estabilidade econômica das famílias.

A questão da infraestrutura, de maneira geral, não foi determinante para a tomada de decisão entre permanecer e evadir, uma vez que assentamentos com condições estruturais melhores, como o Martins I, apresentaram taxa de evasão superior aos assentamentos com piores condições, como Volta Grande e Santa Emília. Todavia, notou-se uma maior frequência de jovens no meio rural no projeto Martins I, em virtude de uma escola que possuía a 3º série do ensino médio, o que possibilitou a manutenção destes jovens no assentamento. Desta forma, ainda que não seja determinante para a permanência, a infraestrutura cria condições para que a família permaneça e se reproduza socialmente, auxiliando indiretamente neste processo de manutenção dos beneficiários nos assentamentos rurais.

Os entrevistados apontaram quais foram os motivos que os fizeram permanecer no assentamento: a identificação com o meio rural, a propriedade da terra e a tranquilidade foram os principais motivos apontados por eles. Isto revela que, além da concepção de posse da terra por parte destes trabalhadores e de sua identificação com o campo, a noção de uma melhor qualidade de vida representada pelas amenidades existentes no meio rural, a exemplo, o sossego e a tranquilidade, apresentaram-se como um fator de permanência. A ideia de que no lote é possível reproduzir-se de maneira mais qualificada é evidenciada nos apontamentos dos beneficiários. Segundo eles, a vida no campo, mesmo com suas dificuldades, possibilita uma

qualidade de vida superior à área urbana. O sossego, como argumentado em muitas entrevistas, pode ser representado pela ausência de problemas cotidianos da vida das cidades, como criminalidade, poluição sonora e agitação. Sendo assim, o campo fornece uma alternativa a esse contexto, influenciando, com isso, a tomada de decisão das famílias beneficiárias em permanecer nos projetos.

4 CAPÍTULO IV - AVALIAÇÃO DA COBERTURA VEGETAL DE