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Raiz da mesma semente: o papel da Educação/Escola do Campo no processo de resistência e luta pela terra

DA LUTA PELA TERRA BROTA A RAIZ DA LUTA PELA EDUCAÇÃO

4- Raiz da mesma semente: o papel da Educação/Escola do Campo no processo de resistência e luta pela terra

Segundo Arroyo (2017): “A luta pela terra é mais do que luta por terra. È luta libertadora, formadora. Nessa radicalidade de lutas, radicaliza-se o lutar por escola, por educação no campo, nos territórios indígenas, quilombolas” (p.81). O MST começou implantando as escolas itinerantes, estas, segundo Camini (2009), “nascem a principio, em função das crianças não serem aceitas nos estabelecimentos públicos existentes nos municípios próximos aos acampamentos” (p.51). Elas acompanham o movimento e tem possibilitado a continuidade dos estudos para os acampados, depois passou a lutar pelas escolas permanentes. Nesse sentido Arroyo (2017) cita que:

A presença física da escola como espaço, organização, fortalece o direito a terra ocupada como a presença da escola itinerante fortalece os acampados em suas lutas pela terra. Igualmente a luta pela escola indígena ou quilombola fortalece a luta pelo fortalecimento dos territórios indígenas e quilombolas. (p.211).

A prerrogativa do autor é confirmada no relato de Arlete:

Quando pergunta, lá tem um colégio, tem gente que estuda, lá tem criança, tem tudo isso, então quando o cara chega então não pode sair porque como é que vai tirar uma escola, tirar as crianças da escola e vão para onde esse pessoal de uma hora para outra, então esse colégio faz parte da nossa permanência.

Ainda tratando do papel da escola na resistência e luta pela terra, irmã Rosana afirmou:

[...] porque através da escola a gente fazia as festas aí vinha os vereadores, vinha os prefeitos, vinha essas pessoas, então eles sempre estavam ajudando, eles falavam assim, que a gente estava de parabéns, eles davam voto de confiança pra gente, muita gente via a gente como um ladrão que tava invadindo a terra alheia, e aí depois que eles chegavam aqui, eles viam que não era do jeito que eles pensavam que as coisas eram diferente, então tudo era mais fácil com a escola. (Depoimento irmã Rosana, 2º roda de conversa, novembro de 2017).

Conforme relatos das participantes, a presença de uma escola na comunidade evidencia que há vida naquele espaço: crianças, jovens e adultos, e que eles precisam ser atendidos no seu direito de estudar, além de permitir a superação de visões negativas acerca dos camponeses sem-terra, posto que ao visitarem a escola conheciam também o acampamento, viam a resistência daquele povo, que mesmo em condições adversas, provisórias e improvisadas conseguiam desenvolver seus modos de vida material e simbólico. Neste sentido, Joaquim ressalta:

Essa escola ela como é que se diga ela é um pilar de segurança pra nós aqui, porque você sabe que um acampamento, assentamento se ele não tiver escola ele não tem segurança nenhuma tem que ter escola tem que ter o pessoal que trabalha ali tem que ter uma escola, tem que estudar porque se não nós não temos segurança nenhuma naquele lugar a segurança nossa aqui é esse colégio que nós mantém (Entrevista de Joaquim, agosto de 2016).

Corroborando com a fala de Joaquim, Diana cita que: “a parte chave, mais segurativa da terra é a escola”, a este respeito Santos (2012) expõe: “Os sujeitos coletivos, que lutam pela terra e pela educação, (entendendo que esta, além de um direito, é uma ferramenta importante em suas lutas de resistência aos processos de expansão do capital no campo”. Caio também compartilha dessa visão:

Olha, o primeiro passo, quando construímos o acampamento é a escola, seja ela em qualquer parte do país o primeiro passo é construir a escola, segundo é trabalhar com a saúde orgânica e natural, então tem o xarope, tem o remédio e tal então, isso já é o princípio do movimento é conseguir logo a escola, porque criar a criança fora da escola não é um interesse nosso. Mas nós que discute com o Estado com o município que tem que ter a escola, mas nossa resistência maior é para manter a família no campo, o primeiro passo é a escola, sem a educação, sem a saúde não há agricultura no campo.

As palavras do entrevistado evidenciam que a prioridade, depois da ocupação da terra, é com a educação. A este respeito Caldart (2004) menciona:

O MST assumiu a tarefa de garantir escola para os sem-terra pressionando as circunstâncias de uma luta feita em família, e que tinha como um de seus objetivos exatamente a reconstrução de comunidades no campo, com todas as dimensões da vida social que isso envolve, incluindo a presença das escolas. Passou a se preocupar a se ocupar mais detidamente com essa luta específica, e também com o que acontecia dentro das escolas conquistadas, á medida que foi definindo com mais clareza os contornos de sua organização, de sua identidade política cultural, e a abrangência de sua luta, onde então a formação das pessoas, a produção de novos seres humanos tornou-se um objetivo tão importante quanto à conquista da terra, e exigente de integralidade e de perspectiva histórica. (p.380)

Esta formação humana realizada pela escola tem sido primordial para instrumentalizar os sujeitos a lutar pela sua permanência na terra conquistada, conforme narrativa de Lia:

Muita gente que estava aqui lutando pela terra que às vezes tá lutando pela terra, mas não sabia nem assinar o nome hoje em dia já sabe, através dela aí aprenderam a assinar o nome, a ler alguma coisa, só não foi melhor porque não continuou não tá continuando. Esse ano passou em branco, não teve aula aí, os próprios alunos daqui tiveram que sair para ir estudar fora daqui isso já é uma desvantagem para gente porque invés de crescer de ter uma ajuda para a gente fez foi decair um pouco. (Relato de Lia, participação observante).

A escolarização e formação humana propiciada pela Educação do Campo permitiu aos educandos transformar suas vidas e agregar ainda mais elementos para lutarem pela reforma agrária. Confirmando isso Carla citou:

é porque nas aulas envolve muita coisa em questão da terra, da reforma agrária, então nossos alunos, se você chegar e perguntar a um aluno que estuda na rua o que é o hino do MST nenhum vai saber lhe responder e todos

daqui sabe cantar e sabe o que é reforma agrária e sabe o que é MST e sabe o que é a luta pela terra (Entrevista de Carla, janeiro de 2017).

Entende-se que a escola 1º de Maio tem oferecido escolarização e formação social para seus educandos. Deste modo, “pode contribuir para a formação de novas gerações de “intelectuais orgânicos” capazes de conduzir o protagonismo dos trabalhadores do campo em direção á consolidação de um processo social contra- hegemônico” (MOLINA E SÁ, 2012, p.327). Acerca desta questão Luma expôs:

A escola do campo já está dizendo que desenvolve esse processo porque a realidade dos educandos é a realidade da família deles, né? Então, eles estão ali. Eles sabem os direitos deles… Eles começam a estudar e começam a ter esse olhar que tem o direito. Então, o papel da escola é fundamental para que eles também tenham essa experiência, de querer lutar pelo espaço do campo. Porque no momento em que eles passam a vivenciar, a ter o conhecimento. Eles começam a desenvolver dentro de si aquela vontade de querer que, dentro do espaço deles, tenham esses dois tanto a escola, como a terra (Entrevista de Luma, outubro de 2017).

A narrativa da docente evidencia que “[...] educação não é mais apenas escolarização das crianças acampadas e assentadas que a formação também pode acontecer na escola”. (CALDART, 2004, p.280). Deste modo Caldart (2004) citou que “a escola passou a ser vista como uma questão também política, quer dizer, como parte da estratégia de luta pela Reforma Agrária, vinculada às preocupações gerais do Movimento com a formação de seus sujeitos” (p.225-226).

Ainda tratando desta questão Luma afirmou:

A escola ela está dentro da área. Então a educação do campo já se diz: é a dos pequenos agricultores, que vem lutando para que seus filhos não saiam do campo para ir para à cidade, sendo que dali ele pode ter o conhecimento… E dali [do campo] pode surgir uma oportunidade para eles. Então, dentro da educação do campo, o processo da resistência da terra, trabalha em conjunto. Ali dentro, daquela realidade, a escola tinha esse olhar (Entrevista de Luma, outubro de 2017).

Corroborando com esse argumento, Arroyo (2012) sustenta que, “educação/escola do campo é inseparável das lutas por reforma agrária” (p.244) e ainda lembra que:

lutar por terra, escola no campo para não migrar, para que os (as) filhos (as) permaneçam no lugar, enraizados na agricultura camponesa, ribeirinha, das florestas. Conotações tão próximas entre o direito ao lugar e á escola como lugar ou como condição para ficar e não migrar. (p.249)

Deste modo, a combinação da luta por terra e por educação são basilares para que os camponeses possam permanecer no campo e assim produzir e se reproduzir neste espaço.

5- Arrancando a raiz e impedindo o florescimento: processo de nucleação da

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