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3. SUSTENTABILIDADE NOS PAVIMENTOS

3.2. Práticas sustentáveis

3.2.5. RAP: Reciclado de pavimento asfáltico

O Reciclado de Pavimento Asfáltico, RAP, é uma importante fonte de agregado e ligante asfáltico para projetos de pavimento. O RAP pode ser usado em substituição para a base de agregado virgem, o que não aproveita ao máximo sua contribuição potencial como ligante e agregado no revestimento. O ligante asfáltico no RAP, denominado ligante residual, é geralmente mais rígido e mais quebradiço do que o asfalto virgem, porque foi oxidado através do aquecimento prévio no misturador e devido a sua exposição atmosférica durante a vida em serviço (VAN DAM, et al., 2015).

Os métodos de reciclagem do RAP são amplamente classificados como reciclagem em usina e reciclagem in situ. Na reciclagem em usina, o RAP é processado longe da obra em uma usina, enquanto que a reciclagem in situ envolve a modificação do RAP no local de construção. Além disso, segundo a temperatura, a reciclagem é classificada em reciclagem a quente ou a frio, sendo que a frio é realizada a mistura a temperatura ambiente.

As figuras 21 e 22 mostram a evolução na utilização do RAP nos Estados Unidos. Segundo a NAPA (National Asphalt Pavement Association), 99% dos produtores relataram usar RAP em suas misturas para nova construção, preservação de pavimentos, reabilitação ou outros projetos. A quantidade média do RAP utilizado no ano 2015 no total das misturas HMA/WMA (Hot Mix Asphalt/ Warm Mix Asphalt) foi de 20,3% (HANSEN, et al., 2017).

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Figura 21. Comparação de toneladas de RAP aceitas e toneladas de RAP usadas ou dispostas em aterros. Milhões de toneladas 2009-2015. (HANSEN, et al., 2017)

É interessante perceber como também tem aumentado a porcentagem nas misturas com o avanço dos anos. O gráfico da Figura 22 mostra o número de estados americanos que utilizam RAP e sua porcentagem. O crescimento mostra que muitos Estados utilizam entre 20-30% nas misturas.

Figura 22. Número de Estados dentro de USA e a porcentagem de RAP nas misturas de HMA/WMA. (HANSEN, et al., 2017)

Além do benefício ambiental com a preservação dos recursos, o uso de RAP e RAS pode ajudar a reduzir os custos de materiais para a construção de estradas, permitindo aos órgãos rodoviários realizarem mais construções e atividades de manutenção dentro de orçamentos limitados (HANSEN, et al., 2017).

A redução de custo da mistura com 50% de RAP é de, aproximadamente, 34% no total, caso seja feito em usina a quente (KANDHAL, et al., 1998).

O uso de RAP no ano 2015 estimou ter reduzido a necessidade de 3,7 milhões de toneladas (21 milhões de barris) de ligante asfáltico e quase 70,5 milhões de toneladas

36 de agregado, com um valor estimado no total em mais de US $ 2,4 bilhões (HANSEN, et al., 2017).

Segundo o (DNIT, 2006), o consumo de energia entre um recapeamento e a reciclagem seria reduzida em 7% para misturas com 20% de RAP e em 16% para misturas com 40% de RAP. Sabendo que a energia proporcionada por um galão de diesel é 139.000 BTU, a redução seria de 2.548 litros de diesel por tonelada produzida para RAP com 40% (Tabela 1). Nestas considerações se encontra o consumo devido ao transporte.

Tabela 1. Comparação entre consumo de energia. (DNIT, 2006)

Os resultados do cálculo mostram 35% da redução do CO2 por tonelada ao produzir

mistura asfáltica a partir de 100% de RAP em vez de usar material virgem (ZAUMANIS, et al., 2016). Dependendo dos preços no mercado com disponibilidade de RAP, os custos de uma tonelada de 100% de mistura de RAP seriam reduzidos entre 50 a 70% em relação à mistura virgem (ZAUMANIS, et al., 2016). Este é um caso que ainda não tem sido provado na prática, porque não existem estradas com 100% de RAP.

Nesta parte do trabalho será analisada a utilização de RAP nos processos de reciclagem a quente em usina por ser a prática mais comum. No Brasil, esta técnica está regularizada pela norma DNIT 033/2005-ES – Pavimentos Flexíveis – Concreto asfáltico reciclado a quente na usina – Especificação do Serviço.

A reciclagem a quente em usinas fixas é um processo no qual uma parte ou toda a estrutura do revestimento é removida, geralmente através de fresagem à frio, e posteriormente transportada para ser misturada e recuperada em usina de asfalto. O material fresado não pode ser introduzido diretamente em usinas Drum Mixer convencionais (Figura 23), pois o contato do RAP com a chama do tambor, que tem por finalidade gerar calor para secagem dos agregados virgens que serão incorporados na mistura, iria resultar em queima do ligante envelhecido que está aderido ao material. No caso de “drum mixer”, o agregado novo entra no tambor pela extremidade do maçarico (zona de radiação) onde é seco e aquecido. O material fresado entra num ponto mais abaixo (na porção central), longe da chama e da elevada temperatura dos gases (DNIT, 2006).

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Figura 23. Operação de usina “drum mixer”.

Na prática, existem diferentes formas de introduzir o RAP na produção de mistura em usina. Os dois métodos mais comuns são: adicionar o RAP frio no misturador juntamente com os materiais virgens sobreaquecidos ou introduzir o RAP pré- aquecido (por exemplo, por tambor paralelo para a secagem) antes de ser adicionado à mistura com o asfalto.

O tipo de usina mais empregado é a “drum-mixer” (DNIT, 2006), mas o que dá melhor rendimento é a "double barrel".

A "double barrel" é uma usina em que o tempo de mistura, em decorrência do comprimento da câmara de mistura, é mais longo (75 segundos). Ela possui um tambor de menor diâmetro e de maior comprimento, semelhante ao de uma usina gravimétrica, que gira dentro de outro tambor, concêntrico e fixo, de diâmetro bem maior, de menor comprimento e termicamente isolado. A coroa circular formada ao longo do comprimento do tambor de maior diâmetro forma a câmara de mistura, onde existem pás para a execução e homogeneização da mistura (DNIT, 2006).

O agregado novo é adicionado no tambor de menor diâmetro, onde é aquecido por um maçarico cuja chama atua no contra-fluxo do material. O material é superaquecido após percorrer o comprimento do tambor menor e é introduzido na câmara de mistura. O material fresado é então introduzido diretamente na câmara e, após ser homogeneizado e aquecido pelo calor do material novo, é misturado juntamente com asfalto, agente rejuvenescedor e fíler (DNIT, 2006). Este tipo de usina permite misturas com mais de 40% de RAP (STROUP-GARDINER, 2016).

A outra forma é colocar um tambor paralelo onde seja preaquecido o RAP para eliminar a umidade e reduzir assim o superaquecimento dos agregados virgens. A implementação de um tambor paralelo exige adaptações na usina de asfalto com consideráveis investimentos, mas é uma abordagem mais eficiente para a reciclagem (ANTHONISSEN, et al., 2016). O superaquecimento pode causar maior consumo de combustível e energia, o que reduz os benefícios econômicos do uso do RAP (AURANGZEB, et al., 2014).

É de extrema importância controlar a umidade tanto do RAP como do agregado virgem. É importante lembrar que não só é importante no caso do RAP, em misturas de agregados virgens um aumento de um 4% no teor de umidade implica em 60% a

38 mais no consumo de energia. Por isso, se recomenda cobrir o RAP estocado como prática sustentável, tanto funcional como econômica. A demanda de energia é de 2,62 kW/h para um aumento de 10°C na temperatura da mistura e 8,21 KW/h por cada 1% de aumento de conteúdo de umidade (THIVES, et al., 2017).

A questão mais controvertida agora não é se o asfalto com RAP é melhor ou pior, já que numerosas pesquisas ressaltam que 15% de RAP não tem influência sobre a mistura final e o ciclo de vida do pavimento (PETHO, et al., 2016), mas até que ponto pode ser utilizado na mistura uma maior porcentagem de RAP para que ainda seja o resultado correto, dependendo menos de agregados e CAP virgem.

O trabalho de FONSECA, et al.(2015) traz resultados de diversas pesquisas com diferentes porcentagens de material fresado, onde os estudos de laboratório com porcentagens superiores de RAP mostraram resultados satisfatórios, na rigidez, vazios, susceptibilidade à umidade, resistência à tração, etc. Pode-se deduzir então, que o problema não é tanto se a mistura cumpre sua capacidade funcional, mas sim se a mistura é economicamente viável. A tabela 2 mostra um resumo dos trabalhos analisados, a porcentagem de RAP nas misturas, as propriedades investigadas e as camadas que foram consideradas. Vale ressaltar que foram analisados os pontos fortes e fracos de cada projeto segundo a dosagem de material fresado.

39 Autor e ano Título % Fresado Propriedades Investigadas Camada/Tipo de mistura

1

(SU et al., 2009)

Study on recycled asphalt concrete for use in surface course in

airport pavement 40; 70 Susceptibilidade a umidade; Resistência à tração. Revestimento/ mistura asfáltica quente 2 (MIRÓ et al., 2011) Evaluation of high modulus mixture behaviour with high

reclaimed asphalt pavement (RAP) percentages for sustainable road construction 0; 15; 30; 50 Deformação permanente; Resistência a trincas e fadiga; Susceptibilidade a umidade; Módulo de rigidez;

Temperatura de mistura. Revestimento/ mistura asfáltica quente 3 (VALDÉS et al., 2011) Experimental study of recycled asphalt mixtures with high percentages of reclaimed

asphalt pavement (RAP) 40; 60

Resistência a trincas e fadiga; Resistência a tração;

Módulo de rigidez. Revestimento/ mistura asfáltica quente 4 (COLBERT; YOU, 2012) The determination of mechanical performance of laboratory produced hot mix asphalt mixtures using controlled RAP and virgin aggregate size

fractions 15; 35; 50 Deformação permanente; Módulos dinâmico e de resiliência. Revestimento/ mistura asfáltica quente 5 (COLBERT; YOU, 2012)

The properties of asphalt binder blended with variable quantities of recycled asphalt using short term and long

term aging simulations

30; 70; 50; 100 Módulo de rigidez; Temperatura de mistura. Revestimento/ mistura asfáltica quente 6 (MONTEPA RA et al., 2012) Effect on Pavement Performance of a Subbase Layer Composed by Natural

Aggregate and RAP 50 - Sub-base 7 (SILVA et al., 2012)

Are totally recycled hot mix asphalts a sustainable

alternative for road paving? 100 Deformação permanente; Resistência a trincas e fadiga; Susceptibilidade a umidade. Revestimento/ mistura asfáltica quente 8 (ZHAO et al., 2013) Comparative evaluation of warm mix asphalt

containing high percentages of reclaimed asphalt pavement Base: 0; 30; 35. Revestim ento: 15; 20; 30; 40. Deformação permanente; Resistência a trincas e fadiga; Susceptibilidade a umidade. Base e Revestimento/ mistura asfáltica quente e morna em ambas as camadas 9 (POULIKA KOS et al., 2014)

Influence of short and long term aging on chemical, microstructural and macro-

mechanical properties of recycled asphalt mixtures

40 fadiga; Módulo de rigidez. Resistência a trincas e

Base e Revestimento/ mistura asfáltica quente 10 (GUO et al., 2014) Laboratory performance of warm mix asphalt containing recycled asphalt mixtures 40 Deformação permanente; Resistência a trincas e fadiga; Susceptibilidade a umidade. Revestimento/ mistura asfáltica morna

Tabela 2. Pesquisas sobre utilização do RAP internacionalmente com diferentes porcentagens (FONSECA, et al., 2015).

A literatura ressalta que para porcentagens superiores a 30% deve-se tomar precauções com o uso de RAP, pois uma elevada proporção RAP reduz a trabalhabilidade e precisa aumentar a compactação da mistura devido ao ligante envelhecido residual associado ao RAP. A utilização de ligante virgem em pequenas

40 quantidades não consegue solucionar o problema deixando a mistura com uma rigidez elevada e susceptível às baixas temperaturas e à fadiga (MALLICK, et al., 2008). Na maioria dos casos, a porcentagem de RAP na nova mistura de asfalto é limitada devido a dificuldades em misturar o RAP com os materiais virgens, sem um aumento excessivo das temperaturas da mistura, o que aceleraria o processo de envelhecimento do ligante e também aumentaria o consumo de energia e emissões durante a produção (DINIS-ALMEIDA, et al., 2016).

No caso de usinas Drum Mix, uma porcentagem superior a 30% de RAP faz com que a mistura precise de uma temperatura maior, o que produz um aumento econômico considerável na produção da mistura, alem dos efeitos ambientais para alcançar essa temperatura. Por isso, provavelmente, o maior benéfico do ponto de vista dos materiais para a produção é manter o RAP seco (baixo teor de umidade), o que reduz a necessidade de superaquecimento do agregado virgem (e também o custo) necessário para o aquecimento indireto do RAP e permite taxas de produção mais altas (WEST, et al., 2015).

O uso de um tambor paralelo permite um melhor controle do teor de umidade no RAP. A umidade remanescente na mistura asfáltica influenciará negativamente no desempenho do pavimento, devido ao efeito “stripping” (descolamento) e, portanto, na vida útil, além do maior consumo energético (ANTHONISSEN, et al., 2016).

Deve-se notar, portanto, que as misturas de alto conteúdo RAP só podem ser produzidas com sucesso em usinas que são especificamente projetadas para produzir misturas de alto teor de RAP (PETHO, et al., 2016).

O gerenciamento correto e preciso do RAP é o primeiro passo para a utilização de altas porcentagens de RAP em misturas asfálticas. A caracterização da mistura é considerada apenas o segundo passo (PETHO, et al., 2016).

Um caso interessante se encontra no Japão, onde a utilização de RAP é das mais elevadas do mundo. A dificuldade e o alto custo têm levado a elaborar normas pouco complexas para o uso do RAP (WEST, et al., 2015), considerando três pontos como principais a respeito da qualidade do RAP:

 Deve ter um teor mínimo de asfalto de 3,8%;

 O ligante recuperado deve ter uma penetração maior que 20 ou as amostras de RAP compactado devem ter um coeficiente IDT inferior a 1,70 MPa / mm;

 O material RAP processado não pode conter mais de 5% de material miúdo passando pela peneira No 200.

A norma DNIT 033/2005-ES – Pavimentos Flexíveis – Concreto asfáltico reciclado a quente na usina – Especificação do Serviço não estabelece nenhum parâmetro de controle sobre o RAP, só sobre a qualidade da mistura já reciclada. A única coisa que diz sobre o RAP e sobre sua origem, textualmente:

“A mistura asfáltica a reciclar é obtida na remoção a quente ou frio da camada asfáltica do pavimento.”

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 Os materiais (RAP) são armazenados em locais cobertos e em uma superfície pavimentada para que não sejam molhados e não ocorrer problemas devido à umidade;

 Os teores de umidade e poeira do RAP são minimizados durante a britagem, processamento e armazenamento;

 O ligante do RAP é recuperado e testado para avaliar a sua rigidez;

 O RAP é fracionado e as usinas são equipadas com múltiplos silos de RAP. Isto faz que a utilização de RAP no Japão seja das maiores do mundo, 47%. Com base nas observações e experiências, no Japão, não há barreiras para o potencial de misturas asfálticas com elevado conteúdo de RAP (> 25%).

Devido também a diversidade do RAP, são melhores as usinas por bateladas para produção de misturas asfálticas a quente, já que sua adaptação ao RAP de diferentes qualidades é mais fácil (WEST, et al., 2015). Este ponto difere totalmente do que acontece nos Estados Unidos, onde as usinas contínuas são mais numerosas, e inclusive são as recomendadas. No Brasil existem tanto usinas contínuas como gravimétricas.

Outra vantagem do país japonês é a localização das usinas de produção asfálticas preparadas para a reciclagem. No total cobrem mais de 90% do território, com raios de 20 km. Isso reduz muito os custos por transporte nas obras, facilitando o processamento e a utilização de RAP (SHINGLES, 2014).

É importante citar que o desempenho das misturas com RAP dependem do cuidado no processamento do material, principalmente na fresagem e estocagem. Por isso, se recomenda o planejamento e gerenciamento com conhecimento de origem, processamento, transporte e estocagem do RAP (WEST, et al., 2015).

Com respeito às características estruturais de misturas com RAP, se decidiu neste trabalho não entrar tanto já que existe muita literatura focada nesse aspecto, e como resumo geral pode-se dizer que o desempenho é muito parecido ao das misturas com agregados virgens.

Para este trabalho não se conseguiu encontrar a penetração no mercado do RAP no Brasil. Por isso que se recomenda outra vez a criação de uma base de dados com pesquisas desenvolvidas e obras executadas de fácil acesso para poder ter uma avaliação em longo prazo e possa ser avaliado o desempenho e o ciclo de vida do pavimento. Também se recomenda a criação de um manual com as corretas práticas de escolha de materiais, dosagem e execução em obra, para que seu uso seja realizado de um jeito eficaz. São muitos os países que têm experiências reais cujo resultado é similar do que mistura com utilização exclusiva de materiais virgens sempre que seja adicionado um agente rejuvenescedor à mistura reciclada. Principalmente se for considerado que o preço de agregados e petróleo continua subindo, o que traz não só uma vantagem ambiental e funcional, mas também econômica (VAN DAM, et al., 2015).

Concluindo, é preciso um desenvolvimento maior de casos experimentais no Brasil onde seja utilizada esta tecnologia, especialmente para a camada de revestimento, na qual tem um maior potencial para atividades de manutenção mais simples onde não

42 seja necessário chegar a uma profundidade elevada. O objetivo é fechar o ciclo do pavimento, o que implica em utilizar 100% de RAP.

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