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Rastreando a região: história e contingência

1. REGIONALISMO

1.2 Rastreando a região: história e contingência

Se a questão regional faz parte da história brasileira, é necessário reconhecer que as alterações que sua abordagem vem sofrendo mostram-se lentas em comparação à importância

do tema, de modo que em termos teóricos e literários parecem ainda insuficientes. Apenas mais recentemente o tema começou a ser encarado de forma detida nos estudos literários. Para Pozenato, seria possível afirmar que nos últimos vinte anos a ideia de região transitou de uma visão negativa para uma ao menos positiva.50 Considerando-se que seu estudo data de 2003, essa transição estaria mais ou menos localizada na década de 1980. De fato, são da década anterior alguns trabalhos do próprio Pozenato51 e de Ligia Chiappini52 a respeito do Regionalismo, os quais certamente contribuíram para uma mudança de avaliação. No entanto, o autor parece, talvez, otimista demais ao sustentar que “antes era preciso demonstrar que o regionalismo não consistia numa visão estreita do processo social, em qualquer de suas dimensões”, e que, “hoje, a percepção das relações regionais é vista como um modo adequado de entender como funciona, ou pode funcionar, o processo de mundialização de todas as relações humanas.”53

No que se refere à arte literária, a regionalidade de certas obras e autores segue causando dificuldade aos críticos, uma vez que não são raras as avaliações que atrelam argumentos concernentes à fatura estética dos textos a problemas identificados no nível do conteúdo. Exemplo eloquente da permanência do problema é a obra de Milton Hatoum: enquanto Eurídice Figueiredo traça relações possíveis entre seus textos e uma tradição regionalista vista sob a óptica do contemporâneo54, Allison Leão parte das reflexões de Tânia Pellegrini presentes em “Milton Hatoum e o regionalismo revisitado” para problematizar a vinculação do escritor a essa vertente.55 O próprio autor, por sua vez, rechaça essas relações, dizendo que tem tentado “evitar não apenas o exotismo, como também o regionalismo, que, muitas vezes, pode tornar-se uma camisa de força, uma forma de inscrever o texto numa área geográfica.”56 A seu ver, todavia, os traços da cor local e das circunstâncias históricas estão sempre presentes na obra, visto que o escritor estaria sempre rondando suas origens. Disso se infere que o incômodo do autor não é com os elementos abarcados pelo Regionalismo, pois esses ele assume como essenciais à obra, mas com a própria categoria – com o rótulo –, o que pode se explicar pelo peso negativo que possui e pelo quanto pode concorrer para a perda de

50 POZENATO, José Clemente. Processos culturais: reflexões sobre a dinâmica cultural, p. 149. 51

Seu ensaio O regional e o universal na literatura gaúcha, agraciado com menção honrosa em concurso promovido pelo Instituto Estadual do Livro, é publicado em 1974, com elogios de Guilhermino César.

52 A autora publica Modernismo no Rio Grande do Sul: materiais para seu estudo e Regionalismo e

Modernismo: o caso gaúcho em 1972 e 1978, respectivamente.

53 POZENATO, José Clemente. Processos culturais: reflexões sobre a dinâmica cultural, p. 149. 54 FIGUEIREDO, Eurídice. Literatura comparada: o regional, o nacional e o transnacional, p. 44 – 45. 55

Cf. LEÃO, Allison. Milton Hatoum: regionalismo revisitado ou renegado?, passim. 56

HATOUM, Milton apud MARCONDES, Marleine Paula; TOLEDO, Ferreira de. Espaço e preconceito nas obras de Hatoum, s/p.

capital literário ainda hoje. Em suma, o autor reivindica abrangência, mas seu desconforto personifica um problema quase tão tradicional quanto a própria historiografia literária brasileira.

Em que medida a pecha de tacanho, pequeno e culturalmente inferior que acompanha a ideia de região e contamina tudo o que a ela se vincula interfere no julgamento do que é capaz de fornecer uma arte que se defina como regionalista? É essencial questionar até que ponto um autor rechaça a marcação pela ideia de Regionalismo por conta dos preconceitos atrelados a essa vertente. Do contrário, deve-se assumir que falar daquilo que está à margem dos centros culturais implica uma necessária perda de qualidade artística. Afinal, se como aponta Pozenato, nas últimas décadas a ideia de região tem transitado de uma visão negativa para uma pelo menos positiva, parece evidente que esse trânsito ainda não se deu no campo literário, que segue atrelando à noção de Regionalismo uma concepção reduzida do fazer artístico, segundo a qual a qualidade da obra é quase que imediatamente determinada pela estreiteza do objeto do qual ela se ocupa.

Não obstante, a julgar pelos estudos de Ligia Chiappini, a permanência de traços regionalistas na ficção contemporânea não deveria surpreender. A autora afirma ter, ao longo de suas investigações sobre o regionalismo na América e na Europa, confirmado a suspeita de que esse fenômeno, sempre considerado ultrapassado pela crítica literária brasileira, não só continuava vivo em 1995, quando da publicação de seu texto, como havia se tornado tema de pesquisas bastante atuais, “ganhando uma amplitude maior na intersecção dos estudos literários e artísticos, históricos e etnológicos.”57 Nesse trabalho, Chiappini procura “problematizar juízos críticos estereotipados que generalizam para a tendência como um todo as limitações estéticas e ideológicas da maior parte, reconheço, das obras que o regionalismo tem produzido.”58 Afinal, não seria esse pendor o responsável pelo desconforto de Milton Hatoum ao ver sua obra ligada a tal tradição? Do mesmo modo que essa atitude dificulta o exame da obra do escritor amazonense, cria empecilhos às pesquisas sobre outros grandes nomes, como Guimarães Rosa, que também deu declarações nesse sentido, como logo se verá. O demérito de produzir obras de baixa ou média qualidade não é exclusividade do Regionalismo, muito embora seja esse um dos aspectos mais recorrentes no interesse crítico. Na verdade, é lícito assumir que em qualquer tendência boa parte das obras será inferior ou mediana, uma vez que os textos capazes de atender aos imperativos do campo da arte e realmente inová-los são sempre raros. Para sair de um beco como esse, que não traz fruto

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CHIAPPINI, Ligia. Do beco ao belo: dez teses sobre o regionalismo na literatura, p. 153. 58 CHIAPPINI, Ligia. Do beco ao belo: dez teses sobre o regionalismo na literatura, p. 154.

algum ao conhecimento do sistema literário, Chiappini argumenta que um problema fundamental a ser levado em consideração é que:

em vez de explicar a obra regionalista bem realizada, negando sua relação com o regionalismo para afirmar imediatamente sua universalidade, seria preciso enfrentar, pela análise trabalhosa de cada caso, a questão de como se dá a superação dos limites da tendência, de dentro dela mesma, pela potencialização de suas possibilidades artísticas e estéticas.59

Ou seja, como se dá a criação de uma linguagem capaz de suprir “com verossimilhança a assimetria radical entre o escritor e o leitor citadino em relação ao personagem e ao tema rural e regional, humanizando o leitor em vez de aliená-lo em relação ao homem rural representado.”60 E, nesse sentido, uma ressalva deve ser feita, já que da forma como a autora expõe a ideia pode-se incorrer no vício de considerar o Regionalismo como vítima em especial de uma limitação, quando na verdade qualquer vertente sofre com suas limitações internas e a elas busca responder. Daí, inclusive, seu interesse e sua possibilidade de triunfo. Além de responder a uma necessidade externa de dar a conhecer uma determinada visão do mundo capaz de olhar, sentir e se responsabilizar pelo outro, para empregar expressões de Maria Zilda Cury61, há uma premência de vitória interna em qualquer tendência estética; uma exigência de êxito interno sobre os próprios preceitos artísticos que cada voga impõe a si mesma.

Quando se trata de avaliar as obras regionalistas tendo em vista seu caráter adjetivado, é necessário, portanto, pensá-las a partir do regionalismo que há nelas para averiguar como elas lidam com as imposições que as orientam. Isso não quer dizer, por outro lado, que só se possa examiná-las nessa perspectiva: os focos de análises podem passar ao largo dessa questão, preocupando-se com a dimensão simbólica, mítica, onírica ou qualquer outra do texto literário. Mas uma vez definido o desejo de compreender o sucesso da obra regionalista enquanto regionalista, é essa vitória sobre si mesma o que convém, é a resposta mais ou menos eficiente aos mecanismos que permitem a potencialização artística de uma visão do mundo o determinante da fatura a ser investigada.

Essa resposta e o caminho para ela não são sempre os mesmos. Sendo o Regionalismo um fenômeno diacrônico, examinado neste trabalho em suas manifestações românticas, real- naturalistas e modernistas, as questões às quais está submetido em cada momento histórico diferem e, por consequência, diferem as soluções artísticas possíveis. A contingência histórica das manifestações artísticas, dos meios expressivos e dos modos de avaliá-los deve ser levada

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CHIAPPINI, Ligia. Do beco ao belo: dez teses sobre o regionalismo na literatura, p. 154. 60

CHIAPPINI, Ligia. Do beco ao belo: dez teses sobre o regionalismo na literatura, p. 154. 61 CURY, Maria Zilda Ferreira. Topografias da ficção de Milton Hatoum, p. 59.

em conta para evitar equívocos como o de rechaçar uma dada aproximação à obra de um autor como se isso o acusasse de produzir o mesmo resultado que um determinado conjunto de escritores mal avaliados e insistentemente tomados como sinônimo de todo um fazer artístico. Nessa mesma óptica, as soluções empregadas por Guimarães Rosa podem ser estudadas em suas relações com os autores precedentes sem que isso signifique uma condenação antecipada do que oferecem suas obras. Pelo contrário, situá-las nessa linhagem permite não só a compreensão de sua grandeza como também a aferição do devido valor aos que pavimentaram os degraus dos quais partiu o escritor mineiro.

Isso porque no caso da própria noção de “regionalismo” há um considerável problema de abrangência, o que dificulta a localização precisa dos autores em relação a seus pares. Por essa mesma razão, aqui se optou por grafar o termo com inicial maiúscula quando se referir à tradição literária brasileira, buscando diferenciá-lo de outras manifestações de cunho similar. Conforme Luciana Murari, o “regionalismo tem sido há tempos um tema incômodo na historiografia da literatura brasileira. Sua própria definição carece da necessária especificidade, seja porque tem rotulado objetos culturais de natureza muito diversas, seja porque tem assumido sentidos político-ideológicos contraditórios.”62 No que se refere à literatura brasileira anterior a 1922, a autora sustenta que sua avaliação crítica deve levar em conta o papel auto-imposto pelo regionalismo de traduzir o espírito nacionalista. A seu ver, o próprio discurso regionalista estabeleceu uma instantânea identificação do regional com o nacional, a partir de uma construção ideológica necessária à própria legitimação do gênero, em um momento de intensos debates em torno do problema federalismo versus centralização.63

Por isso, segundo Maria Célia Leonel e José Antonio Segatto, para pensar a presença do regionalismo na literatura brasileira, é necessário levar em conta o contexto histórico subsequente à “montagem do estado nacional, após o rompimento do estatuto colonial”64. Em busca de uma unidade nacional, consolidou-se um estado centralizador que impôs pela força os elementos de união. Na visão dos pesquisadores,

Contra essa unidade imposta do centro (Rio de Janeiro), entre 1822 e 1848 irrompeu o inconformismo em quase todos os pontos do território (Bahia, Pernambuco, Pará, Rio Grande do Sul, atingindo mesmo São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro), por meio de motins, levantes e revoltas – alguns com nítido caráter separatista – pondo em risco a precária unidade do estado

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MURARI, Luciana. “Um plano superior de pátria”: o nacional e o regional na literatura brasileira da República Velha, s/p. 63

MURARI, Luciana. “Um plano superior de pátria”: o nacional e o regional na literatura brasileira da República Velha, s/p. 64 LEONEL, Maria Célia; SEGATTO, José Antonio. O regional e o universal em Guimarães Rosa, s/p.

imperial.65

Inserido nesse contexto histórico de longa duração, do período imperial à República Velha, o Regionalismo se transforma em regionalismos, à medida que ultrapassa de longe os limites das manifestações literárias e se estende a uma série de áreas. Inclui, como se sabe, uma sequência de conflitos armados e de reivindicações políticas que marcaram a história do país. Porém, a imbricação possivelmente inevitável que se engendrou ao longo do tempo entre a face literária do regionalismo e as suas outras facetas contribuiu para que se associasse à primeira toda a conturbada dimensão simbólica da segunda parcela. Por isso o vai-e-vem entre veículo por excelência da nacionalidade e “praga antinacional”66, em cujo meio-termo situaram-se avaliações mais ou menos comedidas dos textos literários, considerando-os no que atendiam à sua época, e outras incisivas e ácidas, preocupando-se sobremaneira com a importação de diretrizes estéticas.

É necessário ter em conta a complexa dinâmica do período para que se possa compreender as forças que orientaram a avaliação de determinados autores. Difícil precisar, hoje, como era a vida intelectual em um momento em que acabavam de ser abolidas duas das maiores instituições da história do país até então, a escravidão e o império. Some-se a isso a consciência das instabilidades que continuavam a se repetir desde os primeiros anos de independência, conforme Leonel e Segatto, as quais eram observadas como ameaças à própria manutenção da nação, e será possível ter uma ideia do clima em que surgiam obras marcadas pelas normas estrangeiras do fazer artístico então em voga.

Atendendo aos preceitos de correntes estéticas como o Parnasianismo e o Simbolismo e os conjugando a todo um conjunto de pressupostos científicos oriundos do pensamento positivista, os escritores do fin de siècle no Brasil acabavam por tocar um ponto delicado do imaginário nacional. Autores como Coelho Neto, Afonso Arinos e o mais reconhecido deles, Euclides da Cunha, procediam a uma síntese desses elementos voltando-se justamente para territórios vistos ora com desconfiança por seu histórico de levantes e rebeliões, ora com desprezo por não se enquadrarem no modelo de desenvolvimento então projetado.

Partem, portanto, de dois revezes para propor ao país uma interpretação de si mesmo. De fato, não surpreende que Euclides da Cunha tenha se dirigido a Canudos para registrar os momentos finais de um motim de celerados que corroíam a nação de dentro dela mesma, e apenas lá tenha tomado conhecimento do que realmente se passava. Amparado pela força dos próprios acontecimentos, o livro é lançado e aclamado, a despeito de uma série de

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LEONEL, Maria Célia; SEGATTO, José Antonio. O regional e o universal em Guimarães Rosa, s/p. 66 ANDRADE, Mário de apud CHIAPPINI, Ligia. Velha praga? Regionalismo literário brasileiro, p. 669.

pressupostos que hoje parecem desarrazoados, mas que naquele momento atendiam a uma visão de mundo quase incapaz de considerar humanos os seres que viviam em condições como as de Canudos. Tanto que a inteligência aguçada de Euclides o impede de sustentar o acerto inequívoco de suas constatações e criva a obra de paradoxos, oximoros e ressalvas. Se o aparato teórico apontava para uma direção, a realidade parecia bradar outro caminho e exigir do intelectual uma tomada de posição.

O livro de Euclides certamente se beneficia de um fator pouco considerado: narrou não só o desaparecimento de um povo e os crimes de uma nação, o que já não seria pouco, mas no plano do imaginário nacional historiou o desaparecimento de uma ameaça. Ainda que uma infinidade de injustiças tenham sido cometidas e denunciadas, não se pode minimizar o fato de que o “problema”, na perspectiva de vários setores da sociedade, havia sido resolvido. Com efeito, segundo Cury, a rebelião foi “usada, inclusive, como justificativa política para a perseguição aos monarquistas que ainda restavam na capital da República.”67 Por outro lado, alguns textos marcadamente regionalistas de Coelho Neto e de Afonso Arinos, em especial os contos de Sertão e de Pelo sertão, respectivamente, registravam uma realidade moribunda, que insistia em seguir viva no imaginário nacional. Para além da ficção, mostravam que aquele modelo de modernização centralizada gentrificava espaços urbanos e ignorava a realidade social que escapava ao sopro renovador.

Se Euclides foi capaz de transcender uma parte dos problemas de sua época, é importante considerar em que medida foram deixadas de lado faces importantes da produção de Coelho Neto e de Afonso Arinos, por conta de leituras que consideravam sua estética fruto de cópia degenerada de modelos estrangeiros quando essas mesmas leituras estavam impregnadas do imaginário dos debates políticos do seu tempo. Afinal, é limitador considerar que os autores, quaisquer que sejam, conseguiriam empregar em solo brasileiro pressupostos europeus tais como eram empregados em sua origem. Ainda assim, essa defasagem tem sido vista sobretudo como defeito e incapacidade, quando na verdade deveria apontar para a individualidade de um escritor inserido em outro contexto, respirando outra atmosfera e, com isso, sintetizando de maneira diferente os elementos de que dispõe. Ao invés de tomar os resultados por cópias corrompidas, o viés crítico poderia tentar encará-los no que têm de particularidade e autonomia, e assim talvez perceba que a arte já estava respondendo ao seu tempo e ao seu lugar de maneira nova e própria, mas continuava sendo examinada com lentes cansadas.

Essa dualidade impede, por exemplo, que o caso brasileiro se equipare ao alemão, onde são relevantes os estudos regionais, e explica em parte as diferenças de objeto a que o Regionalismo acabou por designar ao longo do tempo. Segundo Joachimsthaler, na região alemã da Alta Silésia, “por meio da nacionalização da(s) literatura(s) regional(is), moldou-se a literarização da região de tal forma que, ao invés de uma literatura regional, surgiu uma literatura nacional(ista), com o emprego de elementos regionais”.68 Essa mesma realidade se verifica no Brasil durante o Romantismo, quando, sobretudo a partir do capital literário de Alencar, os recortes regionais se impõem como representação nacional e nacionalista. O regional, naquele momento, nacionaliza-se e com isso cria uma representação literarizada das regiões que se consolida no imaginário, marcando certos personagens como personagens-tipo até hoje.

Esse processo, porém, não parece ter se sustentado na virada do século, quando o Regionalismo já atende a outras doutrinas e produz uma visão muito mais derrisória do nacional. Em conjunto com os fatores políticos mencionados, o regional perde sustentação do seu caráter nacionalizador e em muitos casos é visto até mesmo como separatista. Basta recordar o ressentimento de Gilberto Freyre quanto à maneira pela qual seu movimento foi interpretado. No texto com que faz preceder a publicação do Manifesto regionalista de 1926, vinte e cinco anos após o Congresso de Regionalismo do Recife, o autor defende que o movimento nordestino foi apagado não só pelo destaque dado às outras manifestações do mesmo decênio, mas porque “ao Regionalismo do Recife, a seu modo também modernista, mas modernista e tradicionalista ao mesmo tempo, faltou, na sua época heroica, propaganda ou divulgação na imprensa metropolitana, então indiferente, senão hostil, ao que fosse ou viesse de Província. Chegou a ser confundido por jornalistas desatentos do Rio, com separatismo, para alarme e inquietação do então Presidente da República”.69

A literatura que inicialmente se nacionalizara em seguida chega ao extremo de ser vinculada a separatismo. Dentro das contendas que caracterizam todo o período da República Velha, essa dimensão problemática do regional, que não se curva a uma modernização que oblitera tradições e costumes, solapa o poder de legitimação da vertente enquanto

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JOACHIMSTHALER, Jürgen. A literarização da região e a regionalização da literatura, p. 44, grifo original. 69 FREYRE, Gilberto. Manifesto regionalista de 1926, p. 7. Para melhor situar a observação de Freyre, pode-se destacar como são complexas as relações entre Regionalismo literário e federalismo político no início do século XX, pouco mais de duas décadas antes da realização do Congresso. É exemplar, nesse sentido, o caso gaúcho, já que, poucos anos após a sangrenta Revolução Federalista (1893 – 1895), Alcides Maya defende no livro Através

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