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Razões para a interiorização da indústria paulista

3 O processo de desconcentração industrial da região metropolitana paulista

3.2 Razões para a interiorização da indústria paulista

O capital não atinge o território de forma única, pois são priorizadas localidades que possibilitam ganhos de produtividade e, em conseqüência, que estejam munidas dos requisitos básicos para a reprodução capitalista. No território paulista pôde-se, pelo menos até a década de 1980, espacializar o comportamento do capital produtivo por conta da escolha de outras localidades para novas plantas industriais, fossem elas migrantes da região metropolitana ou de novos investimentos produtivos. Os autores já citados observam aí, em consenso, um raio de distância das principais localidades que se beneficiaram do processo de desconcentração.

Lencioni (1994, p. 56) afirma que “a política de descentralização industrial significou, sobretudo, dispersão abrangendo um raio de cerca de 150 km a partir da capital e, indo além desta distância, ao longo dos principais eixos rodoviários”. Negri (1996), ao analisar tal processo, aponta o que chamou de “tendências naturais” da desconcentração:

[...] os principais eixos de penetração industrial, definidos pelo sistema de transportes, através das rodovias que faziam à ligação metrópole-interior. Os eixos considerados foram a Via Anhanguera em direção à Região de Ribeirão Preto, a via Washington Luiz no sentido da região de São José do Rio Preto, a rodovia Castelo Branco, que cortava a região de Sorocaba, e a via Dutra, para o vale do Paraíba, fazendo a ligação com Rio de Janeiro. Desta forma, detectaram-se as “tendências naturais” do processo de expansão industrial no sentido capital-interior. (NEGRI, 1996, p. 170 e 171).

Fica muito claro que o processo de desconcentração industrial vivido pela capital e sua região metropolitana não atinge o território paulista de forma homogênea. As áreas privilegiadas pelo capital para sua expansão dentro do território paulista não ultrapassaram 150 km da capital. Algumas localidades que são atendidas pelos principais eixos de desenvolvimento, encontrados na figura 3, tiveram a oportunidade de receptar as plantas industriais migrantes da Capital, pelo fato de fazerem parte das principais rodovias sentido Capital – Interior. Contudo, não foi isto o que ocorreu.

Fonte: Mapa Rodoviário 2004

Organizador: Cássio Antunes de Oliveira, 2006 Desenhista: Leandro Bruno dos Santos, 2006.

Deste modo, a cidade de São José do Rio Preto, mesmo não estando no raio de 150 km destacado, é privilegiada, segundo Negri, pois se apresenta no eixo formado pela rodovia Washington Luiz. As cidades de Araçatuba e Bauru se beneficiam da rodovia Marechal Rondon. Presidente Prudente acompanha a rodovia Raposo Tavares, embora não tenha trecho duplicado em toda sua extensão. A cidade de Marília não pertence a nenhum eixo destacado por Negri, nem pelas principais rodovias estaduais que tem predomínio, em sua extensão, de via duplicada.

Importante destacar que as cidades médias aqui estudadas são conectadas aos mais modernos meios de telecomunicações, como a conexão à rede estadual de fibra ótica, por exemplo, e estão amplamente integradas à rede urbana estadual e, por conseguinte, nacional e internacional, isto é, possuem toda a infra-estrutura imperada pelo capital para sua reprodução.

O intrigante são os motivos pelos quais as cidades, que possuem um histórico ligado à produção, que são conectadas à rede urbana estadual (uma das mais densas do Brasil), que são “plugadas” com o mundo através da informática e que são, em sua maioria, conexão para

linhas aéreas, ou seja, que estão em territórios de grande fluidez, não terem sido destino para empresas que saíram da capital paulista sentido interior.

Não vamos esgotar as respostas para uma indagação tão complexa, mas entendemos que temos indícios para algumas respostas satisfatórias, começando pelo que já expomos acerca do pensamento de Lencioni, quando apontamos a concentração e diversificação dos serviços localizados na capital e, por conseguinte, a necessidade destes serviços para melhor competitividade das empresas. Outro fator é pela proximidade desejada da maior aglomeração urbana do país, principalmente em setores da indústria de bens de consumo, ou seja, necessidade de estar perto do mercado consumidor.

Outro fator que achamos importante é apontado por Negri, destacamos a busca de pólos de disseminação de tecnologia no interior. Os investimentos federais e estaduais na rede de universidades públicas e o fomento à pesquisa geraram, no interior, pólos tecnológicos que atraem investimentos produtivos. Municípios como os de Campinas, São José dos Campos, São Carlos e Piracicaba foram destinos de setores como metal-mecânico, de telecomunicações, aeroespaciais, informática, químico, transporte, bélico, eletrônico, entre outros. Como já apontado, ocorreram no interior paulista investimentos públicos produtivos que também atraíram alguns setores econômicos como, por exemplo, as indústrias do setor petroquímico, que buscaram a proximidade com as refinarias localizadas no estado. A tabela 1 mostra o comportamento de alguns setores industriais no período de 1967 a 1980, e por ela comprovamos a interiorização de alguns ramos industriais.

Tabela 1. Modificação na estrutura setorial da indústria de transformação do interior do Estado de São Paulo: 1967-1980 (Valores em percentagem do VTI)

Setores/Anos 1967 1970 1975 1980

Indústria Predominantemente Produtora de Bens

Intermediários 37,7 35,4 42,7 45,7

1. Químico 17,2 12,6 19,3 24,3

2. Minerais Não-Metálicos 5,6 7,0 6,6 5,7

3. Metalurgia 6,0 7,6 8,3 7,7

4. Outros 8,9 8,2 8,5 8,0

Indústria Predominantemente Produtora de Bens de

Capital e de Consumo Duráveis 14,9 15,4 25,0 26,3

1. Mecânica 5,9 6,8 11,7 12,4

2. Material de Transporte 4,2 4,9 5,7 5,7

3. Material Elétrico e de Comunicações 4,0 2,0 4,4 4,5

4. Outros 1,1 1,7 3,2 3,7

Fontes: 1. IBGE – Censos Industriais de 1970, 1975 e 1980 2. IBGE – Pesquisa Industrial de 1967

A distância da capital paulista, a não configuração como pólos tecnológicos, a não recepção de investimentos produtivos públicos já seriam, a nosso ver, respostas plausíveis para responder por que os municípios de São José do Rio Preto, Bauru, Presidente Prudente, Marília e Araçatuba não foram destinos dos capitais produtivos que buscaram, a partir da década de 1970, localidades mais competitivas que a capital. Acreditamos ainda, que as localidades que fazem parte do raio de 150 km da capital paulista e nos eixos rodoviários que serviram de receptáculo para as indústrias interiorizadas, se apresentaram como alternativas até a década de 1980, suficientes para atender às necessidades de qualidade de vida, de desenvolvimento tecnológico e de proximidade do maior mercado consumidor do país, requisitos desejados pelo capital produtivo na busca de ganhos de competitividade outrora oferecidos pela Região Metropolitana de São Paulo.

Importante ressaltar mais um ponto no processo de desenvolvimento industrial do interior: a partir dos anos 1970, a agricultura passa por profundas mudanças relacionadas à produção e processamento de seus derivados, sendo ainda, alvo de políticas públicas que visaram, entre outros objetivos, equilibrar a balança comercial brasileira.