3.1.1 Matérias-primas e ligantes aéreos e hidráulicos
[52, 93, 98, 99, 147]]Enquanto a cal aérea é obtida a partir do calcário, fundamentalmente constituído por CaCO3, com
mais ou menos impurezas, a cal hidráulica parte da utilização de calcários com o máximo de 20% de argila (calcários margosos), contendo portanto compostos argilosos (SiO2, Al2O3 e Fe2O3),
estando classificada como cal hidráulica natural (NHL), ou da mistura de hidróxido de cálcio, silicatos de cálcio e aluminatos de cálcio pré-determinada, classificando-se como cal hidráulica artificial (HL). No caso do cimento Portland, o seu fabrico pressupõe a utilização de calcários margosos ou a mistura de cal com argila, variando a componente argilosa entre 20% e 40%. A composição química do clinker, produto obtido após a transformação térmica das matérias-primas para a produção do cimento, é caracterizada por conter teores em CaO que variam entre 60% e 68%, em SiO2 entre 17% e 25%, em Al2O3 entre 2% a 9% e em Fe2O3entre 0,5% e 6%. A adição
gesso, é efectuada na altura de moagem do clínquer resultante do processo de cozedura, de forma a produzir cimento CEM em que o teor de hidróxido de cálcio e sílica reactivos deverá ser superior a 50%.
Os compostos básicos MgO, K2O e Na2O estão normalmente presentes de forma residual nas
30
3.1.2 Fabrico de ligantes/ Compostos formados durante o processo
Cal Aérea [32, 52, 93, 147]]
De uma forma simplificada, omitindo as reacções secundárias que podem ocorrer durante o processo, devido à presença de impurezas na matéria prima, pode-se descrever a reacção ocorrida a partir da calcite (CaCO3) ou dolomite (CaMg(CO3)2) quando sujeita a aquecimento até
cerca de 900ºC, como: 2 3
Calor
CaO
CO
CaCO
+
→
+
[Eq. 3-1] 2 2 3)
2
(CO
Calor
CaO
MgO
CO
CaMg
+
→
+
+
[Eq. 3-2]Trata-se, portanto, de reacções endotérmicas, com libertação de dióxido de carbono. A produção da cal aérea hidratada pressupõe a hidratação do óxido de cálcio ou de magnésio, para se obter hidróxido de cálcio ou magnésio através da seguinte reacção:
2 2
O
Ca(OH)
H
CaO+
→
[Eq. 3-3] 2 2 2(
)
(
)
2H
O
Ca
OH
Mg
OH
MgO
CaO+
+
→
+
[Eq. 3-4]É o hidróxido de cálcio (por vezes, conjuntamente com o hidróxido de magnésio), em pasta ou em pó, dependendo do processo de extinção, que é utilizado como ligante nas argamassas de cal.
Cal Hidráulica [45, 75, 98]
No fabrico da cal hidráulica, com cozedura das matérias-primas a cerca de 1200ºC, geram-se compostos semelhantes aos presentes no fabrico de cimento, sendo de salientar a formação de C2S (2CaO.SiO2) e os compostos C3A (3CaO.Al2O3) e C4AF (na forma de solução sólida variando
entre C2F (2CaO.Fe2O3) e C6A2F (6CaO. 2Al2O3.Fe2O3)), embora estes últimos estejam presentes
em pequenas quantidades. É expectável a presença escassa de C3S (3CaO.SiO2) devido a altas
temperaturas pontuais no processo de queima, assim como de percentagens variáveis de calcite, dolomite e CaO que não tiveram tempo, temperatura ou estequiometria para reagirem. A principal diferença de composição relativamente ao cimento reside na diminuição da relação C3S/C2S, dado
que o primeiro composto é formado a temperaturas mais elevadas, só pontualmente atingidas nos fornos de fabricação de cal hidráulica. Ao nível de fabrico, este produto necessita de passar pelo processo de extinção, da mesma forma que a cal aérea de forma a converter o CaO em Ca (OH)2.
31 Fig. 3. 1 Modificações químicas no processo de fabrico do cimento Portland, conforme [100] Cimento [52, 93, 147]
Fundamentalmente devido às altas temperaturas atingidas (1450ºC), os compostos que constituem o cimento são, principalmente C3S (alite), C2S (na forma de βC2S, belite), C3A e C4AF
(4CaO.Al2O3.Fe2O3), com preponderância para o C3S (Fig. 3. 1). No processo de formação destes
compostos, é necessária uma rápida velocidade de arrefecimento, dado que o composto C3S é
instável a temperaturas inferiores a 1250ºC e o composto βC2S produzido a 1450ºC não é estável
abaixo dos 675ºC, transformando-se em γC2S, que é muito pouco reactivo. Na realidade, outros
elementos estão presentes na estrutura destes compostos; assim ao C3S contendo Mg, Al ou Fe é
dado o nome de alite e ao βC2S com K, P ou Ba, o nome de belite. Em ambos os casos, tratam-se
de estruturas cristalinas. O composto C3A existe sob a forma cristalina ou como vidro nas zonas
32
3.1.3 O fenómeno da carbonatação
Partindo de ligantes aéreos, a reacção que provoca o endurecimento de argamassas é designada por carbonatação e refere-se à reacção do hidróxido de cálcio ou de magnésio com o dióxido de carbono, obtendo-se carbonato de cálcio e carbonato de magnésio, respectivamente, consoante as equações 3.5 e 3.6: 3 2 2
)
(OH
CO
CaCO
Ca
+
→
[Eq. 3-5] 3 2 2)
(OH
CO
MgCO
Mg
+
→
[Eq. 3-6]Estas reacções ocorrem simultaneamente em argamassas produzidas com cal aérea ou com cal hidráulica.
3.1.4 O fenómeno da hidratação
[52, 93, 147]
O fenómeno de hidratação ocorre tanto nas cais hidráulicas como no cimento, a fase de hidratação é complexa e demorada, devido aos variados elementos intervenientes e reacções simultâneas. Neste ponto serão tratadas as principais reacções típicas de um cimento Portland.
As principais reacções que ocorrem no cimento Portland, após adição de água, são de hidratação, e podem traduzir-se fundamentalmente pelas seguintes equações:
2 3 2 3 3
6
3
(
)
2C
S+
H
→C
S
H
+
Ca
OH
[Eq. 3-7] 2 3 2 3 24
(
)
2C
S+
H
→C
S
H
+Ca
OH
[Eq. 3-8] 6 3 6 3 2 4AF
2Ca(OH)
10H
C
AH
C
FH
C
+
+
→
+
[Eq. 3-9]Os compostos C3S2H3 são usualmente designados por C-S-H e parecendo amorfos, mostram a
sua cristalinidade quando observados por MEV, dada a sua estrutura microcristalina.
Dado que a reacção do composto C3A com a água (Equação 3.10) é muito violenta, provocando
endurecimento imediato, é adicionado gesso (CaSO4 .2H2O) no final do processo de fabrico do
cimento para reagir com o C3A, durante a fase de desenvolvimento de presa, formando-se
33 Paralelamente, o composto C4AF também reage com o gesso, produzindo sulfoferrite de cálcio e
sulfoaluminato de cálcio. A etringite é posteriormente transformada em monosulfato de cálcio (C3A.CS¯ H16), metaestável, formando-se ao longo do tempo aluminato tricálcico hidratado
(C3AH6). 6 3 6 3 3
A
6H
C
AH
C
FH
C
+
→
+
[Eq. 3-10])
(
3
26
3
2 3 32 3A
CS
H
H
C
A
CS
H
etringite
C
+
−⋅
+
→
−⋅
[Eq. 3-11]Fig. 3. 2 Libertação de calor devido às acções de hidratação (conforme [93])
Durante a fase de hidratação, os primeiros a reagir são o C3A e o C3S, sendo que, com a adição
de gesso, o C3S reage em primeiro lugar; a reacção do C2S é mais lenta. A libertação de calor
devido às reacções de hidratação é usualmente monitorizada de forma a permitir o acompanhamento dos diversos momentos de ocorrência destas reacções [Fig. 3. 2], em que A corresponde fundamentalmente à reacção do C3A com a água, anterior à acção do gesso e B (que
ocorre usualmente entre as 4h e as 10 h) corresponde principalmente à reacções de hidratação. Num período entre as 18 e 30h surge o pico C, devido à renovada acção do C3A com a água,
após esgotamento do gesso. Após a fase de hidratação, a pasta é composta pelos vários compostos hidratados - silicatos hidratados, aluminatos de cálcio, sulfoaluminatos de cálcio e
34
ferrites - muito ou pouco cristalizados, por cristais de Ca(OH)2 (portlandite), outros componentes
minoritários e cimento não hidratado, numa estrutura porosa. As impurezas das matérias primas e o combustível utilizado na queima introduzem outros compostos, minoritários, no cimento, tais como os compostos alcalinos (Na, K), os compostos de magnésio que podem cristalizar ou manter-se na fase vítrea e também fluoretos, fosfatos, óxidos de chumbo e zinco e sulfuretos.