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A reaproximação politica entre a Europa e a América Latina na década perdida dos anos de 1980.

CAPÍTULO IV. A Europa e a América Latina: a reaproximação do Velho Continente à Região.

IV.1 A reaproximação politica entre a Europa e a América Latina na década perdida dos anos de 1980.

Nos anos de 1970, o diálogo entre os governos das CE (UE) e dos países latino- americanos foi constrangido e ou dificultado pelos regimes ditatoriais que existiam naquela época, naquela região. Contudo conseguiu-se o estabelecimento de um Sistema de Preferências Generalizado / SPG280, ou seja, as CE (UE) concederam aos países da América Latina certas facilidades de acesso ou “acesso preferencial” ao seu mercado, consoante o grau de desenvolvimento. Ao nível bilateral foram assinados alguns acordos sectoriais, de ajuda financeira e técnica, de apoio aos refugiados, ajuda

277 Paulo Sande, Director do Gabinete do Parlamento Europeu em Portugal (2004-2012). Comunicação apresentada na Conferencia Internacional “A UE e a América Latina”, que teve lugar na sede da UAL, em Lisboa, em 11 Outubro de 2011.

278 Atribui-se este desinteresse à viragem dos EUA para a região Ásia-Pacífico, ao mesmo tempo que a sua agenda internacional prioriza as questões de segurança. Benevolente porque dá uma maior margem de autonomia aos estados latino-americanos.

279 Para uma análise sobre o tema das Relações entre a China e a América Latina, veja-se OROPEZA GARCÍA, Arturo (2006), China. Entre el Reto y la Oportunidad, pp. 235-271.

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O «Sistema de Preferências Generalizadas» (SPG) é um conjunto de regras da UE que permite que os exportadores de países em desenvolvimento paguem direitos mais baixos sobre a totalidade ou parte dos produtos que vendem à UE. Actualmente beneficiam destas regras, 176 países ou territórios em desenvolvimento.

131 alimentar, apoio nas catástrofes naturais da região, e de cooperação na área da energia e siderurgia.

Desde princípios dos anos de 1980, uma serie de acontecimentos ocorrem no subcontinente americano revitalizando o interesse da CE (UE) numa reaproximação, e dinamizando um pouco mais a relação inter-regional: A guerra na América Central; a crise da divida externa que irrompe em 1981-82, com o seu impacto negativo nas relações económicas europeu - latino-americanas; e a guerra das Malvinas, que pusera em evidência a falta de comunicação entre ambas as margens.

O início do retorno da democracia nos países do cone sul, e a sua maior presença na cena internacional, atraíra também a atenção dos países europeus, que irão dar apoio às novas democracias. Muitos dos processos de transição na região serão conduzidos de facto por partidos políticos com fortes ligações aos partidos europeus, através das internacionais dos partidos políticos.281 Daí a importância que as internacionais políticas europeias terão neste contexto, como facilitadoras do processo que conduziria mais tarde a uma reaproximação efectiva entre as duas regiões.

A guerra na América Central.

O conflito centro-americano ‒ no contexto da Guerra Fria ‒ entra num processo de escalada e de ameaça de desestabilização da região que leva Europa a implicar-se directamente na procura de soluções pacíficas e negociadas, em paralelo ao recrudescimento do confronto este-oeste. Podemos dizer que pela primeira vez, os países da CE (UE) agem de forma concertada na cena internacional.

Com efeito, a guerra na América Central e a “política intervencionista” seguida pelo presidente norte-americano, Ronald Reagan, conduziram num primeiro momento a alguns países europeus, como a França socialista de François Mitterrand, no sentido de unir a sua voz ao México ‒ no contexto mais específico da guerra do El Salvador ‒ ,

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através de uma Declaração Conjunta apresentada ao Conselho de Segurança da ONU, em 28 de Agosto de 1981.282 Nessa declaração política, tornada pública, o México e a França afirmaram que a oposição armada de El Salvador constituía uma “força política representativa” devendo, por tanto, participar na solução do conflito.283

No Conselho Europeu de Março de 1982, a CE (UE) decidiu definitivamente dar uma atenção especial à sub-região da América Central. A partir desta data, a Europa solidária e concertadamente vai apoiar abertamente as iniciativas dos países de toda a América Latina, em particular do Grupo de Contadora (México, Panamá, Colômbia e Venezuela), empenhado em encontrar uma solução politica negociada para os diversos conflitos locais. No Conselho Europeu de Estugarda, de Junho de 1983, acordou-se o avanço no estabelecimento dessas relações, através da intensificação da ajuda à sub- região, a assinatura de um acordo de cooperação e a institucionalização do diálogo político e económico. Foi assim que a CE (UE) ficou associada, desde 1984, ao histórico Processo de San José, que reuniu os estados centro-americanos e os Grupos Contadora e Grupo de Apoio (Argentina, Brasil, Peru e Uruguai).

O resultado do processo antes referido foi a I Conferência de San José realizada em San José de Costa Rica, de 28 a 29 de Setembro de 1984.284 O objectivo do fórum era estabelecer uma nova estrutura de diálogo político e cooperação económica entre a Europa e a América Central, destinada a facilitar a conclusão de um acordo de cooperação, assim como a solução pacífica e negociada de conflitos, servindo para promover a justiça social, o desenvolvimento económico e o respeito pelos direitos humanos e a democracia na região.

282 O conflito armado salvadorenho opunha por um lado, o Frente Democrático Revolucionário (FDR) e o Frente Farabundo Martí para a Libertação Nacional (FMLN), e do outro, as Forças Armadas Oficiais Salvadorenhas (exército e polícia).

283 Cf. GOMES, Nancy (1999), “Europa e América Latina: a cooperação inter blocos”, p. 173. Ainda, para uma análise e reflexão sobre o conflito salvadorenho (1932-1985), veja-se FIGUEROA SALAZAR, Amílcar (1987), El Salvador, 125 p.

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A entrada de Portugal e Espanha e os primeiros acordos de cooperação económica.

Em 1984, Portugal e a Espanha participam na I Conferencia de San José junto aos restantes países da Comunidades Europeias, envolvendo-se de facto na Cooperação Política Europeia. Com a entrada efectiva dos dois países ibéricos, no quadro das instituições comunitárias, em 1986, o processo de reaproximação entre a Velha Europa e o Novo Mundo ganha um novo dinamismo. Nesse sentido, Fernando Garcia Casas afirma que,

No que respeita a UE e a América Latina, até 1986, só havia o Dialogo San José com a América Central, e desde então, a maioria das iniciativas políticas e diplomáticas que permitiram a evolução deste relacionamento deve-se a Portugal e a Espanha, e muitas vezes aos dois conjuntamente. Se hoje podemos falar de parcerias estratégicas bi-regionais, em boa medida deve-se a Portugal e a Espanha”285

.

Com efeito, um novo quadro conceptual para as relações entre a Europa e a América Latina é definido a partir da Declaração Comum de Intenções, anexa ao Tratado e Acta de Adesão. A importância deste documento radica no plano político, por quanto é reflexo da vontade comunitária de reorientar a sua política para a região. O caracter formal deste documento vai possibilitar a apertura de um processo de reflexão das instituições comunitárias na procura de novas linhas de actuação.286

Este novo quadro conceptual inclui também as Novas Orientações da CE (UE)

para as Relações com a América Latina, do Conselho Europeu de 1987. Trata-se do

primeiro documento emitido pelo Conselho, exclusivamente para a região, que estabelece ao mesmo tempo, um novo quadro jurídico, e os mecanismos através dos quais proceder ao reforço do relacionamento inter-regional. Arenal clarifica, “as Novas Orientações definem as bases de uma relação nova, igualitária e de sócios naturais, afirmam a existência de valores, objectivos e interesses comuns, supõe o

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Fernando García Casas, Director do Gabinete do Secretario Geral da SEGIB. Comunicação apresentada na Conferencia Internacional “A UE e a América Latina”, que teve lugar na sede da UAL, em Lisboa, em 11 Outubro de 2011.

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reconhecimento da necessidade de mudança e abrem um caminho de possibilidades de cara ao futuro”287

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Ainda na década perdida da América Latina, a partir de 1988, a CE (UE) procura a institucionalização de diversos mecanismos de cooperação económica e política. Temos por exemplo, o aumento das ajudas comunitárias para a região, passando a constituir 35% do total das Ajudas ao desenvolvimento; a inclusão do Haiti e da República Dominicana no IV Convénio ACP-CEE; e a abertura das delegações da CE (UE) em Bogotá, Brasília, Buenos Aires, Guatemala, Lima, México, San José Costa Rica, Santo Domingo e Montevideu, somando-se às já existentes de Caracas e Santiago de Chile.288

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