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2 NOÇÕES GERAIS ACERCA DA PROPRIEDADE E MULTIPROPRIEDADE

2.3 ATRIBUTOS DA PROPRIEDADE E SUA CORRELAÇÃO COM A

2.3.4 Reaver

É possível compreender que reaver a propriedade seria tomar de volta ou recuperar aquilo que é seu por direito, reconquistando o bem que fora injustamente perdido, com a finalidade de restituir e permitir que o proprietário mantenha sua dominação sobre o bem (FARIAS; ROSENVALD, 2019).

Nesta faculdade se revela ao proprietário o direito de sequela, ou seja, a relação jurídica que permanecerá vigente, mesmo que terceiro exerça (injustamente) os poderes relativos ao de dono sobre a coisa, garantindo ao proprietário a possibilidade de seguir a coisa onde quer que esteja ou em que estado se encontre (RIZZARDO, 2016).

A faculdade de reaver, ou reivindicar a coisa, expõe em seu conteúdo o caráter erga omnes. Isso quer dizer que o direito subjetivo será oponível contra todos aqueles que não possuírem relação jurídica que permita a justificação do exercício da posse perante o imóvel, resultando na recuperação da coisa em favor do legitimado.

O artigo 1.228 do Código Civil, em sua parte final do caput fala em “[...] reaver [a propriedade] de quem injustamente a possua ou detenha” (BRASIL, 2002), isto é, todos aqueles que detenham a posse injusta estarão sujeitos a perda, inclusive, em sendo o caso, o detentor.

O detentor é aquele que conserva a posse em favor do proprietário, como bem expõe o artigo 1.198 do diploma civil atual, ao prever que “considera-se detentor aquele que, achando- se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas” (BRASIL, 2002).

Exemplificando a figura do detentor, imagine-se que o proprietário pague a uma pessoa para que more em seu sítio, na intenção de que este cuide da estrutura da casa, a vida das plantações, a criação de animais, entre outras razões. O detentor é aquele que conservará a posse por ordem ou alguma outra relação de dependência com o proprietário. (TARTUCE, 2016).

Fica evidente, assim, considerando as informações levantadas, que a lei faculta ao proprietário a possibilidade ingressar com a ação reivindicatória contra quem injustamente possua a coisa.

2.4 A FUNÇÃO SOCIAL E ECONOMICA DA PROPRIEDADE E DA MULTIPROPRIEDADE

A propriedade envolve interesses indiretos de outras pessoas, e até de toda a sociedade, que almejam o atendimento à sua função social. Estes interesses subsistem quando o proprietário, por intermédio das atribuições concedidas a ele, resguarda seu bem a fim de que se atinja uma finalidade social (TARTUCE, 2016).

Prevê a Constituição Federal, em seu artigo 5º que, ao garantir o direito de propriedade no inciso XXII, impõe também ao proprietário uma obrigação, conforme previsto no inciso XXIII, qual seja, a de que a propriedade deve atender a sua função social (BRASIL, 1988).

Posto isto, sabe-se que o artigo 1.228 do Código Civil traz os poderes inerentes à propriedade (já analisados), mas também engloba em seu § 1º, segundo Tartuce (2016, p. 960), “um dos preceitos mais importantes da vigente lei civil”, ao dizer que o proprietário deve exercer o seu direito resguardando ou preservando os interesses sociais, econômicos, históricos e ambientais (BRASIL, 2002).

Para melhor se compreender o que seria a função social da propriedade, é possível citar a lição de Farias e Rosenvald (2019, p. 322) no que compreendem que “a expressão função social procede do latim functio, cujo significado é de cumprir algo ou desempenhar um dever ou uma atividade”. Por sua vez, Rizzardo (2016 p. 167) impõe um conceito negativo ao dizer que “um imóvel que permanece inativo ou inaproveitado, com o objetivo da simples valorização e posterior revenda, não está realizando a função social”.

O cumprimento da função social, então, está condicionado ao efetivo exercício da propriedade sobre o bem, sendo uma ação social individual. Este ato se define em prol do coletivo, o qual é a conduta de um único sujeito, em situação de dependência da ação do próximo, para o bem coletivo. (CASAGRANDE; AMORIM, 2011).

A Constituição Federal ainda dispõe no § 2º do seu art. 182 que “a propriedade urbana cumpre sua função social quando atender às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor” (BRASIL, 1988).

De igual forma, a Carga Magna também dispõe em seu artigo 186, mais propriamente nos incisos I a IV, os requisitos que são inerentes ao cumprimento da função social da propriedade urbana, mas que podem ser interpretados como de uso analógico ao imóvel urbano. Seriam estes: o aproveitamento racional e adequado do imóvel e dos recursos naturais que ele dispõe, preservando o meio ambiente, observando as disposições que regulam

o relacionamento laboral e explorando o imóvel de modo que favoreça o bem-estar dos proprietários e trabalhadores. (BRASIL, 1988).

A função social, de certo modo, limita o direito do proprietário e daí extrai-se ideia de que a propriedade não mais seria absoluta, mas sim “relativizada ao se deparar com um outro direito fundamental protegido pela lei” (TARTUCE, 2016, p. 958).

O dono é obrigado a cumprir a finalidade social. Farias e Rosenvald (2019, p. 323) esclarecem que “[...] o ordenamento jurídico apenas concederá merecimento à persecução de um interesse individual se este for compatível com os anseios sociais que com ele se relacionam”. Isto significa que o interesse do particular vigorará enquanto atender a vontade da coletividade, não sendo admitido direito exclusivo que prejudique os demais.

Justificando a limitação do exercício da propriedade condicionada à busca da finalidade social, Rizzardo (2016, p. 181) é seguro em arguir que “a conscientização social dos povos, com a liberalização das ideias e dos conceitos de valores tradicionais, leva a imposições de leis e condutas de cunho eminentemente social, inclusive quanto à concepção da propriedade.”

De modo objetivo e claro, e dadas as informações acima, pode-se concluir que o cumprimento da função social é requisito para que o proprietário se mantenha nessa condição de dono da coisa, devendo manter propriedade produtiva, gerando retorno para a sociedade.

Aquele que é ausente na obrigação de conceder uma destinação ao bem que atenda as exigências sociais, poderá sofrer desapropriação, diante de um interesse do Estado em dar uma melhor finalidade ao imóvel na intenção de alcançar um fim econômico, preservando o meio ambiente, inerente ao bem coletivo (TARTUCE, 2016).

A preservação do meio ambiente está incorporada na função social, não havendo como se falar em função social sem a observância da preservação ambiental, tendo em vista a importância inegável na vida da sociedade. Nesta perspectiva, Rosa, Fraceto e Moschini-Carlos (2012, p. 153) explanam que “a vida de todos os seres vivos causa alterações no meio ambiente. Estas podem ser alterações químicas, físicas e até biológicas, cuja extensão depende da sua intensidade e frequência”.

Por isso, exercer o poder de propriedade cumprindo a função social, isto é, praticando aquilo que a coletividade espera do próximo, é primordial e indispensável, justificando sua previsão no rol dos direitos fundamentais do Estado brasileiro.

Porquanto que, na multipropriedade, o instituto traz uma renovação na área imobiliária, turística e social, pois incentiva o mercado imobiliário, principalmente em épocas de férias, em que as pessoas poderão usufruir do imóvel com a sua propriedade plena, dentro

da fração de tempo que adquiriram, deixando o imóvel para que o próximo multiproprietário possa usufruir do bem, mantendo o seu estado de conservação, cooperando com o meio ambiente e cumprindo a função social da propriedade.

Ainda, deve ser ressaltado que nas situações de propriedade comum, em que o proprietário visita o imóvel somente nas férias, por exemplo, em regra, o bem passa a se deteriorar diante do pouco uso e conservação, diferentemente do que ocorre na propriedade compartilhada, uma vez que o imóvel passará a ter utilidade perpétua.

Neste sentido, a multipropriedade tem a intenção de se apresentar como uma solução, sendo um dos argumentos de justificação do instituto, o valor da fração de tempo do imóvel, o qual é financeiramente abaixo quando comparado com a aquisição da propriedade comum (TEPEDINO, 1993).

A explicação deste fenômeno é socioeconômica, uma vez que o período de férias é breve, sendo interessante a possibilidade de assegurar uma disponibilidade habitacional em certos lugares turísticos, porém, o preço para aquisição destes imóveis é muito elevado, demonstrando ser vantajoso, financeiramente, a divisão temporal, em que um grupo de pessoas estará rateando as obrigações e despesas.Portanto, o custo-benefício da aquisição de uma fração de um imóvel é demasiadamente favorável comparado à compra da totalidade de um imóvel. (ADROGUÉ, 1995).

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